i, 1 , 1 1 1 60 Cultlira e ratâo pratjca a antropologia aceitou a especificidade do "primitivo" como sua tarefa acadêmica, embora isso pudesse significar uma amputaçao da sua per linência pelo menas tao drastica quanta a rclativizaçào do materialismo hist6ri co, 1èntei di scutir agui a plausibilidade do ponto de vista "duas sociedade - duas ciências': lv/as SOnlcnte para II cga- lo cm U11/ capitulo posterior como uma espécie de falsa consciéncia: uma traduçao de integraçôes diferentes de c6digo e praxis em uma di stinçao radical na natureza das saciedades, como se uma nao conhecesse ncnhum axioma cancep- tuaI. da mesma forma que a outra nao conhece nenhuma conseqüência prât ica. Acho que isso é "falsa consciència': porque a disti nçao de saida Iegit ima 0 modo de aparência da sociedade ocidental como sua verdadeira explicaçao. A derivaçao da organizaçâo a partir da atividade pratica e da consciência a partir das relaçôes entre pessoas ignora a qualidade si mb6lica ordenada das nossas pr6prias institui- ç6es. Mas se por urn lado se conclui que a determinaçao da consciência pela ser social, coma é geralmente entendida, precisa de alguma reavaliaçao, pOl' outro lado se conclui também que ela continua, exatamente como é, a rnelhor expli caçao da ciência social ocidental. Pois muito dessa ciência é a autoconcepçao do capita- lismo. o verdadeiro problema para 0 marxismo e para a antropologia se localiza na relaçao entre a praxis e a ordem simb6lica. E esse é um problema mais bem explicado a partir da hist6ria da pr6pria antropologia - exatament e porque a hist6ria da antropologia é um coroIar io permanente da contradiçao da sua exis- tência camo uma ciência ' ocidental das outras culturas. A contradiçao é uma condiçao original: uma ciência do homem patrocinada par uma sociedade que, tal como as outras, se definiu exclusivamente a si pr6pria como humanidade e a sua pr6pria ordem coma cultura. Apesar de tudo, acredito que no C3S0 ant ropol6gico essa sociedade aprendeu alguma coisa das outras - sobre si mesma. \ $ZII$, ;a;: m CULTURA E RAZAo PRATICA dois paradigmas da teoria ant ropol6gica A oposiçao levantada recentemente por Lévi-Strauss entre ecologia e estruturali s- ma - dentro de uma unidade de naturalismo mais elevada, ou talvez se trate de um materialismo transcendental- nao é nova. Em seus contomos principais, é endèmica à antropologia anglo-saxônica. Esst conflito ent re a at ividade pratica e os limites da mente se insere em uma contradiçao original e basica, entre cujos p6los a teor ia antropol6gica lem osci lado desde 0 século XIX camo UITI pr isioneiro que caminha compassadamente entre as mais distantes paredes da sua cela. Mui - tas das mes mas premissas que separam 0 estruturalismo de uma explicaçao por adapta ça a também diferenciam Boas de Morgan, Radcliffe Brown de Malinowski - ou mesmo aspectos diferent es de um unico projeta te6rico, como a énfase colocada ao mesmo tempo na definiçao simb6lica da cultura e no seu determinis- ma tecnoI6gico na ob ra de Leslie White. As alternativas nesse veneravel conflito entre utilitarismo e um enfoque cultural podern ser colocadas da seguinte forma: se a ordern cultural tem de ser concebida camo a codifi caçao da açao int encional j e pragmatica real do homem, ou se, ao contrario, a açao humana no munda dcve ser compreendida camo mediada pela projeto cultural, que ordena imediatamen- te a experiência prâtica, a pratica ordinaria, e 0 relacionamento ent re as duas. A diferença nao é simples, nem sera resolvida pela feliz conclusao acadêmi ca de que a resposta se encont ra em algum lugar no meio das duas ou mesmo em ambas as partes Osto é, dialet icamente). Afina l, nunca ha um verdadeiro diaIogo entre 0 silêncio e 0 discurso: de um lado, as leis e forças naturais «independentes da vontade humana", e do outra 0 sentido que os grupos de homens conferem variavelmen te a si mesmos e ao mundo. Por taoto, a oposiçao nao l'ode estar comprometida; nas palavras de Loui s Dumont, a relaçâo nao pode ser senao uma superposiçao. No final, a cultura estarâ rclacionada, na sua especificidade, a lima ou out ra 16gica dominante - a 16gica "objetiva" da superioridade pnHica ou a l6gica significativa no "esquema conceituaJ': No primeiro caso, a cultura um 6 1 -c; C' -ç-. \;' '---.. t· c v 62 Cu/furc< e f «ZaO pra/Ica sistema instrument.al ; no segundo, 0 instrumental se encontra sujeito a sistemas de uma outra espécie. A relevância dessa controvérsia provinciana para a invocaçao da prâxis de Marx é patente, muita embora, como veremos, a posiçao de Marx nao possa seT simplesmente assimilada ao materialismo empirista reconhecido na antropologia. É através de uma versao moderada do marxismo, "senao do pr6prio Marx", que Lévi-Strauss apresenta muita resumidamente sua pr6pria perspectiva: 1 Se afirmamos que 0 esqucma conceitual comanda c define as prâticas, é porque estas, objcto de cstudo do ctn6logo, sob a forma de realidades discretas, localizadas no tempo e no espaça c dîstintivas de gêneras de vida e de formas de civilizaçao, nao se confundem corn a prâxis que - neste ponta, ao men os, estamos de acordo cam Sartre - constitui para as ciências do homem a totalidade fundamental. 0 marxis- mo, senao a proprio Marx, muitas vezes como se as praticas decorressem imediatamente da prâxis. Sem pôr em dûvida 0 incontestavel primado das infra-cs- truturas, cremos que entre praxis e prâticas se intercala sempre um mediador, que é 0 esqucma conceitual, par ob ra do quaI uma matéria e uma forma, desprovidas ambas de existência indcpendente, realizam-se coma estruturas, isto é, camo seres, ao mes- mo tempo empfricos e inteligiveis. [1966, p.130-1.] Lévi-Strauss continua, explicando 0 contraste coma se fosse uma questào de Itividades complementar.es: .t para esta tearia das superestruturas, mal e mal esboçada par Marx, que desejamos contribuir, reservando à hist6ria - assistida pela demografia, pela tecnologia, pela geografia hist6rica c pela etl1agrafia - a cuidado de desenvolver a estudo das infra- estruturas propriarncntc ditas; que nao pode ser principalmente de nossa responsabi- lidadc, porque a etnologia é, antes de mais nada, uma psicologia. [Ibid. ) A seriedade da crîtica de Lévi-Strauss se apresenta assim dissimulada por esta modesta renûncia. Talvcz cIe esteja cedendo uma parte muito grande da sua ciência. Se 0 esquema conceitual abrange a matéria nos termos de uma existência humana, ele nao vern ao cenario da açâo pra.tica apenas para acrescentar a inter- pretaçào apropriada de fatos materiais ou das relaçôes instrumentais. Nem a de codificaçao do esquema seria confinada à Esse esquema é a pr6pria organizaçâo da produçào material; ao analisa.-Io, encontramo-nos na pria base econômica. Sua presença ai dissolve as antinomias classicas de infra-es- trutura e superestrutura, uma "material" a outra "conceitual': Ë clara que ela nâo dissolve 0 "material" enquanto tal. Mas as chamadas causas materiais devem ser, enquanto tais, a produlo de um sistema simb61ico cujo canüer cabc a n6s investi - gar, pois sem a mediaçâo desse esquema cultural nenhuma relaçào adequada entre uma dada condiçào matcrial e uma determinada forma cultural po de ser especifi - Dois paradigmas da Icoria alltropol6gica 63 cada. As determinaçôes gerais da praxis estào sujeitas às formulaçôes espedficas da cul tura, isto é, de uma ordem que goza, por suas propriedades de sistema sîmb6li co, de uma autonomia fundamental. Morgan As questôes envolvidas na opçao entre a 16gica pratîca e a significativa travaram, coma ja disse, em dezenas de campos de batalha, cern anos de guerra antropo16gi- ca. Uma reflexào sobre essa hist6ria nos ajudara a clarificar essas quest6cs. Devo advcrtir, porérn, que a excursao sera uma historia "para n6s" - uma forma de tomarmos consciência de n6s mcsmos na hist6ria - sem qualquer pretensao ao status de uma "verdadeira" abordagem diacrônica. Nesse sentido, estabeleço os contrastes entre Lewis Henry Morgan e Franz Boas como uma oposiçao paradig- matica, sem referência às outras figuras do contexto intelectual da época, cujas influências foraru seguramente crfticas para a controvérsia personificada nos dois. Mais uma vez, deixo de lado ou teço consideraç6es sumarias sobre um grande nûmero de pensadores sérios dos ultimos tempos, tanto cm antropologia quanto em disciplinas correlatas, que outras poderiam julgar mais importantes e exem- plificadorcs. Talvez esse tratamento cavalheiresco possa ser desculpado por atri - buÎ-Io a uma hist6ria corn a quaI os antrop610gos j:i se familiarizaram: uma versao do passa do como ele é realmente'vivido por um segmento da sociedade, camo 0 .mapa da sua condiçao presente (ver Pouillon, 1975) . Começo por Morgan, mas jâ me antecipo em dizer que a escolha pode ter sido, de certa forma, equÎvoca. Camo todo [undador, 0 pensamento de Morgan tende a ser mais generalizado do que os pontos de vista que divergiram dele, contendo dentro de si os "germes" de quase toda posiçâo posterior. Isso significa que a homem pode ser submetido a muitas leituras sendo que q1,lalquer uma delas, precisamentc por se tornar uro mapa para a presente discussao, po de sec culpada de desrespeitar a generalidade original. Assim, Morgan foi do pelos mcios acadêmicos mais recentes camo "idealista", devido à sua ênfase no desdobramento dos "germes [originais] do pensamento"j coma materialista, por firmar a evoluçâ.o social sobre 0 desenvolvimento das artes de subsistência; e ainda camo "dualista filos6fico': por sua dependência simultânea de ambos. Por ter feito uma alusâo à "16gica natural da mente", alguns 0 consideravam um "mentalista", enquanto outros 0 acusavam de "racismo" por ter referenciado a cultura ao orga- nismo (incluindo a famosa transmissâ.o de habitos "através do sangue"). Sem pretender resolver todas essas questôes, acho que é importante nao confundir uma certa semelhança da terminologia de Morgan corn 0 discurso do moderno estruturalismo, isto é, a invocaçâo dos germes originais do pensamento, desdo- brando-se em resposta aos desejos e humanos, mas de acordo.com a , :s ri "" ç 0 r " 1 64 CI/III/ra c razilo prritica "J6giea nalueal da mente': A mente aparct:e Il:1 teo ria de Morga n mais como 0 instrumenta do dcsenvolvimento cul tural do que como seu autor (cf. Terray, 1972). Mais passiva que ativa, simplcsmcnte racional cm vez de simb61ica, a inteligência responde reflcxivarncnte a sÎtuaçôes que nâo produz nem organiza, de modo que, no final, 0 que é reali zado cm fOrlll3.S culturais é urna 16gica pratica- biol6gica nos primeiros estagios, tecnol6gica nos ûltimos. 0 esquema conceitual nao é a construçâo da experiência humana, mas sua verbalizaçâo, como nas clas- sificaçôes de parentesco que sao simpl esmcnte os termos de uma ordenaçao de rclaçôes de fato, efetuados pela vantagcm ccon6mica ou biol6giea. Para Morgan, pcnsamento é reconhecimento; concepçao é percepçâo; e linguagem é 0 reflexo de distinçôes que jél têm sua prôpria ra zao. A qualidade simb6lica da cultura nâo apurece no esquema de Morgan; nele, as palavras sâo simples mente os nomes de coisas. Consideremos a discussâo em Ancient Society a respeito do desenvolvimento do casamento punaluano, da gens (elâ) e, nessas bases, da terminologia do paren- tesco turaniano. 0 casamento punaluano fo i para Morgan 0 triunfo da biologia na socicdade, uma grande reforma nas uni ôes consangüineas de irmaos e irmas cm um grupo que ele caracterizou camo possuidor da mais rudi mentar humanidade. A evidência crîtica desse avanço veio do conlraste corn os padrôes de casamento e as c1assificaçôes de parentesco dos havaianos contemporâneos. A terminologia do parentesco dos havaianos comprovava 0 esta do consangüineo original, uma vez que todos os homens de uma mes ma geraçâo eram "irmâos': todas as mulheres "irmâs" e os fiIhos de todos, indiscriminadamente, "filhos" e "filhas': Mas a pratica do casamento, a pUllalua, exigia a exelusao das irmâs do grupo de mulheres compartilhado pelas irmaos, e dos irmaos do grupo de homens compartilhado pelas irmâs. Morgan concluiu que a contradiçâo entre casamento e parentesco no Havai contemporâneo remontava aos primeiros estagios de emancipaçào do esta- do consangüineo. Eie nao estava seguro de como se produziu exatamente a proi- biçao de casamentos entre irmao e irmâ; refere-se aos primeiros passos como "casos isolados", algo no modelo das variaçôes ocasionais, cuj as vantagens foram pouco a pouco sendo reconhecidas: Dada a familia consangüinea, que englobava tanto os i n llllOS e irmas consangüfneos quanto os irmâos c irmâs colatcrais na relaçao matrimonial, na familia punaluana bastava excluir os primeiros do grupo, nele conscrvando apenas os segundos. Mas cra dificil excl ui r os primeiros e man ter os scgulldos, pois tal medida implicava uma mudança radical na composiçâo da familia, para nao dizer na antiga estrutura da vida domés tica. El a implicava igualmente 0 abandono de um privilégio do quai os selva- gens nào podiam desistir facilmente. Pode-se suporquc essn medi da foi IOl/Tada, iniciaI- mente, em casas iso/ados, que SIIt1S valltagellS foram /ellfalllcll te reconhecidns, e que foi adotada a titulo experimental durante periodos muita longos. A principio, cla foi Dois paradigfltQ$ da tcoria antropol6gica 65 aplicada por algumas tribos, dcpois pela maioria, até ser finalmente universalmentc adotada pelas tribos mais evoluidas que se encontravam ainda no estado selvagem e entre as quais se originara 0 movimento. Sua adoçao oferece lima boa ilustraçao do proces$o segundo 0 quai se realiza 0 principio da seleçào natural. (Morgan, 1963 (1877), p.433-4; grifo meu. J h importante perceber a natureza da intelecçâo humana que Morgan propôe aqui. 0 exemplo da punalua é particularmente adequado, uma vez que é comu- mente utilizado no primeiro ano de antropologia para ilustrar a arbitrariedade do sfmbolo pela observaçao de que nenhum sfmio poderia at ingir a distinçao entre "esposa" e "irma", da mesma forma que nao poderia estabelecer a diferença entre agua benta e agua destilada. 1 No entanto, 0 que Morgan esta dizendo é exatamente o oposto, que a diferença entre "marido" e "irmao" nao é uma const ruçao simb6- lica colocada no mundo, mas a decorrência racional de lima diferença objetiva no mundo, isto é entre homens biologicamente superiores e inferiores. Trata-se de uma percepçao das vantagens biol6gicas como resultantes da diferença, sendo portanto uma representaçao em termos sociais de uma 16gica externa a esses termos. A reforma caracterizada pela punalua foi a primeira de uma ionga série que cul minou na monogamia, uma série na quai a espécie hum(l na livrou-se progressivamente de uma promiscuidade original e dos males decorrentes da procriaçao consangüinea. E esse primeiro passa resume a noçao que Morgan tem do. todo: cIe foi efetuado pela observaçâo e pela expùiência; atençâo às conse- qüências deletérias do casamento dentro do grupo - "os males dos quais a observaçao humana naD podia indefinidamente escapar" (Morgan, 1963, pA33) - a experiência das vantagens mentais, portanto institucionais. do casamento fora grupo. "É uma inferência correta dizer que 0 costume punaluano chegou à adoçao geral através da descoberta da sua intluência benéfica" (p.509). Portanto, n pensamento é reconheClmento e a mente é um veiculo pela quaI a natureza é '\ compreendida como cultura. A explicaçâo posterior de Morgan da gens como uma derivaçao da sociedade punai uana e uma codificaçao das suas vantagens leva ao mais alto nivel a mesma concepçao. Enquanto matrilinear, a gens original representa 0 acabamento natu- rai da familia punaluana no tempo, dada a impossibil idade de se verificar a pater- nidade sob as condiçôes maritais existentes. 0 conceito social de d escendéncia é, mais uma vez, uma consciência de relaçôes jâ prevalecentes (p.442). (Em um ! 0 uso de c. "signo" na anlropotogia amcricana, ou peto menos cm grande parte dela, tende a sc dar no sentldo lIlverso das famosas dcfiniçôes de Saussure, em seu CI/rso dt: liugiiisticagcra/; na anterior "simbolo" é 0 verdadei ramente arbitnlrio ou 0 naD motiva do, e "signo" é 0 mOIi.va?O Langer, 1957, ou White, 1960. com Saussure, 1966 Il9l 5 J). Coma regra geral segulrel a usa amencnno, exccto onde 0 contexto é clarnmente saussuri nno. g 0' ? 'i' î V' f. -<; ç 0 ' .. .. ,J . , " ( 66 Cu/wra e razào pratica lllomentQ posterior no esquema de Morgan, a descendéncia se tornarâ patrilinear sob a influência do crcscimento da "propriedade" - termo geral empregado por Morgan para dcsignar a l'osse da "riqueza" estratégica - que é a junçâo na quai 0 int eresse econômico, ou 0 desdobramento efetivo dos meias crcscentes de subsis- tência, prevalece sobre a vantagem biol6gica como a determinante pratica da forma social.) Exatamente como a famflia punaluana, cuja funçao nesse aspecta cJa duplica e generaliza, a gens se tamau accita graças às CCvantagens a ela conferi- d;1S", ou seja, a melhoria genética que deve resultar da regra da exogamia: Vm objeto primario da organizaçao Cfa, evidentemente, isolar uma metade dos descendentes de um suposto fundador, evitar 0 casamento entre eles por motivos de , parentesco ". A gens, que se origina provavelmente da ingenuidade de um pequeno bando de selvagens, deve ter logo provado sua utilidade na produçao de homens superiores. Sua prevalência quase universal no mundo antigo é a maior evidência das vantagens que da apresentou. (Ibid., p.73-4; cf. também p.68, 389, 442.) Por sua vez, 0 sistema de parentesco turaniano reflete a organizaçào sobre a base da punalua e da gens. Na sua distinçâo entre 0 parentesco paralelo e cruzado, cla apenas expressa as diferenças jâ estabelecidas na pratica. 0 parentesco turania- no nao é mais que a articulaçao criteriosa das distinçôes sociais desenvolvidas pela scleçao natura!. A teoria pode ser da seguin te forma: os homens cedo desenvolve- ram certas prâticas, formas de comportamento, como a exclusào de irmaos e 1 irmas de uniôes sexuais de grupo, que provàram naturalmente ser uteis e vantajo- sas. As vantagens foram apreciadas e os comportamentos formulados como mo- I dos de organizaçâo - por exempIa, a farnilia punaluana, a gens - que, por sua , vez, estavam suj eitos à reflexaa secundâria ou à codificaçao na terminologia do parentesco. A lin ha geral de força da demol1straçao, a orientaçtio do efeito 16gico, vai dos limites naturais à pratica camportamental, e da ·pratica comportarnental à \ instituiçao cultural: ( 1) circunstância -+ pratica -+ o rganizaçao e codificaçâo (instituiçao). Para se cornpreender qualquer segmenta dado na cadeia de efeito, deve-se ter par base 0 segmente precedente; assim como a codificaçao expressa organizaçao, também a estrutura institucional coma um todo esta referida à pratica e a pratica ;\ cxperiéncia no mundo, de tai modo que a seqüência total representa a taçao, dentro da cultura, da 16gica da natureza (a vantagem adaptativa).2 1 Em termos mais gerais, uma vez que nos ultimos estagios do esquema de Morgan 0 interesse sc apossa da vantagem biol6gica, a l6gica bâsica poderia ser caractcrizada simplesmente como "vantagem pnitica". De uma pcrspectiva ecol6gica, contudo, a diferença se dâ apenas entre modalidades de vantagern adaptativa. (Na realidade, 0 aumento do estoque é uma mctarora que vem 0 homcm primitivo, passando pelos pastores patriarcais, até 0 capitalismq.) . ,---. Dois paradigmas da teorÎa alltropoMgica 67 Mas entao a tcoria de Morgan é apropr iada a uma cllltllra nào-humana - ou melhor, a uma humanidade nao-cultural. TaI camo 0 pensamento é a rcconheci - mento de uma significaçao exterior, as palavras dos ho mens nao sac a conceito das realidades externas, mas sim 0 seu signo. Consistindo simpl esmente na capa- cidade de agir racionalmente sobre a exper iência, a inteligência que Morgan en- tende coma humana nao difere da de outras espécies mamfferas, especialmente do castor. Na sua famosa monografia The American Beaver and his Works (1968 ), Morgan de fend eu vigorosamente a idéia de que "a principio do pensamento" era comum aos homens e aos animais. As qualidades mentais do castor, escreveu eIe, sao "essencialmente as mes mas que aquelas manifestas pela mente humana" (p.252). A diferença ent re essas qualidades e 0 pensamento huma no, "e, por inferência, entre os prindpios que e1es representam respectivamente, é de grau e nao de gênera" (ibidem). A semel hança especîfica consiste na capacidade de se fazer <C urn uso racional" das percepçôes transmitidas pelos sent idos para agir pragmaticamente sobre a experiência. Dai, para Morgan, a fonte de significaçâo que é materializada nas produçôes das espécies, tanto na casa do africano quanta do castor, residir na pr6pria natureza. Morgan retornou rcpet idas vezes à gia animal, sem pre preocupado em mostrar "que todas as espécies, incluindo a hum an.;:!., recebem orientaçtio imediata da natureza" (Resek, 1960, p.SI; grifo meu). 3 Sua teoria do conhecimento foi, portanto, caracterizada pela suposiçao- para fi carmos de acordo corn a descriçao gerai de Cassirer - de que a "real" é dada "tout fait, tanto na sua existência como na sua estrutura, e que para a mente (esprit) humana é apenas uma questao de tomar posse dessa realidade. Aquilo que existe e subsiste 'fora' de n6s deve ser, por assim dizer, 'transportado' para a alterado em alguma coisa interna sem, contudo, acrescentar nada de novo ao processo" (Cassirer, 1933, p.18). Morgan reduziu a linguagem ao ato de nomear as diferenças manifestas na experiência. Preferiu respeitar a continuidade da inteligência, às expensas da criatividade da linguagem, susten tan do que 0 castor era apenas "silencioso", mas nao " mudo': chegando mesmo a afirmar que a faculdade lingüîstica do homem era apenas rudimentar na Selvageria, desenvol- 3 Resek, 0 mais perspicaz bi6grafo de Morgan, estabelece uma conexao precisa entre a racional idadc atribuida aos animais e a pr6pria epistemologia antropol 6gica de Morgan. Desconfiando tanto do instinto quanto da imaginaç50, a longa obra de Morgan sobre a evoluçao social deixou intact a a i1ist6ria das idéias, mesmo que cie - racionalista supremo - pudcsse considerar cssa pr6pria obra intocada pda ideologia. Morgan "nunca duvidou de que seus pcnsamentos fossem verdadeiros retlexos da realidadej 0 que ele via na base das Montanhas Rochosas ou em um povoado asteca pouco ou nada tinna a ver com 0 fato de ser rko ou às vezes mil Whig dissidcntc. Ele teri a re;eitado a noçao de que fatores subjetivos, irracionais ou subconscientes fazem de cada homem seu pr6prio dor. As leis da natureza e da socicdade foram dcscobertas em plena luz do dia, 115.0 nos subterrâneos da alma ou nas meditaçôes dos fi!6sofos. Elc tentou provar isso aos outras - como sc fosse preciso prova - em seus ensaios sobre psicologia animal" (Resek, 1960, p.151·2). " " 1 i"' . 68 Culll/ra e razao prdtica venda-se gradualmente através daquel e longo perfodo. Morgan fo i UI11 antrop61o- go pré-simb6lico. 4 Ent retanlo, 0 pr6prio conceito do conceito continua em muitas antropolo- gias da praxis recentes. Esta é uma premissa implkita,mas decisiva, da filosofia. A ana lise deve negligenciar a arbitrariedade fundamcntaJ da palavra -reconhecen- do talvez que nào haja qualquer relaçao inerente entre 0 som-imagem e 0 conceito (idéia), supondo, porém, que exista tal relaçâo entre 0 conceito e a realidade objetiva à quaI ela se refere. 5 Assim, a linguagem s6 é simb6lica no sentido de que represcnta 0 munda de uma outra forma, mas que nao t'cm sentido algum se retirada do mundo; por conseguinte, é 0 comportamento do signo em uso, sc nao em invençao. 1 Mas a arbitrariedade do simbolo é a condiçào indicativa da cultura humana. 6 Isso nao se da simplesmente porque a combinaçao de sons sheep [carneiro] nào tem qualquer conexào necessaria corn 0 animal designado desse modo, da ffieSITIa forma que a palavra mouton, mas porque 0 conceito de carneiro também varia em diferentes sociedades. 0 exemplo acima é clara mente motivado por urn farnoso exemplo de Saussure, no quai ele usa a di ferença de significado entre sheep e mouton para ilustrara diferença entre valor e significaçao lingüfsticos. As palavras francesa e inglesa referem-se à mesma espécie, mas 0 fazem "em termos diferen- tes"; cada uma, em virtude das diferenCÎaçôes semânticas das respectivas Hnguas, exprime uma concepçào distinta das (e em relaçào às) espécies. A palavra inglesa nao se aplica ao animal quando pronto para ser comido, no seu estado culinario, para 0 quaI ha um segundo termo, mutton; mas 0 francês ainda nâo foi capaz de participar da distinçao mais elevada entre 0 cru e 0 cozido: o francês moderno mouton pode ter a mes ma significaçao do inglês slleep, mas nao 0 mesmo valor, è isso por varias razoes, cm particular porque, ao falar de uma peça de carne pronta para ser levada àp1esa, 0 inglês usa l11uttOIl e nao sheep. A diferença de valor entre sheep e mutton deve-se ao fato de 0 primeiro ter, ao seu lado, um segundo tenno,o que nao é 0 caso da palavra francesa. Dentro de uma mesma lingua, todas as palavras que cxpressam idéias vizinhas se limitam reciprocamente ... Assim, 0 valor de qualquer termo é determinado pela que 4 Para uma posÎçao scme1hante sobre a Iinguagem na ohr .. do antrop61ogo evolucÎOllista inglês E.B. Tylor, ver Hcnson ( 1974, p. 16-7). 5 Uma vcz que Îlcm a som-imagcm nem a idéia podcrn ocorrer um se m 0 outro, coma argument ou Benvcniste cm seu conhccido comentârio sobre 0 texto saussuriano, sua re1açao é cOll5ubstancial e absoluta, e nesse sentido nao-a rbitrâria. A verdadeira contingência est:\. entre 0 conccito e a palavra, um::! re1açào quc Benveniste recusa tratar, por consider:\.-Ia fom do objetivo de lingüistica 09li, p.43-8). 6 "Enquanto encarannos as sensaçoes coma signos das coisas que supostamente lhcs dao origem, qualificando talvez esses signos corn rcferência a scns::!çOes p::! ssadas que (omm scmel hantcs, nem terernos arranh:ldo a superficie dessa mente humana ocupada de simbolos" (Langer, 1957, pA3). Dois parndigma5 da tcoria tinlropoMgica 69 o ccrea; é impossivel flXar até mesmo 0 valor da palavra que sign ifica "sol" sem <la tes considerar 0 que h;, ao seu redor; ha Iinguas onde n50 é possivel dizer "scntar-sc no sol". ISaussurc, 1966 (1916), p.I I S-6.] No que diz respeito ao conceito ou significado, uma palavra é rcfcrivel nao simpl esmente ao mundo externo, mas antes de tudo ao seu lugar na lingua, ou seja, a oulras pal av ras relacionadas. Par sua diferença cm relaçâo a essas palavras, constr6i-se sua pr6pria avaliaçao do objeto, e no sistema dessas diferenças ha uma construçâo cultural da realidade. Nenhuma lingua é uma simples nomenclatura. I'"j'; Nenhuma se baseia cm uma simples correspondência UI11-a- UI11 dos seus proprios 1 termos com "as" distinç6es objetivas. Cada uma confere certo valor às distinçôes determinadas e const itui, por conseguinte, a realidade objetiva em outra quaI ida- de, especifica àquela sociedade. 7 Na realidade, enquanlo projeto social tolal, a atividade simb6lica é ao mesmo tempo sintética e analitica, lrazendo para 0 conceito toda a 16gica cultural. Se, por um lado, as diferenças nr valor lingüistico efetuam uma découpage part icular do mundo externo, dividindo-o de acordo com certos principios, por outra lado os el ementos assim segregados sao reagrupados por correspondências significativas ent re eles. Refira-mc aqui nâo apenas a distin- çôes semânticas, mas também a praposiçôes culturais. E a arbit rariedade simb61i- ca das segundas é mesmo maior do que a das primeiras. Ao menos na leoria ha limites naturais no campo semântico de um ûnico lexema: nenhuma ûnica pala- vra, por exemplo, é capaz de significar, simultânea e exclusivament e, as duas espé- CÎes, boi e lagosta. Mas 0 mesmo exemplo suger ini aos americanos, entre os quais a peculiar combinaçao "bife e lagosta" é uma categoria definida de jantar, que a cultura nâo se submete a tal tipo de limitaçao. Parece nao haver qualquer limite te6rico determinavel a priori em relaçao ao qué sera c1assificado com quê no esquema cultural: "Um parente por casamento é uma anca de elefante." A 16gica proposicional é rnaravilhosamente variada e assim sào as culturas, dentro deste mesmo e ûnico mundo. 8 7 "A represenlaçào 'objetiva' - é isso 0 que eu quero tentar cxplicar - Ilao é 0 ponlo de part ida do processo de (ormaçào da linguagem, mas sim 0 fim ao quai esse processo conduz; ela n5.o é seu terminus a quo, mas si m seu termi/lus ad qI/cm. A linguagem nào entra em um mundo de perœpç6es objetivas acabadas, somentc para acrescenta r, a ohjetos individuais dados e claramc nte dellmitados uns cm relaçao aos outros, "nomes" que seriam signos puramenlc cxteriores c arbitrarios; cla mcsma é um mediador na {ormaçao dos objetos; cm um scntido, é 0 mediador por excclência. 0 instrumenta mais importante e mais precioso para il conquista e para a eonstruçào de urn verdadeiro mundo de objetos" (Cass irer, 1933, p.23). Para uma boa di scussao antropol6gica sobre a rclatividade cultural da dislinçao entre crcnça e experiência, urna distinçao peculiar dessas sociedades ocidcntais que se propôcm fa u r a antropologia das outras, vcr Necdham, 1972 (sobretudo p.173). 8 No mcslllo sentido de uma construçao cultural, pode-se observar no p:lr carneiro/carne de ca rnei- ro (sllcep/mlllton) que esse animal, no mundo anglo-saxao, ocupa no açougue um lugal' ao lada de . , « , -, .. '" ni ~ .... ... .... ~ <- ' $ li: ~ i I --F d ~ 1 i 1 1 1 pwa: 70 Cu/Jura c razJo pratica Em suma, através da avaliaçao simb6lica e da sintese da realidade objetiva, criamos um novo tipo de objeto, com propriedades distintas: a cultura. A lingua- gem é um meio privilegiado clesse projeta. Mas, para Morgan, a linguagem naQ é mais que a percepçao articulada. Dai, a passagem da natureza para a cultura, na visao de Morgan, nao ser mais importante do que, digamos, a reduçao da Odisséia da forma falada à escrita. Coma escreveu recentemente um destacado rnarxista cm , relaçao a Kautsky, 0 mesmo pode ser dito de Morgan. Parà cie, "a hist6ria humana l'" é um apêndice da hist6ria natural, sendo a sua lei de movimento simplesmente \formas de manifestaçao das leis bio16gicas" (Schmidt, 1971, pA?}. 9 Boas Eru contraposiçao ao que foi dito, a odîsséia de Boas "da ffsica à etnologia" torna- se significativa, representando uma oposiçao dentro da quai a antropologia pas- sou por varios ciclos durante todos esses anos. Como George Stocking (1968) descrcve muito bem, foi uma viagem de muitos anos na quaI Boas passou de um materialismo monista à descoberta de que "0 olho que vê é 0 6rgao da tradiçao"; l' uma jornada de muitos estâgios nos quais ele descobriu que, para 0 homem, 0 :! orgânico nao procede do inorgânico, 0 subjetivo do objetivo, a mente do mundo 1 _ e, finalmente, a cultura da natureza. Os primeiros passos foram dados dentTO da pr6pria fisica. Na sua dissertaçao sobre a cor da âgua do mar, Boas observou a dificuldade de determinar as intensidades relativas de Iuzes que diferiam levemen- te em cor. A variaçao quantitativa no objeto nao evocava uma variaçao correspon- dente no sujeito. lo Boas repetiu, mais tarde, a experiência ao nivel lingüfstico, porcos e bois, que compartilham uma' declinaçao paralela de termos para 0 estâgio de consumo (pig/pork, cat/le/bec}), embora todos des difiram ncsse sentido dos cavalas e cachorros. A hist6ria sem estrutura da a impressao de nao explicara classificaçao, uma vez que nao possuimos nenhuma palavra de inspiraçâo normanda para cheval par analogia às palavras para carnes de carneiro, de boi e de porco. No capitula 4, discuta a 16gica da comestibilidade/nao-comestibilidade no esquema america- no (p.166-79). 9 Estou em débito com 0 professor Paul Kay pelo muito quc elc contribuiu para a nossa discussao do problema da "arbitrariedade do signo". Meu débita vai mais além, chegando mesmo ao uso de certas [rases que sao suas - tanto quanto quaisquer erros SaD de minha intdra responsabilidade. Entre os erros que devo evitar encontra-se a reivindicaçao de um extremo relativismo lingüfstico. Nao quero dizer que 0 pensamento deva coincidir corn as distinçoc$ gramaticais de determinada Hngua. A idéia coma um todo parece implicar uma paralisaçâo dos poderes simb61icos neccssarios il sua postulaçao. Ha também alguma evidência de que 0 falar interior, que se encontra cm "um piano ~ distinto do pensamento verbal': tenna uma cstrutura diferentc c mais simplificada que a estrutura da II lingua falada. Nem chegamos ainda ao nive! mais profundo dessa relaçao complexa e amplamente l desconhecida entre pensamento e palavra (Vygotsky, 1962) . 10 ''Ao preparar minha tese de doutorado, tive de usar métodos fotométricos para comparar intensi- dades de luz.lsso levou-me a considerar os valores quantitativos das sensaçoes. No decorrer de minha r Dois paradigmas da leoria antropo16gica 71 quando, através de informantes da Costa Noroeste dos Estados Unidos, descobriu que os SOll.') considerados iguais por um orador de uma lingua podiam ser ouvidos como algo completamente diferente por pessoas que falavam outra Hngua, e vice-versa, na medida em que ca da um percebia no discurso do outra asdistinçôes apropriadas ao seu pr6prio. 11 Nesse meio-tempo, ele passou naturaimente por uma fase de psicoflsica fe- clllleriana que teve a mesma importância: experimentos sensoriais em fenômenos liminares que nao apenas reiteraram a conclusao de que as diferenças objetivas a estimulos llaO engendravam nenhuma diferenciaçao paralela de resposta - que a reaçao humana à quantidade efa em si mesma qualitativa - mas também que a resposta dependia de fatores situacionais e do conjunto mental da pessoa. No sujeito humano, a percepçao (perception) é reconhecimento (apperception), que depende, pode-se dizer, da tradiçao mental. A quai, par sua vez, nao é em si mesma decisiva nem unica para 0 homem. Para qualquer grupo humano, a tradiçao em questao é um conjunto de significados acumulados, teoria coletiva e hist6rica que faz da sua percepçao uma concepçao. 12 Permitam-me aqui fazer uma breve digressao e uma comparaçao aparente- mente curiosa. É fascinante que tanto Boas quanto Marx tenham passado, no inicio das suas vidas intelectuais, pele mesmo ponto. Em um determinado mo- mento, ambos foram compelidos a recusar um materialismo mecanicista que lhes vinha do iluminismo. No entanto, escolheram respostas concebiveis alternadas, que nao eram em si mesmas muito diferentes, mas 0 suficiente para conduzi-Ios a caminhos fatalmente diferentes. Marx teve de reagir ao materialismo contempla- tivo e sensorial de Feuerbach, um materialismo do sujeito hipotético individual que responde passivamente à realidade concreta; mas a reaçao de Marx também foi refreada pelo idealismo de Hegel, que se apropriou do sujeito ativo hist6rico. A soluçao, como Marx colocou na prime ira tese sobre Feuerbach, era aproveitar 0 ativismo do idealismo.para remediar 0 defeito de um materialismo que concebia "a coisa, a realidade, a sensibilidade ... apenas na forma do objeto ou da contempla- Çao, mas nao como atividade humana sensivel, pratica, nao subjetivamente" investigaçao, aprendi a reconhecer que existem dominios da nossa experiênda nos quais os conceitos de quantidade, de medidas que podem ser acresccntadas ou subtraidas como aquelas corn que eu estava acostumada a operar, nao sao aplidveis" (Boas [19381 il! Stocking, 1974, p. 42). II "A alternância dos sons é daramente um deito da pcrcepçao obtida atra\'és de um sistema de fonética estranho" (Boas, 1966a [1911], p.14; cf. Stocking, 1974, p.72ss.). 12 "A primeira impressao obtida de um estudo das crenças do homem primitivo é que, embora as percepçoes de seus sentidos sejam suficientes, seu poder de interpretaçaa logîca parece deficiente. Acho que a razao para esse fato pode ser encontrada !laO cm qualquer peculiaridade fundamental da mente do homem primitivo, mas sobretudo no carater das idéias tradicionais pelo quai cada nova percepçào é interpretada; cm outras palavras, no carater das idéias tradicionais com as quais cada nova percepçao se associa, determinando a condusao alcançada" (Boas, 1965 [1938], p.198-9)- M :\....- il' ."" ~ - ~ - , , ;.... ~ - , , 1 ~ i ;- r ~ ' ~ l b$ ~ : i <- ~ r, 1. ... - ... "" ,.. r ' 1 l 72 CI/III/ra c mziio pralica (Marx, 1965. p.66J; escrito cm 1845). "Feuerbach, naD satisfeito cam 0 pensamen- to abstrato': escreveu Marx em sua quinta tese, "deseja a contemplaçâo; mas cIe nao con cebe a sensualidade COIllO atividade pratica, humano-sensorial." Marx salientou que cssa praxis deve sel' entendida ca mo social e na sua especificidade hist6rica, nao como a açào de um individuo abstrato e isola do. Entretanto, 0 reconhecimenlo do social. comum a Marx e a Boas, foi inscrita com uma diferen- ça de ênfases. Marx chegou até a l' ratica e as estruturas da realidade, construidas cam base na açào concreta e presente, cm modos historicamente especificados, de seres humanos sensiveis. Boas transferiu 0 mesmo problema do materialismo mecânico para os esquimôs, e mais tarde para a Costa Noroeste, para descobrir a especificaçâo histôrica do sujeito que age. A escolha de Marx 30 materia- li smo histôrico; a de Boas, à cultura. l ' o fato de a viagem de Boas ter acabado no poder estruturante da tradiçao parece agora, em retrospecto, incrente às condiç6es do seu inîcio. Boas começou questionando a essència da tese de Morgan, a expressao da natureza na cultura pela mediaçao de uma mentalidade refl exiva. Em uma série de cartas ao seu tio na América, em 1882-3, Boas des creve 0 arcabouço de seu proj eto esquim6: Embora, no inicio, minha intençao fosse esludar matematica e fisica coma meta final, fui levado, através do estudo das ciências naturais, a outras questôes que logo me conduziram à geografia, e esse assunto de lai forma atraiu meu interesse que final- mente 0 escolhi camo meu estudo principal. No entanto, a direçao de meu traba1ho e estudo foi fortemente influenciada par meu treinamento em ciências naturais, espe- cialmente a fi sica. Com 0 passar do tempo, fiquei convencido de que meu Weltans- chaullIIg materialista anterior - para Unl fisico, algo muito compreensivel- era insuslentavcl, c assim cheguei a um nova ponta de vista, que me revelou a importân- cia do estudo da interaçao entre 0 orgânico e 0 inorgânico, sobretudo entre a vida de Ulll pava e seu meio ambiente fisico. Assim nasceu meu plana de considerar a [se- guinte J investigaçâo coma minha tarera de vida: até que ponto podemos considerar os fenômenos da vida orgânica, especialmente da vida fi sica, de um ponto de vista mecanicista, e que conc!usôes podem ser retiradas de uma consideraçâo desse gêne- ra? fCitadoin Stocking, 1968,p.1 38.1 13 Dai a rejeiçao paraleJa de Boas do dct cnni nislUo "geogriifico" e "econômico", baseado em uma noçao de cuhma nao tant o coma uma condiçao da rclaçaodo homem cam a natureza. massobretudo camo a cOllccpplo dela (por exemplo, 1965 119381. p.1 7S-7). 'Iodas as questoes fundamentaÎs do ultimo dcbatc - bem como as discutidas no capitula 1 -eS130 aqui prefiguradas: "nao ha razao para denominar as outras rases da cultura de uma superestrut ura sobre uma base econômica, pois as condiçôes econômicas sempre agem sobre uma cultura precxistente e elas mesmas dependem de outros aspectos da cultura" (ibid., p.I7S). 