Resumo a Partir Da Leitura Do Ensaio a Inocência Do Devir

May 4, 2018 | Author: Anonymous | Category: Documents
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Universidade de São Paulo Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas MODULAÇÃO E RITMO: Resumo a partir da leitura do ensaio A Inocência do Devir, de Silvina Rodrigues Lopes. Anderson Vieira Santana Nº USP 6465132 São Paulo, Novembro de 2013 Modulação e Ritmo: Resumo a partir da leitura do ensaio A Inocência do Devir, de Silvina Rodrigues Lopes. Se nos predispomos a adentrar o imaginário poético de Herberto Helder, é necessário, de antemão, esquecermos – ou ao menos esforçar-se por fazê-lo -, o lugar da poesia marcada, “pré-dita”, encapsulada sob a forma de esquemas que mais amarram do que fazem fluir a “palavra-poema.” Ora, o poeta em questão nos proporciona o prazer quase ingênuo de estar diante do novo, de uma transformação que se realiza na poesia pela própria poesia; à medida que nos faz crer que na palavra escrita - ou dita -, haja a chave para tantos outros lugares, revelando a possibilidade mágica do bilinguismo da linguagem, da transgressão sintática a operar minuciosamente versos que trasmudam-se infinitamente. Para longe da sutileza, do lirismo do senso [poético] comum, Helder é matemático, preciso em suas escolhas não óbvias e, paradoxalmente, liberto dessas amarras se levarmos em consideração o papel do leitor – também ele autor da obra, em certa medida -, e de seu lugar de enunciação a partir da recepção da leitura. É sob esse ponto de vista da eterna mutação do verso, lugar onde corpos – orgânicos e inorgânicos -, e o mundo expressam a complexidade poética e sua imanência, que Silvina Rodrigues Lopes traz à superfície a ideia do devir na obra helderiana. Espécie de metamorfose – o corpo que se transforma no mundo, porque é parte dele, por que é ele -, dá-se na poesia de Helder, certa simbiose através da qual se percebem jogos de combinação, fusões, negações, palavras que valem por imagens e vice-versa, na construção de sentidos incessantemente novos. Importante é salientar, não obstante, que o que soa em princípio paradoxal, dado o caráter experimental, por vezes um tanto caótico desta poética, ganha verossimilhança e ainda mais propriedade ao entendermos que a ideia de continuidade aí representada, e explicitada no ensaio A Inocência do Devir, é parte do processo de criação do poeta que nos faz entender que o ritmo – ferramenta essencial à poesia -, não se dá apenas pela constância – daí o aspecto inovador que imprime o poeta; o eterno frescor do poema. Ao contrário, é a negação desse paradigma a partir da qualidade do que é perene, que revela as novas possibilidades exploradas pelo autor. O ritmo em Herberto Helder não é dado pela oposição temporal claro/escuro, por exemplo, antes o que se vê é a imanência de um no outro: não há o claro sem escuro, portanto os dois não se antagonizam necessariamente, nem devem apenas ocupar recortes de tempo distintos. A modulação, ou ainda, o devir, é a palavra-chave para a leitura de seus poemas, assim, o claro transforma-se no escuro num ritmo de completude e não de exclusão. Não há finitude, apenas continuidade. Nas palavras de Silvina, “o devir é um molde temporal contínuo”, ou ainda: “ O poema assemelha-se à acção passada num palco, que pode ser o mundo, onde o encenador e o actor trocam os papéis, sem que o acto de troca seja perceptível.” (p. 52) Essa força representativa do que não se esgota, mas transforma-se, é posta por Helder de maneira a construir uma espécie de espelho da palavra - e do sujeito que a enuncia, seja ele o próprio autor, ou mesmo o receptor da obra, que assume papel ativo no processo de criação poética, à medida em que a “re-enuncia” de seu lugar -, que traz à tona “diferentes máscaras (...), deformando-as em novas formas.”, uma vez que “não há linguagem sem metalinguagem”. (pp. 54 – 55) Dessa exposição, Silvina nos chama atenção para o fato de que a imagem é de suma importância para o poeta – “Escrevi a imagem que era a cicatriz de outra imagem”, diz ele. Ora, é a partir desse entregar-se à dissecação espontânea, mas nada ingênua e que exige do leitor certa astúcia, da leitura da obra helderiana que se descobre esse potencial imagético de sua poesia. Está nela uma capacidade ímpar de revelar imagens no signo dado, escrito e, portanto, escancarado, mas também através de seus silêncios: signos mudos que saltam através da criação de tensões que extrapolam a natureza semântica, mas que provém de “timbre, (...) acentos, (...) intensidades.” (p. 60) Esta relação, já tratada como não sendo paradoxal, mas complementar, pode ser encarada como uma espécie de generosidade do autor. Ora, para Silvina Lopes a modulação de imagens não se dá de forma definitiva – o que possibilitaria a desmoldagem, a desconstrução, também ela definitiva -, mas contínua: “modular é moldar de maneira contínua e perpetuamente variável.” (p. 62) Desta forma, portanto, se admitimos a tal premissa, estaremos sempre diante de uma obra que não carrega o peso de uma relação unilateral autor/leitor, mas que se apresenta nova a cada contato. Em suma, entendemos, a partir da leitura do ensaio de Silvina Rodrigues Lopes, que a poesia helderiana é o lugar da invocação do novo, do presente eterno que não nega a experiência mnemônica - e com isso o passado -, porque dela também se alimenta na criação do que está dado e do que ainda está por vir. Importante é percebermos que estes lugares de alternância que não são excludentes, mas formam parte da experiência “do dizer sim ao devir. O instante do voo.” (p. 105)


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