SínteseUnidade 3 Poetas contemporâneos Síntese Poetas contemporâneos: Miguel Torga MIGUEL TORGA • Adolfo Correia Rocha nasce em São Martinho de Anta, no distrito de Vila Real, a 12 de agosto de 1907. Estuda na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra entre 1928 e 1933. • Em 1928, publica a sua primeira obra em verso. • Terminado o curso de Medicina, regressa a S. Martinho e exerce, depois, como clínico geral, em Vila Nova de Miranda do Corvo. • Em 1934, publica, já com o pseudónimo Miguel Torga, A Terceira Voz. Miguel Torga, fotografia de Alfredo Cunha, «Miguel Torga e a consciência da portugalidade», in Público online, 9 de março de 2016. Síntese Poetas contemporâneos: Miguel Torga O poeta considera-se um geófago, porque afirma precisar de “comer” terra, alimenta-se desta, precisa da sua presença física e da sua proximidade para se retemperar e recuperar forças. planícies serras Portugal Temáticas Natureza terra Homem e a sua condição Em Torga, toda a representação do contemporâneo está associada à representação da Natureza, ao amor pela terra e ao apego do poeta a ambas, onde encontra motivo de paz e serenidade e se sente feliz. Síntese Poetas contemporâneos: Miguel Torga • O poeta figura no poema como alguém em «Aqui, diante de mim, quem o bem e o mal não são dissociáveis, Eu, pecador, me confesso revelando o desespero humanista próprio de De ser assim como sou. quem conhece bem a humanidade, com todos Me confesso o bom e o mau os seus pecados e virtudes. Que vão ao leme da nau Nesta deriva em que vou. (…)» • No seu interior de poeta coexistem o bom e Miguel Torga, Poesia Completa, Vol. I, Lisboa, Dom Quixote, 2007, pp. 85-86 o mau, espelhando a divisão interior do eu. Síntese Poetas contemporâneos: Miguel Torga Figurações do poeta • O poeta surge ora com pudor ora numa espécie de revelação. • Ser em agonia ou homem revoltado, é efetivamente o retrato do poeta que é desenhado nos seus poemas. Isolino Vaz, Retrato de Miguel Torga, 1961. Síntese Poetas contemporâneos: Miguel Torga Arte poética • A espontaneidade da inspiração alia-se a um processo rigoroso de trabalho sobre o poema. • Matéria literária e modo de expressão da poesia são indissociáveis. Miguel Torga na sua máquina de escrever. Tradição literária • Recolhe influências de outros poetas e correntes literárias diversas, mas constrói uma personalidade literária inconfundível. • Aborda as contradições, que decorrem da luta permanente com o mundo, com as palavras e com Deus. Síntese Poetas contemporâneos: Miguel Torga Representação do contemporâneo Todos os recantos da paisagem, sobretudo portuguesa, são transmitidos por meio de uma linguagem poética que os transforma num verdadeiro mosaico de cores e sensações. Ambiente de mitos agrários e pastoris que (da sua origem aldeã transmontana) remontam aos símbolos bíblicos. A semente, a seiva, a colheita, a água, a terra, o vento, o pão, o parto, o pastoreio, Adão e Eva, por exemplo, recorrem nos seus livros como se fossem, não ideias, mas imagens irradiantes. Síntese Poetas contemporâneos: Miguel Torga Linguagem, estilo e estrutura • Importância do trabalho técnico do verso e poema. • Presença de rima. • Oralidade e temporalidade. • Uso de imagens irradiantes: a semente, a seiva, a colheita, a água, a terra, o vento, o António Carneiro, pão, o parto, o pastoreio, Adão e Eva. Porto Manso; o Rio Douro em Arcede, 1927. Síntese Poetas contemporâneos: Eugénio de Andrade EUGÉNIO DE ANDRADE • José Fontinhas nasce no concelho do Fundão (Póvoa de Atalaia), onde foi criado, no seio da Natureza, pela sua mãe. • Fez os seus estudos em Castelo Branco, Lisboa e Coimbra. • A mãe acompanhou-o sempre até, praticamente, à sua morte, o que justifica a enorme ligação do poeta e como que uma fixação na figura materna. • A partir de 1950, passou a residir no Porto. • Desde cedo despertado para a poesia no Eugénio de Andrade contacto com, entre outros, Fernando Pessoa e Camilo