0 tempo aguç:lria a oposiçao entre a realidade material da simbolizaçào c a simbolizaçao da rèalidade material-que para Boas nao efa nem racionalidade nem dis(arce. Dois paradiglllas da /eoria alllropo16gica 73 De cert'a forma, a carreira antropol6gica de Boas pode ser caracterizada como um processo no quai 0 axioma originaI,la construS,âo humana da experiéncia.Joi transposto do nivel psîcolôgico para 0 destaca 0 velho arli go (1888) "Sobre os sons alternantes" como contendo os germes clesse desenvolvi - mento e, por conseguinte, do moderno conceito de cultura. Mais que um exercicio critico ou metodolôgico, escreve Stocking, esse artigo: 1 prenuncia muito do pensamento antropol6gico moderno, cm direçao à "cultura". Ao ! '1menos pa r implicaçao, de vê os fenômenos culturais em termos da ÎlI1posiçilo de tls!!fficaA.o Ele os vê como . cionados e transmitidos pela processo de aprendizado. Ele os vê como determinal1tes de flossa s pr6prias percepç8es do mUl1do externo. Ele os vê em termos mais relativos que absolu tas. Grande parte do final da obra de Boas, e da dos seus seguidores, pode ser vista simplesmente camo a acabamento das implicaçôcs presentes nesse artigo. IIbid., p. 159; grifo m,u.] De fato, os caminhos pelas quais Boas chegou ao conceito cultural foram diversificados e aigu mas vezes cheios de meandros (cf. Stocking, 1968, p.195-223; 1974, p.I-20). Vm desses caminhos tem aqui especial importância, jâ que foi desenvolvido no confronto direto corn Morgan sobre a questao de leis gerais de evoluçao social. A antropologia modern a tende a considerar essa controvérsia em particular como infeliz, pois a nominalista, operada por Boas no contet'ido das culturas para provar a diversidade dos processos de desenvolvîmen- to, entronizou aquela concepçao de "far rapos e remendos" do objeto que a etno- logîa amer icana leva ria décadas para expiaI'. Na realidade, Radin criticou, cedo e de forma vigorosa, a noçao "quantitat iva" do traço cultural separado que Boas desenvolveu a partir da sua obsessao corn a contestaçâo do evolucionismo (Radin, 1966 [1933]). No entanto, 0 desmembrarnento negativo da cultura gerou, forço- sarnen te, um resultado contradit6rio e sintético.:Rara BO,as, <? que racionâlizou a . disparidade de traços aparentemente semelhantes, que realmente existiam em as diferenças emsignificados e usas determinados local- . esses significados implicavam processos dissimil ares de desenvolvimen- . to, provando que Morgan estava errado, era tambérn pOl' suas implîcaç6es de um contexto total e arientado: uma cult ura que padronizava os traças de acordo com Il seu prôprio espîrito singular. Dado. que Boas argumentava que as mascaras da Il sociedade A, usadas para enganar os espiritos, nao comparaveis às mascaras .! da sociedade B, que comemoravam os ancestrais - e correspondentemente que d os c1âs, os totens ou os sistemas de metade variavam em todo 0 mundo - ele teve t·, de conduir pela existência de culturas, de totalidades cujas "idéias dominantes" ou padrôes criam essa diferenciaçào (Boas, 1966b [1940J, p.270-89, e passim). Em um artigo muito conhecido, "Hist6ria e antropologia': Lévi-Strauss observa a eventualidade conceitual do método: ., f '" 1. 1<. <>. Ç' .. i ' /l " , s C' < t v c. , ' C . \ 1 r- r .- ',/ 'i' L.,r oF < 74 Cul/!lra e razào pratica Procurar-se-a entao levar ao extremo 0 nominalismo boasiano, estudando cada um dos casas observa dos como se fossem outras tantas entidades individuais? Dever-se-a constatar, de um lado, que as funçôes atribuidas à organizaçao dua\ista nao coinci- dem; e, por outra lado, que a historia de cada grupo social mostra que a divisâo cm metades procede das origens mais divcrsas. Assim, a organizaçâo dualista pode resul- lar, scgundo 0 casa, da invasâo de uma populaçâo par um grupo de imigrantes; da fusao, por fazoes cm si mesmas variaveis (econômicas, demogrMicas. cerimoniais), de dois grupos tcrritorialmente vizinhos; da cristalizaçao, 50b forma de instituiçao, de regras empiricas destinadas a assegurar as tracas matrimoniais no scia de determina- do grupo; da distribuiçao no interior do grupo, nas duas partes do ano, de dois tipos de atividade ou duas fraçôes da populaçao, de comportamentos antiéticos, mas julga- , dos igualmente indispensaveis para a manutençao do equiHbrio social etc. Assim, seremos conduzidos a despedaçar a noçâo de organizaçao dualista camo constituio- do uma falsa, calegoria e, estendcndo este raciodnio a todos os outros aspectas da vida social, a negar as instituiçôes em beneficio exclusivo das sociedades. [Lévi- Strauss, 1963b, p.lO-l.] A problematica geral de Boas difere, portanto, radicalmentc da de Morgan. Onde Morgan entendia a pratica e suas formulaçôes costumeiras pela 16gica das circunstâncias objetivas, Boas intercalava um subjetivo independente entre as condiçôes objetivas c 0 comportamento organizado, de modo que 0 segundo nao derivasse mccanicamente do primeiro. Ao nivel psicol6gico, onde foi primeira- mente anunciado, 0 termo interventor pode ser caracterizado grosso modo como uma operaçao mental, gerado pele contexto e pela experiência anterior, que, ao governar a percepçao, especifica a relaçao entre estîmulo e resposta (figura 7). Ao nive} cultural, em direçào ao quaI 0 pensamento de Boas estava cm continuo desenvolvimento, 0 termo mediador é a tradiçao, 0 VoIkergedanken ou 0 padrao dominante, que ordena ao mesmo tempo a relaçao com a natureza, as instituiçôes existentes e a sua interaçao (figura 8). A semelhança das duas f6rmulas corn a de Lévi-Strauss é indiscutîvel (p.61- 2). Na vcrdade, os termos da afirmaçao de Lévi-Strauss da sua posiçao - em oposiçao a um certo marxismo - descrevem Boas corn exatidao, especificando até mesmo 0 tCl titl1n quid entre a praxis e as prâticas como um "esquema concei- tuai" (ou c6digo). Adotando esses termos, 0 contraste te6rico entre Boas e Morgan pode ser estabelecido, de [arma geral, como mostra a figura 9. É clara que 0 "es que ma conceitual" tem uma qualidade diferente nessas duas perspectivas. Para Boas, é a encodificaçao (encoding), enquanto para Morgan é a codificaçao (codiJicntioll) de distinçôes externas. Para Boas, a significaçao do obje- to é a propriedade do pensamento, ao passo que para Morgan 0 pensamento é a representaçao da significaçao objetiva. Se na concepçào de Morgan pensamento e linguagcm funciOi}2m de Boas tl-ata-se, essencialmente, de uma problematica do srmbolo. Na re31idade, a estrutura do simbôlico desenvolvida por '- '" ) Dois paradigmas da tcoria alltropol6gica 75 Boas corrcsponderia às posiçôes empirico-racionalistas do tipo que Morgan man- teve, isto é, uma forma caracterîstica de auto-retlexao cultural, um apelo post-fac- tum à racionalidade de pratÎcas cuja verdadeira lôgica é nao-explfcita e cujas verdadeiras fontes sac desconhecidas. Boas afirmou que a formaçao de uma cultura, como um pracesso de tomaI' a experiência significativa, se exerce necessariamente cm uma teoda - da natureza, do homem, do ser humano na natureza. Essa teoria, contudo, continua naD sendo formulada pelo grupo humano que vive nela. A linguagem é um exemplo privile- giado desse processo inconsciente, mas outres costumes, priticas, crenças e proibi- çôes sac também baseados em pcnsamentos e idéias nao-retletidos e imemoriaveis. Todos eles sac baseados na categorizaçao da experiência, na apropr iaçao do perce- bido pelo conceito, exatamente coma nas raizes da palavra ou_'2a, sintaxe de uma \ determinada lingua, a experiência nao é é classifica-- 1 \ da. E como toda classificaçao deve ter seus princîpios, cada lingua é, ao rncsmo - V tempo, "arbitriria" cm rclaçao a qualquer outra lîngua e cm relaçao ao real, agru- pando, sob uma significaçao unica, uma variedade de coisas ou eventos que nas outras lînguas poderiam ser concebidos e denotados separadamente. Boas exp li ca: FIGURA 7 (2) Nivel psicol6gico FIGURA 8 (3) Nrvel cultural FIGURA 9 (4) Boas: (5) Morgan: estfmulo meio ambiente praxis - , ,7"' , _' operaçao mental - tradiçao (V6/kergediinken) esquema conceitual (c6digo) resposta praticas praxis _ prtiticas_ esquema conceit.ual (c6digo) , S ). <, F 76 Culfl/ra c razào pratica As Ii nguas difcrem nao apenas quanta ao carater dos scus elcmentos fonéticos e grupos de sons COll stitutivos mas também quanta Olos grupos de idéias que tram expressao cm grupos fonéticos flXOS ... Dma vez que 0 âmbi to total de experiên- ci as pcssoais às quais a lîngua serve é infinitarncnte variado c sel! objctivo, coma um Lodo, devc sec expresso através de um nûmero Iimitado de palavras-lroncos, de uma extensa classificaçao de experiências que devem necessariamente ernbasar todo 0 discurso articulado. Issa coincide corn um traça fundamen tal do pensamento humano. Em nossa expe- riência real, nem dois estados de senti do-impressôes ou emocionais sao idênticos. N6s os classificamos, de acordo cam suas semelhanças, cm grupos mais au menas amplas, cujas limites padern ser determinadas por uma grande variedade de pontas de vista ... / Em vârias culturas, essas c1assificaçoes podem ser baseadas em prindpios mel1talmente distintos ... Par excrilplo: que as cores sao c1assificadas em grupos bem dist intos, de aeor'do cam suas semelhanças, sem qualquer di fercnça associada à capacidade de distinguir formas de cor ... A importância do fato de que a palavra faz surgir um quadro diferente na fala e no pensarnento, de acordo corn a c1assificaçào do verde (comJ a arnarelo ou do verde [camI a azul coma um grupo, difici lmente pode ser exagerada. [Boas, 1965 (1938), ver também Boas, 1966, (1 911 ).)" Boas argumentoli mais tarde - em uma observaçao hoje cJassica _ que, embora a linguagem e outras costumes sejam organizados por lima 16gica f1 etida) ha lima diferença entre el es no fato de que as classificaçoes da primeira normalmente nao atingem a consciência, ao passo que as categorias da cultura a atingem, estando tipicamente sujeitas a uma reinterpretaçao secundaria (1966a, p.63). A diferença desponta essencialmente no modo de reproduçao. Encaixadas em regras inconscientes, as categorias de linguagem sao automaticamente repro- duzi das na fala. Mas a continuidade do costume é sem pre vulnera.vel à ruptura, quer somente pela comparaçao co'rn outras formas, quer na socializaçao do jovem. o costume, conseqüentemente, toma-se um objeto de contemplaçao, bem como uma fonte dela, e emprestamos uma expressao convencional que mal parece razoaveJ a uma razao convencional que permanece A 16gica cultural reaparece entào sob uma forma mistificada - como ideologia. Nào mais como um princîpio de classificaçào, mas como satisfaçao de uma demanda por 14 As cxplic:lçôcs de Boas dos gr:lus de generalizaçao c difcrendaçli o, cspccialmell{c 110 vocabu/<i rio, cram vaganwntc funcionalistas, apebndo para os "interesses" ou para as "ncccssidades" do POyo. Ele enfatizou, porém, que as categorias de uma populaçào (dai os interessc5 e as necessidades) nao podem ser comprccndidas pela invocaçao de processos racionais, isto é, baseados no raciodnio consciente, ou na lltilidadc pdt ica ( 1965[ 1938), p.204-25). Nessa mesma época, Boas a reconhecer a pnltica camo sen do, de fato, a unica base das categorias terlllinol6gicas, pois poderia facilmente acontecer 0 isto é, 0 comportamento rell etir a d assificaçâo. Foi a partir dessa posiçao que cIe encarou as teorias de Morgan de tenninologia de parent esco (por exemplo, 1966a [ 1911), 1'.68-9). Dois pnrndigmns dn ' carÎn mr'ropo/6gicn 77 tiva. Por conseguinte, nao aparece mais como algo arbitn.hio em relaçâo a uma realidade objetiv<i, Illas como algo motivado pela . _ As impli caçoes dessa compreensào para 0 proJcto ant ropologlCo alnda nao estâo rcsolvidas. E em alguns aspectos, nao fora m ai nda percebidas. POl" um bdo, quanto do que considcramos como inst ituiçôes e crenças essenci ais dev.e ser lisado como uma elimologia do povo? Por outro lado, nao parece sel" maIs pOSSIVel compart ilhar do otimismo de Boas quanto às categori as que, por alguma operaçào positivista continuada , oposta à formaçao das Ide.las e costumes às quais das se referem, poderiam ser realmente "derivadas de, COI1s!stentes com c, num certo sentido, internas aos pr6prios fenômenos" (Stocking, 1974, pA). Em todo caso, 0 comentario sobre a analise racional ista de Morgan implicado pela noçao de consciência secundaria Jlao seria difici l de ser desenvolvido. Se por um lado "a ori gem dos costumes do homem primit ivo nao deve ser procurada . processÇ)s como cscre·veu Boas (196S [1938 j, p. 2IS), por outro .. ' gem de certos proèessos racionais podia ser procurada no costpme. A de das institui çoes, e acima de tudo sua utilidade, é a forma pela quaI nos mos a n6s mesmos. A racionalidade é nossa racionalizaçao. Boas fornece a plo do tabu do incesto, que ha algum tempo nos contentavamos em atribuir a razoes religiosas, mas que hoj e é "um conceito uti li tario, sendo 0 filhos nào-saudaveis - devido ao casamento dentro do grupo de parentes proxlmos- apresentado coma a razao para nossos sentimentos" (I 965. [1 938], p.20B). A questao é que, quando interpretamos 0 convenclonal. coma utIl, el: também se transforma, para n6s, no "natural", no duplo senudo de merente a natureza e de normal à cultura. Por isso é que Morgan fez dessa contradiçao.uma teoria etnol6gica, 0 status do que poderia ser enUio descrito C?I1"lO .a ap_l"opnaçao das realidades significativas dOlS vidas de outros povos pelas raclonahzaçoes darias das nossas pr6prias. Variedades antropol6gicas da razâo prâtica Anunciado primeiramente na obra de Morgan e Boas, 0 desacordo basico a natureza do objeto antropol6gico continua a se fazer presente, mesmo hOJe, e de 15 0 exemplo mais conhecido é a origem do cornportarnen\ o que sc tem ii I.llcsa: "0 easo, comport :lInento que se tem à mesa ofereee também um barn exemplo secundar.I,I. Coma nao é usual se levar a (aca il boca, surge da! a intuiçiio de que a (aca naD e usada dessa manClfa porque, cmprega.ndo-a, correr-se-ia a risco de carlar os A tardia i.nvcnçào do garfo e a fato de facas sem cort e serem usadas em muitos pafses, e de que eXIste Ulll penga semelhante se furar a lfnglla ou os l:ibios cam os garfos de aço ponli agudos comUlllcnte usados Europa, delxam claro que eSS<l expli caçao é apenas uma tentativa radonali sta secunddria para expllc;\ r um costume que, de outm modo, permaneceria inexpl ic;ivel" (Boas, 1965 [1938]. p.65). 'Jill .>: '" • , 1 78 ClIltura e razao prririca todos os modos - através de outras controvérsias te6ricas. Isto nao significa subestimar 0 alcance de antinomias famosas tais como "hist6ria/ciência': "cultu- ra/sociedade': "diacronia/sincronia': Mas se essas oposiçôes foram bem-sucedidas 30 gerarem 0 desdobramento de UI11 momento te6rico para 0 seguin te, isso se deveu apenas à reproduçào, em cada estagio, das contradiçôes nâo-solucionadas na base. No final, as perspectivas posteriores que aparecem demarcando rupturas te6ricas encontram-se, internamente, em pendência ao longo das mes mas linhas que separam a visao de Morgan da de Boas. Desta forma é que se distingue U111 funcionalismo do outro, como também um historicismo do outro, assim como a metade de funcionalistas ou evolucionistas encontra um improvavel aliado na tribo do outro. Parece muito para'doxal agrupar certas ênfases te6ricas de Lévi- Strauss e Leslie VVhite? (ver mais adiante, p.106-7). 0 acordo em termos de prin- cipios entre 0 arquievolucionista Morgan e 0 arquifuncionalista Malinowski é muito mais completo. Malinowski e 0 "neofuncionalismo" De uma forma ainda mais explicita que Morgan, Malinowski considerou a cultura coma a realizaçao instrumental de necessidades biol6gicas, construîda a partir da açao pnitica e do inter;esse, como se orientada por uma espécie de super-raciona- lidade - à quaI a Iinguagem fornece apenas a vantagem de um suporte te6rico (cf. Leach, 1957). Devemos ter como base, escreveu Malinowski, dois axiomas: "Ern primeiro lugar, e principal mente, toda cultura deve satisfazer ao sistema biol6gico de necessidades, corno as ditadas pelo metabolismo, reproduçao, as condiçôes fisiol6gicas da temperatura." E em segundo lugar, "toda realizaçao cultural que implica 0 uso de artefatos e do simbolismo é um realce instrumental da anatomia humana, e refere-se, direta ou indiretamente, à satisfaçao de uma necessidade fisiea" (Malinowski, 1960 [ 1944), p.l?!). Utilizando uma frase do soei6logo ffan- cês Baudrillard, é como se a cultura fosse uma metafora sustentada sobre as funçôes biol6gicas da digestao. Em tiltima ana lise, a cultura é referenciâvel à utilidade prâtico-orgânica. Simples ou complexa, é "um vasto aparato, parciaI- 1 mente mate rial, parcialmente humano, e parcialmente espiritual, através do quai 0 homern é capaz de competir corn 0 concreto em problemas especificos corn os quais se defronta" (Malinowski, 1960 [1944). p.36). Apresentar a concordância, ponto pOl' ponto, do texto de Morgan corn 0 de Malinowski seria cair no lugar-comum. Por ser mais explicito, Malinowski se mais interessante para certas implicaç6es te6ricas do argumento das praxis que sâo apenas sugeridas em Morgan, embora elas estejam, na realidade, contidas ali e em muitas versôes posteriores, até na mais recente ecologia "neofuncionalista". Abordarei diversas dessas implicaç6es, que podem sel' resumidamente intituladas ,"<; -' --- --.- ---_._-- -- - ,. Dois paradigmas da tcoria flmropolOgica 79 de "0 hllhri s etnogrJ.fico", "rendimentos decrescentes na explicaçao funcionalista", 1 "tel [QI ", "fetlChismo da eco}ogla': "dualismo utihtario" e "desapareClmento da j cul tU! a" A plll11elra tem a ver corn a relaçâo partlCular su}elt%b}eto envolvida na ênfase pl agmâtIca, que contrasta Iadicalmente corn 0 relatIvismo ,.. _ .... o scntldo dominante do projeto de MahnowskI cra reduzlr. de todas as ES ';-l mancil as, costumes aparentemente bizarros, do Inttcluuma austrahano ao tote- f ..;, mlsmo de Trobnand, a valores pratlcos (Jela-se bioI6gicos).l? eVl,dente que Mah- 5S:-? : nO\vskt fOI 01 ientado poruma sllnpatia pecuh:r para corn Jarvle, 1 ;J '" 1969, P 2-3) Ele gostana de mostrar que a razao subJ3cente as mascaras aparen- __ .. _ , temente sem senti do do que en tao chamavamos de "selvagens" (Richards, 1957, 1 r 'V' '' .c... 'l p.IS) era algo que qualquer europeu poderia entender: a vantagem materia1. Isso ,1 :t 3 significava, de fato, uma inversao do se informada y.ela g mesma indulgência. Sob certo aspecto, 0 IntlchlUma e lucratIvo; logo, 0 abongme ff S , australiano é nosso irmao: Desde 0 começo ... um interesse na utilidade das mascaras aparentemente sem senti- do do que entao chamavamos "selva gens" foi 0 ponto principal na sua obra [de Malinowski]. Seu primeiro artigo foi publicado com a intençâo de demonstrar que as cerimônias Intichiuma dos aborîgines australianos, corn suas danças selvagens, scus_., corpos pintados e seus escudos simbolicamente esculpidos, desempenham efetiva- mente uma funçao na sua vida econômica ... Ap6s a sua viagem de estudo às ilhas Trobriand, publicou seu primeiro artigo importante sobre a vida econômica dos habitantes das ilhas, no quaI manifestava a mesma determinaçao de provar que aquilo que aos europeus pareciam trocas de bens cerimoniais sem utilidade desempe- nhava, na realidade, um importante papel na sua organizaçao econômica [Richards, 1967,p.18)16 Ha nisso uma dimensâo mais ampla do que a implicaçao 6bvia se a interpretaçao for aceitavel ao europeu, ela diz mais 'sobre de do que sobre os "selva gens" - mais geralrnente de que a "ética" do antrop610go é a "êmica" da sua pr6pria sociedade. Aigo deve ser dito sobre a relaçao sujeito/objeto, subentendida pela compulsao em atribuir um "sentido" pratico a um costume ex6tico que é tao intricado quanto nao é de cara uma questao de necessidade pratica. Ela eleva 0 antrop610go à divindade de um sujeito constituinte, de quem emana 0 projeto da 16 Como 0 projeto de Malinowski é popularmcnte descrito: do blzarro ao bazar 0 artlgo d: (1957) sobre Malinowski faz uma excelcnte ami!ise clesse processo de "fazer sentido", cscreveu: "Na realidade, seremos capazes de provar que aigu mas realidades que nos parecem mUlto estranh:ls il primeira vista (canibalismo, cOtlvade, mumificaçao etc.) estâo ligadas elemcntos culturais muito univcrsais c fundamcntalmentc humanos, e esse reconhecllllento acabara admitindo a explicaçao, ou scja, a dcscriçao, cm termos familiares, de costumes cx6ticos" (1960 [1933 J, pA). !k l • ,".:1 r \ 1 { 80 Clllll/ra c razao prtltic(/ Em vez de submeler-se à compreensào de uma estrutura corn uma exis- tênda indcpendente e autênti ca, cie co mpn.-' ènde a est rutura pela sua compreen- stlO do objelivo dela, fazendo assim cam que sua existëncia 1 da estrutura J dependa delco l'ara Mal inowski cra um ponta do método etnografico "pcrecber () ponta de vista do nativo, sua relaçào com a vida, para compreender a sua visâo do sel! Ill undo" (1950 [ 1922J p.25). Este cra Uffi principio fundamental do seu "cmpirismo radi cal", como chama Leach. Ha, porérn. uma contradiçao clara entre esse empir ismo e a compulsao para dissolver costumes estranhos cm noçôes ul ilit;i ri 3s. 0 "empir is mo" en tao deve cOll si sl ir na aplicaçao radical de uma teori a - :1 dos interesses praticos e do calculo pessoal - que sustenta que as rnaneiras ap:1n.'ntl'mente peculiares pelas quais as pessoas estào agindo nao merecem em nada, nos seus proprios termos, a nossa alençao. Cer ta vez, Kroeber lançou a ,sl'guinte pergunta, pensando obviamente em Malinowski: "Por que um Yurok nao (Oill e l' Ill sua canoa enquanto navega no occano?" A questôes como esta "nao ha Ilenhuma rcsposta 6bvia coma a que se da a perguntas do ti po: por que uma flecha é eillplumada ou quai é 0 uso dade a uma rede de pescar" (Kroeber, 1948, p. 307). j\ l:tl inowski - fcita esta critica - se recusa a rcconhecer qualquer capacidade no sistl'Illa cult ural, quanto men os tenl ar compreender sua 16gica inerente. Areas intcÎras da cultura escapam, portanto, a uma explicaçao funcionalista, uma vez qut.' IÜO fonnam nenhum, senti do pnHico aparcntc. Leach coloca a feitiçaria corno \l1ll c:ü' mplo do que acaba de ser dito: "De acordo cam a dogma de Malinowski, pelo quai essa racionalidade é natural à espécie humana, as crenças em feitiçaria 1) - Il;10 sendo nem sensiveis nem racionais - nunca foram efet ivamente incorpo- radas ao esquema funcionalista" (Leach, 1957, p. 128-9; cf. Nadel , 1957). t-tlYia muitos outros domînios da vida dus îlhas Trobriand - parentesco, polîtica - dos quais Malinowski deixou- nos uma avaliaçao incompleta e Il :1o-sist€'matizada, devido a algul1s desses mesmos escrupulos t'c6ri cos. Ele consi- (1$ textos e declaraçôes de pessoas como simpl es formulaçôes do ideal, cm lOlll !,.uaç:1o com os motivos reais pragmaticos que governavam as relaçôes dos com tais regras e entre si (cf. Malinowski, 196611926]). Em tudo isso, \\alillo"'ski inverteu nao apenas as premissas de uma antropologia boasiana, ':Otl1('\ t;lI11bém 0 relacionamento original do antrop6logo com a popul açao. Ë hem wrJade que Boas termi na ria tendo uma compreensao do parentesco Kwa- kiutl à que Malinowski teve do sistema Trobriand. De fato, Boas foi muito I1Ul :' illù)t'fente, a partir de um respei to decente pel a ininteli gibi lidade do indi o. BO.l:' .l.:h.1Y;l que os fatos "falariam pOl' eles mesmos': Hojc cm di a, esta aftrlnaçao / t' como a signo de um empi ri smo ingênuo, Mas, cm pri meiro lugar, 0 quI:'" !'rocurava cra uma submi ssao à cuhura em si mes ma, um compromisso em 1 t'n.:('tHr.H ordem nos fat os, e nao em colocar os fa tos em ordem (cf. Smith, 1959). ;\. cmpi ri sta de Boas consist ia na ilusao de que a pr6pria ordem se '-"'1f- cc Dois paradigmas da teoria ant ropoMgica 8 1 revelar ia exatamente tal como apresentada, através dos textos de mil receitas de salmâo, sem se benefi ciar de nenhum entendimento da sua parte,17 Tratava-sc aqui de uma relaçâo total mente di fe rente corn 0 objeto. 0 antropôlogo foi reduzÎ- do ao status de um aparelho de gravaçao; nem mesmo sua propria inteligência podia entraI' em cena, Para Malinowski, parém, a "selvagem" era negatividade pura. Ele nào existia; Malinowski 0 criaria: "Ouço a pa!avra 'Kiriwina' ... estou pronto; pequenas cabanas cinzas, r6seas: sou eu quem as descrevera ou criara" (Mali nowski,I967, p.140). o funcionali smo utilitario é uma ceguei ra funcional para 0 conteudo e para as relaçôes internas do objeto cul tural. 0 conteudo é apreciado apenas por seu efeito instrumental, sen do sua consistência interna, por conseguinte, mistificada como sua utilidade externa. A explicaçao funcionali sta é uma espécie de barganha feita com a realidade etnografica, na quaI 0 conteudo é trocado por uma "com- preensao" de le. Uma teoria, porém, deve ser julgada tallto pela ignorância que exige, quanto pelo "conhecimento" que oferece. Ha uma enorme disparidade entre a riqueza e a complexidade de fenômenos culturais como 0 Intichiurna e as noçôes simples do antrop610go quanto às suas virtudes econômicas. Sornente a fraçao mais infinitesimal dessa rica realidade, e nada do seu conteudo especifico, é avaliada por sua funçaO. 18 Quando Malinowski demonstrou que "as cerimônias Intichiuma dos aborfgines australianos, corn suas danças selvagens, se us corpas 'pintados e seus escudos simbolicamente esculpidos, 'desempenhavarn uma funçao na sua vida econômica" - ou sej a, que estimulavam a produçao através da ante- cipaçao representada pelos ritos (Malinowski, 1912) - 0 que de fato aprendemos sobre essas danças selva gens, esses corpos pintados e as mil outras propriedades do Intichiuma? Esse empobrecimento conceitual é 0 modo funcionalista da produçao te6ri- ca. Ele se apresenta exacerbado quando a funçao é buscada ao nivel biol6gico, 0 que é quase sempre verdadeiro, nao s6 em Malinowski, como também em vers6es mai s recenles da antropologia (cf, Vayda, 1965, p. 196; Vayda e Rappaport, 1967). Quanto mais 0 fato cultural se afasla da esfera da utilidade à quai esta referenciado - a orgâni ca, a econômica, a social -, menos intensas e mai s mediatizadas devem ser as relaçôes entre esse fato e os fenômenos dessa esfera; conseqüente- 17 Radin apresenta resumidamente 0 pri ndpio de Boas de que "ninguém tem a dircilo de alterar a forma cxala na quai suas informaçôes foram recebidas", embora, na mesma obra, critique em profun- didade a tentaçâo do mestre de retalhar a cultura em pedaços, adotando um tratamento difusionista, entre outras imperfeiçôes do método historicista (1966 (l933J). Para uma excelente discussao da at itude de circunspecç:l.o de Boas para corn 0 fen6meno em si mesmo, ver seu artigo "0 estudo da geografia" (in Boas, 1966b [ 1940J), 18 Neste ponto, devo muito a Firthjof Bergm3nn e Raymond C. Kell y, quanto a uma primeira formulaçâo da "lei dos rcndimcntos decresccntcs para a explicaçao funcional ista" que deriva .dela. ,., .:: , ., . l \ j 1 • 82 Cu/tllra c mzao prarica mente, menas intensas e menas especificas serac as coerçôes sobre a natureza do costume cm consideraçao; menas determinada sera a explicaçâo através de vir tu- des func ionais, ou, inversamente, maior sera a variaçao de prâticas culturais alter- nativas que poderiam servir igualmente (até melhor) ao mesmo prop6sito. Deve haver muitas maneiras de estimular a produçâo além de encenar uma cerimônia Intichiuma. Na realidade, a explicaçaa sai frustrada no seu objetivo de tomar 0 costume inteligîvel; esta é uma forma bizarra de se ocupar dos seus pr6prios assuntos. Para nos provar a indeterminaçao de qualquer dessas explicaçôes. basta inverter a questao: é vantajoso aumentar a produçao - e, conseqüentemente, é vantajoso 0 Intichiuma? 0 entendi mento funcionalista de Malinowski teria sido mais convincente se, à la Radcli ffe Br6wn, ele examinasse a cerimônia ao nivel do fato social. As relaçôes domi nantes entre os cHis totêmicos, homens e mulheres, iniciados ou de percor rer um longe caminho até tornar inteligiveis as danças selvagens e os escudos esculpidos. Quanto mais se recorre às vantagens econômicas, menos é dito. E menos ainda teria sido obtido se Mali- nowski tivesse levado adiante seu projeto, até 0 nivel biol6gico. Ai 0 conteu- do cul tural, cuja especificidade consiste no seu significado, ficaria completamente perdido em um discurso de «necessidades"vazio de significaçao. for mular uma regra geral dos rendimentos decrescentcs para a explicaçao funcionalista: quanto mais distante e distinta a prâtica cultural do observador da sua pretensa funçâo, menos essa funçao especificara 0 fe nômeno. A regra deve ser concebida como uma expressao instrumental da "autonomia relati- va" de diferentes dominios culturais (ceri mônia/economia), e particularmente da irredutibilidade do cultural aos nfveis constitutivos da integraçâo fenomenal (su- perorgânic% rgânico). Nesse ultimo aspecto, a fo nte geral de inadequaçâo nas explicaçôes pela nat ural esta relacionada, precisamente,à atividade tiva da simbolizaçao: mais uma vez, a natureza arbitraria do signo, que envolve 0 objetivo apenas selctivamente, submete 0 natural a uma 16gica espedfica da cul tu- ra. Lucien Sebag demonstra-o bem: por definiçao, toda refraçao de uma realidade através de uma linguagem implica uma perda de informaçao, podendo 0 que é abandonado, por sua vez, tornar-se 0 objeto de um tratamento da mesma ordem. A atividade lingüistica aparece portanto como um esforço permanente para submeter a um conjunto de formas um dado que sempre ultrapassa os seus limites. Mas nao é esta uma caractcdstica apenas da linguagem; é a cultura como um todo que se deixa de fini r da mesma rnaneira. A relaçao do dado natural coloca isso em pie na luz: quer se trate da sexualidade, dos rirmos do dcsenvol- viOlenta do corpo, da gama das sensaçôcs ou' dos afetos, cada sociedade aparece coma submetendo a um principio de organizaçao que nunca é a ûnico concebivel uma realidade que se presta a urna multiplicidade de transformaçôes. A partir desse fato, compreende-se por que a explicaçao naturalista é sempre insuficicI11e, pois a essência da necessidade, descoberta aquém das diversas modulaç5es culturais, nao nos pode 1· Dois pamdigmlls da tcoria antropol6gica 83 dar senao 0 esboço da pr6pria forma da cultura, nunca do seu conteûdo; ora, é este illtimo que deve ser compreendido. [Sebag, 1964, p.166-7. ] f Em francês no origina1.] É 0 conteudo que deve ser compreendido. Esse é 0 nosso objetivo. No entan- to, a pratica funcionalîsta, C0l110 ja vîmos, consiste em considerar as propriedades culturais simples mente camo a aparência. 0 concreto-real cultural torna-se um abstralo-aparente, apenas uma forma de comportamento assumida pelas forças mais fundamentais da economia ou da biologia. Sartre fala, num contexto analo- go, de um "banho de acido sulfurico". Além disso, como as forças supostamente essenciais sac na verdade abstratas - sobrevivência humaI/a, necessidades numa- tlas, etc. -, a abstraçao do simb6li co atinente ao objeto foi complementada pela simbolizaçao de uma abstraçao pertencente ao antrop610go. 0 ataque de Sartre tinha camo alvo um certo marxismo, que se contenta em negligenciar a 16gica autêntica de um "fato superestrutural", lai coma uma obra de arte ou um ato poHtico, e as determinaçôes especificas do seu autor, em favor das determinaçôes gerais de classe e produçâo. A partir dessa visâo, a poesia de uro Valéry é repudiada coma um exemplo de "idealismo burguês': A crîtica de Sartre parece apropriada, ponto par ponto, à pratica funcionalista clâssica: u formalismomarxista é um projeto de eliminaçao. 0 método é idèntico ao terror na sua recusa inflexîvel do dlferetrte; sua meta é a assimilaçao total corn um minimo . possivel de esforço. 0 objetivo .nao é integrar aquilo que é diferente enquanto tal, preservando para de uma relat iva autonomia, mas sim suprimi-Io ... Delerminaçôes espedficas despertam na teoria as mcsmas suspeilas que as pessoas despertam na realidade. Para a maioria dos marxistas, pensar é exigir totalidade e, com esse to, substituir a particularidade pele univcrsal. l! nccessario levar-nos de volta ao concreto [0 material] e conseqüentemente apresenlar-nos com determinaçôes fun- damentais mas abstratas ... 0 marxista pensaria estar perdendo 0 seu tempo se, por exemplo, tentasse compreender a originalidade de um pensamento burguès. Aos seus 01h05, a ûnica coisa que importa é mostrar que 0 pellsamento é um modo de idealis- mo ... O marxista, por conseguinte, é levado a tomar por aparência 0 contcûdo real de um comportamento ou de um pensamento e, quando dissolve 0 particular no Uni- versai, tem a satisfaçao de acrcditar que esta reduzindo a aparência à verdade. (Sartre, 1963,p.48-9.]. Da mesrna forma, Malinowski dissolveu repelidas vezes a ordem simb6lica na verdade âcida da razao instrumental. Qualquer que fosse 0 dominio cultural em questào, seu exame s6 podia começar livrando-se da consistência simb6lica. Parentesco ou tOlemisl11o, mito ou magia, crença nos espiritos ou disposiçao do morto, e até mesmo a anâlise da pr6pria li nguagem - em relaçao a tudo 0 primeiro passo de Malinowski era negar qualquer 16gica interna, qualquer est ru- tura significativa, ao fenômeno coma tal (ver, par exemplo, a anilise que permeia todo a seu Magic Science and Religion (1954]). Dai decorria que a , - <. ! 84 CIIltllra c razào pratica jihum;:ma, a "especulaçâo': como }.[alinowski a considerava, nuo poderia ter qual - ïquer papel constitutivo. 0 costume se origina na prâtica, na vida - nao no jogo Ido pensamento, mas no da emoçâo e do desejo, no do instinto e da necessidade: Nessa perspect iva, dificil mente urn "selvagem" teria uro Interesse na natureza que nac fosse ditado pela fome, nem articularia qualquer concepçâo além da raciona- Iizaçâo clesse desejo. Dai a famosa afirmaçâo de Malinowski sobre a mentalidade manifesta nas classificaçoes totêmicas: "a caminho que vai da selva para 0 estô- mago do selvagem, e conseqüentemente para a sua cabeça, é muito curto, e para ele 0 munda é um indiscr iminado pano de fundo contra 0 quai se destacam as espécies uteis de plantas e animais e dentre elas sobret udo as comestiveis" (1954. p.44) . Do mesmo modo) " ha pouco,.espaço para 0 simbolismo nas suas idéias c contos" (ibid .• p.97). Quanto ao mito, nao é "uma raps6dia inutil ... mas uma força cultural ativa, extremamente importante" (ibid., p. 97) : o mito estudado vivo ... nao é simb6lico, mas urna cxpressao direta do objeto cm questao; nao é uma explicaçao para a satisfaçao de um interesse cientîfi co, mas urna ressurreiçao narrativa de urna realidade primeva, narrada para a satisfaçao de pro· fundos desejos rcligiosos, anseios marais, submissôes sociais, e até mesmo necessida· des praticas [ibid .• p.l 0 J ... Pademos, certamente, descartar·nos de todas as interpre· taçôes expl icativas e simb6licas mitas de origcm. Os pcrsonagcns e seres sao 0 que parcccm ser na superficie, e n30 sirnbolos de realidades ocultas. No que toca à funçao explicativa desses mitas, nâo ha qualquer probJema de que eles dêcm conta, qualquer curiosidade'que eles satisfaçam, qualquer teoria que eJes encerrem." [ibid. , p. 1261 . Esta também foi a famosa abordagem de Malinowski à linguagem. Pace, Boas. a linguagem nao contém teoria aigu ma: ela nada contém. nada além de urn gesto verbal. de " 'apreensao' das c01sas", cujo significado consiste nos efeitos induzi dos sobre os ouvintes. ''As palavras sao parte da açao e sao equivalentes às açôes" (Malinowski, 1965 [19351 2:9). E eomo as palavras sao aç'a, 0 signifieado é a reaçao evocadaj as primeiras SaD 0 estimulo, 0 segundo é a resposta; Uluas sao 0 instrumenta, 0 outra é 0 seu pr6prio produto: o significado de urna ûnica expressao vocal. que nesses casos é rcduzida quase semprc a urna palavra, pode ser definido como a llludança produzida pela som no campor· tamento das pessoas. ta manci ra pela quai um som, proferido apropriadamentc. ê correlacionado corn elementos espaciais c temporais e com movimentos do corpo humano que canstitui 0 seu significado; e isso se dcve <1 respostas culturais produzi· das por treinamenlo, "condicionamento" ou educaçao. Uma palavra é um esllmulo condicionante da açao humana e torna·sc. por assim dizer, ullla "aprecnsao" das cOLsas externas 30 alcance de qucm fala, mas dentro de quem ouve [ibid., 1'. 59. J 19 19 Malinowski dcscnvolveu essa visao instrumentaI·pragmalica da linguagem cm uma séri e de t'seri· Dois paradigllul5 da teor;a IlI!tropolOg;cn 85 Fica evidente também que 0 significado é limit ado à expcr iência pela associa· çao. isto é, a urna referência ori ginal e indicado ra que cont inua senda 0 conccito bâsico da expressao vocal através das suas reproduçôes Pa ra Mali· nowski, a linguagem. em vez de cJassificar il exper iència, é ela pr6pria dividida pela exper iência. VIlla palavra se diferencia de outra da mesma fo rma que a contexto do mundo real na q uai a pri rneira ocorre é perceptivelmen te dis tingulvel do contexto do segundo. "A li nguagem espelha, na sua estrulura, as catcgorias reais derivadas de atitudes praticas da criança e do homem natural ou primitivo para com a mundo eircundant." (Malinowski, 1949 [1923], 1'.327-8). Esse tipo de recusa fundamenta l do simb6lico. da palavra como categoria. levou Mali nowski a aIgu mas escolhas bévues. Uma deJas foi "a doutrina dos homônimos": uma vez que cada referência cmpi ri camente distinta de determinaâa palavra collst itui um significado dist into, Malinowski viu-se obrigado a conc1uir que a "palavra" em questao é. na realidade. muitas outras diferentes, urn conjunto acidental de homô- nirnos. 20 Se fosse esse 0 caso, é clare, nem as palavras nem a cornunicaçao pode. riam existir como nés as entendenlOs. na medi da em que os contextos de dois usos diferentes da mesma palavra nunca sâo os mesrnOSj portanto, cada um desscs so ns é uma "unidade" d ife rente de todos os o utres. 0 que significa dizer que nao existern palavras, mas apenas uma infinidade de sinais contextuais fugidios . Difi - culdades semelhantes se apresentam pelo fato de que duas pessoas nao podern nunca experimentar a mesma realidade exatarnente da mesrna maneira. ja que - elas pr6prias. de um modo ou de outro, sao diferentes. Mais uma vez, jj que "no final das contas todo 0 significado das palavras é derivado da experiência fl sica': Malinowski insist iria em q ue mesrno os conceitos mais abstratos. coma os de ciência, derivarn-se realmente do lugar.comurn ou da praxis infantiL "Mesmo 0 rnatermitico puro, lidando corn 0 mais inut il e arrogante ramo da sua ciência. a teoria dos nurneros, provavelmente ;a possuÎa alguma experi ência de contar seus tos. Porexemplo, no art Îga sobre "Cultura", na Ellciclopédia das ciêncÎas socÎais:"O signifi cado de uma palavra nao esta misteriosamente conlido nela; é antes um efcito ativo do som proferido dentro do contexto de uma sÎtuaçao. A emissào do som é um ato significa nte indispensâvel a todas as formas de aç<'io huma na combinada. Ë um tipo de comporlamento intimame nte comparanl à manipulaçâo de uma ferrarnenta, ao mancjo de uma anna, à exccuçao de um ri tuai ou à conclusâo de um contrato. a uso das palavras cm Iodas essas formas de atividadc numana lem uma rebçao mütua e indispens:lvcl corn a comport;uuento manual e fîsko" (Mali nowski , 1931, p.622; cf. Malinowski , 1949 ! 1923] ; 1964 [ 1963]). Para uma avaliaçâo critica dOlS tcorias da linguagem de Malinowski, ver Henson ( 1974). 20 "Para definir um som, devemos descobrir, através do exame cuidadoso de contexlos \'erbais, cm quantos significados distingulveis ele é usado. 0 signHicado nao é algo que rcsida denlro de um som lista é, nao é os dois lados do papcl de Saussure]; elc existe na rel açao do som com 0 contexto. Da[, se a palavra é usada cm um contexto diferente nâo pode ter 0 mesmo significado, deixa de ser a mesma palavra e torna-se duas ou mais unidades semantkament e disti nguÎveis" ..Ialinowsld, 1965! 1935 ] 2:72; cf. Leach, 1957, 1'. 130·2). :a ! :c. ...,. r !l' .' ,. \ .. , > ,. .. 86 Cu/tum e rf/zao pratica trocados" (1965 [1935] 2:58). MalinO\vski ignora agui 0 fato de que 0 sîsterna de numeros deve ter antecedido a contagem, mas é esse tipa de erra que ele sempre comete nos se us argumentas ontogenéticos (como 0 da pratica classificat6ria do parentesco), confundindo a maneira pela qual 0 indivîduo é socializado no ma com a explicaçâo - na realidade a "origem" - do sistema (cf. Malinowski, 1930),21 Finalmente, 0 conceito de significado de Malinowski é inca paz de explicar seu pr6prio projeta etnogrâfico de dar sentido funcional ao costume ex6tico. Na medida em que a forma ostensiva desses costumes é estranha ou mesmo nao-fun- cional, Malinowski nao pode seT orientado pela experiência na sua interpretaçao, ou pela men os deve categorizar e valorizar seletivamente as atitudes racionais das pessoas sobre seu comportamento nao-racional através de um princîpio n3oO- dado pela encontro etnograflco. Malinowski sustentava que 0 mundo nao corpo- rifica idéia aIguma, que 0 seu significado é externo aos seus "efeitos" empîricos ... Uma etnografia correta, gerada por uma prolongada socializaçao na vida de Tro- briand, seria exatamente 0 que um nativo de Trobriand teria escrito. Mas se Malinowski tem de criâ-Ios, deve organizar sua experiência etnografica através de se us conceitos. E é 0 que faz ao admitir isso. embora em contradiçao corn sua noçao de que a palavra nao contém idéia alguma: Nao existe descriçao destituida de tcoria. Quer se reconstruam cenas hist6ricas, se leve a cabo uma pesquisa de campo em uma tribo selvagem ou em uma comunidade civilizada ... toda declaraçao e toda argumentaçao têm de ser feitas em palavras. isto é, cm conceitos. Cada conceito. por sua vez, é 0 resultado de uma teoria que declara que aIguns fatos sac relevantes e outros acidentais, que alguns fatores determinam 0 curso dos acontecimentos e outros sao simplesmente entreatos acidentais; que certas coisas acontecem como acontecem por causa de personalidades e mediaç6es materiais do meio ambiente que as produziram. [Malinowski. 1960 (1944). p.7.1 21 Ricoeur (1970, p.197-219) formula uma brilhante cdtica geral da noçao da palavra praxis pura (incluindo a palavra imperativa), que se aplica totalmente a Malinowski . Enfocando particularmente a matematjca, Ricoeur escreve: ",Ë porque 0 homem exprcssou 0 espaço cm geometria, em vez de vivê-Io e experimenta-lo em suas mcdidas rcais, que a matematica foi posslvel e, através dcla. a fisica e as técnicas matematicas rcsu!tantes das sucessivas rcvoluçôes industriais. E surpreendente que Platao tenha contribuido para a constmçao da geometria euclidiana através de sua obra de denomi- naçao dc conceitos tais como linha, superficie, igualdade. similaridade das figuras etc .... que impossi- bi!it:tvam qualquer recurso e qualquer alusao a manipulaçôes, a transforrnaç6es fisicas dc figuras. Esse ascetiSlllO da linguagem matematica. a que devemos, em ûltima analise, todas as nossas maquillas desde a aurora da era mecânica, teria sido impossîvel sem 0 heroismo 16gico de um Parmênides negando todo 0 mundo do devir c da praxis cm nome da auto-identidade das significaç6es. E a essa ncgaçao do movimento e da atividade que devcmos as rcalizaçôes de Euclidcs. de Galileu. a maquina- ria modcrna e todos os nossos dispositivos c instmmentos. Pois todo 0 nosso conhecimento. todas as palavras quc a princlpio nâo procuraram transformar 0 mundo cstao contidos dentro deJes" (ibid., p.201-21). Dois paradigmas da tcoria antropo/6gica 87 Ricoeur observa que no exemplo mais forte do mundo como praxis. a "pala- vra imperativa", a "efeito" requer a presença de seres simbolizantes em urn contex- to simbolizado, ja que a "compreensao" inclui ao mesmo tempo um projeto e um sistema de va!oraçôes que diferenciam 0 mundo e as aç6es dos ho mens neleY fazer a mesma afirmaçao de outra maneira. Pode-se ver na compreensao que Malinowski tem da linguagem como trabalho e do significado como resposta produzida ao ouvinte a mes ma reduçao do sujeito humano ao objeto manipulado que informa sua técnica etIlografica. Nessa concepçao. 0 Alter é simplesmente um meio para um fim. Vma matéria-prima a sel' trabalhada como qualquer outra. Mais uma vez, porém, camo insiste Ricoeur, 0 resultado de uma observaçao sobre o comportamento de outra pessoa nâo é 0 mesmo tipo de relaç300 como a do deito de uma ferramenta sobre a forma de um objeto; cIe nao é "produzido" como um bem mate rial é produzido (1970. p.203). Nao apenas porque 0 outrc é um ser l intencional como eu. e sim, mais decisivamente, porque a comunicaçao implica uma comunidade) e) conseqüentemente. isso intluencia 0 "efeito" de todas essas concepçôes comuns de homens e coisas que, ordenando essas inter-relaçôes, de- termina a "intluência" especîfica da palavra. A eliminaçao por Malinowski do simbolo e do sistema das praticas culturais, o canibalismo da forma pela funçao, constitui uma epistemologia para a elimina- çao da pr6pria cultura como objeto antropoI6gico prôprio. Sem prcpriedades distintivas por direito nato, a cultura nao tem qualquer condiçao de ser analisada como uma coisa-em-si-mesma. Seu estudo degenera em uni ou outrc dos dois naturalismos vulgares; 0 economicismo do individuo racionalizante (natureza humana); ou 0 ecologismo da vantagem seletiva (natureza externa). Malinowski. é clara, nao pode ser tido como responsavel pela invençao de qualquer das duas problematicas. nem pele desenvolvimento completa de ambas. mas a primeira é definitivamente integrada em sua obra. enquanto a segunda ja ai se prefigu,ra. 0 economicismo ou 0 utilitarismo se desenvolve a partir de sua distinçao entre norma cultural e atitude subjetiva. e da submissao, na sua opiniao, do "ideal"a um interesse pr6prio pragmâtico - que investe 0 segundo como 0 verdadeiro opera- dol' da vida social. 22 ''A palavra. tal camo afirmamos. nao 'faz' nada. no maximo incita à açao ... mas se incita à açao é porque significa 0 que ha para ser feito e porque a exigência significada para outrem é 'entendida' por de e 'scguida' por cie ... A palavra se articula cm frases. verbos e substantivos. objetos, complcmentos. plurais etc. ... e. por causa disso. somos capazes de controlar nossa açao por uma espécie de 'ftasea- mento' de nossos gestos ... 0 significado desse fraseamento nao é uma transformaçao das coisas ou dc n6s mesmos. nao é uma produçao no sentido literaI, mas uma significaçao. e toda significaçao designa vaziamente que trabalho realizara. no sentido em que se realiza um piano. um descjo, um objetivo . é através desse v:Ilio de significaçôes, que designam sem nada fazer. que a palavra conecta e as estruturas agcm" (ibid .• p.204) . ' " ' . ,'JO -- ." %. t 1 · ·.1 .., \ 1 88 CUIIl/ra e razao prdtica Mali nowski podia "ver as cnisi1s COIllO os nativos as viam': contanto que des concordassem cm ver as coisas da sua mancira. Eles teriam que desenvolver uma analise que valorizasse a açâo prât ica sobre a norma cultural - e de novo corn referència à :lçâO --'- 0 afeto subj etivo sobre a forma ostensiva. Pelas noçoes de Malinowski, as regras eram llma coi sa, e as açôcs uma outra (oisa e mais verdadei - ra, senda as primci ras uma si mpl es co nversa cam a "realidade" das ûltimas. merc- ccnda as nonnas menas existência e analise do que 0 comportamento motivado por um auto-Înteresse iluminado. Todavia, 0 ato- as "danças selvagens': as trocas de ornamentos killa que nac podiam ser possuidos-continua senda peculiar nas suas propriedades observaveis. Privil cgi<i-Io sobre a regra em nome do interesse racional requereria uma segunda distinçao: ent re essa aparência externa, forma incongruente, e as atitudes pniticas que as pessoas conferem a ela. Os dados mais verdadei ros da etnografia nào consistern em fatos de ordern cultural, mas na maneira pela quai essa ordem é subjctivamente vivida, a famosa "imponderabili- dade da vida quotidiana': Muito freqüenternente, insiste Malinowski, os antrop6- logos sac envolvidos pel a narrativa das "ficçôes legai s" dos nativos, tais como a solidariedade do da, as regras de exogamia c1ânica, e 0 que 0 valha, que repre- sentam somenle 0 "aspecto intel ectual, manifesta, totalmente convencionalizado da atitude nativa". Mas "0 c6digo da condut a natural, impulsiva, as evasôes, os compromissos e os costumes nâo-legais s6 sao revelados a quern faz 0 trabalho de campo, a quem observa a vida diretamente, registra os fatos, vive nesses abrigos junto ao seu 'material' corl1o par.a compreender nao somente a sua linguagem e as suas afirmaçôes, mas também os motivas ocultos do comportamento, a quase nunca formulada lin ha da conduta espontânea" (Malinowski, 1966 11926]. p.120- 1). A importância desse "c6digo natural, é que, no final, ele prevalece sobre 0 convencional, e a forma cultural se submete à praxis "espontânea': "0 verdadeiro problema nâo é estudar camo a vida huma na se submete às regras - isso simplesmente nâo existe; 0 problema real é saber como as regras se tornaram adaptadas à vida" (ibid., p.127)." :3 Fortes descreve corn agudeza a oposiçao entre nonna "ideal" e pdtica "l'cal" na obra de Malinows- ki, e documenta a sua transposiçâo para um contraste entre forma e sentimento que n:1o deixou qualque r possibilidade de entendimento do parentesco em si mes lllo: "0 que é digno de nota é a cnfase na prâlÎca (a atÎvidadej a comportamcnto; os mûtuos serviços concretos; 0 interesse pr6prio, a ambi ç1io e a vaidacle demonstradas; 0 amor mat erno e a afeÎçao paterna; cm suma, as açôes, sentimentos e pensamentos de indiv(duos cm situaçocs sodais, tal corno diretamcnte obscrvadas pelo ctn6grafo e admiticla$ pc10s atores) vista coma a realidadc da vida social, cm contraposi çao ao ' ideaJ' <l U 3 ' teori a', 3S fonnul açoes simplesmente verbais (Fort es, 1957,1'. 160) ... os fatos das relaçOes e dos agrupamentos sociais sao, em seu esquema, fatos meramente de costume e motivo, amplamentc cquipafados, par exemplo, com :lS crenças magicas, e que emcrgern cm ûltima instância de instintos huma nos universais camo 0 parentesco ou de sent irnentos humanos comuns coma a va idadc e a :llnbiçào. Assim, nao temos cm parte aIgUilla uma anâlisc artîculacla da organizaçao local, do paren- tcsco c d3 cstrutur3 po!itîca trobriandesa" (p.164) . Doi$ paradigmas da ttoria antropo16gicn 89 Mas ao separar dessa forma a ordem cultural do sujeito humano, assim como a fi cçâo é separada da vida real, Malinowski introduz um tipo de esquizofrenia ontol6gica na etnologia - que é °pensamento normal da ciência social da nossa época. A vida social humana é tomada como dividida contra si mesma, composta de dois tipos difercntes de objeto que se mantêm em relaçôes de contraposiçao e competiçao. Por um lado, ha as regras e formas convencionais que equivalem à "cultura" da situaçao. S6 elas têm direito a esse status, da mesma forma que s6 elas sao descritas l'or propriedades especificamente culturais: descendência matrili - near, exogamia dânica, rituais mortuârios, pagamentos de valores aos afins, pro- duçâo de inhame, parentesco classificat6rio. Em princîpio, elas também poderiam ser compreendidas nesse sentido, ou seja. por uma 16gica, ao mesmo tempo, de significaçao e açao, desdobrada a partir dos atributos simb6licos, da rnesma forma que a valorizaçâo de bens e a divisâo do trabalho, por exemplo, poderiam ser relacionadas às classificaçôes de parentesco ou às prâticas matrimoniais. Mas a identificaçâo dos atributos culturais como a "norma" ou 0 <Cideal" vis-d-vÎs a vida real deve condenar esse esforço como metafisico. A cultura, ao contrario, se subor- dîna a uma outra 16gica - que, como nao preserva as propri edades simb6licas, nâo pode fazer uma avaliaçao delas. 24 Por outro lado, em opos}çâo à nonna da cultura esta 0 "comportamento real" da pessoa. E isso, enquanto especificamente humano, deve ser descri to e compreendido em termos retirados de outro universo de discurso: necessidades, impuisos, motivos, desejo"s, sentimentos e emoçôes das pessoas. Neste ponto, uma espécie de inversâo bâsica dos prindpios durkheimia- nos, muito embora de acordo corn a premissa de que "0 homem é duplo", Mali- nowski desloca a dinâmica social para 0 nivel natural, procurando representa- la por forças que emanam do pr6prio organismo. remos de lidar com a luta do suj eito individual para alcançar seus pr6prios fins, em face de convençôes cul tu- rais coercitivas. Uma anâlise significativa cede port anto lugar a uma racionalidade manipulativa, à analise formaI de relaçôes meios-fins baseadas em uma teleologia das satisfaçôes humanas. Deste outro ponto de vista, a cultura aparece simples- mente coma um instrumento ou urn ambiente da dinâmica constitutiva do pro- p6sita humano. É um instrumento no sentido de um conjunto de meios à dispo- siçao do sujeito, através do quaI ele alcança se us fins autofixados. E é um ambiente, nao somente como um conjunto de coerçôes externas ao individuo, mas coma algo sobre 0 quaI de opera suas razôes e, ao agir assim, ordena as propriedades 24 Sorokin caractcriza corrctamente esse procedimento COolO "3 falacia da inadequaçâo - 0 que é dtadocom aprovaçao par Parsons t assim dcscrito: "Consiste cm cx:plic3r um conjunto de f3tos corn propriedadcs que 0 diferenciam d aramente de outras, cm termos de um csquema apli c:i.vel da mesma forma aos outros" (Parsons, 1968 r 19371 1 :354). A i11esma fahid3 se aplica tante ao ccologismo quanto ao economicismo (utilitarismo), camo "cremos adiantc. 1 1 '--- 1. 1 . , 1 • 1 1 . 13 I l i 90 Cu/wra e razao prdtica clesse meio. 25 Concebida des sa forma, a interaçao entre "vida" e "cultura" é sariamente desigual: uma relaçao de sujeito com objeto, ativo corn passivo, cons- tituinte com constitufdo. Comportando-se corn uma mente singular em direçao aos seus melhores interesses pr6prios, as pessoas formulam e reformulam adequa- dam ente sua ordem cultural (cf. Firth, 1963). Mas a eficacia da cultura como uma ordem significativa é ao mesmo tempo suspensa. A cultura é reduzida a um epifenômeno de "processos de tomada de decisao" intencionais (como dizem). Essa expressao familiar, é clare, naO é de Malinowski, mas apresenta uma conexao aprepriada corn 0 saber atual da ciência social. Esse utilitarismo - a adoçao axiomatica da sujeito que calcula, ordenando 0 mundo social racionalmente de acordo corn desejos igualmente axiornaticos - é uma consciência instintiva que n6s temos dos outros e de n6s mesmos. Muitos daque- les que podiam criticar 0 funcionalismo de Malinowski estao, nao obstante, satis- feitos corn sua contraposiçao essencial entre interesses pessoais e ordem social (p. ex., ]arvie, 1967, p.77; Kuper, 1973, p.49; ou mesmo Wolf, 1964). É verdade que Malinowski foi 0 primeiro antrop610go a negar a generalidade de um homem econômico (1921; 1950 [1922J). Mas isso nao se deu exatamente para conferir ao mesmo conceito um alcance maior? "Nas pâginas dos Argonautas e em seus sucessores", escreveu Leach, "0 'selvagem' deixa de ser uma marionete ... Ete é um ser huma no vivo que opera um sistema bizarro da organizaçao social através do exercicio de escolhas naturais entre meios alternativos para fins alternativos" (1957, p.12?). Do mesmo modo, Bateson considerou que 0 método funcionalista de Malinowski "é provavelmente acertado e, pela sua investigaçao cuidadosa, pode oferecer um sistema coerente de antropoIogia aliado a sistemas de economia baseados no 'homem que calcula'" (1958, p.2?). Pois, como 0 pr6prio Malinowski relatou, "sempre que 0 nativo pode fugir à sua obrigaçao sem perda de prestigio, ou sem provâvel perda de lucfo, ele 0 faz, exatamente como faria um homem de neg6cios civilizado" ( 1966 [19261, p.30). A perspectiva em questâo continua sen- do 0 economicismo nativo do mercado transposto aqui da anâlise da sociedade burguesa para a explicaçao da sociedade humana. 0 lugar analitico assim conce- dido à sociedade foi brilhantemente descrito por Dumont: 2S "Os problemas colocados pelas necessidades nutritivas, reprodutivas e higiênicas do homem têm de ser resolvidos. E sao resolvidos pela construçâo de um nova meio ambiente, secundârio ou cial. Esse meio ambiente, que é nada mais nada menos que a pr6pria cultura, tem de ser permanente- mente reproduzido, mantido e controlado" (Malinowski, 1960 [1944], p.37; grifo meu). Indicamos também que a cultura, coma trabalho manual do homem e camo meio através do quai ele atinge os seus fins, um mdo que lhe permite viver, estahelecer um padrao de segurança, conforta e prosperida· de; llm meio que lhe da poder e Ihc permite criar bens e valares que vâa além dos seus dotes animais,. orgânicos - essa cultura, em tudo isso e por tudo isso, deve ser entendida camo Ilm meio para !/fil fim, ou seja, instrumental ou fundonalmente" (ibid., p.67-8; grifo meu). Dois paradiglllas da tcoria autropo/6gica 9 1 Na sociedadc modern a .. . 0 Ser Humano é a homem "clementar': indivislvel, sob a forma de ser biol6gico, ao mesmo tempo em que sujeito pensante. Cada homem particular encarna, em um certo sentido, toda a Humanidade. É a medida de todas as coisas, em um sentido pleno e totalmente novo. 0 reino dos fins coincide corn os fins Icgitimos de cada homem, e assim os val ores se invertem. 0 que ainda se denomina "sociedade" é 0 meio, a vida de cada um é 0 fim. Ontologicamente, a sociedade nao existe, nao é mais que um dado irredutivel ao qual se pede som ente que nao contrarie as exigências de liberdade e de igualdade. Naturalmente, 0 que foi dito acima é uma descriçao de valores, uma visao da mente ... Uma socicdade tal como 0 individualis- mo a conecbe nunca existiu em parte alguma pela razâo ja apresentada, ou seja, a de que 0 individuo vive de idéias sociais. [Dumont, 1970, p.9-10; para outras importan- tes discuss6es do utilitarismo (economicismo, individualismo), ver Dumont, 1965; Macpherson, 1962; Parsons, 1968 [1937]; Polanyi, 1944.] A separaçao economicista da estrutura normativa da açao pragmatica, se nao bane completa mente a cultura do alcance antropol6gico, a reduz ao status de uma preocupaçao secundaria. Apenas pressagiados par Malinowski, esses efeitos apa- recem muito mais claramente em uma "antropologia ecol6gica" que homenageia suas fontes intelectuais intitulando-se "funcionalista" ou "neofuncîonalista" (cf. . Collins e Vayda, 1969). Entretanto, como afirmou Marx corn razao, a anatomia do homem é a chave para a anatomia do macaco. 0 sistema econômico mais desen- volvido faz uma diferenciaçao explicita de categorias que permanecem combina- das, ambîguas ou som ente virtuais no sistema econômico menos desenvolvido. Do mesmo modo, as împlicaçoes prefiguradas em uma determinada perspectiva intelectual tornam-se explicitas apenas em versoes mais evoluidas dela. 0 novo funcionalismo ecol6gico demonstra que 0 efeito da dissoluçao de Malinowski do conteûdo cultural na funçao biol6gica, particularmente do simb6lico no instru- mental, é uma soluçao final para 0 problema cultural. Ele deixa explicito que a cultura nao permite qualquer compreensao especial, isto é, distinta de uma expli- caçao biol6gica. Nesse caso, a cultura desaparece. Como no funcionalÎsmo de Malinowski, esse processo depende da apropria- çao te6rica das qualidades culturais como efeitos orgânicos, interpretaçao que nao somente dissolve as especificaçôes culturais como também lhes permite reapare- cer de forma mais cientîfica (isto é, quantificavel). Explica Rappaport (/s questaes scjant colocadas em termos de fenômenos culturais, elas siio respon- didas em fermos dos efcitos de UIII comportamcnto illformado culturalmentc sobre siste- mas biol6gicos: organismos, populaçoes e ecossÎstemas. A caracteristica distintiva da antropologia eco16gica nao é simples mente a de levar cm consideraçao os fatores ambientais nas suas tentativas de elucidar os fenômenos culturais, mas a de atribuir significado biol6gico aos termos-chaves - adaptaçao, homeostase, funcionamento adequado, sobrevivência - das suas formulaçoes. [1971, p.243.] : - . f. • 1 1 1 1 1 1 \ 92 Crlliura e razilo prtitica . A prâtica te6rica poderia sel' chamada de "fetichismo ecoI6gico". Nada do que e .cultural é 0 parece; tudo é mistificado como ml1 fato natural que possui a vlrtude ostenslva de ser bâsico e exato, embora essencialmente abst rato. 0 casa- "um intercâmbio de materiais genéticos", assim coma a caça é um mtercambiO de encrgia corn 0 meio ambiente", milho, feij âo e ab6bora sào uma "dicta nao-equilibrada': a sociedade uma "populaçao de organismos huma- nos': e 0 canibalismo uma {<atividade de subsistência". ("Ao examinar 0 canibalis- m.o> operamos a partir da premissa de que todas as atividades que proporcionam alImentos para os membros do grupo, ali mentos que eles realmente consornem sao 'atividades de subsistência' que podern, pois, sel' comparadas e/ou tomadas em conjunto como atividades constÏlutivas de uro repcrt6rio com· portamental global> chamado de ' padrao de obtençâo de alimentos'" - Dorns- trcich e Moeren, 1974, p.3). Dougl.3S (1966) chamou ao mesmo ti po de pensamen- to, aplicado à descoberta de valor'es sanitarios cm ta bus de dieta, de "materialîsl11o Trata-se somente uma versao antropol6gica ou ecol6gica particular da troca do conteûdo signi Qcativo pela verdadc funcional que Sartre descreveu coma vulgar. 26 Esse mesquin ho comércio metafisico de pormenores etnograficos nao apresentaria interesse algum, nâo fosse por sua intençao confessa de apoderar- se do conceito de cultura. Malinowski opunha "cultura" a cornportarnento; para a ecologia ela é "com- Pode tratar-se de comportamento aprendido, mas nem pOl' isso digno de tratamento diferente do "comportarpento espedfico de espécie" de qual- outro de .organismos. Pensemos nele simplesmente como um "reper- 16no cultural (Collms e Vayda, 1969, p.155). Compreendido isso, 0 fe nômeno 26 ao I,?nge de estar envolvido, foi ele quem formulou as crfticas e explicaçôes maiS ,desse fehchlSIllO: A aparente estupidez de fundir todas as multiplas relaçôes das pessoas cm uma rel açao de utilidade, essa abstraçao aparcntemente metaffsica resulta do fa to de que, na socledade burgucsa, todas as rcl açôes sao subordinadas na prat'ÎCa a uma relaçaa monctario- Essa tcaria veio à tona corn Hobbes e Locke ... Em Holbach, toda a atividade de Illutua, isto é, 0 ato de falar, 0 amor etc., é descrila coma uma relaçao de utthdade e utl,hzaçao. Dai, as rclaçôes reais que sac aqui pressupostas - 0 ato de falar, a alllor- m,amfcstaçôes definidas qualidades definidas dos indivlduos. Assim, essas rclaçôes per- . m s,lgm!Ïcad? que lhes é peCIIIUlr para se tornarem a expressao e a ma nifestaçao de uma terceira Iclaçao mtroduzlda em seu lugar, a relaçiio de IIlilidnde Olllllilizaçiio ... Tudo isso realmente se aplica ao Para ele, lIIt/a rclaçao é valida por si mesma - a relaçao de exploraçàoi Iodas as demals rc!açôes s6 têm validade para cie na medida cm que podcm ser incluidas sob aquela (mica rdaçao, e mesmo onde de encontra rclaçôes que niio podelll ser diretamente subordinadas à rel açao ao menos as subordina a d a na imaginaçao. A expressào material desse uso é 0 a representaçao do valor de Iodas as coisas, pcssoa.s e relaçôes sodais. Conseqüentemente, cm um relance, que a catcgoria de 'utilizaçao' é subtraida das relaçoes reais que cu tenho com OUi ras (mas de forma alguma como renexo ou simples vontade) e enUio essas rc!açôes passam a sel' a. da categoria quc delas foi abst raidaj urn método completamcnte metafisico de procedlmcnto (Marx e Engels, 1965,1'.460-1), Dois parndigmCJs da leorin 93 como tal nao deve distinguir 0 homem de quai squer outras espécies, nem a antropologia da biologia. Como "comportamento" - ou mcsmo mais abslrata- mente, "movimentos do corpo" - a cultura pode ser estudada, do l11esmo modo, como as açôes de qualquer animal, isto é, como boas para a espécic ou mas para cla, sob as condiçôes seletivas naturalmente constituidas: A atençao a idéias, valores ou eoneeitos culturais nao pode, cOlltudo, ser cansidcrada uma sine qua 1/011 da analise de eeossistemas que incluam 0 homem. Ao contrario, pode-se prcferir dar ênfase ao comportalllCllto ftsico real OH aos 1II0villletJtos do corpo através dos qllnis 0 IlOmem efetua diretamellte alteraçoes 110 seu IIU'Î O illllbiente ... Na realidade, uma abordagem posslvel sugerida par Simpson ... entre outras, é oillar n wltura hunltwa sÎlIlplesmente como 0 comportamento ou parte do C()/llportflnlCl!to de lima espécie particular de pril11atas. Encarando·a desse modo, estolJllOS eapacitados para estuda-Ia e interpreta-la da mesma forma que estudamos e interpretamos a comportamento de qualquer outra espécie, como, por exemplo, com respeito nao samente à sua interaçao corn variâveis ambientais, mas também com 0 efeito dessa interaçao sobre a seleçao natura!. 0 [ato de 0 comportamento humano ser complexo, variado, variavel e, cm uma medida eonsideravel, espedfico de uma populaçâo, pode fazer da observaçào e da deseriçao tarefas formidaveis, mas isso nao signifiea que prindpios basieamente diferentes devam ser usados no estudo do eompartamento humano e no estudo do comportamento de outras espéeies animais. [Vayda. 1965, p.4; grifo meu, J o funcionali smo ecol6gico coloca a cultura em um rÎsco du plo. É ameaçada de liquidaçao porque nâo pode ser especificada como tal por motivos naturais, e porque a consideraçâo da sua qualidade especifica exigiria a invocaçao de uma razâo de outra natureza. A crise torna-se entao ontol6gica cm suas proporçôes. A cultura é trocada pelo "comportamento". Suas qualidades concretas sao apenas a aparência de "movimentos do corpo", cujo saber é seu efeito biol 6gico. A ontolo- gia recapitula assim uma metodologia, E a antropologia perde seu objeto. 'Tendo sido ignoradas as propriedades da cuttura na pratica da sua explicaçao, presume- se que essas propriedades nâo tenham qualquer autonomia ou valor como tal- o que é uma racionalizaçao do fato de que a explicaçao nao pode responder pOl' elas: Pareee que uma cîêneia unifieada da eeologia telll eontr ibuiçôes definitivas a fa1.er no sentido da realizaçao das melas ant ropol6gicas, nao requerendo qualquer saerifjeio apreei<\.vel de intcresses antropol6gieos tradieionais, Pode, eontudo rcquerer um sa- erifieio UIll poueo difcrentc, isto é, 0 da noçào da autonomia de lima ciência da eultura (Varda e Rappaport.1967, p.497), Esse sacrificio da autonomia da cultura (e da ciência cultural) seria à conse- qüência da sua subordinaçao denlro de um sistcma maior de coerçào natural. Na r; <, r -" -' ct r <: ( ·17 , • i - { "' / = !- 1 1 , 1 4 0 , -I I J ., - > ; , 94 Cullllra e raziio pra/ica medida em que esta ûltima é concebida como uma ordem cibernética, como é comum nos estudos ecol6gicos, senda a cultura inclufda em uma "ciência unifica- da", isso também requereria 0 deslocamento da propriedade da "mente" da huma- nidade para 0 ecossistema. Como conjunto de relaçôes termodinâmicas auto-re- gulado ras, que respondem às "informaçôes" ou a alteraçôes significativas dos se us componentes, 0 ecossistema camo um todo é hoje 0 local de uma "atividade mental" que deve, logicamente (no interesse da autor idade exclusiva do Behe- math)," ser negada cm qualquer uma das suas partes. Bateson expli ca esses siste- mas: "podemos afirmar que qua/quer conjunto de acontecimentos e objetos em andamento, que possua a complexidade apropriada de circuitos causais e as çôes apropriadas de energia, exibira.caracteristicas mentais. Ele comparara, isto é, respondera a diferenças ... <Processara informaçôes' e sera, inevitavelmente, auto- corretivo, quer no sentido de 6timos homeostaticos, quer no sentido da maximi - zaçao de certas variaveis" (1972,· p.315). Evidentemente, se qualquer um dos C0111- ponentes desse sistema auto-regulat6rio fosse capaz de impor seu pr6prio projeto à totalidade, 0 ultimo deles se toma ria uma mera cadeia de conseqüências, nado apenas negativamente pelos limites de funcionamento possîvel. (Donde, para preservar a sistematicidade, a mente s6 poder ser uma propriedade do todo: "em nenhum sistema que mostre caracterfsticas mentais, qualquer uma das partes pode ter um controle unilateral sobre 0 todo. Em outras palavras, as caracteristicas mentais do sÎstema siïo imanentes, nao a esta ou àquela parte, mas ao sistema coma um todo" [ibid., p.316).) , Dentro do ecossistema, a trama interativa, ou 0 subsistema que envolve 0 homcm e seus arredores Îmediatos, seria caracterizada por relaçôes de retroali- mentaçao (feedback) reciprocas e iguais às existentes entre quaisquer outros ele- mentos do circuito, apesar de a transaçao homem-natureza ser mediada pela cultura. A cultura é aqui, simplesmente, a automediaçao da natureza. É somente 0 modo humano de resposta, e portanto sistemat icamcnte governado, na medida em que 0 homem é mais que uma variavel funcional do todo - um componente reativo em mutua determinaçao corn variaveis ambientais, elas mesmas tao suj ei- tas ao seu objeto quanto vice-versa. Um dos exemplos favoritos de Bateson é a interaçao do homem corn a arvore no corte da madeira: Consideremos um homem que corta uma arvore cam um machado. Cada golpe do machado é modificado ou corrigido, de acordo corn a forma do corte da ârvore provocada pela golpe anterior. 0 processo aulocorrelivo Osto é, mental) é realizado par um sistcma total, arvore-olhos-cérebro-musculos-ùlachado-golpe-arvorc; e é esse sistema total que tem as caracterist icas da mente Îmanente. IIbid. , p_371.J • Behemoth - ani mal descrito no Velho Testamento, provavelmente 0 hipop6tamoi cm sua acepçào correllte, a palavra significa algo opressivo ou de dimensües e poder monstruosos. (N.T.) ._- Dois paradigmas da teoria antropol6gica 95 o problema é que os homens nllI1Ca "cortam madcira" simplesmente dessa forma . Eles cortam toros para as canoas, esculpem as figuras de deuses cm clavas gllcrn?iras, ou mesrno cortam madeira para lenha, mas sempre estabelecem re1a- çôes corn a madeira de um modo especifico, uma forma cultural, em tcrmos de um projeto significativo cuja final id ade governa os termos da interaçao redproca ent re 0 homem e arvore. Se 0 objetivo é produzir uma canoa, a resposta a uma mudança na arvore é uma; se a meta é a obtençao de lenha, é outra. A resposta ao ultimo golpe depende de um obj ctivo que nao é dado ao processo coma um processo natural; esse golpe e todos os golpes que 0 antecedem, desde 0 inicial, dependem da intençao significativa. A interaçao determinada de arvore-olhos-cé- rehro-etc. foi estipulada par uma ordem simb6lica; é um exemplo paradigmatico da natureza subordinada a serviço da cultura. A alternativa cibernética prevista pela teoria dos ecossistemas nao passa de um fetichi smo ecol6gico mais apropria- do ao seu pr6prio contexto cultural, do capitalismo industrial e burocratico, cujo projeto consiste igualmente em reduzir os homens e as coisas às suas especifica- d · d . 27 çôes fUllcionais como elementos de um processo pro utlVO auto etermmante. G.P. Murdock o fim do "terror" sera a morte da cultura nobre .. Em George Peter Murdock, a antropologia pode jâ ter encontrado â seu Robespierre. Murdock aproveitou a ocasiao aparentemente apropriada da Huxley Memorial Lecture de 1971 para anunciar a morte da cultura. t interessante observar como ele finalmente chegou a esse ponto de autoconsciência metodol6gica. 0 tema central do seu Social Stru.cture (1949);3. repetia em seus pontos essenciais 0 entendimento morganiano das relaç6es entre circunstância pratica, açao utilitaria e ordem cultural. Murdock pode ter sida 0 primeiro a divergir de Morgan cm questôes de metodologia e detalhes de interpretaçao, mas sua compreensâo da estrutura social deriva em hnha direta da teoria da praxis. Para Murdock, a formaçao de "grupos de paren- 27 "De fato, no processo de produçao do capital ... 0 trabal ho uma totalidade ." cujas partes componentcs individuais sao estranhas umas às outr<lS, de modo que 0 global como uma totalidade 11110 é 0 traball/O do trabalhador individual, mas 0 trabalho de dlfcrentes trabalhadores que Cslào juntos s6 na medida em que esUo agrupados là forçai e naD se reûnem Ivoluntariamente] uns corn os outras. A combinaçào desse trabalho <lpucce exatamente coma subservicnte e controlada l'or uma vontade e par uma inteJigência estranhas - cstando a sua IIIr idade dCll1iimaçao cm outra parte _ assim camo a sua unidade material aparece subordi nada à rmidade objetiva da maquinaria, a capital fIXO, que, COffiO 1I1O,1$l ro allimado, objeüfica a idéia cicntlfica e é, de fato, 0 coordenador; nll.o se rclaciona de mancira alguma corn 0 trabal hador individual camo seu instrumento; ao contra- rio. ex.iste camo um sin al de pontuaçào de um.indi viduo animado, coma seu acess6rio isolado vivo" (Marx, 197311857-8], 1'.470). 1( ..... ,a,. çt 0 " h 2 t AQ .. ,. .. " c< "" "" ..- .• '. , ..> t '\- .( <. (j t ..... r . l 1 1 1 1· 1 1 1 96 CI/llr/ ra c razao pnirica tesco consangüincos" - e pOl" conscqüência, a c1assificaçao de pa rentes - repre- senta 0 reconhecimento de arranjos baseados cm relacionamentos determinados pelas praticas residcnciais, que pOl sua vez respondem a exigências praticas. A pratica residencial é portanto a chave dinâmica. A deter minaçào da composiçao rcal dos agrupamcntos 50ciais descmpenha, no esquema de Murdock, um papei anâlogo ao desempenhado pelas uniôes exogâ micas nos primeiros estâgios de Morgan: 0 inst rumenta pelo quai a LO mpulsào obj etiva ou natural é reificada na forma cultural. As relaçôes de parentesco sac constituidas por uma consciência reflexiva da composiçào do grupo en tao estabelecida, Elas sào as exprcssôes arti- culadas de arranjos residenciais, arranjos res idenciai s esses que, por sua vez, refle- rem as "condiçôes fundamentais de vida": As condiçôes de existência de qualqucr socicdadc estao sempre passando por mudall - ças - às vezes nipidas, out ras vezes lentas _ em conseqüência de acontecimentos naturais como fomes e epidemias, de acontecimentos sociais como guerras e revolu- çoes, de influências bi o16gicas como uma densidade populacional em crescimento, de adaptaçoes internas coma invcnçocs lecnol6gicas, e de conlatos externos que podern esti mular empréstimos culturais, MuÎ tas mudanças nas condiçëies fundamentais de vida podem exercer pressao na direçao da modificaçao da regra ex.istente de residên- ciao Tao diversos sao os fatares causais na mudança social, e tao poucas as alternativas nas regras de residência, que, praticamente, qualquer sociedade, independente do nive! de cult ura das for mas existentes de organizaçao social, pode encontrar, prova- vclmente, concatenaçôes particub res de circunstâncias que favorecerao 0 desenvolvi- mento de qualquer uma das regras alternativas de res idência, [Murdock, 1949, p.203.] Assim, por exemplo: A residência patrilocal parccè scr desencadeada por alguma mudança na cultura das condiçëies de vida social que, significativamente, aumenta 0 status, a importância e a influência dos ho mens em rdaçao ao sexo oposta, Qualquer modificaçao na econo- mia basica é particularmente influentc, ]-lois por meio dela as atividades masculi nas na divisao sexual do trabalho chcgam a produzi r os principais mei os de subsistência. {Ibid. , p. 206] Essas prât icas residenciais geram alinhamentos especî fi cos de parentes,28 cujo "reconhecimento" - recon hecÎmcnlo este que pode sel' negado - estabelece grupos de parentesco tais como as linhagens e as costumci ras c1assificaçoes de pessoas: 28 Murdock considera 0 "parcntesco" Uln (;lt O gClle:l16gico- nalural, exatal11 ente nos termos expostos c crit icados por Schneider ($cbneid,'[', 1968; 1972), Dois paradigmQs da {caria mltrop%gica 97 A rcsidência unilocal nâ.o produz diretamentc li nhagens ou parentes, Simplesmente favorece 0 descnvolvi mento de famil ias extensas e demes exogâmicas, corn 0 caracLc- ristico alinhamento nao-linear de parentes, podendo um desses levar ao rcconheci - mento de grupos de parentesco nao-Iocalizados. 0 que a residência mat ri local ou patrilocal realiza é reunir, cm uma proximidade espacial, gr upos de parentes do mesmo sexo unilinearmente relacionados, junto corn as suas csposas, [Ibid" p, 21O,] Murdock resume toda a discussâo em um relato do desenvolvimento de um sistema patrilocal -patrilinear, a partir de uma organizaçao dual de dis matrilinea- res. 0 exemplo é capital sob diversos ângulos, dos quais nâo é 0 menaI' a de que Mur'dock é levado a cunhar sua cxplicaçào coma um mito de origem. Ao mesmo t empo, 0 pr6prio método de Morgan desponta claramente, nâo SOmeI)te em termos gerais, mas através dos detalhes do crescirncnto da patrilincaridade a partir da matrilinearidade (embora Murdock, evidentemente, nao afi rme que essa tenha sido uma seqüência universal da evoluçao). Como diz 0 relato, algurn fator aparece no conj unto matrilinear que "confere esta vantagem à residência pat rilo- cal", coma a introduçao do gado (0 pr6prio "fator" de Morgan), escravos ou rnoedas de concha, acompanhado pela noçao de que 0 prestîgio é fort alecido pela poliginia (ibid" p,217). Agora, todos os homens, "ao adqui:':rem Tiquezas",29 sâo capazes, ao pagarem 0 preço da noiva, de persuadi r os pais das noivas a permiti - rem que suas filhas se mudem para a casa deles. E os ho mens começam a deixar aIgumas de suas propriedades para os filhos, em detrimento dos filhos da irma, coma no sistema matrilinear. Assim, "pouco a pouce': os laços corn a "pa- rentela patrilinear" sâe reforçados às expensas da "parentela matrilinear': até que as pesseas final mente descubram que estavam usando a patrilinearidade sem ter consciência disso: Pouco antes de a populaçao da aldeia se dar conta de que algo particula'rmcnte signi fi cativo tin ha acontecido, ela descobriu que as casas de um lado da rua eslllo agora por homens relacionados patri li nearmente, corn as suas mulhcres c filhos, e que um grupo semelhante vive do outro b do da rua. A residência patrilocal fo i firmemente estabelecida, a herança pat rilinear é accita, e os antigos matrietas foram transformados cm incipientes patriclas. A situaçào esta madura para 0 desen- volvi mento da descendência patrilincar, c isso pode ocorrer mui[O rapidamente, casa exislam sociedades patrilineares nas redondezas para servirem como modelos, [Ibid" p.216.] 