Pessanha, publicou uma obra que pode considerar-se avultada. Síntese Poetas contemporâneos: Eugénio de Andrade Figurações do poeta • O poeta projeta, medindo cada traço, o seu retrato, a sua própria imagem, de um poeta que persegue obstinadamente as palavras difíceis. Arte poética • O ato poético é o empenho total do ser para a sua revelação. • O poeta procura sílaba a sílaba para António Carneiro, Paisagem, 1920. encontrar a forma certa do poema. Síntese Poetas contemporâneos: Eugénio de Andrade «(…) Desamparadas, inocentes, Ideia de polissemia das palavras leves. Tecidas são de luz e são a noite. E mesmo pálidas Podem ser «desamparadas, inocentes, verdes paraísos lembram ainda. leves», como também «cruéis desfeitas». Surgem espontaneamente, Quem as escuta? Quem por vezes, muito frágeis, mas as recolhe, assim, lembrando, ou ajudando a criar cruéis, desfeitas, sempre, uma certa ideia de paraíso nas suas conchas puras?» idealizado. Eugénio de Andrade, op. cit, pp. 105-106. Síntese Poetas contemporâneos: Eugénio de Andrade Tradição literária Representação do contemporâneo • Poesia de temática lírica amorosa por • Forte presença do «agora»: interessa- excelência, na esteira da poesia de lhe o tempo presente ou o futuro. tradição oral e de Camões sobretudo. • Forte presença do «aqui» – marcado • Poesia rica e variada, com um pelos quatro elementos: água, terra, fogo simbolismo enraizado na tradição e ar. literária de várias culturas, e nas vivências pessoais do escritor beirão • Forte presença do mundo rural e da (presença recorrente de elementos natureza: árvores, rios e flores. como – água, árvores, flores e frutos). • A paisagem demarcada pelos granitos, • O poeta não inventa a palavra, pelas oliveiras e pelos campos de trigo é mas sim uma nova linguagem, a partir da mitificada. sua utilização em contexto poético. Síntese Poetas contemporâneos: Eugénio de Andrade Linguagem, estilo e estrutura • A palavra surge como mediadora entre o mundo que o poeta propõe e a nova recriação por parte do leitor. • Presença de termos dicotómicos, como «silêncio/sentado», «chover/olhos» e o trio «carícia/ olhos/mãos», que apresentam novos sentidos conjugados. • Uso abundante da palavra «palavra» e da palavra «nome». Síntese Poetas contemporâneos: Ana Luísa Amaral ANA LUÍSA AMARAL • Nasceu na Maternidade Alfredo da Costa, em 1956. • Mudou-se aos nove anos, por vontade alheia, de Sintra para Leça da Palmeira. • Andou, dos dez aos dezasseis anos, num colégio de freiras espanholas. • Frequentou a Faculdade de Letras do Porto, tendo-se licenciado em Germânicas (Inglês e Ana Luísa Amaral. Alemão). • Trabalhou como Professora Associada nessa Universidade e foi publicando livros de poemas e contos infantis. Traduziu poetas. Recebeu prémios. Vive ainda em Leça da Palmeira. Síntese Poetas contemporâneos: Ana Luísa Amaral Figurações do poeta Arte poética • A poeta revela um descentramento do • A sua poesia assenta, recorrentemente, sujeito quotidiano; na associação de termos que se reportam a ações familiares e simples do dia a dia e ao ato de criação artística. • Formas de enunciação ambíguas entre a ficção do eu e a sua figuração; • Indeterminação da figuração do eu poético, que está «entre», numa tensão quase permanente. Henri Lebasque, Mulher e Menina à Janela, s.d. Síntese Poetas contemporâneos: Ana Luísa Amaral Representação do contemporâneo • Espaços, objetos e tarefas do espaço doméstico. • Todas as divisões de uma casa, todas as tarefas domésticas. • Presença de coisas e situações do quotidiano elevadas a objeto de atenção poética. Theodore Robinson, Rapariga a Coser, 1891-1892. Síntese Poetas contemporâneos: Ana Luísa Amaral Linguagem, estilo e estrutura • Mobilidade do diálogo ou réplica no poema. • Desprezo pela rigidez da forma impressa em rimas e métricas. • Presença de vocabulário ligado à casa e à cozinha: «silêncios», «armários», «cebolas perturbantes», elevado do quotidiano comezinho ao universo poético.