29 Murdock, camo Morgan, toma "riqueza" corna tlma catcgoria natural, praticamente do mt!s mo modo que aceita "parentcsco" ou "parcntela patrilinear" como catcgori as gc ncaJ6gicas, :t (. .. ;,., 98 Cu/lura c razao prtilica A posiçao basica de Murdock pode sel' ilustrada de outra forma, através de um confronta c1assico com Leach, no quai a pr6pria concepçao de Murdock da rela- çâo entre a ordcm vivida e a ordem pensada emerge claramente do equfvoco. De cefto modo, 0 errc de MUI"dock nao chegou a sê-Io, pois reconheceu no fato de Leach privil egiaI' a escolha individual sobre a regra legal um desvio do paradigma l cstrutural -funcional semelhante à sua pr6pria prâtica.:W Com relaçâo à aldeia sinhalesa de Pul Eliya. Leach disse que "as estruturas sociais sao algumas vezes JI melhor obscrvadas coma 0 resultado estatistico de multiplas escolhas individuais do que como um reflexo direto de regras legais" (1960, p. 124). Para Murdock, f entao, foi apenas l6gico concordar corn Leach, invertendo a frase de modo a dizer que as regras legais sac melhor observadas coma 0 resultado de uma tendência estatistica das escolhas individu ais (Murdock, 1960, p.9). E isso era 0 que de vinha ! dizendo pelo menos desde 1949: l E em 197 1 a conclusao l6gica evidenciou-se para ele. Naquele ano, perante a reuniao dos antrop6logos .da Grâ-Bretanha e l rlanda, evento cuja insignificância te6rica s6 pode ser equiparada à sua solenidade, Murdock renunciou à sua adesao _.J...,..... aos conceitos de "cultura" e "sistema social". Esses conceitos, disse ele, nao passam I de "abst raçôcs conceit uais ilus6rias" dos "fenômenos reais" de indivîduos que ÎJ interagem uns corn os outros e corn 0 seu meio ambiente em busca dos seus ) 1 pr6prios e melhores Înteresses. Finalmente, Murdock se conscientizou da teoria em sua pratica. Essa nova concepçao da cultura nao era mais que uma "abstraçao .. conceitual il us6ria" do método que ele tinha utilizado durante tanto tempo: l' , 1 {b'1l (ji....i""J 1 1 Parece-mc agora desconcertantemente 6bvio que a cultura, 0 sistema social e todos os 1,) YI h conceitos desse tipe, tais cole.riva, espirito de grupo e organlsmo social, seJam abstraçôes conceltualS rl us6nas l11fendas da observa- çâo dos "fen6menos reais" que sao os individuos interagindo uns corn os outros e . com 0 seu meio ambiente natural. As circunstâncias da sua interaçâo levam quase sempre a similaridades no oornportamento de individuos diferentes, que tendemos a reificar sob 0 nome de cultura, e fazem corn que os indivîcJuos se relacionem uns corn os outros de manei ras rcpeti ti vas, que telldemos a reificar coma estruturas ou siste* mas. Na realidade, cultura e sistema social sao meros epifenômenos - produtos dcrivados da interaçâo social de pluralidades de individuos. [Murdock. 1972, p.19. } 30 Nao obsl antc Leach tenha sido muito influenciado pelas técnicas estruturalistas francesas. ainda que trcinado nas tradiçôes de Radcliffe-Brown, ele é capaz de uma di scordância malinowskiana corn ambos. espccilicalllcnte qu:mto 3 interposiçao de interesses prat icos entre ci rcunstância e ordem social. 1550 é cxplicitado em Pul Efi)'a. a que se rcfcre 0 exemplo acima, mas é também 0 casa cm Sistemas po/it;cos dos plana/tos de Burina, na medida em que ele entende a imposiçao de um ou out ra c6digo alternalivo (gumsa/gumb.o) coma umOl escalha ditada pela vOlntagem polftica. Dai. a necessi- dade te6rica de Si.! assumir uma propcnsao natural para compctir par prcstigio, difcrcntc apenas no conteudo da prcmissa economu:mte da economia cblssica, e para conferir-lhe 0 pOlpel de uma força motara geral nos assuntos humanos (1954, p. l O). Dois parndigmas da teoria alltropol6gica 99 \ ..... v 2i\ 1 r " 1 , , 1 .' , ., ....., 1"" •• "-- • .' Mas nao se deve deduzir que essa der ivaçao da ontologia a partir da metodo* logia represen te uma exceçao - ao men os para as ciéncias sociais - da nossa tese geral de que 0 conceito nao procede da prat ica_ 0 status empfrico da proposiçao segundo a quaI a cultura é 0 "epifenômeno" de uma outra rea!idade é em si mesmo UIua i1usao. a que esta\'a presente ao longo de todo 0 método, e que assoma à superfic ie aqui como a verdadei ra font e da proposiçao, é a sociedade burguesa. Por consegui nte, Murdock simplesmente produz para a antropologia 0 mesmo tipo de reduçao solipsfstica que Max \.\leber tentou para a sociologia, com a mesma suspensao do coletivo ou do objetivizado em favor de intenç6es indivi- duais. ara, consideremos a noçao que Murdock colocaria posteriormente no lugar da chamada cultura, ou seja, "a abordagem da tOIllada de decis6es para 0 estudo dos fenômenos sociais" de Frederik Barth, uma abordagem que "focaliza os acontecimentos da vida social em Jugar de seus aspectos ffsicos ou estatisticos, e vé 0 comportamento social do ponto de vista das decisôes tomadas por indivf- duos na 'alocaçao de tempo e recursos' dentre as alternativas disponfveis" (ibid., p.22-3). A anatomia do homem e do macaco: 0 ultimo paradigma de Murdock é uma for ma evolufda daquele contido no funcionalis mo de Malinowski - ai nda que 0 cruzamento das li nhas filogenéticas seja aqui complexo, uma vez que, como se refere Kuper ao modelo de Barth, "A visao de Radcliffe*Brown da estrutura social como uma rede de relacionamentos didaticos reais tornou-se, ironicamen- .te, a salvaçâo do homem manipulativo de Malinowski" (I973, p.230). Mas 0 <C homem manipulativo" revela a ascendência comum de t?das essas teorias utilitâ- rias. A idéia geral da vida social aqui expressa é 0 comportamento particular das partes no mercado. Toda a cultura é entendida como 0 efeito organizado da economia individual. A Cultura é 0 Neg6cio na escala da Sociedade. 0 conceito , l ' tJl r - f ,f;- ':- , de cultura de Murdock nao veio da experiência ant ropol6gica: 0 conceito antro- pol6gico ja era uma experiéncia cultural. 1tt-" " t E mais, a condusao a part ir da "exper iência" de que a cultura nao existe é uma \-Z., '- lusao dupla, ja que toma como modelo de toda a vida social nao a realidade da lf l,..' · 1 :< ociedade burguesa, mas a autoconcepçao dessa sociedade. Ac!-cdita na tlda conspirando portanto para a \ . gue é 0 socializado da atividade pratica, ignorando a . S& (' f onstituiçao simb6lica da pratica.' A ciência social eleva a uma declara- . t ao de princîpio té6riê"O-ë que a il cultura é assim ameaçada corn um negligenciamento na antropologia 1 [que s6 se equipara à consciència dcla na· sociedade. J ' a fato de que, na li nha da teor ia da praxis iniciada por Julian Steward, esse negligenciamento tenha levado a algum arrependimento, ja pode servir como consolo. - _. 1 1 1 100 Cufll/ra e razao pralica Julian Steward A perspecliva fundamentaJ de Steward sobre a "ecologia cultural" é, cm tcrmas gcrais. a mcsma da problemâtica desculturada de Morgan e, no detalhamento do seu artigo paradigmatico sobre os bandos patrilineares ( 1936), corresponde exa- tamente à idéia de estrutura social de Murdock. Portanto, s6 valeriaa pena expô-Ia aqui para apresentar 0 contexto paradoxal no quai Steward, e mais tarde Murphy [1970J, colocam sua ecologia cultural - como oposiçao à bio16gica. 0 paradoxo é instrutivo. Scu esclarecimento mostrara como a mistificaçâo da 16gica cultural \ da açao econômica te da forma cultural. i Em seu preâmbulo à principal quesUio eco16gica sobre os "bandas primiti- vos", Stéward, de uma maneira o'u de outra, arrola as mais importantes condiç6es técnicas e sociais dos caçadores e coletores - referindo aigu mas à vantagem econômica, outras à natureza humana, e outras simplesmente ao fato empirico. A upropricdade" territorial se entende corn base em que "qualquer ani mal pode se assegurar de alimento e agua de uma maneira n'lais eficiente no terreno que habitualmcnte utiliza"; os grupos de famflia, corn base em "uma excitabilidade sexua! crônica" da espécie hunJ..ma; e 0 bando de fammas, corn base no fato de que "em praticamente todqs os grupos humanos muitas familias cooperam .... Isso proporciona um tipo seguro de subsistência" (Steward, 1936, p.332). As princi- pais relaçôes de produçâo - a divisao de trabalho por sexo - sao encaradas a partir de sua generalidade empirica entre os caçadores. E isso também em relaçâo à simples tecnologia existente, nao apenas como um conjunto de ferramentas em si mcsmas, mas. também como um conjunto evidente em si mesmo de intenç6es: a provisâo da "subsistência': Essa tecnologia se desenvolve em areas de recursos alimentares limitados; dai, os caçadores nunca ultrapassarem os pequenos agrega- dos em b;:mdo, da ordem de 20 a 50 pess03s, e apresentarem baixas densidades populacionais. Dadas essas condiçôes, passa-se a determinar a base ecol6gica das varias formas de banda; "patrilinear", "matrilinear" e "composta". Como na an,i1ise de Murdock, 0 elo critico entre 0 meio am bien te e a est rulura social é a prâtica residencial. Steward concentra suas atençôes sobre 0 tipo de bando mais difundi- do,o patrilinear, que ele entende como a fo nna lizaçao da residência patr il ocal. Na primeira versao do estudo (1936), a patrilocalidade é expli cada pela dominância inata do macho e pela importância econômica dos homens nas culturas caçadoras (p.333). Em uma versao posterior, a patrilocalidade é rc1acionada particularmente suas vantagens econômicas cm areas de recursos animais dispersos, mas fixos: "cm um mcio ambiente no quai 0 principal alimento seja caça nào-migrat6ria e dispersa, é \'antajoso que os homens permaneçam no seu terr it6rio geral de nascÎ - Dois pamdigmas da /caria (lIJ /rol'0l6gica 101 mento" (isto é, de vez que ja conhecem 0 territ6rio) (I 955, p. 135 L Com a patrilo- cal idade assim estabelecida corn base na sua superioridade econ6mica, a estrutura do bando decorre como reconhecimento e articulaçâo - de uma maneira agora fami li ar a n6s. A residência patrilocal deve agregar pa renles Con- seqüentemente, 0 tabu do incesto é imposto ao nivcl do bando, e 0 grupo é organizado coma uma patrilinhagem exogâmica. Resumindo a questao em ter- mos gerais: a eficiência econômica em um dado conjunlo de circullstâncÎas técni- cas e ambientais requer certas prâticas e relaçôes sociais (residència patrilocal) que, por sua vez, sào fo rmuladas e codificadas como uma estrutura social (bando patrilinear). Pu ro Morgan. 3 ! A proposiçao tambérn épura praxis. Pois para da os "padr6es comportamen- tais de trnba/ho" "exigidos" pela contexto ecol6gico é que se realizam sob forma cultural. Murphy expl ica a posiçâo de Steward: o rneio ambiente por si mesmo naD é 0 fator critico, t'ois os "padrôes de comparta- mento" exigidos na sua exploraçâo através do usa de ccrlos "dispositivos econômi- cos" é que sâo os e1ementos-chavcs. Esses padrôes de comportarncnto sac 0 lrabalho e a lecnologia, os "dispositivos econômicos': Dc uma fo rma muito simples, a teoriada ecologia cultural esta envolvida corn 0 processo de Irabalho, sua organizaçao, scus cidos e ritmos, e suas modalidades situacionais ... (1970, p.155 J. ... Os padrôes de trabaillo sao diretalllelite derivados das fcrramclltas e recursos aos quais eles sao aplicados, e esses dois falores servem para limitar as atividades huma- nas às quais cstao relacionados [p.156]. E é da (!f/{îlisc da atividadc, emiugarda muilise das instituÎçôes e vaiores, que a teoria deriva. Essas atividades sac aquelas pertencentes ao cido de trabalho e delas emerge a estrutura da sociedade Shoshone [p. 156 J ... o ponto que desejo enfatizar é que 0 dominio da açào social enyolvido na produçâo material, islO é, 0 trabalho, encontra-se subjacente ao sistema social Shoshone como um todo. Os recursos sao a objeto de trabalho e ai jaz sua importância para uma da sociedade e da cultura .... Como abjctos de trabalha, eles possucm cerlas caracteristicas imadificâveis às quais a trabalho deve sc adaptar para fazê-Ios acessÎvcis à cxploraçao. As ferramcntas devem sua posiçao central na analisc da socicdade à sua condiçaa de instrumentos e mediadorcs do trabal ho. 0 uso de fcr ra- mentas requer certos mados de comportamellto, e a aplicaçao desses inst rumentos a materiais induz a posteriores ajustes de cornportamento [p.1571 . 31 0 parildigma praxis - pdticil- estrutura, generalizado por Ste .....ard na forma de "três proce- dirncntos fundamentais da ecologia cultural": "Primeiro dcve seT :lI1alisado 0 inter-rdilcionamento de tecnologia explorativa ou produtiva cam 0 mdo ambiente ... EI11 scgundo lugar, devem ser analisados os padrôes de comportamento envolviclos na exploraçiio de uma ârca particular por mdo de uma teenologia partieular ... 0 terceiro procedirnento é para detcnninar ah! que ponto os padroes de comportamento rcqueridos na cxploraçiio do meia ambicnte aCctam outras aspectas da cuttura" ( 1955, pAO-I). 1-- 1 1 i '. 1 1 102 CI/II/ml c raziio prtilica A t",oria e 0 método da ecoJogia .cultural nao sao UIl1 tipa de determÎnismo ambien- uJ. nem mesmo basicamente preocupados corn 0 mcio ambicnlc. Trata-se de sem ser "culturolôgica" ou E mais, é urna tcaria aç"û, no sentldo cm que esse terma foi usado cm sociologia. Embora reconhecen- '::0 que 0 c?mportamcnto é, cm boa parle, regulado por normas, vé também as narmas ù' mo slIrgllldo 110 primeiro piano d - . 1 d " c açao sOCJa , e sen 0 wl1a cnstaltznçiio do comporta_ que, por sua vez, mantém esses padr6es comportamcntais [p.163J ... as ferra- e recurSQS rcquerem [grifo de MurphyJ aIguns lipas de comportamento para corn sucesso, e essas exigencias _ 0 processo de trabalho _ pres. cm segUlda a estrut ura social gcral fp.163; todos os grifos sao meus corn as e... ,,\: (eçoes cxpressas. )32 .... . ,fa.zendo eloqüente defesa dessa "ecologia cultural", n .. ;) reduçoes blOloglCas da nova ecologia" (da quaI Vayda, Sweet e Leeds sac .:ltJOÙS como expoentes) 33 A der ,_ . .:: . , . '.. lcsa, porem, nao se faz sem contradlçôes e, no unl1. das contas, é dlflctl dlstmguir as duas posiçôes, a nao ser por diferenças de . acordo corn Murphy, Steward pensava a sociedade como um modo distin- rl .... llltegraÇao. e, como tal •. nao-subordinada à natureza. Ordenada por idéias e a goz3na de uma relativa autonomia. Mas para apresentar a sucmtamente, as idéias sac sobre atividades, enquanto que a razao -:6$3.5 atI\ïdades nao passa da sua eficJ:.· , . d ' , . ' 1 dCl a pratlCa em eterrnmadas clrcunstân- 'tas de mod . , . d • 0 que 0 pnnclplO a ordem cullural permanece sendo 0 princfpio .:ultural da vantagem adaptativa. Como 0 pr6prio Murphy observa (na passagem A. intere:ssante obra te6rica de Murphy (297!) cl ' , • d uI . parte a mesma duahdade de açao e norma K"«la e e c tura, e das premissas irreconcTâ . cl . . . . ' • • _ ru! al 1 t vels e que a atlvldade gera Idélas e a percep\âo é ,' . I,;.:n .. w: tur mente de modo qu 'l' '.' d' - .' _ . sempre 1 us6no (por exemplo, p.34-5, 55, 90- 1, 100-2). As IÇoeS de uma Interaçao dlalétu:a tornam-se en tao contradiçô d 6' M h ! t:.\1d..;.de anles da idéia que é a recondi :1 d .. es 0 pr pno urp y, corn a . . ' p . ç 0 a atlVldadc, estando essas duas proposiçôes rclaciona- _;J!> po. uma negatlvldade aleat6na' I)or ex 1" b • , . 1 - 1 - . COlI' 0, cm ora cu tenha argumentado que as idéias sâo a açao, e as nào sao apenas um rc(\cxo 1 . 'd d L.:. , ; 'cl ai '. . (essa atl\'1 a cou uma reafirmaç:1o dela na forma •.;l1l""Il.iCa el': . Ao contnlno as Idélas in 1 . d _ . .... "·d d d ' ,c ll1n 0 as que sao 1l0nnatlvas elll uma sociedade podern .. :l.! a rea.u a e a comporlamento IJode " .. ' , : ; •• - d cl '. .' III rCJI1tcrprcta_la de acordo corn outras estruturas de ..... 0, po em sunphfic:i· la e dlstorcê la ou d . cl .' _ '.' 1 .. -, po em:llll aemrar cmconflitoabertoeconscientc ,. fi a aÇ30 SOCldJ. sso n:1o slglllfica que 0 sist . '. ... _ . cilla Ilormaln'o n:1o esteJa relaclonado à condula pois J.; s.ao <i precondlç:1o da atividadc" (p.158). ' como dey? p:r:1 distingui_la da ecologia cultural de Steward, estâ .. ' ..1 ... . .. aptaçào c coerCJlCI<l slslcmal lcas ('l1lre cultura e mcio ambientc, cessa busca lM • • ... :l <.: ... mento e ordem na I"claçào caUS:1 0 ob .' " '" . '.' SCUrCCll1lCnto c 0 des:1parccimcnto das distinçôes entre . . ' ... 015 ... As conexôes entre um SISlcma soc' · J ' . ,.; ... . . . .' 1.\ e 0 St.'11 melO :1mblente podem ser cfetivamente . , mas ISSO dlfi cllmente elllllina as frolltt'ir:1s enlrt' os do's A cl ',' • ' d ,,">-!:.:ma social derivam d t: t d . _. 1 ... 15 mç 0 e a 3utonomla a d cl 0 a e que sua IIllegraçao n.'side no dominio das idéias e das atividades ....:-..: •.:1..1>., .: mo 0 que estas se 3}Ustam pm I"od ,', cl ' ' . d • . U7.11 um mo 0 de \'Ida coerente e ordenado Elas est:io as 2 natureza, mas suas moda!idades ellcontrarn-se da natureza" ! 970, Dois paradigmas da teoria anlropo16gica 103 citada), a teoria de Steward deriva mais da atividade do trabalho "do que das instituiçôes e valores". Essas instituiçôes e valores, conseqüentemente, nao organi- zam a interconexao huma na COOl a natureza, mas chegam à cena post festum, como uma cristalizaçao das relaçôes estabelecidas na situaçao de trabalho. Por outro lado) os padrôes de trabalho "derivam diretamente das ferramentas e recursos"; des sac "exigidos" para a integraçao efetiva dos dois no processo de produçao (cf. Steward, 1938, p.260- 1). Tudo, portanto, leva à noçao de "exigências", e a "exigên- cia" em questao é a purarnente objetiva de lidar com sucesso corn 0 meio ambien- te. As conclusôes de Murphy sobre as relaçôes de cultura corn a natureza sao verdadeiras, mas infelizmente nao sao pertinentes à ecologia stewardiana; Os fenômenos de ordem superior ordeoam os fenômenos de ordem inferior de acordo corn seus objetivos, embora o<io possam alterar suas propriedades. Do mesmo modo, os sistemas sociais humanos alcançam e envolvem os ecossistemas, e nao 0 contrario, e a cultura reordena a natureza e realça as partes deia que sac relevantes para a situaçao humana. f 1970, p. 169.) É justamente assim. No entanto, toda a filosofia de Steward se encaminha exata- mente no sentido oposto. A morfologia cultural se toma inteligîvel precisamente nas mes mas bases que as asas de um passaro ou as guelras de um peixe. A cultura nao reordena a natureza através dos seus pr6prios objetivos porque, para Steward, todo objetivo, a nâo ser 0 pratico, desaparece no momento da produçao. A sabe- do ria ecol6gica consiste em esquecer a ordenaçao cultural da natureza em todos os rnomentos decisivos. A interaçâo da tecnologia corn 0 rneio ambiente segundo determinadas relaçôes de produçao - sobre a quaI se erige uma morfologia cultural- é considerada por Steward coma um fato instrumental. Dai a ordem que é transmitida através da açao à estrutura ser a eco-16gica da adaptaçao efetiva. A problemâtica de Steward é um padrào para 0 negli genciamento, no princî- pio te6rico, da ecologia como sistema cultural. Isso é cm parte uma questao de ornissao, incapacidade de desenvolver ao nivel do conceito 0 que é reconhecido de fato. Steward estâ bem dente de que 0 carMer particular da tecnologia determina o carMer do meio ambiente, isto é, confere significância a recursos por um critério de relevância cultural. No entanto. no modo de argumentaçao de Steward, isto é urn dado, juntamente corn as relaçôes de famHia e de produçao (divisao de traba- . Iho por sexo: homens caçando, lTIulheres colhendo). A ordenaçao cultural da natureza é portanto disfarçada como premissa para uma ordenaçao naluralista da cul tura. Na realidade) a intencionalidade completa do processo produtivo é negli - genciada na suposiçâo de que essa seja uma economia de "subsistência". conde na- da pela pobreza dos meios técnicos a LIma rnisedvel existência. .': " = ". S-' <:" e- L fI If " 1 \ " . " , " • 104 CI/hum c mzdo prtlticil Essa naturalizaçao da econonù:-. do caçador-coletor é. evidentcmente, 0 saber an tropo16gico E isso km a ver direlamcnte com uma explicaçâo "ecoI6- gica" da cultura total. Por ignoraf 0 c" rater hist6rico dos objetivos econ6micos, tanta cm qualidade coma em quantidade, tailla nos bens particulares que se tenta produzir quanta na intcnsidade do processo. carece ainda da organizaçao cultural da relaçao corn a cultura. 3S Neill l11CSIllO os caçadores estâo engajados cm lima simples economia de subsistência. Toda grupo distingue a comestivel do nao-co- mestîvel e nâo apenas para a como um todo, mas para classes especifi- cas de idade, sexo e condiçôes rituais tais C0l110 sao local mente defin idas. Além do mais, uma porçao de exemplos dos aborigines australi anos serve para rnostrar que diferentes tipos de troca intergrupal têm implicaçôes correspondentes sobre a intensidade e os padrôes sociais do trabalho. Os australianos sao mesmo capazes de um totemismo concreto, no quai os grupos de vizinhança se especializam na produçao de diferentes objetos utilitarios para comerciar a partir de materiais igualmente disponîvei s para todos, duplicando, desse modo, no plana econômica, os ritas e a interdependência de grupos imaginados no sistema totêmico. Em suma,O que Steward deixa de lado é a organizaçâo do trabalho como um processo simb6lico que opera tanto nas reIaçôes de produçâo corna nas suas fin ali dades. A atividade da produçâo é) ao co nt rario, desconstituida culturalmente, para dar lugar à constituiçao da cuhura pela at ividade da produçao. A quesUio real colocada à antropologia par essa raZaO pratica é a da existência da cultura. As teorias da utilidade jâ mudaram muitas vezes de roupa) mas a desfecho é sem pre 0 mesmo: a eliminaçao da cultura - camo objeto di stintivo da d isciplina. Vê-se, através da vari edade dessas teorias, dois t ipos principais que correm ao 10ngo de duas eSlradas diferentes em direçao a esse fim comum. Um tipo é naturalist ico ou ecol6gico - por assim dizer, objetivo - enquanto a segundo é utilitario no sentido c1assico, ou economidstico, invocando a familiar rclaçao meios-fins do sujeito humano racional. o naturalismo compreende 3 cultura coma 0 modo humano da adaptaçao. A cultura, desse ponto de vista, é uma ordem instrumental; concebida (segundo H "Um homem que passa a vida seguindo animais apenas para mata-los e comê- Ios, ou passando de urna moita de fruteiras para outra, na realidadc vive coma um animal" (Braidwood, 1957, p.122j cf. $ablins, 1972, cap.l j Lee e De Vore, 1968). 35 a que esta falt:mdo especificamentc é a intencionalidade cultural corporificada no c6digo de objetos descj:\.\'eis, Coma l3audrilJard explica cam muila propriedade, um "objeto de consumo le pOl'tanlo de produç:io] existe da mesma forma que um fonema tem um significado absoluto em lingüistica. Esse objeto naD adquire signific:ldo nem numa rcl açao espedfica corn 0 sujeito, .. nem numa relaç:io operativa COrn 0 mundo (0 objeto·utensîlio)j cie s6 adquirc significado através de sua di ferença dos outras objetos. de acordo cam um c6digo herarquico" ( 1972. p.61). Sendo este 0 casa, o!lo h:\. "necessidades a nao ser aqueJas Inecessidadesl de que a sistcma nccessita" e isso nao se da porque 0 consumo é uma funçao da. produçao, mas porque a cOI!SIII11/nalivité é um modo estrutural de produçao (ibid., p.89). Dois paradigmas da tcoria alllropolOgica 105 cada escola eco16gica em particular) camo engajada na reproduçao de si mcsma enquanto cultura ou na manutençao da populaçao huma na dentro de limites de viabilidade biol6gica. Em qualquer caso, a praxologia é "objetiva" no scntido de que a explicaçao consiste em determinar as virtudes mate riais ou bio16gicas de determinados traços culturais; naO ha qualquer demanda te6rica de que os atores façam seus calculos diretamente em utilidades adaptativas; pelo contrario, os mais triunfantes eurekas! serao reservados para a demonstraçao de que 0 fazem malgré eux. 0 ato final para a cultura consiste na sua absorçao, de uma maneira ou de outra, dentro da natureza. Ou a pratica cultural é um modo comportamental de aparência das leis da seleçao natural, exatamente como qualquer "cornportamen- ta especîfico de espécie>l, ou ela se inclui dentro de um ecossistema mais geral que, sozinho e camo uma total idade, desfr uta dos poderes de auto-regulaçao ou "men- te': e cujas li mitaçôes se dâo sob formas culturais. Mais do que par uma pragmatica de formas culturais, a utilitarismo subjeti- va esta, em contraste) preocupado corn a atividade intencional dos indivîduos na persecuçao dos seus pr6prios interesses e das suas pr6prias satisfaçôes. Pode-se dizer que este segundo tipo de teoria pragmatica pressupôe um Homem Econô- mica Universal, corn um conjunto relativizado de preferências, isto é, um homem agindo racionalmente em direçao a metas que variam contudc je sociedade para sociedade. Essa relativizaçao é, portanto, uma acomodaçao à variaçao cultural , mas também sua apropriaçao) coma premissa, par tl,ma explicaçâo que pretende representa-la camo conseqüência. Nessa praxologia, a cultura é tomada coma um meio ambiente ou 0 conjunto dos meios à di sposiçao do "individuo que age': e também camo uma resultante sedimentada de suas maquinaçôes auto-Î nteressa- das. A soluçao caracterist ica da cultura é portanto solipsistica na forma. Apenas os atores (e os interesses considerados a priori como seus) sao reais; a cultura é 0 epife nômeno das suas intençôes. a os esses tipo?ae râzio pratica tallÏoénlfêiTïefilèomüm uma conœpçao empobrecida da simbolizaçao humana. Para todos eles, 0 csquema cultural é 0 signo de outras realidades, obedecendo no final em seu arranj o interna a outras leis e outras 16gicas. Nenhum deles foi capaz de explorar a fu ndo a descoberta antropol6gica de que a criaçao do signifi cado é a qualidade que distingue e cons- titui os homens - a "essência humana" de um discurso mais an tigo - de modo que, pelos processos de valor izaçao e significaçao diferenciais, as relaçôes entre os 1 ho mens) bem coma entre eles e a natureza, sao organizadas. ____ , __ ---------- .... -- A razao cultural Nos paragrafos iniciais deste capitula. referi -me à rel açâo exislente ent re a propos- ta cultural e a proposta prâtica coma uma oposiçao dclica e repetitiva à q,ual a J' _. ,; f iQ.-. [ti IV f < ! 1 , L.... ... 1 '. t..- e - .. '- - <:. ç - C)...... ç ':o.. '" ::1 ' ;i · 0 c ) _ . ,- ç:>. \. , . 0- 1 ;- , 0 1 ;S 1 1 .. (, .- 0 '" '" .$ l , !' 106 Cul/ura e raziio pra/ica antropologia se manteve presa nos ultimos cern anos. Assim, exatamente coma na , sociedade norte-amer icana, onde tudo que é essencialmente 0 mais convencional é t ido como 0 mais natural, começou em desvantagem a luta pelo reconhecimento ) Il ... 1. ) da perspectiva cultural que poderia ser qualificada como uma tentativa de Iibertar ... .,,-, f) ) ant ropologia dos grilhôes do naturalismo. Desenvolvida tanto na Eurepa coma ; nos Estados Unidos, essa luta se tem caracterizado nao somente por uma maior !consciência ant ropol6gica a respeito do simb6lico, mas também por uma penetra- , • '" '1 çao crescente no campo da analise do pratico. _,1 l • t\ 1) ,ép l . ; No que se refere aos Estados Unidos, os pr6prios discipulos de Boas tomaram \",(.,. . :,a si a defesa do seu conceito de cultura coma es trutura significativa interposta ènt re as circunstâncias e 0 cost umé. Esse conceito foi posteriormente desenvolvi- do, sobretudo pa r Ruth Benedict , que sustentou a idéia de uma 16gica or ienta dora que reunificaria os fragmentos espalhados por Lowi e, alin havando-os para for- mar padrôes consistentes de cultura. Segundo Benedict, a ordem seria produto da infusao de significados e .atitudes comparaveis encontrados em todas as praticas da cultura. Nao se tratava, é clare, de um c6digo di ferencial, mas de um opératoire global que organiza 0 mei o ambiente, as relaçôes sociais e, acima de tudo, a hist6ria, um filtro seletivo que reduziria 0 caos em potencial dos empréstimos culturais (a difusao) por meio de um critério de aceitaçao e uma atribuiçao de significado (Benedi ct, 1961 11934]J . Na obra de Lesli e Whi te, outro conheddo ant rop61ogo norte-americano, 0 paradigma de Boas coiwive corn 0 de Morgan, sem que, no entanto, seja alcançada a unidade dos opostos te6ricos. Essa ambivalência presente na filosofi a de White pode nao ser idiossincni tica; constitui um reconhecimento legftimo de quea razao pratica e 0 simb6lico coabi tam, sem suscitar muitos comentarios ou escândalos, na maioria da.s teori as antropol6gicas. Para "White, as idéias sào, por um lado) a refI exo da base t ecnol6gica, seja diretamente, seja por mediaçao das relaçôes so- d ais igualmente determinad(\,s por essa base. Aqui) sua formulaçao te6rica provém di retamente da epistemologia de Morgan. As idéias que os ho mens elaboram sobre 0 mundo derivam necessariamente do modo peio quaI 0 conhecem pela experi ênda, e essa experi ência, por sua vez, depende do modo pela quai se articu- lam tecnicamente ao mundo: Os sistcmas ideol6gicos ou filos6ficos sac 0 produto da organizaçao de crenças nas quais a experiência humana encontra sua interpretaçào. Mas a experiência e) em conseqüênci a, as intcrpretaçôcs sao profundamente condicionadas pelas tecnologias. A cada tipo de tccnologia corresponde um tipo de filosofia. A interpretaçao de um sistema de experiência do quai mTI coup de pOÎnt é um traço caracterfstico refletira neccssariamente esse tipo de experi éncia. Nao seria impr6prio falar em um ti po de • 50co (cm no original). .. Dois paradigmas da tcoria alltropoMgica 107 fi losofia coup de poing hem como de uma tecnologia coup de pOÎng ... Vm determinado tipo de tecnologia encontra cxpressao na filosofia do lotemislllo, outro tipo na astro- logia ou na mecânica quântica. (\o\'hite, 1949, p.365-6.) Como as idéias decorrern das condiçôes técnicas da percepçao, a evoluçao da fil osofi a é, em sua esséncia, concebida por \'\Thi te como a passagem do estagio da falsa consciência para 0 estagio da verdadeira consciência, atravessando 0 curto periodo de transiçao da metafîsica. Ao dispor de recursos tecnol6gicos cada vez mais efi cazes para tidar corn 0 mundo, 0 supernaturalismo pri miti vo) correspon- dente à representaçao antropom6rfica de uma ignorânci a fundamental, deveria fo rçosamente dar lugar a uma fil osofi a cientifica baseada no conhecimento obje- tivo. Pa r out ro lado, White insiste no ca rater unico do "comportamento simb6li- co': isto é, um sistema de signifi cados que independe da realidade fi sica. Conse- qüentemente, 0 modo pelo quaI 0 mundo é "experimentado" nao constitui um simples processo sensorial determinado pela exposiçao direta da realidade à per- cepçao por meio da tecnologia. 0 poder que 0 homem tem de conferir significado - experiênda como atribuiçao de si gni ficado - constr6i out re tipo de mundo: o homem difere do macaco e, ao que sabcmos, de todos os out ros sercs vivos por ser capaz de um comportamento simb6lico. Corn palavras, 0 homem cria um novo mundo, um mundo de idéias e filosofias. Nesse mundo, a existência do homem é tào real quanto no mundo fisico de seus sentidos. Em verdade, 0 homem sente que a qualidade essencial de sua cxistência consiste em ocupar esse mundo de sfmbolos e idéias - ou, como às vezes cie 0 chama, 0 mundo da mente ou do espirito. Esse mundo das idéias da provas de uma continuidade e de uma permanência que 0 mundo externo dos sentidos jamais podeni ter. Ele naD é feiro apenas do presente, mas de um passado e tambérn de um futuro. Tcmporalmente, nao co'nsiitui uma sucessao de epis6dios desconcxos, e sim um continuum que se estendc ao infinito em amhas as direç6es, da ctcrnidade à eternidadc. (White, 1942, p.372.] Mas en tao, nessa perspectiva simb6lica - que se opoe à consciência positi- vista e utili taria através da exposiçao tecnolôgica - a ferrame nta é, ela pr6pria, uma idéia. A ferramenta "nao é um mero objeto mate rial ou mesmo uma imagem sensorial como pode ser para um macaco. Ë também uma idéia" (White, 1942, p.373). Se um machado de pedra gera deter mi nado tipo de filosofia, ncm por isso deixa de sel', ele pr6prio, u m conceito cujo significado e uso - como ocorre corn todos os conceitos - sào flXados, nao por suas propri edades objet ivas, mas pela sistema de relaçôes entre simbolos. Assim, a determinaçào tecnol6gica da cul tura na teori a evolucionista de White atua lado a lado com a determinaçao cultural da tecnologia em sua teor ia simb6lica: - " , < " f' , .. r I! 13- '- 1 c 1 ! 1 1 1 i 108 Cultura c razao prdtica Um machaclo lcm um componentc subjetivo; n30 teria scntido algum sem UI11 COll- ceito cuma atit ude. Por outra Jado, um concei to ou uma 3titude nao teriam sentido algum sem uma clara expressao, através do comportamento ou da (ala (que é uma forma de comportamento) . Toda elemento cultural, toda traça cultural, lcm um aspecta objetivo C subjetivo. Mas as concepçëies, atitudes e scnt îmentos - fenômcllos que têm seu lugar no organismo huma no - podem ser considerados, para fins de interprctaçao cicntifica, num contexto extra-sol1latico, isto é, a partir da sua relaçâo corn outras coisas e acontecimcntos simbolizados, cm vez de cm sua relaçâo COOl 0 organismo humano ... [Desse modo, um machado pode ser a partir da sua relaçao 1 corn out ras coisas e acontecÎmentos si mbol izados, tais como arcos, enX2- das e costumes que regem a divisao de trabalho na sociedade. [White, 1959a, p.236.J36 / Em oposiçao ao paradigma fundamentalmente prat ico e tecnol6gico que 0 Iiga a Morgan, White é capaz de .assumir uma perspectiva simb6lica que 0 cola ca em companhia de um nome inverossimil. Permitam-me justapor uma citaçao de Lévi-Strauss, transcrita anteriormente, a um texto extraido do discurso proferido por White na condiçâo de presidente da seçao de Antropolagia da MAS [American Associati on for the Advancement of Science - Associaçao Americana para 0 Progresso da Ciência]: UVI -STRAUSS 1 Se afi rmamos que 0 esquema concei - tuaI comanda e define as prâticas, é porque essas prMicas, objeto de estu- do do etn61ogo, sob a forma de reali- dades discretas,lacalizadas no tempo e no espaço, e distintivas de gêneros de vida e de formas de civili zaçao, nâo se confundem com a praxis que ... constitui a totalidade fundamental para as ci ências do homem ... Sem pôr cm duvida 0 incontestavel prima- do das infra-estruturas, cremos que entre prâxis e prâticas se intercala sempre /lm medindor, que é 0 esquema WHITE Assim [corn simbolosl 0 homem èriou um novo mundo para nele vi- ver. Certamente ele nâo deixou de palmilhar a terra, de sentir 0 vento no rosto, de escuta- lo suspirar nos ra- mos dos pinheiros; ele bebeu a agua dos rios, dormiu sob as estrelas e le- van tou-se para saudar 0 sol. Mas ja nâo era 0 mesmo sol! Nada mais era como antes. Tudo estava "banhado por luz celestial" e havia «sugestôes de imortalidade" em cada mao. A agua ja nâo servia mais apenas para saci ar a sede; poderia tornar a vida eterna. l6 Nesse arti go, \Vhite confere dcsncccssariamente à cultura uma definiçi'io contextual; cm out ras palavras, os "simbo13dos" \l istos no contexto de outros "simbolados':o que coloca a carga da deu'nn i- naçao no antrop61ogo - mesmo quando 0 local do simb61ico permanecc no sujeito humallO - e ignora 0 proccsso real pelo quai as produçôes hum3113s si'io reifi cadtls ou "ohjeti\ltldas'; ou scja, tornam-se "cxt ra-sornâticas". Vcr Berger e Luckmann para ll!l1tl di scussilo rcccnte de "objcti vaçao", presa, cOlltudo, às ll ot6ri as origens na pr:ixis. , : Dois paradigmas da l eoria 109 COll ceiwal por obm do quaI t/l1U1 maté- ria e lima forma, desprovidas al1lbas de existéllcia independel'lte, realizam-sc COIIID cstrul'uras, isto é, como seres ao mesmo tempo empi ri cos e inteligi- voi s. [1966, p. 130; grifo rneu·1 Entre 0 IlO1IIC111 e a WHll reza, illterpu- /l iul-se a Véll da W/lHrrI , e ele nada po- derja cll xergaf" (j lU'i O scr arTavés desse véu. Ele ainda usa\'a seus sentidos. Lascava pcdras. caçavtl ccrvos, acasa- lava-se e procriava . Mas tlldo cra per- meado pela essêllci f"! Jas palavras: os significados e valores ql/e estamm além dos sell tidos. E esses sigl/ificados e va/o- res 0 orie ll ta 1'L'111J, a/ém cfe oricl/ tar seus selltidos, tendo /nlliras vezes precedê/!- cia sobre eles. [1958 ms; grifo meu.Jl7 Ao que parece, sempre que se incursiona pela antro.polagia norte-an:ericana, verifica-se. se nao exatamente essa ambivalência de White, uma apropnaçâo, de certo modo inescrupulosa, do obj eto cultural pel o significado. A impressionante etnociência desenvolvida por Goodenough, Lounsbury, Conkl in e outros, sobre- tudo a partir do legado lîngüistico da escola de Boas, foi agrilhoada por um conceito positivista de cuttura como competência ou conseqüent emente do significado coma significânci a rcfe.rel.1Clal e. camo traduçao, em termos de um.c6digo aparentemente Ob)l2! tIVO, CUp dade" encerra uma teoria. Ou, para mencionar exemplos de natureza bem dlstmta (ainda que igual mente impression antes pela qualidade os Geertz ou Schneider, por caminhos diferentes, esbarraram tambem em hn:'- taçao especifica do simbolo, concebido a parti r da disti nçao açao e sociedade e cultura. Essa dist inçao, cm particular, é caracteristlca dos melOS euro- peus. muito mais di fundida na antropologia inglesa q.ue na na. Como suas implicaçoes remontam a Durkheim e, de pOiS, ao 111oderno estt u- turalismo francês _ que também incorpora a tradiçâo de Boas através de Lévi - Strauss- pareceu-me mais correto dedicar maior atençao à maneira pela quaI foi concebida a relaçao entre util itarismo e cultura nessa tradiçao. Começo pOl' Durk- hei m. Embora se t'cnha tornado a her6i de um cer to "funcionali smo" posterior, Durkheim desenvolveu sua pr6pria posiçâo a respeito da sociedade em contra po- siçao à modali dadc de economicisl11o e individualismo radical que vimos no projeto de Malinowski (cf. Parsons, 1968 [19371; Lukes, 1972) . Durkheim 37 Ë evidcnt c que essa comparaçao é IC\le l11ente maliciosa, pois a frase final do paragrafo Vlhite é uma proposiçao que Lévi-Strauss nao endoss a ria, embora scja le propre da escol;} de Boas: 0 homem tornou-se 0 animal irracional." ... :.; '" '" .. , " • c • . k<"j _ .. '.' 110 Cul/lira c razao pratica elegclI Spencer coma seu principal adversario socio16giço no que se [cfere a essas questocs, cm par ticular na obra A divisiio do trabalho (1949 [1893J). Portanto, paralclamente ao contraste entre Morgan e Boas, é passivel estabelecer uma COI11- paraçao paradigmatica entre Spencer e Durkheim, cujo debate mais recente estava cent rado no utilitarismo pr6prio ou na sua açao economicistica, logo, na oposiçao enlre indivîduo e sociedade, estanda esta ûltim3 relacionada à 16gica materi aI da prod uçao e, por conseguinte, à oposiçào global entre cultura e natureZ3. Por varias razoes, contudo, 0 exerdcio dessa comparaçâo entre Durkheim e Spencer nao seria tao valioso. Uma delas é a grande semelhança residual entre 0 "superorgâni- co" de Spencer e a "sociedade" de Durkheim. Mais importante é que Durkheim forjo u seu conceito de social num confronta gera! corn a economia poli tica clJ.ssi- ca, e apenas corn Spencer, e portanto é mais correto entendê- Io camo uma profunda crîtica à autoconcepça6 do capitalismo que se exibia como teoria da Tratava-se de uma crîtica geral à adoçao da f6rmula racio nalista do indivîduo que acumula como 0 modelo da produçao soci al, modela que elevava a sociedade ao status de predicado das su postas fin alidades e necessidades humanas. A esse voIuntar ismo e intencionalismo, Durkheim opôs 0 fato social. As esmaga- . doras propriedades e poderes que Ihe atr ibui em relaçao ao individuo repre- sentam um ataque direto à idéia que 0 economÎsta liberal fazia da sociedade como produto publico do Interesse privado. Porlanto, a célebre advertência contida em As regras do tnétodo socio16gico- "tratar os fatos sociais coma coisas" - representava mais que uma liçào aplicada à ret ificaçao positivista. Ressaltar a fact icidade do fato social efa precisamente uma fo r ma de removê- lo da produçâo individual: "Pois tudo que é real possui uma natureza defi nida que impôe cont role, que deve ser levada em conta e que jamais é complet amente superada, mesmo quando conseguimos neutrali za-Ia." (1950a {1895J, p.iv-vi). Todos os aspect os afirmativos da sociabili dade no esquema de Durkheim sao, simultaneamente, aspectos negativos da individualidade. A ques- tao nao se reduzapenas a que 0 fato social seja coletivo. Trata-seda consciência em oposiçJo ao desejo, do convencional em oposiçao ao espontâneo; e em vez de se das necessidades, que sac internas, ela se impôe como coerçao, que é extern:l. "De fato, a ma is impor tante caracteristica de uma 'coisa' é a impossibili- dade de que seja modificada por um simples esforço de vontade" (ibid ., p.28) . De maneir;l analoga, 0 m6vel real das incursôes de Durkheim no terreno da psicolo- gia ach;l\'n-se em sua critica à economia. Entendia de que a origem real do redu- cionisillo era a ideologia do homem que calculava: D ..' tato, se a sociedade é apenas um sistema de meios instituidos pelo horncm para atingir determinados fins, esses fins 56 podem ser individuais, pois somente os indi- viduos podcriam tcr existido anles da sociedade. Do individuo, portanto, cmanaram ns nçc:essidades e dcscjos que determinam a formaçao de socicdades; e sc é dele que Dois paradigmas da feoria alltropoldgÎca 111 Indo provém, é nccessariamente através dcle que tudo devc ser explicado. Além disso, ha nas socicdades apenas consciências individuais; portanto, é nelas que se encontra a fonle de Ioda a evoluçao social. Em conseqüência, as leis socio16gicas s6 podem ser um carola rio das ieis mais gcrais da psicologi a. /Ibid., p.97-9.] Desde cedo, observa Luke, Durkheim convenceu-se de que a econornia poH- tica conslÎluia UIl1 eSlagio do desenvolvimento da ciência social que precisava ser superado. Obrigada a part ir do pressuposto de que "nada ha de real na sociedade além do tai ciência nao oferecia qualquer espaço te6rico para a socio- logia. Com retaçao a esse individuo eterno do quaI fora abstraida a sociedade, Durkheim nao poderia deixar de nutrir 0 mesmo desprezo que Marx. Esse pr6- prio "individuo" era uma abstraçao. Privado de todas as coordenadas de tempo, espaço e hist6ria, tudo que restava era "0 t riste retrato do puro egoÎsmo" (Durk- heim [ 1888[, citado par Lukes, 1972, p.80). Ncm Malinowski nem Weber. Durkheim recusava-se a conceber a sociedade como 0 objeto externo da manipulaçao huma na ou troca- la pela realidade exclu- siva do sujeito intencional. Como enlâo se coloca Radcliffe-Brown? Seguramente, as mesmas consideraçôes impediriam Durkheim de ser indulgente corn a utilita- rismo mal disfarçado do funcionalisIl1o sociol6gico. Nem mesmo seu entusiasmo pela "solidariedade" 0 levou a supor, em pri ncipio, que a funçao de u m costume 9U seu papel na satisfaçao dos sociaux poderia dar conta de sua natureza especifica. l8 Nâo obstante, os deli neamenlos do funcionalismo de Radcliffe- Brown transparecem na ontologia de Durkheim. Ao negar a economia politica, Durkheim foi obrigado a reproduzi r ao nivel da sociedade, encarada como .uma espécie de supersujeito, 0 mesmo economicismo que se havia recusado a admitir como const itut ivo ao nivel do individuo. Pode-se perceber mu ito bem essa uniao de opostos em um ensaio (1887) que escreveu sobre a ciência moral alema, onde enaltece as perspectivas sociais dos historiadores econômicos G. e A. Wagner, combatendo os liberais da "escola de Manchester': Corn relaçâo a estes ultimos, escreve: a economia politica consiste na satisfaçao das nccessidades dos indivfduos, em parti- cular de suas necessidades mate riais. Segundo CSSa concepçao, 0 individuo supôe-se camo 0 unico hm das relaçôes econômÎCasi tudo é feito par e1e e para de. A sociedade, par sua vez, é uma invcnçao do pensamento, uma entidade metafisica que 0 estudioso 38 Mostrar em que sentido um fato é l'tlll nào é expli car par que é verdadeiro nem por que é a quê é, pois os usas aos quais serve pressupèiem as propriedades espedficas que a caracterizam. mas flao a criam. A necessidadc que temos das coisas nâo pode determinar que elas sejam desta ou daquela forma c, par conseqUência, nao é cssa nccessidade que pade ret ira-las do nada C conferi r-lhcs existência (Durkheim, 1950b [1895], p.90; cf. p.94-5, 109- 11; e 1965, p.42-4). "" , ... .. , ... ,. ." =1 c . ;' "" - J f;: f " e- <0 l !'!Î'. 1:: f. cc- , · C ft ..:;, ,." '4,' .,;, "' -;:s ., s '" Il , 112 CI/hura e. razao pra/Ica pade c devc ignoraI'. Essa palavf(l apcllas [ol ul a 0 conj unto de todas as atividades individuais; trala-se de um fodo que ,Sc redu?, à soma das suas partes ... Vê -se que, basicamçnte, os ecoll omi stas libcrai s s:io. sem 0 sabcr, disdpulos de Rousseau, a quem repudiam par cngano. É ycrdadc que reconhcCè I1l que 0 cstado de isolamcnto nao é ideal, mas, tal como Rousseau, vêcm no do social nada mais que uma aproximaçao supcrficial, dcterminada pela conjunçao de înl ercsses individuais. [Durkheim, 1887, p.37. Em um cnsaio postcrior (1965) sobre Rousseau, sua opiniao muda. J Quer di zer entào que 0 argumenta iilvocaclo contra 0 scr individual é exatamente o da existência de um ser social - e contra 0 l'oder ordenador da necessidade individual esta 0 da l1ecessidade social. A negaçao de que determinada pratica- econ6mica, por exemplo - seja produto do desejo indi vidual adquire a forma de uma insistênci a em sua utilidade social: Para [Wagner e Schmoller], ao conùêlr io, a sociedade é um verdadeiro ser que nao esta, sem duvida, acima dos indivîduos que a compôem, mas que, nao obstante, tem sua pr6pria natureza e personalidade. Essas express6es utilizadas na linguagem cor- rente - consciência colctiva, cspirito colet ivo, corpo da naçào - nao possuem apenas uma dimensâo puramcnte verbal, mas expressam fatos que sac emÎnente- mente concretos. :Ë errado dizer que 0 todo é igual à soma de suas partes. Pelo simples (ato de que as partes man}êm relaç6es dcfinidas Lunas com as outras, porque estao dispostas de determinada maneira, algo de nova resulta de sua combinaçao: um ser composto, é certo, mas dotado de propriedades especiais e que, em ci rcul1stâncias especiais, pode inclusive tom ar-se consciente de si mesmo ... Como ... 0 ser social lcm necessidades pr6prias. entre as quais a necessidade de objetos mate riais para satisfa- zê-las, cie institui e organiza uma atividade econômica que nao é a atividade deste ou daquele individuo, tampouco a maioria dos cidadâos, Illas a atividade da naçao cm seu conjunto. [Ibid., p.37 -8.] A sociedade, portanto, tem os seus propr ios fins. que nào sao aqueles do individuo, e é através da sociedade, e nao do indivfduo, que a atividade social po de ser compreendida. "Para um fa to ser sociol6gico, ele deve interessar nao apenas aos individuos considerados separadamcnte, mas também à pr6pria sociedade. 0 exército, a industria, a fa mflia possuern fun çëies sociais na medida cm que têm coma se us obj etivos um a defesa, a outra a alimentaçâo da sociedade, e a terceira a sua renovaçao e cont inuidade" (Durkheim, 1886, p.66). Nesse casa, a telcologia utilitaria nâo pode sel' evitada. 0 paradigma meies-fins camo U1n tode foi cons- truide corn base na cOll cepçao do rata social, na medida em que esse fato foi determinado por oposiçiio à necessidade individual. Assim, a vida da sociedade era a fin alidade relevante. Mas, além di sso, precisamente porque foi definida camo exteri or e por dist inçao ao bem-esta r individua!, es sa idéia de sebrevivència social .. -= .. om=-.. .... -----------------'- . . Dois paradigmas da teoria alltropo/6gica 11 3 produzia grande numero de efcitos permanentes sobre a idéia do objeto social. Um deles cra a visao de que a sociedadc cstava continuamente ameaçada a part ir de dentro por uma guerra da parte contra 0 toda, e que era construida de modo a evitar esse peri go; esse conceito, que inspirou profundamente a maioria das obras do grupo do Am1ée Sociologique, encantrava-se também por detrâs da preocupa- çao de Radcliffe-Brown corn a "cooptaçao" e corn a ordem legal em geral (cf. Sahlins, 1972, cap. 4). Pode ser que essa noçao de luta subterrânea e dos probl emas funcionais que ela apresenta à sociedade permaneça como 0 legado mais impor- tante conferido à ciência socia l pela ideologia capitalista. B 6bvio que a ênfase na vida da sociedade em oposiçao ao pro ividual proporcionou a base 16gica para a apropriaçao de toda a metafora orgânica omo a idéia basica da constituiçao social. A tradiçao da socieda e co ITm organismo foi mantidal)Or -é "com ela a divisao da antropologia social ou sociologia, nos ramos das ciências naturai s: morfologia, fi siologia e evoluçao. Ela requeria apenas a proposiçâo de que a "funçâo social" de uma instituiçâo, ou sua contribuiçao à continuidade social, fosse também sua miso,t d'être (Radcliffe-Brown, 1950, p.62) para completar em um mesmo movimento a reversâo da maxima de Durkheim para 0 seu contrario - e a transferência do utilitarismo do indivîduo para 0 sllpersujeito que a pr6pria linha ini cial de argumentaçâo de Durkheim tornou inevitavel. o conceito de simbolizaçao de Durkheim, incluindo a muito conhecida "epÎstemologia sociol6gica': acabou viti ma do mesmo tipo de dualismo, da mes- ma forma que se tornou, nas mâos dos seguidores antropol6gicos, outra forma de 16gica instrumental. Lukes e outros em __ il objeçôes de da i social, que Durkheim se tornara cada vez malS consciente da autonomla e da Uri'ivêtsalidade do sÎgnifj .JCadoJIalyeZ __ estar consciente de um fato e conhecer seu lugar.. te6ricq Os lextos que lfJ poderiam ser os lados da questâo equivalem a apenas um conjunto de paradoxos dentro da compreensao do mest re da relaçâo do pensamento com a mundo. Outro conjunto de paradoxos é 0 problema (muito semelhante ao de Malinowski ) da diferença entre 0 modo de conhecimento do soci610go e a maneira pela qual 0 conhecimento é constituido na infância e na sociedade - processos tao di stintos na concepçao de Durkheim que isso 0 deixa inca paz de abarcar seu pr6prio programa positivi sta. Esse programa afirmava que os fatos sociais, preci samente porque eram "coisas", s6 podiam ser penetrados de fora, contanto que guiados pela percepçao e sem preconcepçao. No entanlo, Durk- hei m nunca acreditou que 0 nosso pr6prio conhecimento como membros da sociedade ou, a fortiori, os fatos sociai s tivcssem a mesmo tipo de gênese. Esse dilema pode ser exemplificado por duas curtas passagens das Regras. Por urn lado, Durkheim escreve que "toda educaçao é um esforço continuo para irnpor na i J;: .. -' ...·1 A. ..- . [ - " , .. , • o () 114 Clllwra e raziiQ prl!/ica cf iança maneiras de ver, sentir e agir às quais ela nao poderia chegar espontanea- mente" (1950a [1895], p.6). Todavia, al gumas paginas adiante, ele diz: "Os mora- li stas pensam que é necessario determinar corn precisao a essência das idéias de lei e élic3. Eles ai nda nao chegararn à verdade muita simples de que, como nossas idéias (représentations) das coisas fisicas sâo derivadas dessas pr6prias coisas e as expressam mais ou menas exatamente, assim [como estudiososJ nossas idéias de ét ica devem ser derivadas da manifestaçao observavel das regras que estao funcio- nando 50b nossos olhos" (ibid., p. 23). Durkheim se apegou simultaneamente a uma re'laçao mediada e nâo-medi ada entre suj eito e objeta. Se 0 segundo se adaptava ao projeta cientîfico, 0 primeiro era 0 destino do homem na sociedade, No entanto, a contradiçao era ma{s complexa e nao deixava de apresentar certa determi naçao, No caso mediado, a sociedade confrontava o .homem como um supersujeito cujos pr6prios c;onceitos do mundo dominavam e suhstitufam suas sensibilidades e depois, como um objeto, a experiência direta do que explicava empiricamente esse processo de imposiçao conceitual. Na condiçao de locus desse dualismo antagônico entre sociedade e sensibiJidade, 0 homem era «duplo" na visao de Durkheim, e a dualidade do seu ser correspondia a uma oposiçâo entre percepçao (individual) e concepçao (social), bem como entre gratificaçao egoista e moralidade coletiva. 39 essas ?ial éticas e1as a explicar as vir- D . , !(' . . e as hmltaçôes da problemahca durkhelmlana como da cultura.Essas 1 iJ . Ur. virtudes sao apenas parcialmente documentadas pela mfluencla do concelto de Jw.. 1 fato social de Durkheim na formulaçao de Saussure da distinçao entre langue e . , , \1 l "..l·V al-1 <"parole (Doroszewski, 1933). Na Classificaçao primitiva corn Mauss) e ! ,\ \ i i em 0 desenvolve,u uma U signo, particularmente em às de classe, espaço, te'rhpo, causa, etc, qqe em mUltos pontos essenClalS era bastante pr6Xlma à de Saussure. Observa-se outra paradoxe do ponto de vista do carater arbitrârio do signo, uma vez que para Durkhei m as categorias representavam a morfologia 39 Em outro artigo ( 1914), que da seguimento às Formas elementares, Durkheim "Nossa inteligência, como nossa atividade, apresenta duas formas muito. diferent es.: um lado, sao sensa- çoes e tcndèncias $ensoriais; por outro, sao 0 pcnsamento conce.tual e a atlVldade moral. Cada uma dessas duas partes de n6s mesmos representa um p610 scparado do !lOSSO ser, e esses d.ois p610s san apenas distintos um do outro, mas também sao opostos um ao out ro. Nossos sensonalS sao neccssariamente egolstas: des têm a !lossa e apenas da, como Quando satisfazemos nossa fome, nossa sede etc., sem colocar em Jogo qualquer outra tendencla, é a n6s mesmos, c apenas a n6s mesmos, que satisfazemos. [0 pensamento conceitualj e a moral, ao contrario, distinguem-se pelo fato de que as regras de condutas às quais estao su}eltos sel" univers:lIizadas. Assim, por definiçao, perseguem fins impessoais. A moral começa com 0 desmteres- se, com a ligaçao com alguém que naD n6s mesmos" (1 960 ( 1914] , p.327; cf. 1951, e Lukes, 1972, 1'.23-4). DaÎs paradigmas da tcaria lZlltrapolOgica 115 mais adiante). Entretant o, como os ( .especificamente a expe- nêncla IOdlvldual. Em vez de arttcularem essa expenêncla, el es se elevam a uma metalinguagem pela quai a experiência é organizada. 40 E uma vez que ascategorias nao sao as particularidades da experi ência, mas antes idéias gerais das particulari - clades (que fazem de uma exper iência uma particularidade), el as nao refietem especificamente a percepçao, mas apropriam-na dentro de um sistema cultural relativo. 41 Finalmente, Durkheim reconhece 0 carater arbitrario do signo direta- mente, como uma conseqüência 16gica da distinçao entre 0 fa to individual e 0 social, exatamente porque a sensaçâo individual é somente um fato transit6rio que 116s. como seres sociais. temos os meios e a liberdade para representar em outros termos: Urna sensaçao, urna irnagem, relaciona-se sempre corn um objeto determinado ou corn uma coleçao de objetos desse tipo c expressa 0 estado momentâneo de uma consciência particular; ela é esscncialmente individual c subjetiva. Por isso, podemos dispor, corn relativa liberdade, das reprcsentaçôes que têm essa origem. Sem duvida, quando nossas sensaçôes sac reais, se impOem a n6s de [ato. Porém, de direito, somos livres 'para concebê-las de modo diferentc do que realmente sâo, de representa-las a n6s como se desenvolvendo em urna ordem difercnte daquet a na quai realmentc se produzirarn. Frente a elas. na.da nos prende, cnquanto nao intervenham considera- çôes de outro tipo [ou seja, sociais). [Durkheim, 1947 (1912), p.14.r 12 40 "De fato, ha um nûmero muito pequeno de pal avras que empregamos normalmente cujo signifi- cado nao ull rapassa, cm maior ou menor medida, os limÎtes da nossa experiência pessoa!. Com muita frequência, um termo expressa coisas que nunca percebemos ou experiências que nunca tivemos ou das quais nunca fomos testemunhas" (Durkheim, 1947 [19121, 1'.434). 41 "0 pensar através de conceitos nao é apenas ver a realidade do seu lado mais geral, mas é projetar uma luz sobre a sensaçao que a ilumina, penetra-la e transforma-la. 0 conceher algo é aprender mclhor seus c1ementos essenciais e tamhém situa-Io cm seu lugar; cada civil izaçao tem seu sistema de conceitos organi zado que também a caracteriza" (ibid., 1'.435). 42 Em outra part e da sua obca, Durkheim escreve sobre a alienaçâo envolvida nessa apropriaçao da experiência individual de uma forma semelhante à que Ma rx aprcsenta nos Manl/s,ritas de 1844: "N6s s6 comprecndemos quando pensamos soh a forma de conceitos. Mas a realidade sensorial n:ïo é fcita para entrar no quadro de conceitos, nem espontaneamente nem por si mesma. El a resiste e, para submetê-Ia, temos de cometer aigu ma violência para com cla, temos de submetê-Ia a todos os ti pos dc operaçoes laooriosas que a alteram de modo que a mente possa assimila-la. No cntapto, nunca somos completa mente bcm-sucedidos ao controIar nossas sensaçôes e ao traduzi-Ias t·otal. mente em termos inteligiveis. Elas s6 tomam forma conceit ual perdendo 0 que ha de mais concreto nelas, aqui lo que as fazem ral ar ao nosso se r sensorial e a comprometê.lo na açâo; desse modo, tornam-se algo ftxo e morto. Portanto, n:io podemos comprecnder as coisas sem renunciar parcial- mente a um sentimento sobre a sua vida, e nao podemos sentir aquela vida sem renunciar à sua compreensao. Sem duvida, às vezes sonhamos corn uma ciência que expresse adequadamcnte tod<l a realidade; isso, porém, é um ideal do quai nos podemos incessantemente aproximar, mas nunca at ingir" (Durkheim, 1960 [1914], p.329). ' l ! f f , r , ( 1. 1 , ,. f 'l , • Cl/IIUnI e razào pra/Îca Portanto, para Durkheim, 0 fato social, acima de toda consc iência coletiva, nao é um simples reconhecimento da circunstância mate rial. A oposiçào a essa recluçao levaria Durkheim, ao menos momentaneamente, além de seu pr6prio reflexioni smo sociol6gico. Da determinaçao do esquema significativo pela morfo- Jogia social, ele passau a uma determinaçao da morfologia social camo significa- tiva, e da si ntaxe significativa coma sui ge/leris: "A sociedade ideal", insistia ele, l "nao se encontra fora da sociedade real; é parte integrant e dela .... Villa socicdade 1. nao é constituîda somente da massa de individuos que a comp6em, 0 chao que ': el es que eles e os que ma.s acima I l de tudo é 'l lde'VIue ela for ma de SI mcsma (1914 [1 9121, p.422). Dlvergmdo do i materialismohist6rico em gestaçao, Durkheim contrap6s "todo um mundo de , sentimentos, idéias e imagens que, uma vez nascidos, obedecem a Ieis pr6prias. Eles se atraem, repelem, unem, dividem e multiplicam, embora essas combinaç6es nao sejam comandadas nem compelidas pelas condiç6es da realidade subjacente" (ibid. , p.424; comparar com as primeiras observaçôes de Labriola, em Lukes, 1972, p.23!). Observem que mesmo dentro da epistemologia sociol6gica surgiu um desvio fundamental na relaçao entre sociedade e natureza que podia afastar qual- quer reflexionismo. A sociedade, DurkJ1eim costumava dizer, abrange os "moldes dentro dos quais é formada a experiência Conseqüentemente, 0 mundo conhecido do homem era um mundo social, preci sa mente nao um reflexo, mas dc dcntro da sociedadc. A do mundo era a narrativa da existência da tribo, exatamente coma 0 espaço geogrâfico podia ser explicado a partir do ponto central de uma aldeia. Os obj etos dessa existência social nao eram simplesmente classi fi cados isomorficamente corn a homem, em correspondência corn as catego- rias de homens, por isso foi dado a el es um Iugar dentro des grupos huma nos. ("Para os australianos, as pr6prias coisas, tudo que existe no universo, sao uma parte da tribo; sao elementos const itutivos dela e, por assim dizer, membros rcgulares dela, e, exatamente camo os homens, elas têm um lugar determinado no esquema geral da organizaçao da sociedade" [Durkheim, 1947 (1912). p.141 ).) Se, camo Durkheim colocava, 0 universo s6 existe na medida em que é pensado, entao ele foi abrangido dentro de uma ordem até mesmo maior; desse modo, ele nao pode mais ser pensado para agir simplesmente de fora, de uma maneira puramen- te natural. A oposiçao 30 marxismo foi exagerada nesse exemplo te6rico. Do mesmo modo que DurkJleim concordaria corn Marx quanto ao reconhecimento l 'Ide que "a homem nao é um ser abstrato, pairando for a do mundo': ambos estào Ide acordo quanta à proposiçao corolarÎa de uma natureza sociali zada ou)h'1mani- J zada. A descr içao feita por Lukâcs é valida para os dois: \'A natureza lé uma , , / categoria social. Issa significa tudo que éconsiderado natural em Ùhl de(ermi nado lestagio de desenvolvimento social ; contudo, essa natureza é relativa 30 homem, e J. tudo que forma seu envolvimento com cie, isto é, a forma da natureza, seu conteu- ! do e sua objetividade sâo todos socialmente condicionados" (1971, p.234) . j Dois paradigllws 1'1/1 tcoria fill/ropo16gica 117 Esse conceito da apropriaçao social da I1Jtureza, da ordem nalural (OIllO ordem moral, con ti nua a info rmar a rnclhor antropologia estrutural, inglesa ou francesa. Ele foi essencÎal ao lrabalho de Radcliffe-Brown sobre a crcnça e 0 .• cerimonial dos andamaneses, assim como aas seU5 estudos de totemismo, tabu c :" reli giao cm geral. Ele também foi dcterrn inante para as iniciativas etnograficJs de Evans-Pritchard e seus alunas, bem como às ana lises mais rceentes de c1assificaçâo de Douglas, Leach, BuJrrier e Tambiah. Além di ssa. reconhece-se nesse problema- mat riz da antropologia social inglesa a mesma "i530 geral da relaçào de costume corn a natureza que distingue Boas de Morgan. Se a funcionalismo inglês reprodu- ziu certo tipo de economicismo, e se 0 exagerou pela transposiçao de uma telcolo- gia utilitâria ao supersujei to social, èsse mesmo rnovimento evitaria a naturalismo vulgar, ou a ecologismo. The Nuer (1940), de Evans-Pritchard, dcsen'lolve lad a a questao na sua const ruçâo, permeando 0 contraste entre as detenninaçôes gcrais da ecologia e a especificidade do sistema de linhagem pelas suas famosas passo. gens , Il sobre a constitui çao social do tempo e do espaço. Mas entao Evan.)-Pritchard ja os 'pOÎ1toS essen'ciaisde uma ecologia cultural em sua obra sobre a bruxaria Zande (1937). Por que, perguntou cIe, pessoas essencia\- mente racionais camo os Azande, sabendo perfeitamente que suas hortas ti nham sida destroçadas par elefantes e suas casas queimadas pela fogo, ainda assirn acusavarn disso seus vizinhos e parentes e ernpreendiam aç6es magicas de defesa e represâlia? A resposta que ele mesmo deu foi que a efeit b socialhâo resulta da causa natural. Embora a fogo passa ter a propri edade de casa, nao é , - propri edade do fogo qucimar a sua casa. A resposta poderia ser encontrada tam- bém especificamente no nivel cultural; nao estâ na natureza do fogo queimar uma .. casa; a fogo s6 queima madeira. Uma vez incorporado ao dOl11lnio huma no, a . açao da natureza nâo é mais um J'nera fato empirico, mas um significado social. E entre a propri edade de 0 [ogo queimar madeira e 0 fato de um homem perder sua propriedade nao existe qualquer relaçào comensurâvel. Nem ha uma resposta comensuravel. POl' nenhuma 16gica natural a açao nl<\gica contra um tipo especi- fico de pessoa é conseqüência do processo de comb us tao. Um fato natural abran- gido pela ordem cultural. se nao cede suas propriedades fîsi cas, nao dita mais suas conseqüências. 0 "resultado" cultural particular nào é qualquer predicado direto da causa natural. Em crit ico, é até mesmo 0 o posto. 'ft epistemologia sociol6gica 2te Durkheim tinha seus limites enquanto teoria { do significado, limites esses, contudo, que parecem estaI' reproduzidos nos melho- :/ res t rabalhos modernos. Nào me refiro ao sentimentali smo da explicaçao de Durkheim do totemismo austral iano, a derivaçao de forma 16gica do afeto inqis- tinta pele quai Lévi-Strauss a censurou - um problema também colocado· ·pelo papel que Durkhei m e Mauss (1963 [1901-2]) emprcstaram à "confusào" na geraçâo de categorias conceituais. Foi antes a diferenciaçao fatal entre morfologia social e representaçâo coletiva - recriada por auteres modernes coma socicdadc • t r r r t. 1 . t_ , .. ' . • • .. .. • .) fi 01 '''',. . .... ___ .... __ .... . .", -.." .... ,., . r"I .. r,., - = ... 11 8 Cl/flLlra e razao prritica (ou sistema social) versus cultura (ou ideologia) - que arbitra ria mente limitou a extensao de simb61ico e deixou 0 campo aberta ao habituai dualismo funcionalis- ta. uA sociedade", escreveu Durkheim. "sup5e uma organizaçào autoconsciente que nada mais é que uma classificaçiio" (194711912 J, p,443). A dificuldade foi que Durkheim derivou as categorias que a sociedade "sllpôe" de sua constituiçâo jâ concretizada, deixando assim a forma da sociedade sem explicaçâo, a nao sec que Cfa "natural': Daî 0 dualismo de estrutura social e conteudo cultural, que conti- I1uamente ameaçava 0 segundo corn uma reduçâo funcional aQS modelos e prop6- sitos utilitarios da primeira. ! 1" Na visâo de Durkheim, como vimos, as noçôes fundamcntais dos ho mens - I {de classe, tempo, numero, etc. - foram dadas, BaO inata ou transcendentalmente, mas na pr6pria organizaçao e açâo da vida social: 1 As primeiras categorias 16gicas foraru categorias sociais; as primeiras classes de coisas foram classes de homens, nas quais as coisas estavam integradas, Foi porque os 1 i homens (otam agrupados, e pensavam em si mesmos sob a forma de grupos, que em : i suas mentes e1es agruparam outras coisas, e no inkio os dois modos de agrupamento I se misturavam ao ponto de serem indistintos, As metades foram os primeiros gêne- 1 ros; os clàs, as primeiras espécies, As coisas cram pensadas coma partes integrantes da sociedade. e foi seu lugar na sociedade que determinou seu lugar na natureza, [Durk- heim e Mauss, 1963 (1901-2), p.82-3; cf. Durkheim, 1947 (1912), p.431-47.} No entanto, as metades sac el as mesmas categorizaçôes (de ho mens), e por isso representam operaçôes mentais das quais eles sao. supostamente. 0 modelo 1"",;"",-. original. Rodney Needham, convincentemente. fez a seguinte objeçâo: J po l a 11 0çao de teve de existir antes de os grupos sociais poderem ser percebidos J para cxibir. cm sua disposiçao, qualqucr relaçao espacial que pudesse entao ser apli- cada ao universoj as categorias de quantidade têm de existir a fim de que uma mente i individual passa ser capaz de rcconhecer uma. muitas e a totalidade de divisoes da sua 1 sociedade; a noçao de classe precede necessariamente a apreensao de que os pr6prios grupos sociais, em concordância corn os quais os fen6menos naturais sac dispostos f em classe. sac c1assificados, Em outras palavras. 0 pr6prio "modelo" social deve ser : percebido para possuir as caracterfsticas que a tornam util na classificaçao de outras coisas. mas isso nao pode ser feito sem as pr6prias categorias que Durkheim e Mauss derivam do modelo ( 1963, p,xxvii ),4 3 43 Durkheim rcecbcu edtieas do mesmo teor do fil6sofo contempon'lOeo D, Parodi, que contestou a idéia de que nossas categarias de eomprecnsao e 16gica derivasscm cm primeiro lugar da "maneira pela quai determinada tribo armara suas tcndas". D. Patodi cscteveu: "Parcee manifesta, ao contrario, ". que a simples cristència de cerimônias ou de trabalhos rcgulat es, que a simples distinçao entre dis e tribos e os seus respectivos lugares no campo pressupoem as categorias 16gicas e s6 sao possivcis m:.. • 'Ift\ '\ "1 • . ;' , Dois paradigmas da tcoria mrtropolOgica J119 t r! Durkhei m formulou uma teor ia sociol6gica da simboli7..açao, t- u:;: U l teoria d3 sociedad:,: A sociedade nao vista constitufda pelo ',>$,. t processo slmb6 hco; ao contrano. s6 0 reverso parecI3 verdadelro, Que dizer enHio f- il: 1Ol . t.!!< dos suporles das categorias, da pr6pria sociedade? 0 problema da sua natureza "' , ,S ... (\ QI tornou-se agudo ao nî vel pois Durkheim tinha t E : de enfrentar a questao de como as categonas denvadas de uma formaçao social f' m ft! particular podiam provar-se adequadas para a compreensâo do mund9' A -. -_ _, cm um sentido, foi ja . .(totlt à coup)) r . .f-l. " ";1 todos os paradoxos do superorganiClsmo de Durkheull, ,,- L sim dizer. cm um superparadoxo que as futuras geraçôes teriam de combater, A resposta a coma as categorias podiam aplicar-se à reza foi que a pr6pria sociedade et:,a natural: ) .-.J ----- ' ......... -... '. -'---_/' " Porém sc as catcgorias nao traduzem originariarncnte nada além de estados sociais, nao deriva dai que elas possam ser aplicadas ao resta da natureza apenas camo rnciâforas? '" Porém. intcrprctar dessa maneira uma teoria sociol6gica do conhecimento é esque- cer que, se a é uma real idadc espcdfica. naD é duvida oum império ,V dentro de um IInpenoj forma parte da natureza. é sua mamfestaçao mais elevad!:l2_ fi ' 1 . s,ociaI é um reine que s6 dos sua mais>r complexidade, .1\ \ \..::rW - ": É por isso que noçoes se elaboraram sobre 0 modela das coisas sociais podem .. 3)udar-nos a pensar as COJsas de outra natureza a idéia exatamente oposta dvo de Lévi-Strauss do "chamado totemismo''J. Ao menos, sem duvida, quando elas se . desviam da sua significaçao primeira, essas noçôes descmpenham, em um senti do. 0 t!L papel de trata-se de simbolos bem fundamentados, Se, pela fato mesmo de - que sâo conceilos construfdos·. entra neles a artificialidadc. é uma artificialidade que segue de perto a natureza e que se esforça par se aproximar dela cada vez mais, IDurkheim, 1947 (1912), p.18-9.} yale a pena nessa recuperaçao da sociedade pela natureza, ou n_a do de,outras contradiç?es melhor compreen- saD do que DurkheIm apresenta aqu J. Basta mdlca r certas conseqüên- cias da distinçao -entre eStrutura social e conceito mental coma realizadas em uma a,ntropologia posterior, A incompleta do sfmbolo. isto é, como ... - .... - sun pies representaçao de realidades continua a perseguir 0 funcionalismo est rutural desenvolvido por Radcliffe-Brown e outros em uma base durkheimia- na,44 0 "simb6li co" foi. na maior parte dos casos, tomado no sentido secundârio gruças à intervençào anterior dOlS idéias de tempo, espaça e causalidade" (1919, p,155ss,). Gostaria de ugradecer a Mark Franci!lon por chamar minha atençào para cssa passagem e para esse livro. 44 Jamesoll atriblli, qllase à maneira de VVhorf, ao reflexo representacional na ciência social anglo- amcricana a prcferéncia pelo termo "simbolo" em oposiçiio à utilizaçiio (rancesa de "signo", e a tendência dM resultante de se relacionarem os termos em \llll sistema scmi6tico cujos principios de " -u '"' c ... .. , . • 1 "1 -:! ... .. ... -i ,,*,,.1 -, -, ,. , _i .. , 120 Cllttura c raziio prtftica c derivalivo de uma moda lidade ideal do fato social, uma expressao articulada da sociedade, tend.o a funçao de apoio para rclacÎonamentos farmadas por processos ., " , t polîticos e econôl-qicos reais. cfcito é dada pela arbitnl ria diferenciaçào J entre "cultura" e dsistema social" na escola inglesa, como se as relaçôes sociais também nac fosse m compostas e organizadas pela significado. Na realidade, à mcdida que 0 significado é considerado como 0 mera "conteudo cultural" de relacionamentos cuja estrulura formai é a preocupaçao verdadeira, 0 simb61ico é simplesmente uma condiçao variavcl ou acidental do objeta antropol6gico. cm vez de sua propr iedade defi nidora. Mesmo os trabalhos mais valiosos sobre a conceitualizaçâo da natureza, 0 de Mary Douglas, por exemplo, tendem a trocar 0 valor scmântico das categorias pelos se us efeitos sociais. Em termos mais precisos, um tende a ser identificado corn 0 outre - conteudo significativo corn valor (no sentido dado ppr uma ifàaiçao-que"toma como certo que 0 pensamento huma no serve aos interesses humanos e, consc- "j qüentemente, traz consigo mesmo, cm qualqucr momento, as configuraç6es so- . ciais daquele tempo e lugar" (Dc:Jglas, 1973b, p. 11 ). 0 efeito disso é uma visao unilateral do significado como diacritica social, e da ordem cultural total como um projeto utilitario. .,....--... Reconhecendo dai doutrinas epistemol6gicas de As formas elemetlta- res da vida religiosa, Douglas promove a adoraçao de Terminus, 0 deus dos marcos fronteiriços. Para eIa, a ordenaçao da natureza é uma objetificaçao, ou melhor, uma expressâo nas regras para lidar corn os objetos, da diferenciaçao dos grupos r __ ,,-_·1 . î Jhumanos. 0 significado é coerentemcnte sacrificado à marcaçao social. Os c6di- ".- . ... culturais de pessoas e objetas, como as correspondências entre eles, sac consu- ':::. J) 1 midos em implicaç6es abstratas de inclusao e exclusâo. Pois no projeto te6r Îco . l ' j total,o sîmbolo nao é mais que um signo que nao é gerativo de significância em virtude do scu lugal' em um sistema de simbolos, mas empiricamente motivada !a 1 t: (f'l ,! por realidades sociai s existcnt es, as quais, coma os "interesses humanos" que se d f" sup6e constituf- las, fogen\ a qualquer explicaçao sÎgnifi cativa. 45 Mas, en tao, nao se . n ':.., 0 ' ) ,j.z. . diferenciaçao ordcnariam a referênCÎ a objctiva. A diferc nça de predi leçôes analiticas pareee rcal, rncsmo se a expllcaçao nac for inteiramente convÎncente (accitando-se 0 USQ corrente do (rancrs da palavra signe): " 3 etidcia da terminologia anglo-americana, da palavra 'sim1>olo', é a de di ri gir nossa atençaÇ! para 0 relacionamento entre as palavras e scus objctos ou refcrcnt cs no mundo Tcal. Na realidade, a pr6pria palavrn '51I11bolo' implica que a rcl açao entre patavra t,coisa J.1li.q s_cja totalme'!!.c que exista alguma adcquaçao basica na situaçâo ini cial. Aconlece que, desse ponto de vista, a tàref:rmais importa nte de in\'cstigaçao lingüist ica consiste cm uma busca de referent es, frase por fr ase, uma a,uma ... Saussure, por outra lado, dcsviou·sc, devido à sua pr6pria terminologia, de Ioda a quesU'io dos referentes tiltimos do signa lingülstico. As linhas de Irajct6ri a do seu sistema sac laterais, de lin signo outro, ein vez de front ais, da pabv!"a à {eoria. um movirnenlo ja absorvido e interiorizado no pr6prio signa coma a ll1ovimento do signifi canle ao significado" (Jameson, 1972. p.3I·2). 45 "Se fossemos Deus, poderi amos 1er imaginado um pIano melhor? Se quiséssemos cscalher um pava para n6s mesmos, revclar-lhe Ul1l l yisào l1l onoteistica e dar-Ihe um conceito de santidade que ii . HilL L 1 I H . ---_.---- . _ , Dois paradigmas da tcoria alltropo/6gica 121 poderi a esperar que a 16gica simb6lica fosse mais sistematica que «as maneiras incorretas pelas quais as pessoas usam a 16gica para lidarem umas corn as outras" (Douglas, 1973a, pAl). Pelo lado dos objetos e das essa rcduçao, ! simb6lica envolve um esvaziamento progressivo € uma des-'i consideraçâo para corn a sua estrutura em favor de propri edades puramentell· formais de distinçao e categorizaçao. Vma discussâo do significado corn a particularmente voltada para a diacritica social permite - apenas parcialmente - a liberdade analitica para considerar 0 que é simbolicamente variavel e proble- matico - digamos, uma divisao tripartida de espécies entre terra, céu e agna - como a priori e normal. 0 mais importante é que, de um modo paralelo ao , dualismo 16gica em sG'--- mesma, assim como sua ordem verdadeira é ul1l _refle?o:9 dos grupos .e r social: _Antes de serern Iistados para os prop6sitos .de · , d iferenciaçao de grupa, os elementas de um c6digo de objeto, tais como diferenças alimentares, possuem apenas a coerência de um "fluxo arnbiente de simbolos" (Douglas, 1971, p.69). Entretanto, ap6s esse processo pelo quai sao selecionados t . do "meio ambiente cultural" e assim classifi cados e inter-relacionados, eles nao estao realmente em melhor condiçao semântica, uma vez que seu signi ficado nao é mais que a intençâo social dirigente. "Se a comida é tratada COlüO um c6digo", escreve Douglas, «as mensagens que ela codifica serao encontradas no padrâo de relaçôes sociais que estao sendo exp cessas. A. mensagem trata de diferentes graus de hierarquia, de inclusâo·e exclusao, de fr'onteiras e transaç6es através das fron- teiras ... As categorias de comida, por conseguinte, codificarn eventos sociais" (ibid., p.61). Do mesmo modo, nào sao os aspectes contrastantes de espécies liminares que merecem atençâo, possibilitando portanto uma discussâo da ma- neira pela quai 0 mundo é culturalmente construfdo em relaçao aos homens, mas apenas mais abstratamente se a espécie é olhada cam benevolência, ma vontade ou ambivalência, visto que isso pode sec comparado às relaç6es entre grupos, contan- to que um deles esteja preparado para definir essas relaçôes corn 0 rnesmo grau de indeterminaçao. E observcm que ao prestar-se a ess'e empobrecimento, 0 social também deve sofrer uma decomposiçâo est rutural. Um exemplo apropriado disso é a tentativa de Douglas de correlacionar a consideraçao atribuida a espécies sent isse em sua pr6pria carne, que fadamos? Prometer a seus descendentes uma terra fér lil e ce rca· la de impérios ini migos. Isso, par si mesmo. seria quase a suficiente. Vma cadcia politîcamente ascen- dente asseguraria a hostili dade crcscentc de se us vizinhos. Sua desconfiança dos estranhos seria validada ainda mais completamente. Fiel ao nosso santuario e à nossa lei, ser-l he· ia evidente que nenhuma irnagem de animal, nem mesmo um bezerra, nem que fosse de ouro. poderia relratar seu deus 1 ou scia, na medida em que um grupo humano que se concebe coma uma espécie di sl.inta deve ver 0 resta do mundo coma composto desse modo, cie seria 1110 pouco capaz de acei tar uma divindade beneficente sob forma extra-humana quanta de acolher um genro nao-judeuJ" (Douglas, 1973a, pAO). • .. 1 :1 .j ij J 122 CrI/film c razao pnfti ca anômalas corn tipas de tracas matrimoniais, na medida em que as varias regras- como 2 da troca gcneralizada, as exclusôes Crow-Omaha, ou 0 casamento da filha do irmao do pai - situariam a pessoa intercalada, isto é, 0 afim. Douglas 56 chega a essa correlaçao entre a consideraçao para corn 0 afim e as relaçàes corn as espécies intersticiais através de uma operaçao dupla na estrutura de troca que a dissolve (às vezes falsamente) em uro coeficiente de integraçao entre grupos. Primeiramentc, Douglas prefere ignorar as armaduras espedficas e bem-conheci- das das relaçôes intergrupais, as varias formas de ordem intergrupal, coma sac geradas por regras de troca marital elementares e complexas. Em segundo lugar, ela traduz essas regras e formas determinadas em implicaç5es de distância social, nao considerando mais uma vez as régras, mas sim invocando praticas de facto que Ihe permitem ignora-l as {as regras}. Argumenta, par exempla, que vista que se padern casar membros c1assificat6rios das categorias preferenciais de parentesco, as estruturas elernentares (inc1uindo a forma LeIe da troca generalizada perm item uma incorporaçao mais radical de estranhos do que.as_p_roibiçôe.s Crow-Omaha (que proîbem a repetiçâo de inter\aSamentos corn as Em 1 suma, a anâlise de Douglas ,dé o·s- signifj.cados constituidos" (1973a, , p.31) tende a tornar-se um feichismo ae--sociabj@ je, similar . .ao-{çoI6gico, por , substituir os efeitos sociais abstratos por forrn conceituais espedficas, sendo estas t'i ltimas tratadas coma dos primeiros, corn 0 resultado sernelhante de dissolver 16gicas estruturais definidas em interesses funcionai s , incipientes. '-1 Nao quero corn isso negar 0 sentido apurado que Douglas demonstra corn i relaçao à construçao humana da experiência. E menos ainda negar a impor tância crftica das correspondências estabelecidas nas sociedades hurnanas entre catego- rias de pessoas e: categarias de coisas, ou entre as respectivas diferenciaçôes dessas taxonomias. Desejo apenas sugerir as limitaçôes de uma anâlise que almeja fazer desmoronar a estrutura coocei.tuaI de um c6digo de objetos em uma mensagem funcional, como se as coisas culturais fossem versôes substanciali- zadas de solidariedades sociais, sendo estas entendidas aqui como privilegiadas e 46 De Corma seme!hante, Douglas nem sempre é cuidadosa cm seus estudos de diferentes culturas ao comparar "grupos" ou processos de diferenciaçao da mesma ordem. Assim, a excl usivi dade social dos israelitas como povo é comparada às relaçOes entre linhagens Karam ou Leie, embora a implicaçao do casamento da filha do irmao do pai entre os judeus, entendida par Doug!as coma uma indicaçao de desprezo pela estranho, dividiria. igualmente, linhagem minima por linhagem mi nima dentro da mesma tribo israelita (cC. Douglas. 1973a) . Mais uma vez se coloca a questao da pretensa conexao entre os afins e as espécies anômalas, através de estudos que Dougl as prefere ignorar: Leach (1964) sobre os camponeses Kachin e Tambiah (1967) sobre os carnponeses Thai. Nesscs exemplos, a categoria da afinidade é identifid.\'c1 corn um conjuntode animais normalmente constituido, baseada em uma l6gica de grau de distAncia do Jar, e portanto da domesticidade das espécies. Inversamente, as espécies anôma!as na Polinésia sao muitas vezes identificadas especificamente corn as suas pr6prias linhagens ancestrais, como no aI/makI/a havaiano (cf. Kamakau, 1964). ,. , ... Dois paradigmos da tcoria all tropol6gica 123 praticas. 47 Desse modo, no final, a verdadeira 16gica do todo soci ocultural é taria. Este é 0 resultado da adesào à decisiva separaçao durkheimiana da morfolo- tl gia social da representaçào - - .- A recusa deffil-Strauss de conferir status ontoI6gico a essa di stînçâo, por outra lado - sua apropr iaçao do social pel a simb61ico - foi um passa decisivo no desenvolvimento de uma teoria cultura1. 48 n bem verdade que essa recusa nào desvinculou inteiramente 0 trabalho de Lévi-Strauss das preocupaçôes fun cio na- listas (cf. Baon e Schneider, 1974), mas ao menas concedeu menos espaças para essa preocupaçào atuar, evi tando todo e qualquer reducionismo na rel açào entre sociedade e ideologia. Também é verdade que ao levar a em.presa durkheimiana a uma conclusào consistente incluindo as rel açôes sociais dentro Il do sistema geral de coletivas, chega, no processo, a observar lllcluslVe um aparente fechamento do clrculo da insistência de Morgan de que 0 crescimento das instituiçôes estava predeterml- nado e limitado pela "16gica naturai da mente humana" a uma analise estrutura- lista cuja coda é composta por uma frase semelhante (Lévi-Strauss, 1971; 1972). Mas 0 curso desse processo foi mais uma espiral do que um circula, uma vez que ,1'-"'-"- toda a apropriaçao do simb6lico intervém eH route; como jâ vÎmos, seria um erro equiparar a invocaçao da mente de Lévi-Strauss ao "princîpio de pensamento" de Morgan, que nao podia senao limitar-se a reagir racionalmente a val ores pragmâ- ticos inerentes à experiência. "0 homem nunca pode sel' imediatamente confren- . . d ..., fi r ! 47 utra Corma de pensar essas Iimitaç6es é observar que Douglas esta }ogan 0 pnnclpd.lmente 1 . ' • , açôcs motÎvadas entre sfrnbolos, assim a definiçao do signÎfi cado de um pela i - . outro (a . 3.0) fara necessari amente corn que a maior parte do eonleudo cultural se evapore.' O oug as esta realmente preocupada com 0 fundonamento de e1ementos j a simb6licos (relaçoes corn f :'fY,·.· .- afins, linhagens, conceitos de animais, labus a!imentkios etc.) como signos uns para 'os outros - ' usando agora "slmbolo" e "signo" no sentido anglo·americano costumeiro (na verdade, a maior parte r;. : .: . ij dos estudos antropol6gicos endereçados ao "simb6Iico" estao mais preocupados corn essa funçao de 1 segunda ordem do signo do que corn a constituiçao da forma e sim.b6Iicos). to, como aponta Roland Barthes, uma importante caracterlstICa do Slgno motJvado lem frances, symbole], cm contraste corn 0 nao· motivado, é que no primeiro' nao existe qua!quer adequaçao conceitual entre signifi cante e significado: 0 conceito "ultrapassa" 0 signo fisico, por exernplo, como a cristandade é maior que a cruz (1970 [ 19641, p.38). J: fkil constatar, portanto, que q U3 i1do 0 significante e 0 significado, em mTIa relaçâo de signo motivada, sao slmbolos pa r dircito mlto, essa inadequaçao é composta duplamente. Dada a relaçao logiea entre e1es, cada um dos e!ementos, como por exemplo no caso dos tabus ali mentarcs e dos grupos sodais exclusivos, pade agi ralternadamente, ara como sigoificante ora camo significado do outra. No cntaoto, cada um continua sendo, além do signo do outro, simbolo no seu pr6prio dominio. Conseqüentemenle, é muito difidl sc exaurir 0 ,. significado de um pela analagia (Cracîonaria) corn 0 outro. A amilise semi6 ti ca das praticas res deve transcender de longe a transCerência aos grupos sociais, e vice· versa. 48 "Lévi-St rauss Coi bem-succdido porque nao olhou os fatos culturais como expressoes, de algum modo, de Corças sociais; ao contrario, ambos roram analisados dcntro de um unico qU:ldro de referência" (Kupcr, 1973 p.223) . • < 124 CI/Ill/ra e raziio puitÎca tado ccm a natureza da maneifa pela quaI 0 materialismo vulgar e 0 sensualismo empirico a concebem': escreve Lévi -Strauss. Seu apelo ao esprit humain, entao, nâo provocaria curto-circuÎto no simb6lico, mas antes arcaria ca m as conseqüên- cias de sua pr6pria ubiqüidade. 0 argumenta se desenvolve com base na simples prernissa de que, na medida cm que 0 mundo humano é simbolicamente consti - tUldo, quaisquer similaridades nas operaç5es pelas quais os diferentes grupos constroem ou transformam seu projeto cultural padern sec atribuidas à maneira pela quaI a pr6pria mente é construida. Segundo a mesma premiss3, as "similari- clades" nâo padern aqui significaro contcudo daquele projeta. mas apenas 0 modo de ordenaçao. Nunca é uma questao de significados especfficos, que cada grupo executa por sua pr6pria iniciat ivl, mas a maneira em que os signifi cados sâo sistematicamente relacionados .que, em formas do tipo "oposiçâo bimiria", pode ser observada como gerais. Conseqüenlemente, também nâo se trata de uma t:-':', .... .... questâo de "reducionismo biol6gico", um encargo que, no contexto da mente, uma discussâo da cuttura 'poderia igualmente provocar. Nenhum costume part i· cular podera ser atribuido à natureza da mente hurnana) pela dupla razao de que em sua particularidade cultural ela esta para a mente como uma diferença esta : para uma constante e uma pratica para uma matriz. Ô , estruturas conJ'!nto ilradas"t 1971, p. 561).\' Portanto, 0 objeto cultural, na sua integndade slmb6liëa, inteira e exclusivamente dentro da esfera da interpretaçao signifi cati- va. Apenas os pontos comuns da estruturaçao podem ser referenciados à mente, incluindo especifi camente os sentidos e a· transmissao sensori al, que parecem F ,... ... "...- operar por prindpios similares ao contraste binario (cf. Lévi-Strauss, 1971). Para alérn disso instaura-se 0 mais alto naturalismo, no .qual Lévj·Strauss une-se a e a Durkheim d,? seu método pr6prio de Iigar e natureza, ou 1· seJa, 0 de que, na medlda em que a natureza usa, na st.:'a pr6pna construçao, 0 l t mesmo tipo de processos - por exemplo, 0 c6digo genético, a estereoquimica de 49 Nessa passagem de L'Homme 1/11, Lévi-Strauss emprega uma frase de Piaget - baseada, ao que me parece, em um estrutul'alismo falho de compreensilo cultural (Piaget, 1971) - como uma crHica nitida a varios reducionismos biol6gicos. Piaget observou, corn efeito, que toda fo rma é um conteudo relativo à sua forma circundante, assim coma todo conteudo é uma forma dos conteudos que ele abarca. 0 projeta do redueionismo. prossegue Lévi-Strauss. é 0 de explicar um tipo de ordem referindo-se a um conteudo que nao é da mesma natureza e que age sobre ele a partir de fora. "Vm estrut uralismo autêntico. ao contrario. procura aci ma de tudo apreender (saisir) as propriedades int rinsecas de cert os ti pos de ordens. Essas propricdades li do expresjam Nada do que esra fora de si mcsmas {grifo meuJ. Mas se é forçado a referi-las a algo n'terno, sera necessâri o vohar-se no sentido da organizaçao cerebral, concebida coma uma rede da quai as mais diversas ideologias. interprctando esta ou aque1a propriedade nos termos de uma estrutura parlicular, reveJ:lm, da sua pr6pria maneÎ ra, os modos de inlereonexao" (1971 , p.561). Dois /Ulnldig/luu da Icoria alllropolôgicn 125 , odores _ que a mente emprega para ha uma cumPlîci-l\ l 0 dade ultima que é a condiçao da posSlblhdade de compreensao. ! 1..' Pareceria, con tu do, que 0 problcma principal do "reducionisdmo d " aOige ' '. - .I;/': constantemente 0 cstruturali smo moderne consiste em um 1110 0 e Iscurso 'r. 'K'''''' que, dando à mente todos os poderes da "lei" e da acabou por a cultura em uma posiçao de submi ssao e dependencla. Todo 0 vocabulano das leis "subjacentes" à mente confere toda força de coerçao 30 lado 0 cultural pode apenas responder, como se 0 primeiro fosse 0 clemento allvO e_ 0 segundo apenas passivo. Talvez fosse melhor dizer que as cstruturas da m:nte --fiï.ê-Il0S-0S-iinperativos da 'cultura do que se us impIe.mentos. compoem um conjunto de possibilidades organi zacionais à disposlçao do pro)eto .cultural hu- mano, projeto, no entanto, que governa seu entrosamen to de ac?rdo a su.a natureza exatamente como governa seu investimento cam conteudos slgOlficatl - Y: :,. ...'" ;.J .. ;'11 \);; l -:: (1 //f vos dive: sos. Como explicar a presença na cultura de estruturas universais F, em url! hdar ,., de um superorganismo, cont radlçoes de "consciência coletiva", "representaçao,coletlva ou pensamento ob)etlficado que atribu,em a uma entidade socia.I'uma funçao.que n6s îndividual? Para responder a todasns questôes des se tlpO, sera necessano 0 mental humano anteS como instrumento do que como determman-· lêCa cultu ra. - -_:--; .. ---Nâ realirlade, nosafastamos muito do "prindpio de pensamento" d: Morgan. Porém. ai nda falta fazer a crHica especifica da posiçao morganiana connda da perspectiva estruturalista. Eu ilustraria essa lançando mao do notavel trabalho de Lucien Sebag, Marxisme et structuralrsme, onde se pode uma tese que também é essenciamente de Boas. 0 olho que vê conslderado em sua particularidade cultural. :Ë impossivel denvar 0 dlretamente da ou-dô-acoi1teèimento. na medida cm que a pratlca se cm um 50 "A nalurela aparece cada vez mais como construfda de propriedades mais ricas, embora nao diferentes em espécie dos c6digos est ruturais nO_5 quais 0 slstcma as interprcta. nem das propriedades estrut urais elaboradas pela compreensao a fim de voltar, na medlda do posslvel, às estruturas originais da rcalidade. Reconhccer que apenas a mente der 0 ll111ndo que nos ccrea porque da. em si mesma, é parte c produto dest e mesmo mundo nao signifiea sel' mcnlalista ou ideali sta. POl' conseguinte, a mcnte,enquant o tent a 0 mllnd7,: 1 : s6 apliea operaçôcs que nao difcrem em espécie daquelas que ocorr:m pr61: rLO mundo ; (Lévi-Strauss 1972 p.14) . Lévi-Strauss vê css:! perspecti va como 0 UI1I CO tlpo de 1 ', consistente c;m a pela quai a ciéncia se desenvolve" E ela é total mente conSlS,tente 1 \ cam a vis3.o de Marx: UA pr6pria Hist6ria é lima parte real da Iusfona lUlli/ rai: da natureza gue \em a ser homem. As ciências naturais chegarao a incluir a ciència do mesma forma que a ciência do homem induira as ciências da natureza; havera ruila s6 cl:ncla (Marx, 1961 ! l 84.4 j, p.lll ). Ver às p.269-73 algumas tentati vas de uma integraçao substanclal de estruturas cullurals C perceptivas. ,. .. ';. j '.' l .,' .. ' . '. • 1 (.. 1 \:t .; t ...... « .' , 126 Cu/lZlra e raziio prtitic(/ : , f}". 'b (:.1 0 ' mundo jâ simbolizado; assim, a mesmo quando ela se depara com , 'C. uma realidade externa à Iinguagcm' p,or meio da quai é compreendida, é construi- " da coma uma realidade humana pelo:conceitodela (cf. Berger e Luckmann, 1967). f '.. Ci} .• ·;"·\ A tese nao é mais que uma deduçao imediata da natureza do pensamento simbo- ,,'V"" li.co'Fi? signi fi cado é sem pre em relaçao às propriedades fisicas 't\ " .-.J '. por con seguin te, em primeiro lugar, a um côdigo distinçôes pr6prio à cultura em quéstao. Scbag desenvolve a idéia no contexto . _da alternativa marxÎsta corrente, que, objeta ele: . ... remete a totalidade das significaç6cs ao sujeito em fornccer, entrelanto, os meios de tematizar efetivamente essa constitui çào de sentido, É cm direçao a essa tematizaçâo que tendem as distinç6es que retomamos depois de outras; elas excluem a possibilidade de uma gênese hist6rica ou l6gica da sociedade em seu conjunto a partir da praxis constitutiva dos indivfduos e dos grupos, pois essa prâx.is se desenvolvc em um universo ja simbolizado e nao é concebivel qualquer surgimento anterior dessa simbolizaçao. {1964, p.142.1 lEm francês 00 original.] Mas seus comentârios sobre a experiência da natureza também sac direta- mente relevantes para a antropologia convencional da praxis: A ioterferência entre natureza e cultura nao provém entao da sua colocaçao em relaçao extrînseca, mas de uma culturalizaçao da realidade naturaI. A natureza torna- se cultura nao em razao da existêncïa de um sistema de equivalências que faria corresponder a cada unidade de mn dominio uma unidade emprestada a um outra domfnio,51 mas através da integraçao de certo numero de elementos naturais a um tipo de ordem que caracteriza a cultura. Ora, essa caracterfstica é pr6pria de todo sistema simb6lico e mais profundamcntc de todo discurso, desde que a mensagem que eJe veicule 'suponha urna codificaçao suplemcntar em relaçao à da lingua; da pode ser definida como se segue: utilizaçao de uma matéria retirada de outre registra que nao este onde funciona 0 sistema, matéria que pode ser natural (cores. sons, gestos etc,) ou cultural (a fornecida par sistemas semiol6gicos jâ construfdos) e aplicaçao a essa matéria que é ordenada em si mes ma de um prîncfpio de oTganizaçao que Ihe scja transcendente. ! 0 arbit rario do signa, resmtado da associaçâo de dois planas distintos do real. 1 en contra-se reduplicado pela integraçao de cada unidade significante (integraçao que 1 é a pr6pria lei dessa associaçao) em um sistema difcTenciado que permitc 0 surgimen- 1) to do efeito de sentido. 1 Ibid., p. l 07 -8.1 lEm fTancés no original. 1 5! Compare-se corn Rappaport (1967), que encontra oculto no "meio ambientc apropriado concei. tualmcntc" c nas praticas rituais da sociedade a maior sabedoria biol6gica da adaptaçao. As distinçoes da natureza reaparccem portanto na traduçao cultural, sen do a segunda apcnas um mcio de forçar uma aderência às primeiras (cf. Friedman. 1974). - --_. _- _ .. _--'. -- , Dois p(/radigmas da leori(/ antropo16gica 127 As ressonâncias da primeira viagem de Boas aos esquÎm6s aparecem clara- mente no texto de Sebag. Mais que uma pratica ou interesse "econômico", a sociedade comporta significados desenvolvidos por toda a ordem culturaL Para os homens, nâo pode haver qualquer interesse ou sign ificância prâticos nos objetos de consumo, tal como é caracterîstico nos animais, cuja relaçâo corn 0 objeto é prccisamente confinada às coisas como elas sâo: A Fecutldidade da geografia huma na, sem duvida, nunca é tao grande quanto a possibilidade que ela tem de estudar como, a partir de condiç6es naturais globalmen- te idênticas, certas sociedades do mesmo tipo organizam 0 espaça, 0 cielo de ativida- des produtivas, a preparaçao do terreno, os ritmos de utilizaçao do solo etc. Os determinismos entrevistos sao de uma ordem diferente da daqucles que impôe 0 meio; cada sociedade poderia ter feito a mesma escolha que a vizinha e nao a fez por motivos que sac 0 signa de seus objetivos essenciais. entao cm que sentido a noçao de infra-estrutura pode encontrar um sentido relativo: trata-se sempre do limite do espîrito, do que é irredutiv€l a certo nivel de funcionamento da socîedade. A criaçao de detcrminada espécie de animais, a pratica de determinado tipo de cultura sao 0 produto de um trabalho permanente do to que sc exerce sobre um certo meio natural; a fabricaçao de Înstrumentos, 0 ! . Iho da terra, a utilizaçao ordenada e regular do universo animal supôem grande ,\ quant idade de observaçôes, de pesquisas, de analises que nao podern, de modo l i l ' j gum, ser !evadas a termo de maneira"Cragmentada; €las s6 tomam forma através da 1 mediaçao de .de mais vasto que ultrapassa 0 pIano um carMer malS natural do q e qualqucr outro aspecto da cmtura de uma sociedade. tecnol6glco ou SimPlesmeOfleCOri.ômiCO. Nesse sentido, estes Ultimos nao possuem \) [Sebag, 1964,p 216.J l,' Ao confrontar os ultimos desdobramentos do estruturalismo corn Morgan e i\ Boas, tentei mostrar a continu{dade da luta da antropologia contra seu pr6prio I l que é também, poç assim dizer, uma luta contra sua pr6pria natureza bItturai herdada. Mas a passive) relaçao que essa paroquial controvérsia passa ter Il l . 1" 6 . \ com 0 marxismo requer outro capltu 0 llltelro: 0 pr XIffiO. !' il li 1 '1 1 1 , ,:1 , ,,' '" '. • '" " .., "' "t " " .. , " " " 62 Cu/furc< e f «ZaO pra/Ica Dois paradigmas da Icoria alltropol6gica 63 , sistema instrum en t.al ; no segund o, 0 instrumental se encontra sujeito a sistemas de uma outra espécie. A relevância dessa controvérsia provinciana para a invocaçao da prâxis de ca da. As determinaçôes gerais da praxis estào sujeitas às formulaçôes espedficas da cul tura, isto é, de uma ordem que goza, por suas propriedades de sistema sîmb6 li co, de uma autonomia fundamental. Marx é patente, muita embora, como veremos, a posiçao de Marx nao possa seT simplesmente assimilada ao materialismo empirista reconhecido na antropologia. É através de uma versao moderada do marxismo, "senao do pr6prio Marx", que Lévi-Strauss apresenta muita resumidamente sua pr6pria perspectiva: 1 Se afirmamos que 0 esqucma conceitual comanda c define as prâticas, é porque estas, objcto de cstudo do ctn6logo, sob a forma de realidades discretas, localizadas no tempo e no espaça c dîstintivas de gêneras de vida e de formas de civilizaçao, nao se confundem corn a prâxis que - neste ponta, ao men os, estamos de acordo cam Sartre - constitui para as ciências do homem a totalidade fundamental. 0 marxismo, senao a proprio Marx, racl~cinou muitas vezes como se as praticas decorressem imediatamente da prâxis. Sem pôr em dûvida 0 incontestavel primado das infra-cstruturas, cremos que entre praxis e prâticas se intercala sempre um mediador, que é 0 esqucma conceitual, par ob ra do quaI uma matéria e uma forma, desprovidas ambas de existência indcpendente, realizam -se coma estruturas, isto é, camo seres, ao mesmo tempo empfricos e inteligiveis. [1966, p.130-1 .] Morgan Lévi-Strauss continua, explicando Itividades complementar.es: 0 contraste coma se fosse uma questào de .t para esta tearia das superestruturas, mal e mal esboçada par Marx, que desejamos contribuir, reservando à hist6ria - assistida pela demografia, pela tecnologia, pela geografia hist6rica c pela etl1agrafia - a cuidado de desenvolver a estudo das infraestruturas propriarncntc ditas; que nao pode ser principalmente de nossa responsabilidadc, porque a etnologia é, antes de mais nada, uma psicologia. [Ibid. ) A seriedade da crîtica de Lévi-Strauss se apresenta assim dissimulada por esta modesta renûncia. Talvcz cIe esteja cedendo uma parte muito grande da sua ciência. Se 0 esquema conceitual abrange a matéria nos termos de uma existência humana, ele nao vern ao cenario da açâo pra.tica apenas para acrescentar a interpretaçào apropriada de fatos materiais ou das relaçôes instrumentais. Nem a de codificaçao do esquema seria confinada à "superestrutura'~ Esse esquema é a pr6pria organizaçâo da produçào material; ao analisa.-Io, encontramo-nos na pr6~ pria base econômica. Sua presença ai dissolve as antinomias classicas de infra-estrutura e superestrutura, uma "material" a outra "conceitual': Ë clara que ela nâo dissolve 0 "material" enquanto tal. Mas as chamadas causas materiais devem ser, enquanto tais, a produlo de um sistema simb61ico cujo canüer cabc a n6s investi gar, pois sem a mediaçâo desse esquema cultural nenhuma relaçào adequada entre uma dada condiçào matcrial e uma determinada forma cultural po de ser especifi - As questôes envolvidas na opçao entre a 16gica pratîca e a significativa travaram, coma ja disse, em dezenas de campos de batalha, cern anos de guerra antropo16gica. Uma reflexào sobre essa hist6ria nos ajudara a clarificar essas quest6cs. Devo advcrtir, porérn, que a excursao sera uma historia "para n6s" - uma forma de tomarmos consciência de n6s mcsmos na hist6ria - sem qualquer pretensao ao status de uma "verdadeira" abordagem diacrônica. Nesse sentido, estabeleço os contrastes entre Lewis Henry Morgan e Franz Boas como uma oposiçao paradigmatica, sem referência às outras figuras do contexto intelectual da época, cujas influências foraru seguramente crfticas para a controvérsia personificada nos dois. Mais uma vez, deixo de lado ou teço consideraç6es sumarias sobre um grande nûmero de pensadores sérios dos ultimos tempos, tanto cm antropologia quanto em disciplinas correlatas, que outras poderiam julgar mais importantes e exemplificadorcs. Talvez esse tratamento cavalheiresco possa ser desculpado por atri buÎ-Io a uma hist6ria corn a quaI os antrop610gos j:i se familiarizaram: uma versao do passa do como ele é realmente 'vivido por um segmento da sociedade, camo 0 .mapa da sua condiçao presente (ver Pouillon, 1975) . Começo por Morgan, mas jâ me antecipo em dizer que a escolha pode ter sido, de certa forma, equÎvoca. Camo todo [undador, 0 pensamento de Morgan tende a ser mais generalizado do que os pontos de vista que divergiram dele, contendo dentro de si os "germes" de quase toda posiçâo posterior. Isso significa que a homem pode ser submetido a muitas leituras te6ri~as, sendo que q1,lalquer uma delas, precisamentc por se tornar uro mapa para a presente discussao, po de sec culpada de desrespeitar a generalidade original. Assim, Morgan foi categoriza ~ do pelos mcios acadêmicos mais recentes camo "idealista", devido à sua ênfase no desdobramento dos "germes [originais] do pensamento"j coma materialista, por firmar a evoluçâ.o socia l sobre 0 desenvolvimento das artes de subsistência; e ainda camo "dualista filos6fico': por sua dependência simultânea de ambos. Por ter feito uma alusâo à "16gica natural da mente", alguns 0 consideravam um "mentalista", enquanto outros 0 acusavam de "racismo" por ter referenciado a cultura ao organismo (incluindo a famosa transmissâ.o de habitos "através do sangue"). Sem pretender resolver todas essas questôes, acho que é importante nao confundir uma certa semelhança da terminologia de Morgan corn 0 discurso do moderno estruturalismo, isto é, a invocaçâo dos germes originais do pensamento, desdobrando-se em resposta aos desejos e n~cessidades humanos, mas de acordo.com a :s ç ~. 0 ri r "" ~ ~ ~ " 1 64 CI/III/ra c razilo prritica Dois paradigfltQ$ da tcoria antropol6gica 65 "J6giea nalueal da mente': A m ente aparct:e Il:1 teo ria de Morga n m ais como 0 instrumenta do dcse nvolvimento cul tural do que como se u au tor (cf. Terray, 1972 ). Mais passiva q ue ativa, simplcsmc nte rac io nal cm vez de sim b61ica, a inteligência respond e reflcxivarn cnte a sÎtuaçôes q ue nâo p rod uz nem organ iza, de m odo qu e, no final, 0 que é reali zado c m fOrlll3.S culturais é urna 16gica praticabio l6g ica nos primeiros estagios, tecnol6g ica nos ûltimos. 0 esquema co nceitual nao é a construçâo da experiência hum ana, mas sua verbalizaçâo, como nas classificaçôes d e parentesco que sao simples mcnte os termos de uma ordenaçao de rcla çôes de fato, efetuados pela vantagcm ccon6 mica ou biol6giea. Para Morgan, pcnsam ento é reconhecimento; concepçao é percepçâo; e lin guagem é 0 reflexo de distinçôes que jél têm sua prôpria ra zao. A qualidade simb6lica da cultura nâo apu rece no esquema de Morgan; nele, as palavra s sâo simples mente os nomes de coisas. Co nsideremos a discussâo em Ancient Society a respeito do desenvolvimento do casa m ento punaluano, da gens (elâ ) e, nessas bases, da terminologia do parentesco turaniano. 0 casamento punaluano fo i para Morgan 0 triunfo da biologia na soc icdade, uma grande refo rma nas uni ôes consangüineas de irmaos e irmas cm um grupo que ele caracterizou camo possu id or da m ais rudi mentar humanidade. A evid ência crîtica desse avanço veio do con lraste corn os padrôes de casamento e as c1assificaçôes de pare ntesco dos havaianos contemporâneos. A terminologia do parentesco dos hava ianos comprovava 0 esta do consangüineo original, uma vez que todos os h omens de uma mes ma geraçâo eram "irmâos': todas as mulheres "irmâs" e os fiIhos de todos, indiscriminadamente, "filhos" e "filhas': Mas a pratica do casamen to, a pUllalua, exigia a exelusao das irmâs do grupo de mulheres compartilhado pelas irmaos, e dos irmaos do grupo d e homens compartilhado pelas irmâs. Morgan concluiu que a contradiçâo entre casame nto e parentesco no Havai contemporâneo remontava aos primeiros estagios de emancipaçào do estado co n sa ngüineo. Eie n ao estava seguro de co mo se produziu exa tam ente a proibiçao de casamentos entre irmao e irmâ; refere-se aos prim eiros passos como "casos iso lados", algo no modelo das variaçôes ocasion ais, cuj as vantagens foram pouco a pouco sendo reconhecidas: Dada a familia consangüinea, que englobava tanto os i n llllOS e irmas consangüfneos quanto os irmâos c irmâs colatcrais na relaçao matrimonial, na familia punaluana bastava excluir os primeiros do grupo, nele consc rva ndo apenas os segundos. Mas cra dificil excl ui r os primeiros e man ter os scgu lldos, pois ta l medida implicava uma mudança radical na composiçâo da familia, para nao dizer na antiga estrutura da vida domés tica. El a implicava igualmente 0 abandono de um privilég io do quai os selvagens nào podiam desistir facilmente. Pode-se suporquc essn medi da foi IOl/Tada, iniciaImente, em casas iso/ados, que SIIt1S valltagellS foram /ellfalllcll te reconhecidns, e que foi adotada a titulo experimental durante periodos muita longos. A principio, cla foi aplicada por algum as tribos, dcpois pela maioria, até ser fina lmente un iversalmentc adotada pelas tribos mais evoluidas que se encontrava m ainda no estado selvagem e entre as quais se originara 0 mov imento. Sua adoçao oferece lima boa ilustraçao do proces$o segundo 0 quai se realiza 0 principio da seleçào natural. (Morgan, 1963 (1877), p.433-4; grifo meu. J h im portante perceber a natureza da intelecçâo humana que Morgan propôe aqui. 0 exemplo da punalua é particularmente adequado, um a vez que é comum ente utilizado no primeiro ano de antropologia para ilustrar a arbitrariedade do sfmbolo pela observaçao de que nenhum sfmio poderia at in gir a distinçao entre "esposa" e "irma", da mesma forma que nao poderia estabe lecer a diferença entre agua benta e agua destilada. 1 No entanto, 0 que Morgan esta dizendo é exatamen te o oposto, que a diferença entre "marido" e "irm ao" nao é uma const ruçao simb6lica co locada no mundo, mas a decorrência racional d e lima diferen ça objetiva no mundo, isto é entre homens biologicamente superio res e inferiores. Trata-se de uma percepçao das vantagens biol6gicas como resulta ntes da diferença, sendo portanto uma represe ntaçao em termos sociais de um a 1 6gica externa a esses termos. A reforma caracterizada pela punalua foi a prim eira de um a ionga série que cul minou na monogamia, uma série na quai a espécie hum(l na livrou-se progressivamente de uma promiscuidade original e dos males decorrentes da procriaçao consangüinea. E esse primeiro passa resume a noçao que Morgan tem do. todo: cIe foi efetuado pela observaçâo e pela expùiência; atençâo às conseqüên cias deletérias do casamento dentro do grupo - "os males dos quais a observaçao humana naD podia indefinidamente escapar" (Morgan, 1963, pA33) - ~ a experiência das vantagens mentais, portanto institucionais. do casamento fora d~ grupo. "É uma inferência correta dizer que 0 costume punaluano chegou ~. à adoçao geral através da descoberta da sua intluência benéfica" (p.509). Portanto, n pensamento é reconheClmento e a mente é um veiculo pela quaI a natureza é '\ compreendida como cultura. A explicaçâo posterior de Morgan da gen s como um a derivaçao da sociedade punai uan a e uma codificaçao das suas vantagens leva ao mais alto nivel a mesma concepçao. Enquanto matrilin ear, a gens original represe nta 0 acabamento naturai da familia punaluana no tempo, dada a imposs ibil idade de se verificar a patern idad e sob as co ndiçôes marita is existentes. 0 co nceito social de d escendéncia é, m ais uma vez, uma consciência de relaçôes jâ prevalecentes (p.442). (Em um ! 0 uso de "si mbol~" c. "signo" na anlropotogia amcricana, ou peto menos cm g rande parte dela, tende a sc dar no sentldo lIlverso das famosas dcfiniçôes de Saussure, em seu CI/rso dt: liugiiisticagcra/; na t~ad i çào anterior "simbolo" é 0 verdadeiramente arbitnlrio o u 0 naD motiva do, e "signo" é 0 mOIi.va?O (compa r~r Langer, 1957, ou White, 1960. com Saussure, 1966 Il9l 5 J). Coma regra geral segulrel a usa amencnno, exccto onde 0 contexto é clarnmente saussuri nno. g 0' ~ V' -<; ç ~ ,J . ~- ' , 0' ? 'i' î f. ~ ~ " ( .. . SI.\ cxperiéncia no mundo. de tai modo que a seqüê ncia total representa a sedimen~ taçao.151·2).eitado a noçao de que fatores subjetivos. cf. 115. A lin ha geral de força da demol1straçao. até 0 capitalismq.-'--~ 1 . mas sim 0 seu signo. sao "essencialmente as mes mas que aquelas manifestas pela mente humana" (p. também a estrutura institucional coma um todo esta referida à pratica e a pratica . da 16gica da natureza (a vantagem adaptativa).18). incluindo a hum an. contudo. Desconfiando tanto do instinto quanto da imaginaç50. a farnilia punaluana. p. acrescentar nada de novo ao processo" (Cassirer. De uma pcrspectiva ecol6gica.racio nalista supremo . a longa obra de Morgan sobre a evoluçao social deixou intact a a i1ist6ria das idéias. dentro da cultura. TaI camo 0 pensamento é a rcconheci mento de uma significaçao exterior. tanto na casa do africano quanta do castor. As leis da natureza e da socicdade foram dcscobertas em plen a luz do dia. susten tan do que 0 castor era apenas "silencioso". para Morgan. que se origina provavelmente da ingenuidade de um pequeno bando de selvagens. e da ·pratica comportarnen tal à \ instituiçao cultu ral: ( 1) circu nstância -+ pratica -+ o rga nizaçao e codificaçâo (instituiçao). grifo meu). como a exclusào de irmaos e 1irmas de uniôes sexuais de grupo. a descendéncia se tornarâ patrilinear sob a influência do crcscimento da "propriedade" . é de grau e n ao de gênera" (ibidem). vez. 1933.como sc fosse preciso prova . ou 0 desdobramento efetivo dos meias crcscentes de subsistência.0 nos subterrâneos da alma ou nas meditaçôes dos fi!6sofos. ou seja. A teoria pode ser r~sumida da seguin te forma: os homens cedo desenvolveram certas prâticas. portanto. 0 sistema de parentesco turaniano reflete a organizaçào sobre a base da punalua e da gens. a inteligência que Morgan entende coma humana nao difere d a de outras espécies mamfferas. também p. estavam suj eitos à reflexaa secundâria ou à codificaçao na terminologia do parentesco.) 3 Resek. "e.2 Mas entao a tcoria de Morgan é apropr iada a uma cllltllra nào -humana . Elc tentou provar isso aos outras .1S". estabelece uma conexao precisa entre a racional idadc atribuida aos animais e a pr6pria epistemologia antropol 6gica de Morgan..:!. Na sua famosa monografia The American Beaver and his Works (1968 ). caracterizada pela suposiçaopara ficarmos de acordo corn a descriçao gerai de Cassirer . p. 1960. residir na pr6pria natureza. 0 parentesco turaniano nao é mais que a articulaçao criteriosa das distinçôes sociais desenvolvidas pela scleçao natura!. às expensas da criatividade da linguagem. as palavras dos ho mens nao sac a conceito das realidades externas. que provàram naturalmente ser uteis e vantajosas. parentesco ". mesmo que cie . A semel hança especîfica consiste na capacidade de se fazer urn u so racional" das percepçôes transmitidas pelos sent idos para agir pragmaticamente sobre a expe riência. sem pre preocupado em mostrar "que todas as espécies. cuja funçao nesse aspecta cJa duplica e generaliza. As qualidades mentais do castor. p.em seus ensaios sobre psicologia animal" (Resek. evidentemente. a diferença se dâ apenas entre modalidades de vantagern adaptativa. Morgan retornou rcpet idas vezes à psicolo~ gia animal. por inferência.que é a junçâo na quai 0 int eresse econômico. Consistindo simplesme nte na capacidad e de agir racionalmente sobre a exper iência. 'transportado' para a c~nsciência. a fonte d e significaçâo que é materializada nas produçôes das espécies. por assim dizer.) Exatamente como a famflia punaluana.73-4. prevalece sobre a vantagem biol6gica como a determinante pratica da forma social.) Por sua vez. entre os prindpios que e1es representam respectivamente. por sua . p. (Na realidade. Dai. a orientaçtio do efeito 16gico. Preferiu respeitar a continuidade da inteligê ncia. Para se cornpreender qualquer segmen ta dado na cadeia de efe ito.:onômico sc apossa da vantagem biol6gica. a melhoria genética que deve resultar da regra da exogam ia: Vm objeto primario da organizaçao Cfa. deve ter logo provado sua utilidade na produçao de homens superiores. e que para a mente (esprit) humana é apenas uma questao de tomar posse dessa realid ade. " ------'.68. irracionais ou subconscientes fazem de cada homem seu pr6prio historia~ dor. Morgan de fend eu vigorosamente a idéia de que "a principio do pensamento" era comum aos hom ens e aos animais. alterado em alguma coisa interna sem.66 Cu/wra e razào pratica Dois paradigmas da teorÎa alltropoMgica 67 " lllomentQ posterior no esquema de Morgan.. assim como a codificaçao expressa organ izaçao. passando pelos pastores patriarcais.pudcsse considerar cssa pr6pria obra in tocada pda ideologia. 0 mais perspicaz bi6grafo de Morgan. deve-se ter par base 0 segmente precedente.termo geral empregado por Morgan para dcsignar a l'osse da "riqueza" estratégica . isolar uma metade dos descendentes de um suposto fundador. Morgan "nunca duvidou de q ue seus pcnsa mentos fossem verdadeiros retlexos da realidadej 0 que ele via na base das Mon tan has Rochosas ou em um povoado asteca pouco ou nada tinna a ver com 0 fato de ser rko ou às vezes mil Whig dissidcntc. Na sua distinçâo entre 0 parentesco paralelo e cruzado. cla apenas expressa as diferenças jâ estabe lec idas na pratica. recebem orientaçtio imediata da natureza" (Resek. (Ibid. Aquilo que existe e subsiste 'fora' de n6s deve ser..ou melhor.que. mas nao " mudo': chegando mesmo a afirmar que a faculdade lin güîstica do homem era apenas rudimentar na Selvageria. Ele teri a re. tanto na sua existência como na sua estrutura. a uma humanidade nao -cultural. A diferença ent re essas qualidades e 0 pensamento huma no. 3 Sua teoria do con h ecimento foi. a l6gica bâsica poderia ser caractcrizada simplesmente como "vantagem pnitica". A gens.de que a "real" é dada "tout fait. dese nvol<C 1 Em termos mais gerais. 389. a gens se tama u accita graças às CCvantagens a ela conferid.252). a gens . 0 aumento do estoque é uma mctarora que vem d~sde 0 homcm primitivo. contudo. especialm ente do castor. 1960. uma vez que nos ultimos estagios do esquema de Morgan 0 interesse ~·. formas de comportamento. As vantagens foram apreciadas e os comportamentos formulados como moI d os de organizaçâo por exempIa. evitar 0 casamento entre eles por motivos de . 442. Sua prevalência quase universal no mundo antigo é a maior evidência das vantagens que da apresentou. Morgan reduziu a lin guagem ao ato de nomear as diferenças manifestas na experiência. vai dos limites naturais à pratica camportamental. escreveu eIe. mas nao 0 mesmo valor. por um lado. enquanlo projeto social tolal. mas 0 fazem "em termos diferentes". mas também a praposiçôes culturais. 5 Uma vcz que Îlcm a som-imagcm nem a idéia podcrn ocorrer um se m 0 outro. entre os quais a peculiar comb inaçao "bife e lagosta" é uma categoria definida de jantar. um segundo tenno..I I S-6.ni . uma palavra é rcfc rivel nao simpl esme nte ao mundo externo. é 0 mediador po r excclência. as diferenças nr valor lingüistico efetuam uma découpage part icular do mundo externo. ISaussurc. Dentro de uma mesma lingua. é capaz de significar. 8 4 Para uma posÎçao scme1hante sobre a Iinguagem na ohr. 7 "A rep resenlaçào 'objetiva' . A diferença de valor entre sheep e mutton deve-se ao fato de 0 primeiro ter. p. 0 valor de qualquer termo é determinado pela que No qu e d iz respeito ao conceito ou significado.o é seu terminus a quo.. é im poss ivel flXar até mesmo 0 valor da palavra que sign ifica "sol" sem <la tes considerar 0 que h.é isso 0 que eu quero tentar cxplicar . vcr Necdham. e nesse sentido nao-a rbitrâria. a realidade objetiva em outra quaI idade. Cada uma confere certo valor às distinçôes determinadas e const itui. somentc para acrescen ta r.o que nao é 0 caso da palavra francesa.68 Culll/ra e razao prdtica Dois parndigma5 da tcoria tinlropoMgica 69 venda-se gradualmente através daquel e lo ngo perfodo.] o francês moderno mouton pode ter a mes ma sign ificaçao do inglês slleep.23). cada uma. Nenhuma lingua é uma simples nomenclatura. nem terernos arranh:ldo a superficie dessa mente humana ocupada de simbolos" (Langer. Se. especifica àquela sociedade. '" .. no quai ele usa a di fe rença de sign ificado en tre sheep e mouton para ilustrara diferença entre va lor e sign ificaçao lingüfsticos. mutton. 0 instrumenta mais importante e mais precioso para il conquista e para a eonstruçào de urn verdadeiro mundo de objetos" (Cass irer.. a atividade simb6lica é ao mesmo tempo sintética e analitica. 0 exemplo acima é clara mente motivado por urn farnoso exemplo de Saussure. todas as palavras que cxp ressam idéias vizinhas se limitam reciprocamente .UI11 dos seus proprios 1 termos com "as" distinç6es objetivas. mas porque 0 conceito de carneiro também varia em diferentes sociedades. pA3). cla mcsma é um mediador na {ormaçao dos objetos. mas 0 francês ainda nâo foi capaz de participar da distinçao mais elevada entre 0 cru e 0 cozido: o ccrea. . cm um scntido..-Ia fom do objetivo de lingüistica 09li." A 16gica proposicional é rnaravilhosamente variada e assim sào as culturas. Mas 0 mesmo exemplo suger ini aos americanos. ha Iinguas onde n50 é possivel dizer "scntar-sc no sol".16-7). Morgan fo i UI11 antro p61ogo pré-simb6lico. p. 1933. A palavra inglesa nao se aplica ao animal quando pronto para ser comido. 1 Mas a arbitrariedade do simbolo é a condiçào in dicativa da cultura humana. em virtude das diferenCÎaçôes semânticas das respectivas Hnguas. ao falar de uma peça de carne pronta para ser levada àp1esa. ao seu lado. entre 0 conccito e a palavra. "nomes" que seriam signos puramen lc cxteriores c arbitrarios. mas sim 0 fim ao quai esse processo conduz. Tylor. ~ i"' . E a arbit rariedade simb61ica das segundas é m esmo maior do que a d as primeiras. ela n5.. é 0 comportamento do signo em uso. por exemplo. 0 pr6prio conceito do conceito continua em muitas antropologias da praxis recentes. a lin guagem s6 é simb6lica no sentido de que represcnta 0 munda de uma outra forma. A linguagem nào entra em um mundo de perœpç6es objetivas acabadas. da filosofia.4 Ent retanlo. As palavras francesa e inglesa referem-se à mesma espécie. sc nao em inven çao. por consider:\. para 0 quaI ha um segundo termo. porém. sua re1açao é cOll5ubstancial e absoluta. Nenhuma se base ia cm uma simples correspondência UI11 -a. ~ .7 Na realidade. A ana lise deve negligenciar a arbitrariedade fundamcntaJ da palavra -reconhecendo talvez que nào haja qualquer relaçao inerente entre 0 som-imagem e 0 conceito (idéia).. coma argumentou Benvcniste cm seu conhccido comentârio sobre 0 texto saussuriano. cm particular porque. que exista tal relaçâo entre 0 conceito e a realidade objetiva à quaI ela se refere.173). Esta é uma premissa implkita. pode-se observar no p:lr carneiro/carne de ca rneiro (sllcep/mlllton) que esse animal. exprime uma concepçào distinta das (e em relaçào às) espécies. mas sim seu termi/lus ad qI/cm. «.. mas antes de tudo ao se u lu gar na lingua. . 1957. p. da ffieSITIa forma que a palavra mouton. do antrop61 ogo evolucÎOllista inglês E. no seu estado culinario. p.mas decisiva. qualificando talvez esses signos corn rcferência a scns::!çOes p::! ssadas que (omm scmel hantcs.. por outra lado os el ementos assim segregados sao reagrupados por correspondê ncias significativas en tre eles. lrazendo para 0 conceito toda a 1 6gica cultural. 1966 (1916). por conseguinte. dentro deste m es mo e ûnico mundo. que a cultura nâo se submete a tal tipo de limitaçao.Ilao é 0 po nlo de part id a do processo de (ormaçào da linguagem. boi e lagosta. 6 Isso nao se da simplesmente porque a combinaçao de so ns sheep [carneiro] nào tem qualquer conexào necessaria corn 0 anima l designado desse modo.. Ao men os na leo ria ha limites naturais no campo semântico de um ûnico lexema: nenhuma ûnica palavra. . ao seu redo r. ver Hcnson ( 1974. Refira-mc aqui nâo apenas a distinçôes semânticas. no mundo anglo-saxao. mas que nao t'cm sentido algum se retirada do mundo. constr6i-se sua pr6pria avaliaçao do objeto. I'"j'. è isso por varias razoes. 5 Assim. Para uma boa discussao antropol6gica sobre a rclatividade cultural da dislinçao entre crcnça e experiência. urna distinçao peculiar dessas sociedades ocidcntais que se propôcm fa u r a antropologia das outras.B. A verdadeira contingência est:\. ocupa no açougue um lugal' ao lada de . Parece nao haver qualquer limite te6rico determinavel a priori em relaçao ao qué sera c1assificado com quê no esquema cultural: "Um parente por casamento é uma anca de elefante. ou seja.4 3-8). a ohjetos individuais dados e claramc nte dellmitados uns cm relaçao aos outros. simultânea e exclusivament e.. por conseguinte. dividindo-o de acordo com certos principios. Par sua diferença cm relaçâo a essas palavras.. 6 "Enquanto encarannos as sensaçoes coma signos das coisas que supostamente lhcs dao origem. a oulras pal av ras relacionadas. Assim. e no sistema dessas diferenças ha uma construçâo cultural da realidade. as duas espéCÎes. 8 No mcslllo sentido de uma construçao cultural. -. 1972 (sobretudo p. supondo. um::! re1açào quc Benveniste recusa tratar. 0 inglês usa l11uttOIl e nao sheep. nao sao aplidveis" (Boas [19381 il! Stocking. a mente do mundo 1 _ e. sendo a sua lei de movimento simplesmente \formas de manifestaçao das leis bio16gicas" (Schmidt. Acho que a razao para esse fato pode ser encontrada !laO cm qualquer peculiaridade fundamental da mente do homem primitivo. ~l "" investigaçao.. como Marx colocou na prime ira tese sobre Feuerbach. criamos um novo tipo de objeto.198-9)- . que depende.para remediar 0 defeito de um materialismo que concebia "a coisa.. ele passou naturaimente por uma fase de psicoflsica feclllleriana que teve a mesma importância: experimentos sensoriais em fenômenos liminares que nao apenas reiteraram a conclusao de que as diferenças objetivas a estimulos llaO engendravam nenhuma diferenciaçao paralela de resposta .). pA?}.. digamos. escolheram respostas concebiveis alternadas. 9 Boas 1 Eru contraposiçao ao que foi dito. lo Boas repetiu. a tradiçao em questao é um conjunto de significados acumulados. Para qualquer grupo humano.. cm outras palavras. representando uma oposiçao dentro da quai a antropologia passou por varios ciclos durante todos esses anos. 1962) .. a experiência ao nivel lingüfstico. aprendi a reconhecer que existem dominios da nossa experiênda nos quais os conceitos de quantidade. par sua vez. relaçao a Kautsky. Em um determinado momento. l' :! porcos e bois. " " li: 1 '$ <- I --F ~i d i 1 1 ~ Em suma. 1971. 10 ''Ao preparar minha tese de doutorado. No decorrer de minha quando.. Meu débita vai mais além. foi uma viagem de muitos anos na quaI Boas passou de um materialismo monista à descoberta de que "0 olho que vê é 0 6rgao da tradiçao". pode-se dizer.. Ha também alguma evidência de que 0 falar interior. Nao quero dizer que 0 pensamento deva coincidir corn as distinçoc$ gramaticais de determinada Hngua. a odîsséia de Boas "da ffsica à etnologia" tornase significativa. Os primeiros passos foram dados dentTO da pr6pria fisica. Parà cie. 0 orgânico nao procede do inorgânico. mas a reaçao de Marx também foi refreada pelo idealismo de Hegel. ~ . a realidade. um materialismo do sujeito hipotético individual que responde passivamente à realidade concreta. nao ser mais importante do que.- Cu/Jura c razJo pratica Dois paradigmas da leoria antropo16gica 71 ~- il' . uma jornada de muitos estâgios nos quais ele descobriu que. Marx teve de reagir ao materialismo contemplativo e sensorial de Feuerbach. ambos foram compelidos a recusar um materialismo mecanicista que lhes vinha do iluminismo. 1965 [1938]. Mas. e vice-versa. a linguagem naQ é mais que a percepçao articulada. p.14. p. . a cultura da natureza. na visao de Morgan. No capitula 4. . a reduçao da Odisséia da forma falada à escrita .- r ~' b$ ~: i <. cat/le/bec}). No entanto.. da tradiçao mental. que se encontra cm "um piano ~ distinto do pensamento verbal': tenna uma cstrutura diferentc c mais simplificada que a estrutura da II lingua falada. na medida em que ca da um percebia no discurso do outra asdistinçôes apropriadas ao seu pr6prio. chegando mesmo ao uso de certas [rases que sao suas . finalmente. É fascinante que tanto Boas quanto Marx tenham passado. A linguagem é um meio privilegiado clesse projeta. Boas observou a dificuldade de determinar as intensidades relativas de Iuzes que diferiam levemente em cor.. que nao eram em si mesmas muito diferentes. No sujeito humano. Stocking. A idéia coma um todo parece implicar uma paralisaçâo dos poderes simb61icos neccssarios il sua postulaçao. 11 Nesse meio-tempo.mas também que a resposta dependia de fatores situacionais e do conjunto mental da pessoa. que compartilham uma' declinaçao paralela de termos para 0 estâgio de consumo (pig/pork. através de informantes da Costa Noroeste dos Estados Unidos. pele mesmo ponto. 0 mesmo pode ser dito de Morgan. mas nao como atividade humana sensivel. A quai. 1 i .72ss. pratica.lsso levou-me a considerar os valores quantitativos das sensaçoes. uma vez que nao possuimos nenhuma palavra de inspiraçâo normanda para cheval par analogia às palavras para carnes de carneiro. nao subjetivamente" ~ . a passagem da natureza para a cultura.r M 70 :\. . mas 0 suficiente para conduzi-Ios a caminhos fatalmente diferentes. p. 1974. .tanto quanto quaisquer erros SaD de minha intdra responsabilidade. determinando a condusao alcançada" (Boas. A variaçao quantitativa no objeto nao evocava uma variaçao correspondente no sujeito. 1966a [1911].166-79). 42).. teoria coletiva e hist6rica que faz da sua percepçao uma concepçao. de boi e de porco. tive de usar métodos fotométricos para comparar intensidades de luz. apenas na forma do objeto ou da contemplaÇao. mas sobretudo no carater das idéias tradicionais pelo quai cada nova percepçào é interpretada. . 12 "A primeira impressao obtida de um estudo das crenças do homem primitivo é que.que a reaçao humana à quantidade efa em si mesma qualitativa . discuta a 16gica da comestibilidade/nao-comestibilidade no esquema americano (p. p. que se apropriou do sujeito ativo hist6rico. r' 1 pwa: . com propriedades distintas: a cultura. para Morgan. de medidas que podem ser acresccntadas ou subtraidas como aquelas corn que eu estava acostumada a operar. através da avaliaçao simb6lica e da sintese da realidade objetiva.~ r. 1974.. mais tarde. Como George Stocking (1968) descrcve muito bem. Entre os erros que devo evitar encontra-se a reivindicaçao de um extremo relativismo lingüfstico. no carater das idéias tradicionais com as quais cada nova percepçao se associa. descobriu que os SOll. Dai. Nem chegamos ainda ao nive! mais profundo dessa relaçao complexa e amplamente l desconhecida entre pensamento e palavra (Vygotsky. para 0 homem. "a hist6ria humana l'" é um apêndice da hist6ria natural. 12 Permitam-me aqui fazer uma breve digressao e uma comparaçao aparentemente curiosa. A hist6ria sem estrutura da a impressao de nao explicara classificaçao. 9 Estou em débito com 0 professor Paul Kay pelo muito quc elc contribuiu para a nossa discussao do problema da "arbitrariedade do signo".') considerados iguais por um orador de uma lingua podiam ser ouvidos como algo completamente diferente por pessoas que falavam outra Hngua. II "A alternância dos sons é daramente um deito da pcrcepçao obtida atra\'és de um sistema de fonética estranho" (Boas. nao é em si mesma decisiva nem unica para 0 homem.. A soluçao. no inicio das suas vidas intelectuais. Na sua dissertaçao sobre a cor da âgua do mar. ~- -. a sensibilidade . seu poder de interpretaçaa logîca parece deficiente. cf. embora as percepçoes de seus sentidos sejam suficientes. 1... 0 subjetivo do objetivo. era aproveitar 0 ativismo do idealismo. a percepçao (perception) é reconhecimento (apperception). embora todos des difiram ncsse sentido dos cavalas e cachorros. Coma escreveu recentemente um destacado rnarxista cm . Vm desses caminhos tem aqui especial importância. A esco lha de Marx l evou ~o 30 materiali smo histôrico. p.r oF 'i' < 13 Dai a rejeiçao paraleJa de Boas do dctcnni nislUo "geogriifico" e "econômico". entronizou aquela concepçao de "far rapos e remendos" do objeto que a etnologîa amer icana leva ria décadas para expiaI'. Em um artigo muito conhec ido. ~. à cultura. Com 0 passar do tempo.. que comem oravam os ancestrais . e mais tarde para a Costa Noroeste.e correspondentemente que d os c1âs. i' r~ ! r .Joi â transposto do nivel psîcolôgico para 0 cuî~St~~ki~·g d es taca 0 velho arli go (1888) "Sobre os sons alternantes" como conte ndo os germes clesse desenvolvi mento e. sobretudo entre a vida de Ulll pava e seu meio ambiente fisico. disparidade de traços aparentemente semelhantes. mas cIe nao con cebe a se nsualidade COIllO atividade pratica. <? que racionâlizou a . os caminhos pelas quais Boas chegou ao conceito cultural foram diversificados e aigu mas vezes cheios d e meandros (cf. C' '" 1<. escreve Stocking. foi inscrita co m uma diferen ça de ênfases. para descobrir a espec ifica çâo histô rica do sujeito qu e age. ~e esses significados implicavam processos dissim il ares d e desenvolvimen. usada s para enganar os espiritos.u.195-223. Grande parte do fin al da obra de Boas. 0 desmembrarnento negativo da cultura gerou..'...66J. os toten s ou os sistemas de metade variavam em todo 0 mundo . Boas tran sfe riu 0 mesmo problema do materialismo mecânico para os esquimôs. Radin criticou. de vê os fenômenos culturais em termos da ÎlI1posiçilo de tls!!ffica c. 1974. minha intençao fosse esludar matematica e fisica coma meta final.. nao er~I11 comparaveis às mascaras ~ .I7S ). A antropologia modern a tende a considerar essa controvérsia em particu lar como infeliz.ele teve de conduir pela existên cia d e cu ltu ras. através do estudo das ciências natu rais. a exp ressao da natureza na cultura pela mediaçao de uma mentalidade refl exiva. p. p. No entanto. 1965. a noçao "quantitativa" do traço cultural separado que Boas desenvolveu a partir da sua obsessao corn a con testaçâo do evolucionismo (Radin. a outras questôes que logo me conduziram à geografia. cm modos historicam en te especificados. esse artigo: 1 prenuncia muito do pensamento antropol6gico moderno. pois as condiçôes econô micas sempre agem sobre uma cultura precxistente e elas mesmas dependem de outros aspectos da cultu ra" (ibid.1 7S-7). Boas des creve 0 arcabouço de seu proj eto esquim6: Embora. 1965 119381. Mais que um exercicio critico ou metodolôgico. 1 . o humana da experiéncia. que me revelou a importância do estudo da interaçao entre 0 orgânico e 0 inorgânico. que rea lm ente existiam em vâriasSoëledaaes.u.!!!39J!. Ele os vê co mo determinal1tes de flossa s pr6prias percepç8es do mUl1do externo. algo muito compreensivel. . 1968. 1. "Hist6ria e antropolog ia': Lévi-Stra uss observa a eventualidade conceitual do método: e Il t·. c assim cheguei a um nova ponta de vista. fo rçosarnen te. incre n te às condiç6es do seu in îcio. IIbid.~~ da_~periên. cm direçao à "cultura".p. especialmente a fisica. No entanto.270-89. humano-sensorial. Em uma série de cartas ao seu tio na América. p.la construS. um resultado contradit6rio e sintético. 1968. to.:Rara BO. fiquei convencido de que meu WeltanschaullIIg materialista anterior . em 1882-3. Marx chegou até a l' ratica e as es truturas da realidade.ci~: Ele os vê como histori~a7r. nao como a açào de um individuo abstrato e isola do. e esse assunto de lai forma atraiu meu interesse que finalmente 0 escolhi ca mo meu estudo principal.. comum a Marx e a Boas. baseado em uma noçao de cuhma nao tanto coma uma condiçao da rclaçaodo homem cam a natureza. 1966b [1940 J. cedo e de form a vigorosa.l /l 72 CI/III/ra c mziio pralica Dois paradiglllas da /eoria alllropo16gica 73 " (Ma rx. 1966 [1933]). 0 tempo aguç:lria a oposiçao entre a realidade material da simbo lizaçào c a simbolizaçao da rèalidade material-que para Boas nao efa nem racionalidade nem dis(arce.~o'ndi A. especialmente da vida fisica. massobretudo camo a cOllccpplo dela (por exe m plo.Jor~in as d ifere nças emsignificados usas determinados local. fui levad o.~ente. 159. de seres hum anos se nsiveis." Marx salientou que cssa praxis deve sel' entendida ca mo social e na sua especificidade hist6rica. pode ser vista simplesmente camo a acabamento das implicaçôcs presentes nesse artigo.. provando que Morgan estava errado.1 38. Ao '1menos pa r implicaçao.1 L. escrito cm 1845).era insuslentavcl. Stocking. e pass im). do modern o conceito de cultura.o . p.para Unl fisico. "deseja a contemplaçâo. 0 reconhecimenlo do social. em retrospecto. qu e Boas argumentava que as mascaras da !~i sociedade A.as. grifo m.o!lxel1c~9!!. jâ que foi desenvolvido no confronto direto corn Morgan sobre a questao de leis gerais de evoluçao socia l. <>. operada por Boas no contet'ido das culturas para provar a diversidade dos processos de desenvolvîmento. e da dos seus seguidores.\ ~> Ç'. construidas cam base na açào concreta e presente.~t. por conseguin te.bem como as discutidas no capitula 1 -eS130 aqui prefiguradas: "nao ha razao para denominar as outras rases da cultura de uma superestrut ura sobre uma base econômica. Na realidad e. de totalidades cujas "idéias dominantes" ou padrôes criam essa diferenciaçào (Boas. e qu e conc!usôes podem ser retiradas de uma conside raçâo desse gênera? fCitadoin Stocking. Assim nasceu meu plana de considerar a [seguinte J investigaçâo coma minha tarera de vida: até que ponto podemos considera r os fenômenos da vida orgânica.! da sociedade B./ ~ o fato de a viagem de Boas ter acabado no poder estru turan te da tradiçao pa rece agora. pois a f~agmentaçao nominalista. De fato. v . a carreira antropol6gica de Boas pode ser caracterizada com o um processo no quai 0 axioma or iginaI. cionados e transmitidos pela processo de aprendizado. "Feuerbach. de um ponto de vista mecanicista. Entretanto. p.I-20).. era tambérn pOl' suas implîcaç6es de um con texto total e arientado: u ma cultura que padronizava os traças de acordo com r~ Il seu prôprio espîrito singular. Ele os vê em termos mais relativos que absolu tas. p. a direçao de meu traba1ho e estudo foi fortemente influenciada par meu treinamen to em ciências naturais. no inicio. t 'C c. Boas começou questionando a essència da tese de Morgan. .] f s < .. . naD satisfeito cam 0 pensamento abstrato': escreveu Marx em sua quinta tese. Dado. a de Boas. 'Iodas as questoes fu ndamentaÎs do ultimo dcbatc . l ' De cert'a forma. mas julga. nas duas partes do ano. S ).descrevem Boas corn exatidao. calegoria e. um apelo post-factum à racionalidade de pratÎcas cuja verdadeira lôgica é nao-explfcita e cujas verdadeiras fontes sac desconhecidas. as instituiçôes existentes e a sua interaçao (figura 8). especifica a relaçao entre estîmulo e resposta (figura 7). do homem. de dois tipos de atividade ou duas fraçôes da populaçao.ual (c6digo) . da distribuiçao no interior do grupo. 50b forma de instituiçao. contudo. Todos eles sac baseados na categorizaçao da experiência. continua naD sendo formulada pelo grupo humano que vive nela. É clara que 0 "es que ma conceitual" tem uma qualidade diferente nessas duas perspectivas. em direçào ao quaI 0 pensamento de Boas estava cm continuo desenvolvimento. portanto. 0 contraste te6rico entre Boas e Morgan pode ser estabelecido. da invasâo de uma populaçâo par um grupo de imigrantes. ao governar a percepçao. estudando cada um dos casas observa dos como se fossem outras tantas entidades individuais? Dever-se-a constatar. uma forma caracterîstica de auto-retlexao cultural. sob uma significaçao unica. a estrutura do simbôlico desenvolvida por Boas corrcsponderia às posiçôes empirico-racionalistas do tipo que Morgan manteve. "arbitriria" cm rclaçao a qualquer outra lîngua e cm relaçao ao real. enquanto para Morgan é a codificaçao (codiJicntioll) de distinçôes externas. de dois grupos tcrritorialmente vizinhos. priticas. E como toda classificaçao deve ter seus princîpios. de [arma geral.é classifica-1\ da. 0 VoIkergedanken ou 0 padrao dominante. de comportamentos antiéticos. agrupando. como um pracesso de tomaI' a experiência significativa. Para Boas. Ao nivel psicol6gico. os termos da afirmaçao de Lévi-Strauss da sua posiçao . de regras empiricas destinadas a assegurar as tracas matrimoniais no scia de determinado grupo. Ao nive} cultural. Adotando esses termos. mas outres costumes.612).~o"lla de Boas tl-ata-se.lO-l. 0 termo mediador é a tradiçao. Boas in tercalava um subjetivo independente entre as condiçôes objetivas c 0 comportamento organizado.74 Cul/!lra e razào pratica Dois paradigmas da tcoria alltropol6gica 75 Procurar-se-a entao levar ao extremo 0 nominalismo boasiano. dos igualmente indispensaveis para a manutençao do equiHbrio social etc. por fazoes cm si mesmas variaveis (econômicas. Se na concepçào de Morgan pensamento e linguagcm funciOi}2m comC\. crenças e proibiçôes sac tamb ém baseados em pcnsamentos e idéias nao-retletidos e imemoriaveis. ao rncsmo V tempo. seremos conduzidos a despedaçar a noçâo de organizaçao dualista camo constituiodo uma falsa. _' operaçao mental (2) Nivel psicol6gico estfmulo resposta FIGURA 8 tradiçao (V6/kergediinken) (3) Nrvel cultural meio ambiente ~nstituiçao FIGURA 9 esquema conceitual (c6digo) (4) Boas: praxis (5) Morgan: praticas '. é a encodificaçao (encoding).em oposiçao a um certo marxismo . Boas exp li ca: . 1963b. ~ . exatamente coma nas raizes da palavra ou_'2a. especificando até mesmo 0 tCl titl1n quid entre a praxis e as prâticas como um "esquema conceituai" (ou c6digo). Boas afirmou que a formaçao de uma cultura. Assim. que as funçôes atribuidas à organizaçao dua\ista nao coincidem. isto é. do ser humano na natureza.da natureza. onde foi primeiramente anunciado. gerado pele contexto e pela experiência anterior. a negar as instituiçôes em beneficio exclusivo das sociedades. scgundo 0 casa. cerimoniais). sintaxe de uma \ determinada lingua. que a historia de cada grupo social mostra que a divisâo cm metades procede das origens mais divcrsas. Na re31idade. uma variedade de coisas ou eventos que nas outras lînguas poderiam ser concebidos e denotados separadamente. se exerce necessariamente cm uma teoda . ao passo que para Morgan 0 pensamento é a representaçao da significaçao objetiva. Essa teoria. Assim. < . cada lingua é. a experiência nao é simplesment~_fepresentadâ'. como mostra a figura 9. de modo que 0 segundo nao derivasse mccanicamente do primeiro. que ordena ao mesmo tempo a relaçao com a natureza. por outra lado. essencialmente. 0 termo interventor pode ser caracterizado grosso modo como uma operaçao mental.'" ) praxis _ prtiticas_ esquema conceit. radicalmentc da de Morgan. A linguagem é um exemplo privilegiado desse processo inconsciente. da fusao. a significaçao do objeto é a propriedade do pensamento. demogrMicas. Na vcrdade.] A problematica geral de Boas difere. a organizaçâo dualista pode resullar. de um lado. estendcndo este raciodnio a todos os outros aspectas da vida social. A semelhança das duas f6rmulas corn a de Lévi-Strauss é indiscutîvel (p. Para Boas. que.. e. na apropr iaçao do percebido pelo conceito. FIGURA 7 -. Onde Morgan entendia a pratica e suas formulaçôes costumeiras pela 16gica das circunstâncias objetivas.7 "' . p. de uma problematica do srmbolo. [LéviStrauss. da cristalizaçao. Foi a partir dessa posiçao que cIe encarou as teorias de Morgan de tenn inologia de parent esco (por exemplo.. A racionalidade é nossa racio nalizaçao. sendo 0 m e d ~ ~e filhos nào-saudaveis . Boas fornece a exe m ~ plo do tabu do incesto. 0 co mentario sobre a analise racional ista de Morgan implicado pela noçao de consciência secu ndaria Jlao seria difici l de ser desenvolvido. processÇ)s [.ivel" (Boas. Par excrilplo: observou~se que as cores sao c1assificadas em grupos bem dist intos.. Illas como algo motivado pela re~lidade cultur~J. esta ndo tipicamente sujeitas a uma reinterpretaçao secu nd aria (1966a. 1'. nao fora m ai nd a percebidas. as categorias de linguagem sao automa ticamente reproduzi das na fala.vel à ruptura.63). cm grupos mais au menas amplas.>: '" As Ii nguas difc rem nao apenas qua nta ao carater dos scus elcmentos fonéticos e grupos de sons COll stitutivos mas também quanta Olos grupos de idéias que e ncon~ tram expressao cm grupos fo néticos flXOS .189~90. isto é.. co rrer-se-ia a risco de carlar os 1 5bi~s. cspccialm ell{c 11 0 vocabu/<irio. / Em vârias culturas. Encaixadas em regras inco nscientes. 0 comportamento relletir a d assificaçâo. ver também Boas. ao passo que as categorias da cultura a atin gem. A tardia i.co mo ideologia. toma-se um obje to de contemplaçao. p. isto é. 0 desacordo basico ~obre a natu reza do objeto antropol6gico co ntin ua a se fazer presente. de fato. Por isso é que Morga n fez dessa co ntradiçao. 1965 (1938).I. no duplo senudo de meren te a natureza e de normal à cultura.)" Boas argumentoli mais tarde . Dma vez que 0 âmbi to total de experiências pcssoais às qua is a lîngua serve é infin itarncnte variado c sel! objc tivo.. Em todo caso.nvcnçào do garfo e a fato de facas sem co rte serem usadas em muitos pafses. e de 14 As cxplic:lçôcs de Boas dos gr:lus de generalizaçao c difcrendaçlio. N6s os classificamos. que ha algum tempo nos contentavamos em atribuir a razoes religiosas. 0 status do que poderia se r enUio descrito C?I1"lO . nao aparece mais como algo arbitn.I.em uma observaçao hoje cJass ica _ que. apebn do para os "interesses" ou para as "ncccss idades" do POyo.las e costu mes às qu ais das se referem . no "natural". m es mo hOJe.20B). qu er so mente p ela comparaçao co'rn outras formas. de acordo corn a c1assificaçào do verde (com J a arnarelo ou do verde [camI a azul coma um grupo. sem qualquer di ferc nça associada à capacidade de distinguir fo rm as de cor .e lisado como uma elimologia do povo? Por outro lado. nao parece sel" maIs pOSS IVel com part ilhar do otimismo de Boas quanto às catego ri as an trop~I~~icas que. de uma extensa classificaçao de experiências que devem necessariamente ernbasar todo 0 discurso articulado. ~s. [1 938]. 1974. baseados no raciodnio conscien te. delxam claro que eSS<l explicaçao é apenas uma tentativa radonali sta secund dria para expllc. difici lmente pode ser exagerada. devc sec expresso através de u m nûm ero Iim itado de palavras-lroncos. p. mas que hoj e é "um conceito uti li tario. A razoablh. cram vaganwntc fun cionalistas. [Boas.uma teo ria etnol6gica. cmprega.. ta mbém se transforma. p. essas c1assificaçoes podem ser baseadas em prindpios funda~ mel1ta lmente distintos . num ce rto se ntido. que as categorias de uma populaçào (dai os interessc5 e as necessidades) nao podem ser comprccndidas pela invocaçao de processos racionais. comport :lInento que se tem à mesa ofereee também um barn exemplo d~ c~pbcaçao secundar. co nseqüentemente. Se po r um lado "a ori gem dos costumes do homem primitivo nao deve ser procurada e~l .devido ao casamento dentro do grupo de parentes proxlmosap resentado coma a razao para nossos sentimentos" (I 965. (1 911 ). a unica base das categorias terlllinol6gicas.76 C ulfl/ra c razào pratica Dois pnrndigmns dn ' carÎn mr'ropo/6gicn 77 ~ ~ 'Jill . e de que eXIste Ulll penga semelhante d~ se furar a lfnglla ou os l:ibios cam os garfos de aço pon li agudos comUlllcnte usados I~a Europa. coma um L odo. • el: Variedades antropol6gicas da razâo prâtica Anunc iado prim eiramente na obra de Morga n e Boas. poderiam ser realm en te "derivadas de. Ele enfatizou. mas como satisfaçao de uma demanda por jus tifica~ tiva. quando interp retamos 0 conven clo nal.. Nessa mesma época. Em nossa experiência real. cujas limites padern ser determinadas por uma gra nd e variedade de pontas de vista .hio em relaçâo a uma realidade objetiv<i. 15 0 exemplo mais conhecido é a origem do cornpo rtarnen\ o que sc tem ii Illcsa: "0 easo. Coma nao é usual se levar a (aca il boca. A questao é que.. pois poderia facilmente acontecer 0 c~lI1tr:i rîo. p.204-25). permaneceria inexpl ic.ndo-a. Por co nsegu inte. embo ra a linguagem e outras cos tumes sejam o rganizados por lima 1 6gica n ao~re f1 etida) ha lima diferença entre el es no fato de que as class ificaçoes da primeira normalm ente nao atingem a consciência.65 ). COI1s!ste ntes co m c.. co ma ~ utIl. A 1 6gica cultu ral reaparece entào sob uma forma mistificada . A importância do fato de que a palavra faz surgir um quadro diferente na fala e no pensarnento. 1965 [1938].~cio nais". po rém. de outm modo.68-9). oposta à formaçao das Ide. e emprestamos uma expressao convencio nal que mal parece razoaveJ a uma razao convencional q ue permanece n ào~exp ressa . Nào ma is como um princîpio d e classificaçào. e acima de tudo sua utilidade. ou na lltilidadc pdt ica ( 1965[ 1938 ). nem dois estados de sen ti do-impressôes ou emocionais sao idênticos. pA) . A difere nça desponta essencialmente no m odo de reproduçao. surge da! a intuiçiio de que a (aca naD e usada dessa manClfa porque. é a forma pela quaI nos exphca~ mos a n6s mesmos.. o costume. 2IS). internas aos pr6prios fenômenos" (S tocking. de acordo cam suas semelhanças. como cscre·veu Boas (196S [1938 j.. ~. F . por algu ma operaçào positivista continuada . bem co mo um a fonte dela. Issa coin cide corn um traça fund amen tal do pensamento humano. Mas a continuidade do costume é sem pre vuln era. POl" um bdo. .\ r um costume que. p.o . por outro ~ ~n~ . _ As implicaçoes dessa com preensào para 0 proJc to ant ropologlCo alnda nao es tâo rcso lvidas.' gem de certos proèessos rac ionais podia ser procurada no costpme.a ap_l"opnaçao das realidades significativas dOlS vidas de outros povos pelas raclonahzaçoes sec un~ darias das nossas pr6prias. E em alguns aspectos. 1966a [ 1911). quanto do que considcramos como inst ituiçôes e crenças essenciais de v se r a~a ~ . quer na socializaçao do jovem. . de aeor'd o cam suas semelhanças.da~ de das instituiçoes. p. 1966. Boas recusou~st' a reconhecer a pnltica camo sen do. para n6s. -l .. que contrasta Iadicalmente corn 0 relatIvismo ~oaslano. corno as ditadas pelo metabolismo.fico".~bon~lI1es (~f. na realidade. p. pA).IS) era algo que qualquer europeu poderia entender: a vantagem materia1.através de outras controvérsias te6ricas. 78 ClIltura e razao prririca Dois paradigmas da tcoria flmropolOgica 79 . logo. -' --. Aigo deve ser dito sobre a relaçao sujeito/objeto. 1960 [ 1944). através do quai 0 homern é capaz de competir corn 0 concreto em problemas especificos corn os quais se defronta" (Malinowski. é como se a cultura fosse uma metafora sustentada sobre as funçôes biol6gicas da digestao. Leach.l? eVl. "fetlChismo da eco}ogla': "dualismo utihtario" e "desapareClmento da cul tU! a" A p lll11e lra tem a ver corn a relaçâo partlCular su}elt%b}eto envolvida na ênfase pl agmâtIca. contidas ali e em muitas versôes posteriores. Em tiltima ana lise. Ela eleva 0 antrop610go à divindade de um sujeito constituinte. de todas as man cil as.. Apresentar a concordância.--. 0 IntlchlUma e lucratIvo. Isso ~ -"'-"'----""'1 "c . costumes aparentemente bizarros. "tel [Q I "."<. p.". Parece muito para'doxal agrupar certas ênfases te6ricas de LéviStrauss e Leslie VVhite? (ver mais adiante.J '" 1~ 5-~ 5S:-? : ~ f . se a interpretaçao for aceitavel ao europeu. __ 1r s~ ~ ~ . internamente. ~ Ha nisso uma dimensâo mais ampla do que a implicaçao 6bvia d~_que. 1957).c. e parcialmente espiritual. direta ou indiretamente. ou scja. e principal mente. uma inversao do relat!vi~mo b~asian~. é "um vasto aparato.esse.ela ~ mesma indulgência. _. ponto pOl' ponto._-- -.---_ . 'l significava. embora elas estejam. e esse reconhecllllento acabara admitindo a explicaçao. "rendimentos decrescentes na explicaçao funcionalista". assim como a metade de funcionalistas ou evolucionistas encontra um improvavel aliado na tribo do outro. Desta forma é que se distingue U111 funcionalismo do outro.mais geralrnente de que a "ética" do antrop610go é a "êmica" da sua pr6pria sociedade. cm termos familiares.l?!). Utilizando uma frase do soei6logo ffancês Baudrillard. no quaI manifestava a mesma determinaçao de provar que aquilo que aos europeus pareciam trocas de bens cerimoniais sem utilidade desempenhava. que podem sel' resumidamente intituladas Desde 0 começo . publicou seu primeiro artigo importante sobre a vida econômica dos habitantes das ilhas. reproduçao. ~ 'V' ' . "toda realizaçao cultural que implica 0 uso de artefatos e do simbolismo é um realce instrumental da anatomia humana.. isso se deveu apenas à reproduçào... em pendência ao longo das mes mas linhas que separam a visao de Morgan da de Boas. construîda a partir da açao pnitica e do in ter. de "0 h llh ris etnogrJ. 1957. Simples ou complexa. scus_ corpos pintados e seus escudos simbolicamente esculpidos. '. Seu primeiro artigo foi publicado com a intençâo de demonstrar que as . a dcscriçao. subentendida pela compulsao em atribu ir um "sentido" pratico a um costume ex6tico que é tao intricado quanto nao é de cara uma questao de necessidade pratica. um interesse na utilidade das mascaras aparentemente sem sentido do que entao chamavamos "selva gens" foi 0 ponto principal na sua obra [de Malinowski]. P 2-3) Ele gostana de mostrar que a razao subJ3cente as mascaras aparentemente sem senti do do que en tao chamavamos de "selvagens" (Richards. escreveu Malinowski.dente que MahnO\vskt fOI 01 ientado poruma sllnpatia pecuh:r para corn oS. No final. dois axiomas: "Ern primeiro lugar. 0 acordo em termos de principios entre 0 arquievolucionista Morgan e 0 arqu ifuncionalista Malinowski é muito mais completo. 196 9. parciaI1 mente mate rial.18)16 !k l~ . até na mais recente ecologia "neofuncionalista". Abordarei diversas dessas implicaç6es. as perspectivas posteriores que aparecem demarcando rupturas te6ricas encontram-se. _.. Isto nao significa subestimar 0 alcance de antinomias famosas tais como "hist6ria/ciência': "cultura/sociedade': "diacronia/sincronia': Mas se essas oposiçôes foram bem-sucedidas 30 gerarem 0 desdobramento de UI11 momento te6rico para 0 seguin te. parcialmente humano. Malmow~kl cscreveu: "Na realidade. de fato. Jarvle. na realidade. Malinowski considerou a cultura coma a realizaçao instrumen tal de necessidades biol6gicas. à satisfaçao de uma necessidade fisiea" (Malinowski. Malinowski torna~ se mais interessante para certas implica ç6es te6ricas do argumento das praxis que sâo apenas sugeridas em Morgan. 1967. 1 todos os modos . mumificaçao etc. o sc ntldo dominante do projeto de MahnowskI cra reduzlr. e refere-se. p. ~ j ~~ ~ ~~ ! ~' 1 ES . um importante papel na sua organizaçao econômica [Richards. como também um historicismo do outro.36). Devemos ter como base.. Ap6s a sua viagem de estudo às ilhas Trobriand. Sob certo aspecto. a cultura é referenciâvel à utilidade prâtico-orgânica. 0 abongme S australiano é nosso irmao: ff g . das contradiçôes nâo-solucionadas na base.. cerimônias Intichiuma dos aborîgines australianos.. se informada y. Por ser mais explicito. ~. cOtlvade.p. a valores pratlcos (Jela-se bioI6gicos). as condiçôes fisiol6gicas da temperatura. desempenham efetivamente uma funçao na sua vida econômica .1 :t 3 ~ ~ ~ Malinowski e 0 "neofuncionalismo" De uma forma ainda mais explicita que Morgan. do Inttcluuma austrahano ao totemlsmo de Trobnand... corn suas danças selvagens.. do texto de Morgan corn 0 de Malinowski seria ca ir no lugar-comum.. em cada estagio." E em segundo lugar. 1960 [1944)..) estâo essencial~ente ligadas ~ elemcntos culturais muito univcrsais c fundamcntalmentc humanos. • ..:1 .. como se orientada por uma espécie de super-racionalidade ..106-7). de quem emana 0 projeto da 16 Como 0 projeto de Malinowski é popularmcnte descrito: do blzarro ao bazar 0 artlgo d: Leac~ (1957) sobre Malinowski faz uma excelcnte ami!ise clesse processo de "fazer sentido". p. de costumes cx6ticos" (1960 [1933 J...à quaI a Iinguagem fornece apenas a vantagem de um suporte te6rico (cf. toda cultura deve satisfazer ao sistema biol6gico de necessidades. seremos capazes de provar que aigu mas realidades que nos parecem mUlto estranh:ls il primeira vista (canibalismo. ela diz mais 'sobre de do que sobre os "selva gens" . nunca foram efet ivam ente in corpo) ~ radas ao esq uem a fun cionalista" (Leach. m enos intensas e mai s mediatizadas d evem ser as relaçôes en tre esse fato e os fen ôm enos dessa esfera. na quaI 0 co nteudo é trocado por uma "compree nsao" d e le. ':O tl1('\ t. 1912) . Clllll/ra c razao prtltic(/ Dois paradigmas da teoria ant ropoMgica 81 Em vez de submeler-se à compreensào de uma estrutura corn um a existênda in dcpendente e autênti ca.'ntl'mente peculiares pelas quais as pessoas estào agindo nao m erecem em na da. Vayda e Rappaport. Para Malinowski. su a relaçào com a vida. . entre outras imperfeiçôes do método historicista (1966 (l933J).nos uma avaliaçao in completa e Il:1o-sist€'matizada. Malinowski. p. o funcionalismo utilitario é um a ceguei ra fun cion al para 0 conteudo e para as relaçôes interna s do objeto cul tural. para compreender a sua visâo do sel! Ill undo" (1950 [ 1922 J p.l que os fatos "falariam pOl' eles m esmos': Hojc cm di a. Ele se apresenta exacerbado quando a fun çao é buscada ao nivel biol6gico. '~ cc r ~ 80 c lil l ur ~l. sen do sua consistência interna.i ri 3s.:: . Este cra Uffi principio fundamental do seu "cmp irismo radi ca l". uma vez qut. a econômica.l:' / t' (('IIl~ i ~i. 1957. na mesma obra. BO . \\alillo"'ski inverteu nao apenas as prem issas de uma antropolog ia boasiana.('fada como a sign o de um empi ri smo in gênuo. Kroeber lançou a .. pensando obviamen te em Malinowski: "Por que um Yurok nao (O ill e l' Ill sua canoa en quanto navega no occano?" A questôes como esta "nao ha Ilenhuma rcsposta 6bvia coma a que se da a pergunta s do ti po: por que uma flecha é eillplumada ou quai é 0 uso dade a uma rede de pescar" (Kroeber. senti do pnHico aparcntc. por conseguinte.I967. nao s6 em Malinowski. Uma teoria.. Quanto mais 0 fato cu ltu ral se afasla da esfera da utilidade à quai esta referenciado . r6seas: sou eu quem as descrevera ou criara" (Mali nowski. Ele nào existia. pelo quai essa racionalidad e é natura l à espéc ie humana. Smith. fazendo assim cam que sua existëncia 1 estrutura J dependa da delco l'ara Mal inowski cra um p o nta import~l1t e do método etnografico "p crecber () ponta de vista do nativo. Ha. Cer ta vez. Kelly. 1948. que estimulavam a produçao através da antecipaçao representada pelos ritos (Malinowski.. 1959). esto u pronto. . corn suas danças selvagens. parém.--------~--- '-"'1f'~. Boas fo i mu ito I1Ul:' illù)t'fe nte. cm lOlll !.fcita esta critica . as crenças em feitiça ria 1 . a nossa alençao. Mas.0 que de fato aprendemos sobre essas danças selva gens. 18 Quando Malinowski demonstrou que "as cerimôn ias Intichiuma dos abo rfgines australianos. 0 conteudo é ap reciado apenas por seu efeito instrum ental.:1 dos in teresses praticos e d o calculo pessoal .se recusa a rcconhece r qualquer capacidad e no sis tl'Illa cult ural. Leach coloca a feitiçaria corn o \l1ll c:ü'mplo d o que acaba de ser d ito: "De aco rdo cam a dogma d e Malinowski. esta aftrlnaçao . adotando um tratamento difusion ista. devo muito a Firthjof Bergm3 nn e Raymond C. t-tlYia muitos outros dom în ios da vida dus îlh as Trobriand . é avaliad a por sua funçaO. 1966b [ 1940 J).. a social ..17 Tratava-sc aqui d e uma relaçâo total mente di fe rente corn 0 objeto. 'desempenhavarn uma fun çao na sua vida eco nômica" .'ènde a est rutura pela sua compreenstlO do objelivo dela. 1967). cf.:('tHr. Ë hem wrJade que Boas termi na ria tendo uma co mpreensao do parentesco Kwakiutl i:!ll~ll à que Malinowski teve do sistema Trobriand.l.H o rdem nos fatos. Ha uma enorme dispa ridade entre a riqueza e a complexidade de fen ômenos culturais como 0 Intichiurna e as noçôes simples d o antrop610go quanto às suas virtudes econômicas.lde cmpi ri sta d e Boas cons ist ia na ilusao d e que a pr6p ria orde m se \ revelar ia exatamen te tal como apresentada. através dos textos d e mil receitas de salmâo. conseqüente- . Vayd a. quanto a uma primeira formulaç âo da "lei dos rcndimcntos decresccntcs para a explicaçao funcion alista" que deriva .128-9. ver seu artigo "0 estudo da geografia" (in Boas.' IÜO fonnam nenhum. se us corpas 'p intados e seus escudos simbolicamente esculpidos.. e nao em coloca r os fa tos em ordem (cf.dos qu ais Malinowski deixou. nem m esm o sua propria in teligência podia entraI' em ce na. nos seus propr ios termos. Para uma excelente discussao da atitude de circunspecç:l. cie co mpn. 307). porém. se m se benefi ciar de nenhum en tendim ento d a sua parte.lI11bém 0 relac ion amento original do antrop6 lo go com a po pulaçao.. embora. a "selvagem" era negatividade pura.ou sej a. portanto. Malinowski 0 criaria: "Ouço a pa!avra 'Kiriwina' .dela. po rérn. 1957). .. p. co m o chama Leach.parentesco.a orgâni ca.o de Boas para corn 0 fen6meno em si mesmo. polîtica . e nada do se u conteudo especifico. 0 "empir is mo" en tao deve cO ll sislir na aplicaçao radical de uma teori a . Sornente a fra çao mais infinitesimal dessa rica realidad e. Em tud o isso. Nadel .:' !'rocurava cra uma submi ssao à cu hura em si mes m a. p. . critique em profundidade a tentaçâo do mestre de retalhar a cultura em pedaços. cm pri m eiro lugar.l. 1965.que sustenta que as rnaneiras ap:1n.Il. a partir d e um respei to decente pela ininteli gibi lid ade do indi o. devido a algul1s d esses mesmos escrupulos t'c6ri cos. 0 qu e é qu ase sempre verdadeiro.10 sendo nem sensiveis nem racionais .\. 18 Neste ponto. Areas intcÎras da cultura escapam. como tamb ém em vers6es mai s recen les da antropologia (cf. mistificada como sua utilidade externa. De fato. 0 ~ qu I:'" ~.:h. quanto pelo "conhecimento" que oferece. nu~i.1Y.l (1$ textos e declaraçôes d e pessoas co mo simples formulaçôes do id ea l. 1 { 17 Radin apresenta resumidamente 0 pri ndpio de Bo as de que "ninguém tem a dircilo de alterar a fo rma cxala na quai suas in formaçôes foram recebidas". i n ~. 196. 196611926]).140). p. A explicaçao funcionalista é uma espécie de barganha feita com a realidade etnografica. 0 antropô logo foi reduzÎdo ao status de um aparelho de gravaçao.'I1~ co m tais regras e entre si (cf. esses corpos pintados e as mil outras propried ades do Intichiuma? Esse empobrecimento co nceitual é 0 modo fu nciona lista da produçao te6rica.25 ). quanto men os tenl ar compreender sua 16gica in erente. . a uma explicaçao fu ncionalista. j\ l:tl inowski .' n uid . Ele co nsiJt'r~lY. deve ser julgada tallto pela ignorância que exige.uaç:1o com os motivos rea is pragmaticos q ue governavam as relaçôes dos hOI11I.sl'gu inte pergunta. uma contradiçao clara entre esse empir ismo e a compulsao para disso lve r costumes estranhos cm noçô es ul ilit. um comp romisso em 1 t'n. pequenas cabanas cinzas. ter~ain de percor rer u m longe camin ho até tornar inteligiveis as danças selvagens e os escudos esculpidos. a ûnica coisa que importa é mostrar que 0 pellsamento é um modo de idealismo . por conseguinte. sua meta é a assim ilaçao total corn um minimo . que envolve 0 objetivo apenas selctivamente. A atividade lingüistica aparece portanto como um esforço pe rmanente para submeter a um conjunto de formas um dado que sempre ultrapassa os seus limites. qualquer est rutura sig nificativa. necessidades numatlas. - ! . . consiste em considerar as propriedades culturais simp les mente camo a aparênc ia. Te ntou ~ se fo r mular u ma regra geral dos re ndimen tos decrescentcs para a explicaçao func ionalista: quanto mais distante e d istinta a prâtica cultu ral do observador da sua pretensa fu nçâo. por definiçao. men as determ inada sera a explicaçâo através de vir tudes func iona is.. Qualquer que fosse 0 dominio cultural em questào. da gama das sensaçôcs ou'dos afetos. 0 marxista pensaria estar perdendo 0 seu tempo se. menas intensas e menas especificas serac as coerçôes sobre a natureza do costume cm consideraçao.. mas sim suprimi-Io . Delerminaçôes espedficas despertam na teoria as mcsmas suspeilas que as pessoas despertam na realidade.] É 0 conteudo que deve ser compreendido.. à p ratica funciona lista clâssica: <. Mas nao é esta uma caractcdstica apenas da linguagem.sobrevivência humaI/a. mito ou magia. Quanto ma is se recorre às vantage ns econômicas. Nesse ultimo aspecto. preservando para de uma relat iva autonom ia.e. toda refraçao de uma realidade através de uma linguagem implica uma pe rda de informaçao.à atividade valora~ tiva da simbolizaçao: ma is um a vez. tem a satisfaçao de acrcditar que esta reduzindo a aparência à verdade. l! nccessario levar-nos de volta ao concreto [0 material] e conseqüentemente apresenlar-nos com determinaçôes fundamentais mas abstratas .p. seu exame s6 podia começa r livrando-se da co nsistência simb6 lica. lai coma uma obra de arte ou um ato poHtico. po nto par po nto. a explicaçaa sai frustrada no seu objetivo de tomar 0 costume inteligîvel. par exemp lo.. 0 método é idèn tico ao terror na sua recusa inflexîvel do dlferetrte.. ] f Em francês no origina1. A regra deve ser concebida com o uma expressao instrumental da "autonomia relativa" de d iferentes dominios culturais (ceri m ôn ia/economia). 0 ataq ue de Sartre tinha camo alvo um certo marxismo. 1964. A relaçao do dado natural coloca isso em pie na luz: quer se trate da sexua lidade. iniciados ou nao~ inic iados. a abstraçao do simb6li co atinente ao objeto foi complementada pela simbolizaçao de uma abstraçao pertencente ao antrop610go.l \j 82 Cu/tllra c mzao prarica Dois pamdigmlls da tcoria antropol6gica 83 ~I 1 mente.nao é integrar aquilo que é diferente enquanto tal. D eve haver muitas maneiras de estimula r a produçâo além de encenar uma cerimôn ia Intich iuma. quando dissolve 0 particular no Universai. Além d isso. e até mesmo a anâlise da pr6pria li nguagem . descoberta aquém das diversas modulaç5es culturais. a anilise que pe rmeia todo a seu Magic Science and Religion (1954]). Para a maioria dos marxistas. substituir a particularidade pele univcrsal. Malinowski disso lveu repelidas vezes a ordem simb6lica na verdade âcida da razao instrumental. p recisam ente. etc. nao nos pode u formalismomarxista é um projeto de eliminaçao. da necessidade. à la Radcli ffe Br6wn. (Sartre. cuja especificidade consiste no seu sign ificado. As relaçôes domi nantes entre os cHis to têmicos. até 0 nivel biol6gico. ele exam inasse a cerimôn ia ao nivel do fato social.em relaçao a tudo 0 p rimeiro passo de Malinowski era negar qualquer 16gica interna. por sua vez. é vantajoso 0 Intichiuma? 0 entendi mento func ionalista d e Malinowski teria sido mais convincente se. que se contenta em negligenciar a 1 6gica autêntica de um "fato superestrutural". e particularmente d a irredutibilidade do cultural aos nfveis constitutivos da integraçâo feno m enal (superorgânic% rgâ nico). a fo nte geral de inadequaçâo nas explicaçô es pela f~. menos é dito. ora. basta inverte r a questao: é vantajoso aumentar a prod uçao . apenas uma forma de comportamento assumida pelas forças mais fundamentais da economia ou da biolog ia. [Sebag. cada sociedade aparece coma submetendo a um princip io de organizaçao que nu nca é a ûnico concebivel uma realidade que se presta a urna multiplicidade de transformaçôes. a natureza arbitraria do signo. é a cultura como um todo que se deixa de fini r da mesma rnaneira. homens e mulheres. Esse é 0 nosso objetivo. a poesia de uro Valéry é repudiada coma um exe m plo de "idealismo b urguês': A crîtica de Sartre parece apropriada. A partir desse fato. é levado a tomar por aparência 0 contcûdo real de um comportamento ou de um pensamento e.48-9. possivel de esforço. ficaria comp letamente perd ido em u m d iscu rso de «necessidades"vazio de significaçao. 0 co n teudo cultural. tornar-se 0 objeto de um tratamento da mesma ordem. Lucien Sebag demonstra-o bem: dar senao 0 esboço da pr6pria forma da cultura. conseqüentemente. é este illtimo que deve ser compreendido. com esse prelex~ to. Aos seus 01h05. O marxista..mçâo nat ural esta relac io nada. 0 concreto-real cultural torna-se um abs tralo-aparente. Ai ent~ o . ma ior sera a variaçao de prâticas cultura is alternativas que poderiam servir igualmente (até melh or) ao mesmo prop6sito. menos essa funçao especificara 0 fe nômeno. inversamente. submete 0 natural a uma 16gica espedfica da cul tura. A partir dessa visâo. a pratica funciona lîsta. como as forças supostamente essenciais sac na verdade abstratas . compreende-se por que a explicaçao naturalista é sempre insuficicI11 po is a essência e. pensar é exigir totalidade e. Parentesco o u tOlem isl11o. podendo 0 que é abandonado. Sartre fala. ou. dos rirmos do dcsenvolviOlenta do corpo. ao fenômeno coma tal (ver. num contexto analogo.. por exemplo. Da mesrna forma. p.]. tentasse compreender a originalidade de um pensamento burguès. 1963.166-7. 0 objetivo . e as d eterminaçôes especificas do seu autor. crença nos espiritos ou d isposiçao do m orto. Dai decorria que a i ntel~cçao . nunca do seu conteûdo. E menos ainda teria sido obtido se Malinowski tivesse levado adiante seu projeto. de um "banho de acido su lfurico". No entanto. C0l110 ja vîmos. esta é uma forma bizarra de se ocupa r dos seus pr6prios assuntos. Para nos provar a indeterminaçao de qualquer dessas explicaçôes. Na realidade. em favor das determinaçôes gerais de classe e produçâo. mas uma força cu ltural ativa. "condicionamento" ou educaçao.. p. cm q uantos sign ificados distingulveis ele é usado. Qua nto ao mito. Uluas sao 0 instrumen ta. é ela pr6 pria dividida pela expe r iência.• p. 97) : Fica evidente tamb ém que 0 significado é limit ado à exp cr iência pela associa· çao. 0 outra é 0 seu pr6prio produto: o significado de urna ûnica expressao vocal. Esta também foi a famosa abordagem de Malinowski à lin guagem.. cujo significado cons iste nos efeitos indu zi dos sobre os o uvintes. dific il mente urn "selvagem" teria uro Interesse na natureza que nac fosse ditado pela fome.97). e isso se dcve <1 respostas culturais produzi· das por treinamenlo. ver Henson ( 1974).59. nao é os dois lados d o papcl de Saussure]. riam existir como nés as entendenlOs. ~ .. é clare. 20 " Para definir um som. cada um desscs so n s é uma "u nidade" d ife rente de todos os o utres.uuento m anual e fîsko" (Malinowski .a IlI!tropolOg. No que toca à funçao explicativa desses mitas. > o mito estudado vivo . isto é. nao é uma explicaçao para a satisfaçao de um interesse cientîfi co. na realidade. na Ellciclopédia das ciêncÎas socÎais:"O signifi cado de uma palavra nao esta misteriosamente conlido nela. ja que . . p. sao d iferentes. levou Mali nowski a aIgu mas escolhas bévues.. por assim dizer. p. .espaço para 0 simbolismo nas suas idéias c contos" (ibid . da pa lavra com o categoria. a linguagem. 1957. Pa ce. a "especulaçâo': como }. Ialinowsld. qualquer teoria que eJes encerrem. 1965! 1935 ] 2:72. Malinowski viu-se obrigado a co nc1uir que a "palavra" em questao é.327-8). desca rtar·n os de todas as interpre· taçôes expl icativas e simb6licas d ess~s mitas de origcm. nao é simb6lico. 130·2). E eom o as palavras sao aç'a. 1931. qualquer curiosidade 'que eles satisfaçam . Uma palav ra é um esllmulo co ndicionante da açao humana e torn a·sc. e para ele 0 munda é um indiscr imin ado pano de fund o contra 0 quai se d estacam as espécies uteis de plan tas e anim ais e dentre elas sobret udo as co mestive is" (1954.:ma. a lin guagem n ao contém teoria aigu m a: ela nada co ntém. a teoria dos nurneros. Difi culdades sem elhantes se apresentam pelo fa to de que duas pessoas nao podern nunca expe rimentar a mesma realidad e exatarnente da m esrna m aneira.nao no jogo Ido pensamento. ê correlacionado corn elementos espaciais c temporais e com movimentos do corpo humano que canstitui 0 seu significado. Do mesmo modo) " ha pouco .! 84 :a !l' :c.cn 85 jihum. de u m modo ou de outro.. 1949 !1923] . 1'.622. Pademos. . 1'. nuo poderia ter qual ïquer papel constitutivo. através do exame cuidadoso de contexlos \'erbais. .. p. 1'. proferido ap ropriad amentc. devemos descobrir.. é antes um efcito ativo do so m proferido dentro do contexto de uma sÎtuaçao. 0 q ue significa dizer que nao existern pa lavras. 20 Se fosse esse 0 caso.co murn ou da praxis infantiL "Mesmo 0 rn atermitico puro.[alinowski a considerava. J 19 19 Malinowski dcscnvolveu essa visao instrumentaI·pragmalica da linguagem cm uma séri e de t'seri· tos.. nem as palavras nem a corn un icaçao pode. mas dentro de quem ouve [ibid. 0 costume se origina na prâtica. 0 segundo é a resposta. pode ser definido como a llludança produzida pela som no campor· tamento das pessoas. lidando corn 0 ma is inut il e arroga nte ramo da sua ciência. no artÎga sobre "Cultura". Uma deJas foi "a doutrina dos homônimos": uma vez que cada referência cmpi ri camente distinta de d eterminaâa palavra collst itui um significado dist in to.. ao mancjo de uma anna. as catcgo rias rea is d erivadas de atitud es praticas da criança e do ho mem natural ou prim itivo para com a mundo eircundant. e n30 sirnbolos de realidades ocultas. urn conjunto ac idental de homônirnos. a uso d as palavras cm Iodas essas form as de atividadc numana lem uma rebçao mütua e indispens:lvcl corn a compo rt. extremamen te importante" (ibid. cf. na vida .• p. jj que "no final das con tas todo 0 significado das palavras é derivado d a experiência flsica': Malinowski insist iria em q ue mesrno os conceitos mais abstratos. se a palavra é usada cm um contexto diferente nâo pode ter 0 mesmo significado. submissôes sociais. Dai a famosa afirmaçâo de Malinowski sob re a mentalidade m anifesta nas classificaçoes totêm icas: "a caminh o que vai da selva para 0 estômago do selvagem. certamente.. nem articularia qualqu er concepçâo além da raciona Iizaçâo clesse desejo. VIlla palavra se diferencia de outra da mesma fo rma que a contexto do mundo real na q uai a p ri rneira ocorre é perceptivelm en te dis tingulvel d o contexto do segundo.' CIIltllra c razào pratica Dois paradigllul5 da teor. . Esse tipo d e recusa fundamenta l do simb6lico." (Malinowski. Da[. no do instinto e da necessidade: Nessa perspectiva... A emissào do som é um ato significa nte ind ispensâvel a todas as forma s de aç<'io h uma na combinada. cf.. Pa ra Mali· nowski. mas apen as uma infinidade de sina is co ntextuais fugidios . nâo ha qualquer probJema de que eles dêcm conta. Malinowski. derivarn-se realmente do lugar. Leach. 1261 . e até mesmo necessida· des praticas [ibid . que nesses casos é rcduzida quase semprc a urna palavra. Os pcrsonagcns e seres sao 0 que parcccm ser na superficie. à exccuçao de um rituai o u à conclusâo de um contrato. elc existe na relaçao do som co m 0 contexto. 1949 [1923].l 0 J . anseios marais. d e " 'apreensao' das c01sas"." [ibid. a urna referência ori ginal e indicado ra que cont inua senda 0 conccito bâsico da exp ressao vocal através das suas reproduçôes s~bs('qüente s . n ada além de urn gesto verba l. r . Porexemplo. e conseqüentemente para a sua ca beça.. 0 signHicado nao é algo que rcsida denlro de um som lista é. narrada para a satisfaçao de pro· fundos desejos rcligiosos. Boas. na sua estru lura. ta m an ci ra pela quai um so m. 0 sign ifieado é a reaçao evocadaj as primeiras SaD 0 estimulo. 1965 [1935 1 2:9).. em vez de cJassificar il exper iència. nao é "uma raps6d ia inutil .elas pr6prias. 1964 [ 1963]).. na medi da em que os contextos de dois u sos diferentes d a mesma pa lavra nunca sâo os mesrnOSj portanto. mas no da emoçâo e do desejo. muitas outras diferentes. Ma is uma vez. é mu ito curto. "A li nguagem esp elha. ''As palavras sao parte da açao e sao equivalentes às açôes" (Malinowski. Ë um tipo de comporlamento intimame nte comparanl à man ipulaçâo de uma ferrarnenta. Para uma avaliaçâo critica dOlS tcorias da linguagem de Malinowski.. provavelme nte . co ma os de ciência.44) . mas urna ressurreiçao narrativa de urna realidade primeva. deixa de ser a mesma palavra e to rna-se duas ou mais unidades semantkamente d istinguÎveis" (~. mas urna cxpressao direta do obje to cm questao.a possu Îa alguma experi ência de contar seu s \ . ullla "aprecnsao" das cOLsas externas 30 alcance de qucm fala. 1960 (1944). a fisica e as técnicas matematicas rcsu!tantes das sucessivas rcvoluçôes industriais.na realidade a "origem" . Nessa concepçao. embora em contradiçao corn sua noçao de que a palavra nao contém idéia alguma: Nao existe descriçao destituida de tcoria.201-21).. no maximo incita à açao . que a palavra conecta e as estruturas agcm" (ibid . nao é uma produçao no sentido literaI. se leve a cabo uma pesquisa de campo em uma tribo selvagem ou em uma comunidade civilizada .1 21 Ricoeur (1970... gerada por uma prolongada socializaçao na vida de Trobriand. . é 0 resultado de uma teoria que declara que aIguns fatos sac relevantes e outros acidentais. ~ . nao 'faz' nada. enquanto a segunda ja ai se prefigu. que designam sem nada fazer. a que devemos. que alguns fatores determinam 0 curso dos acontecimentos e outros sao simplesmente entreatos acidentais.. MalinO\vski ignora agui 0 fato de que 0 sîsterna de numeros deve ter antecedido a contagem. Enfocando particularmente a matematjca. que impossibi!it:tvam qualquer recurso e qualquer alusao a manipulaçôes. Esse ascetiSlllO da linguagem matematica. mas é esse tipa de erra que ele sempre comete nos se us argumentas ontogenéticos (como 0 da pratica classificat6ria do parentesco).7. através dcla.. e da submissao. cm conceitos. determina a "intluência" especîfica da palavra. todas as nossas maquillas desde a aurora da era mecânica. todas as palavras quc a princlpio nâo procuraram transformar 0 mundo cstao contidos dentro deJes" (ibid. verbos e substantivos. Vma matéria-prima a sel' trabalhada como qualquer outra. um descjo. deve organizar sua experiência etnografica através de se us conceitos. do "ideal"a um interesse pr6prio pragmâtico . que certas coisas acontecem como acontecem por causa de personalidades e mediaç6es materiais do meio ambiente que as produziram. 0 resultado de uma observaçao sobre o comportamento de outra pessoa nâo é 0 mesmo tipo de relaç300 como a do deito de uma ferramenta sobre a forma de um objeto.. Malinowski sustentava que 0 mundo nao corporifica idéia aIguma. em vez de vivê-Io e experimenta-lo em suas mcdidas rcais. cIe nao é "produzido" como um bem mate rial é produzido (1970. que 0 seu significado é externo aos seus "efeitos" empîricos . nem pele desenvolvimento completa de ambas. Quer se reconstruam cenas hist6ricas.203).do sistema (cf. isto é... porém. A palavra se articula cm frases. toda declaraçao e toda argumentaçao têm de ser feitas em palavras. ja que a "compreensao" inclui ao mesmo tempo um projeto e um sistema de va!oraçôes que diferenciam 0 mundo e as aç6es dos ho mens neleY Pode~se fazer a mesma afirmaçao de outra maneira. superficie.. um objetivo . Malinowski nao pode seT orientado pela experiência na sua interpretaçao.. Ricoeur escreve : ". em ûltima analise. Sem prcpriedades distintivas por direito nato. objetos. somos capazes de controlar nossa açao por uma espécie de 'ftaseamento' de nossos gestos . Cada conceito..• p.. teria sido impossîvel sem 0 heroismo 16gico de um Parmênides negando todo 0 mundo do devir c da praxis cm nome da auto-identidade das significaç6es. 0 conceito de significado de Malinowski é inca paz de explicar seu pr6prio projeta etnogrâfico de dar sentido funcional ao costume ex6tico. similaridade das figuras etc . ordenando essas inter-relaçôes. mas uma significaçao. Malinowski.. [Malinowski. 0 significado desse fraseamento nao é uma transformaçao das coisas ou dc n6s mesmos. e sim. 0 economicismo do individuo racionalizante (natureza humana). . que a matematica foi posslvel e. por sua vez... nao pode ser tido como responsavel pela invençao de qualquer das duas problematicas. " l ' . a cultura nao tem qualquer condiçao de ser analisada como uma coisa-em-si-mesma. E a essa ncgaçao do movimento e da atividade que devcmos as rcalizaçôes de Euclidcs.ra. Uma etnografia correta. e. por causa disso.197-219) formula uma brilhante cdtica geral da noçao da palavra praxis pura (incluindo a palavra imperativa). 0 Alter é simplesmente um meio para um fim.que investe 0 segundo como 0 verdadeiro operadol' da vida social. Mais uma vez.Ë porque 0 homem exprcssou 0 espaço cm geometria. na sua opiniao. Na medida em que a forma ostensiva desses costumes é estranha ou mesmo nao-funcional. p. 0 economicismo ou 0 utilitarismo se desenvolve a partir de sua distinçao entre norma cultural e atitude subjetiva. constitui uma epistemologia para a eliminaçao da pr6pria cultura como objeto antropoI6gico prôprio. que se aplica totalmente a Malinowski . p. . . mais decisivamente. p. Pois todo 0 nosso conhecimento. é clara.. de Galileu.'JO 22 ''A palavra. a "palavra imperativa".. ' t 1 ~ · ·. ou 0 ecologismo da vantagem seletiva (natureza externa). a transforrnaç6es fisicas dc figuras. Mas se Malinowski tem de criâ-Ios. p. porque a comunicaçao implica uma comunidade) e) conseqüentemente. Seu estudo degenera em uni ou outrc dos dois naturalismos vulgares. ou pela men os deve categorizar e valorizar seletivamente as atitudes racionais das pessoas sobre seu comportamento nao-racional através de um princîpio n3oOdado pela encontro etnograflco." %. tal camo afirmamos. mas a primeira é definitivamente integrada em sua obra. Nao apenas porque 0 outrc é um ser intencional como eu. confundindo a maneira pela qual 0 indivîduo é socializado no siste~ ma com a explicaçâo . E surpreendente que Platao tenha contribuido para a constmçao da geometria euclidiana através de sua obra de denominaçao dc conceitos tais como linha. isso intluencia 0 "efeito" de todas essas concepçôes comuns de homens e coisas que. Pode-se ver na compreensao que Malinowski tem da linguagem como trabalho e do significado como resposta produzida ao ouvinte a mes ma reduçao do sujeito humano ao objeto manipulado que informa sua técnica etIlografica. seria exatamente 0 que um nativo de Trobriand teria escrito. no sentido em que se realiza um piano. complcmentos.1 . camo insiste Ricoeur.204) . E é 0 que faz ao admitir isso. plurais etc. Malinowski. a maquinaria modcrna e todos os nossos dispositivos c instmmentos. é através desse v:Ilio de significaçôes. 1930).21 Finalmente... a "efeito" requer a presença de seres simbolizantes em urn contexto simbolizado.86 Cu/tum e rf/zao pratica Dois paradigmas da tcoria antropo/6gica 87 trocados" (1965 [1935] 2:58). igualdade. Ricoeur observa que no exemplo mais forte do mundo como praxis. o canibalismo da forma pela funçao. A eliminaçao por Malinowski do simbolo e do sistema das praticas culturais. mas se incita à açao é porque significa 0 que ha para ser feito e porque a exigência significada para outrem é 'entendida' por de e 'scguida' por cie . e toda significaçao designa vaziamente que trabalho realizara. uma espécie de inversâo bâsica dos prindpios durkheimianos. camo "cremos adiantc.. impulsivo'~ é que. cm termos de um csquema aplic:i. É um instrumento no sentido de um conjunto de m eios à disposiçao do sujeito. a cultu ra aparece simplesmente coma um instrumento ou urn ambiente da dinâmica constitutiva do prop6sita humano. da rnesma forma que a valorizaçâo de bens e a divisâo do trabalho.1'. os fatos das relaçOes e dos agrupamentos sociais sao. em seu esquema. 1 1 . de significaçao e açao.88 CUIIl/ra e razao prdtica Doi$ paradigmas da ttoria antropo16gicn 89 \ 1 Mali nowski podia "ver as cnisi1s COIllO os nativos as viam': contanto que des concordassem cm ver as coisas da sua mancira. motivos. Assim. a famosa "imponderabilidad e da vida quotidiana': Muito freqüen ternente. tais como a solidariedade do da. E isso. Malinowski desloca a dinâmica social para 0 nivel natural. registra os fatos.e de novo corn referència à :lçâO --'. Por um lado. tal corno diretamcnte obscrvadas pelo ctn6grafo e admiticla$ pc10s atores) vista coma a realidadc da vida social. ao co ntrario. os mûtuos serviços concretos. impuisos. sentimentos e emoçôes das pessoas. e documenta a sua transposiçâo para um contraste entre forma e sentimento que n:1o deixou qualque r possibilidade de entend imento do parentesco em si mes lllo: "0 que é digno de nota é a cn fase na prâlÎca (a atÎvidadej a co mportamcnto. 1957. e 0 que 0 valha. as regras eram llma coisa. Pelas noçoes de Malinowski. 1968 r 19371 1:3 54). Deste outro ponto de vista. produçâo de inhame. se subordîna a uma outra 16gica . a quem observa a vida diretamente. a ambiç1io e a vaidacle demonstrad as. pagamentos de valores aos afins. com :lS crenças magicas. p. ao agir assim.0 afeto subjetivo sobre a forma ostensiva. ins iste Malinowski. Privilcgi<i-Io sob re a regra em nome do interesse racional requereria uma segunda distinçao: ent re essa aparên cia externa. e as atitud es pniticas que as pessoas conferem a ela. Mas ao separar dessa forma a ordem cultural do suje ito humano. os compromissos e os costumes nâo -legais s6 sao revelados a quern faz 0 trabalho de campo. do parentcsco c d3 cstrutur3 po!itîca trobriandesa" (p.as "da nças selvagens': as trocas de ornamentos killa que nac pod iam ser possuidos-co ntinua senda peculiar nas suas propriedad es observaveis. 0 interesse pr6prio. fatos meramente de costume e motivo.a compreender nao somente a sua lin guagem e as suas afirmaçôes. 0 problema real é saber como as regras se tornaram adaptadas à vida" (ibid. e as açôcs uma outra (oisa e mais verdadei ra. no final. 1966 11926 ]. Uma anâlise significativa cede portanto lugar a uma racionalidade manipulativa. rituais mortuârios. 0 amor mat ern o e a afeÎçao paterna. Eles teriam qu e desenvolver uma analise que va lorizasse a açâo prât ica sobre a norma cultural .. totalmente convencio nalizado da atitude nativa". muito embora d e acordo corn a premissa de que "0 homem é duplo". p. nâo pode fazer uma avaliaçao delas. à analise formaI de relaçôes meios-fins baseadas em uma teleologia das satisfaçôes humanas. E é um ambiente. exogamia dânica. mas na maneira pela quai essa ordem é subjctivamente vivida.vel da mesma forma aos outros" (Parsons. 24 Sorokin caractcriza corrctamente esse procedimento COolO "3 falacia da inadequaçâo 1 6gica~ . através do quaI ele alcança se us fins autofixados. como nao preserva as propriedades simb6licas. Mas a identificaçâo dos atrib utos culturais como a "norma" ou 0 <Cideal" vis-d-vÎs a vida real deve condenar esse esforço como metafisico. as açôes. A cultura. mas coma algo sobre 0 qua I de opera suas razôes e.que. da mesma forma que s6 elas sao descritas l'or propriedad es especificamente culturais: descendência matrili near. enquanto especificamente humano. vive nesses abrigos junto ao seu 'material' corl1o par. nao somente como um co njunto de coerçôes externas ao individuo.164) . por uma 16gica. S6 elas têm direito a esse status. e que emcrgern cm ûltima instâ ncia de instintos huma nos universais camo 0 parentesco ou de sent irnentos hu manos comuns coma a va idadc e a :llnbiçào.1201). Todavia. ha as regras e formas convencion ais que equivalem à "cultura" da situaçao. senda as prim ci ras uma si mpl es co nversa ca m a "realidade" das ûltima s. nao temos cm parte aIgUilla uma anâlisc artîculacla da organizaçao local. 0 ato. Malinowski introduz um tipo de esquizofrenia ontol6gica na etnologia . deve ser descri to e comp reendido em termos retirados de outro universo de discurso: necessidades. par exemplo. sentimentos e pensamentos de indiv(duos cm situaçocs sodais." :3 Fortes descreve corn agudeza a oposiçao entre nonna "ideal" e pdtica "l'cal" na obra de Malinowski. d esdob rada a partir dos atributos simb6licos. 160) . poderiam ser relacionadas às classificaçôes d e parentesco ou às prâticas matrimoniais. A vida social humana é tomada como dividida contra si mesma. a quase nunca formulada lin ha da conduta espontânea" (Malinowski. desejo"s.~ • .127). com posta d e dois tipos d ifercntes de objeto que se mantêm em relaçôes de contraposiçao e competiçao. amplamentc cquipafados. as regras de exogamia c1ânica. Mas "0 c6digo d a conduta natural.0 que é dtadocom aprovaçao par Parsons t assim dcscrito: "Consiste cm cx:plic3r um conjunto de f3tos corn propriedadcs que 0 diferenciam d aramente de outras. cm suma. impulsiva. ao mesmo tempo. A imp ortância desse "c6digo natural. mercccnda as nonn as menas existência e analise do que 0 com portamento motivado por um auto-Înteresse iluminado. assim com o a ficçâo é separada da vida real. que represen tam somenle 0 "aspecto intelectual. mas tamb ém os motivas ocultos do comportamento. em face de convençôes cul tu rais coercitivas.que é pensamento normal da ciência social da nossa época. as evasôes. ordena as propriedades ° 1 1 '--- 1. manifesta. cm contraposiçao ao 'ideaJ' <lU 3 ' teoria'. elas também poderiam ser compreendidas nesse sentido. form a incongruente. por exemplo.. ou seja. . e a forma cu ltural se submete à praxis "espontânea': "0 verdadeiro problema nâo é estudar camo a vida huma na se submete às regras isso simplesmente nâo existe.la por forças que emanam do pr6prio organ ismo. A i11esma fahid3 se aplica tante ao ccologismo quanto ao economicismo (utilitarismo).24 Por outro lado. parentesco classificat6rio. Os dados mais verdadei ros da etnografia nào consistern em fatos de ordern cultural. os antrop6logos sac envolvidos pela narrativa das "ficçôes legais" dos nativos. 3S fo nnul açoes simplesmente verbais (Fortes. remos de lidar com a luta do suj eito individual para alcançar seus pr6prios fins. Em princîpio. ele prevalece sobre 0 convencional. em opos}çâo à nonna da cultura esta 0 "comportamento real" da pessoa. procurando representa. Neste ponto. p. 0 sistema econômico mais desenvolvido faz uma diferenciaçao explicita de categorias que permanecem combinadas. é uma soluçao final para 0 problema cultural. elas siio respondidas em fermos dos efcitos de UIII comportamcnto illformado culturalmentc sobre sistemas biol6gicos: organismos. É verdade que Malinowski foi 0 primeiro antrop610go a negar a generalidade de um homem econômico (1921. homeostase. antropologia eco16gica nao é simples mente a de levar cm consideraçao os fatores ambientais nas suas tentativas de elucidar os fenômenos culturais. um mdo que lhe permite viver.é uma consciência instintiva que n6s temos dos outros e de n6s mesmos. 1973.. e assim os val ores se invertem. ativo corn passivo. A caracteristica distintiva da f. ou seja. em tudo isso e por tudo isso. como 0 pr6prio Malinowski relatou. [Dumont. 1963).] A separaçao economicista da estrutura normativa da açao pragmatica. populaçoes e ecossÎstemas. ou seja. a de que 0 individuo vive de idéias sociais. se nao bane completa mente a cultura do alcance antropol6gico. 1964). em um certo sentido. ~j l~ clesse meio. grifo meu). nao é mais que um dado irredutivel ao qual se pede som ente que nao contrarie as exigências de liberdade e de igualdade.37. Mas isso nao se deu exatamente para conferir ao mesmo conceito um alcance maior? "Nas pâginas dos Argonautas e em seus sucessores". a anatomia do homem é a chave para a anatomia do macaco. estahelecer um padrao de segurança. • 2S "Os problemas colocados pelas necessidades nutritivas. tem de ser permanentemente reproduzido. 0 reino dos fins coincide corn os fins Icgitimos de cada homem. ou mesmo Wolf. escreveu Leach. Muitos daqueles que podiam criticar 0 funcionalismo de Malinowski estao.12?). Polanyi. 25 Concebida des sa forma. A cultura é reduzida a um epifenômeno de "processos de tomada de decisao" intencionais (como dizem).. ambîguas ou som ente virtuais no sistema econômico menos desenvolvido. as împlicaçoes prefiguradas em uma determinada perspectiva intelectual tornam-se explicitas apenas em versoes mais evoluidas dela. instrumental ou fundonalmente" (ibid. ao mesmo tempo em que sujeito pensante.243. Macpherson. particularmente do simb6lico no instrumental. a sociedade nao existe. pela sua investigaçao cuidadosa. Essa expressao familiar. .... 1950 [1922J). deve ser entendida camo Ilm meio para !/fil fim. 0 lugar analitico assim concedido à sociedade foi brilhantemente descrito por Dumont: Na sociedadc modern a . p. mas apresenta uma conexao aprep riada corn 0 saber atual da ciência social. 1970. esse processo depende da apropriaçao te6rica das qualidades culturais como efeitos orgânicos.49.essa cultura. Apenas pressagiados par Malinowski. ex. p. llm meio que lhe da poder e Ihc permite criar bens e valares que vâa além dos seus dotes animais.30). É a medida de todas as coisas. uma visao da mente . Cu/wra e razao prdtica Dois paradiglllas da tcoria autropo/6gica 91 1 13 Il i 1 . p. [1971. grifo meu). mantido e controlado" (Malinowski. 1967. A perspectiva em questâo continua sendo 0 economicismo nativo do mercado transposto aqui da anâlise da sociedade burguesa para a explicaçao da sociedade humana. p. 1944. para outras importantes discuss6es do utilitarismo (economicismo. distinta de uma explicaçao biol6gica.:90 . 1960 [1944].a adoçao axiomatica da problemâtic~/do sujeito que calcula. ou sem provâvel perda de lucfo. Uma socicdade tal como 0 individualismo a conecbe nunca existiu em parte alguma pela razâo ja apresentada. as pessoas formulam e reformulam adequadam ente sua ordem cultural (cf. Naturalmente. satisfeitos corn sua contraposiçao essencial entre interesses pessoais e ordem social (p. conforta e prosperida· de.9-10. reprodutivas e higiênicas do homem têm de ser resolvidos. Parsons. Bateson considerou que 0 método funcionalista de Malinowski "é provavelmente acertado e.das suas formulaçoes. ele 0 faz. Do mesmo modo. a cultura desaparece. 1962. ver Dumont. 1968 [1937]. p. Comportando-se corn uma mente singular em direçao aos seus melhores interesses pr6prios. naO é de Malinowski. sob a forma de ser biol6gico. individualismo). Ontologicamente. em um sentido pleno e totalmente novo. 1965. constituinte com constitufdo.. como afirmou Marx corn razao.67-8. é clare. interpretaçao que nao somente dissolve as especificaçôes culturais como também lh es permite reaparecer de forma mais cientîfica (isto é..2?). toda a Humanidade. "sempre que 0 nativo pode fugir à sua obrigaçao sem perda de prestigio. 0 que foi dito acima é uma descriçao de valores. Do mesmo modo. a vida de cada um é 0 fim. que é nada mais nada menos que a pr6pria cultura.adaptaçao. Esse utilitarismo . pode oferecer um sistema coerente de antropoIogia aliado a sistemas de economia baseados no 'homem que calcula'" (1958. secundârio ou artifi~ cial. coma trabalho manual do homem e camo meio através do quai ele atinge os seus fins. ordenando 0 mundo social racionalmente de acordo corn desejos igualmente axiornaticos .. 1969). Indicamos também que a cultura. Explica Rappaport ~mbora (/s questaes scjant colocadas em termos de fenômenos culturais. E sao resolvidos pela construçâo de um nova meio ambiente. a interaçao en tre "vida" e "cultura" é neces~ sariamente desigual: uma relaçao de sujeito com objeto. 0 que ainda se denomina "sociedade" é 0 meio. Pois. orgânicos . "0 'selvagem' deixa de ser uma marionete . Entretanto. a reduz ao status de uma preocupaçao secundaria. Cada homem particular encarna. p. sobrevivência . 0 novo funcionalismo ecol6gico demonstra que 0 efeito da dissoluçao de Malinowski do conteûdo cultural na funçao biol6gica. mas a de atribuir significado biol6gico aos termos-chaves . Firth. exatamente como faria um homem de neg6cios civilizado" ( 1966 [19261. esses efeitos aparecem muito mais claramente em uma "antropologia ecol6gica" que homenageia suas fontes intelectuais intitulando-se "funcionalista" ou "neofuncîonalista" (cf. Nesse caso. ]arvie. quantificavel).. Ete é um ser huma no vivo que opera um sistema bizarro da organizaçao social através do exercicio de escolhas naturais entre meios alternativos para fins alternativos" (1957. nao obstante. Como no funcionalÎsmo de Malinowski.] . isto é. funcionamento adequado. p.77. Kuper. p. 0 Ser Humano é a homem "clementar': indivislvel. Esse meio ambiente. Mas a eficacia da cultura como uma ordem significativa é ao mesmo tempo suspensa. Collins e Vayda. Ele deixa explicito que a cultura nao permite qualquer compreensao especial. é oillar n wltura hunltwa sÎlIlplesmente como 0 comportamento ou parte do C()/llportflnlCl!to de lima espécie particular de pril11atas. ao menos as subo rdina a d a na imaginaçao. p. 1974. 0 da noçào da autonomia de lima ciência da eultura (Varda e Rappaport. I?nge de estar envolvido.- / ~ = "' 16no cultural (Collms e Vayda. p.. a relaçiio de IIlilidnde Olllllilizaçiio .organismos.lgm!Ïcad? que lhes é peCIIIUlr para se tornarem a expressao e a ma nifestaçao de uma terceira Iclaçao mtroduzlda em seu lugar.cultural é 0 ~u e parece. com respeito nao samente à sua interaçao corn variâveis ambientais. entre outras. A cultura é trocada pelo "comportamen to".460-1).a cultura pode ser estudada.1'. pois. A crise torna -se entao ontol6gica cm suas proporçôes. mas também com 0 efeito dessa interaçao sobre a seleçao natura!. uma versao antropol6gica ou ecol6gica particular da troca do conteûdo signi Qcativo pela verdadc funcional que Sartre descreveu coma ~arxismo vulgar. Esse sacrific io da autonomia da cultu ra (e da ciência cultural) seria à conseqüência da sua subo rdin açao denlro de um sistcma maior de coerçào natural. nâo fosse por sua intençao confessa de apoderar. É ameaçada de liquidaçao porque nâo pode ser especificada como tal por motivos naturais.ou mcsmo mais abslratamente. Nada do que e . p.'Tendo sido ignoradas as propriedades da cuttura na pratica da sua explicaçao. Suas qualidades concretas sao apenas a aparência de "movimentos do corpo". nao requerendo qualquer saerifjeio apreei<\. como. Dougl. J . uma abordagem posslvel sugerida par Simpson ... sel' compa radas individualment~ e/o u tomadas em conjunto como atividades constÏlutivas de uro repcrt6rio com· portamental global>chamado de 'padrao de obtençâo de alimentos'" . Compreendido isso. Pensemos nele simplesmente como um "reper- como tal nao deve distinguir 0 homem de quai squer outras es pécies. "movimentos do corpo" . 0 casa~cnt~ tor~a-se. Encarando·a desse modo. 0 amor etc. milho. eontudo rcquerer um saerifieio UIll poueo difcrentc. variavel e. A prâtica te6rica poderia sel' chamada de "fetichismo ecoI6gico". apena~ lIIt/a rclaçao é valida por si mesma . mas isso nao signifiea que prindpios basieamente diferentes devam ser usados no estudo do eompartamento humano e no estudo do comportamento de outras espéeies animais. cm um relance. pode fazer da observaçào e da deseriçao tarefas formidaveis.3). como boas para a espécic ou mas para cla.sc. Dai. nem a antropologia da biologia.1967..3S (1966) chamou ao mesmo ti po de pensamento. A ontologia recapitula ass im uma metodologia.er no sentido da realizaçao das melas ant ropol6gicas. Ao contrario. Na . que a catcgoria de 'utilizaçao' é subtraida das relaçoes reais que cu tenho com OUi ras pe ss~as (mas de forma alguma como renexo ou simples vontade) e enUio essas rc!açôes passam a sel' a.. Essa tcaria veio à tona corn Hobbes e Locke .amfcstaçôes definidas ~e qualidades definidas dos ind ivlduos. E a antropologia perd e seu objeto. Tudo isso realmente se aplica ao bll~guês.4.. estolJllOS eapacitados ·17 para estuda-Ia e interpreta-la da mesma forma que estudamos e interpretamos a comportamento de qualquer outra espécie.o Illutua.92 Crlliura e razilo prtitica Dois parndigmCJs da leorin flIllropol6~iCfl 93 1 1 1 1 . aplicado à descoberta de valo r'es sanitarios cm ta bus de dieta. cm uma medida eonsideravel. embora essencialmente abst rato.497). na moder~a socledade burgucsa. 0 [ato de 0 comportamento humano ser complexo. 1965. como as açôes de qualquer animal. pode-se prcferir dar ênfase ao comportalllCllto ftsico real OH aos 1II0villletJtos do corpo r. o funcionalismo ecol6gico coloca a cultura em um rÎsco du plo. m ~ s. "um intercâmbio de materiais genéticos". para a ecologia ela é "comp~rtamento': Pode tratar-se de comportamento aprendido. ser ca nsidcrada uma sine qua 1/011 da analise de eeossistemas que incluam 0 homem. v~ . mas nem pOl' isso digno de tratamento diferente do "comportarpento espedfico de espécie" de qualqu~r outro gr~po de .a relaçao de exploraçàoi Ioda s as demals rc!açôes s6 têm validade para cie na med ida cm que podcm ser incluidas sob aquela (mica rdaçao. ass im coma a caça é um m tercambiO de encrgia corn 0 meio ambiente". isto é. Conseqüentemente. [Vayda..155). maiS ger~ls . isto é. espedfico de uma populaçâo. Pode. as rclaçôes reais que sac aqui pressupostas . é descrila coma uma relaçao de utthdade e utl. sob as condiçôes seletivas naturalmente constituidas: A atençao a idéias. ali mentos que eles realmente consornem sao 'atividad es de subsistência' que podern. todas as rcl açôes sao subordinadas na prat'ÎCa a uma relaçaa monctario~a n~e. reahd~~e da categoria quc delas foi abstraidaj urn método completamcnte metafisico de procedlmcnto (Marx e Engels. p. por exemplo. a representaçao do valor de Iodas as coisas. presumese que essas propriedades nâo tenham qualquer autonomia ou valor como talo que é uma racionalizaçao do fato de que a explicaçao nao pode responder pOl' elas: Pareee que uma cîêneia unifieada da eeolog ia telll eontr ibu içôes definitivas a fa1. essa abstraçao aparcntemente m etaffsica resu lta do fa to de que. feijâo e ab6bora sào uma "dicta nao-equilibrada': a sociedade uma "populaçao de organismos huma nos': e 0 canibalismo uma {<atividade de subsistência".vel de intcresses antropol6gieos tradieionais. tudo é mistificado como ml1 fato natural que possui a vlrtude ostenslva de ser bâsico e exato.hzaçao. essas rclaçôes per. Na realidade. Em Holbach. a alllor~:rem a~ m. isto é. Malinowski opunha "cultura" a cornportarnento. 26 Esse mesquin ho comércio metafisico de pormenores etnograficos nao apresentaria interesse algum. do l11esmo modo.0 ato de falar.. de "materialîsl11o médico'~ Trata-se somente d~. e mesmo onde de encontra rclaçôes que niio podelll ser diretamente subordinadas à relaçao d~ c)(~loraçào. ~ -" -' r ct ( <: ~ através dos qllnis 0 IlOmem efetua diretamellte alteraçoes 110 seu IIU'ÎO illllbiente . 1965.. • ~ ~ i { I ~ . e porque a consideraçâo da sua qualidad e especifica exigiria a invocaçao de uma razâo de outra natureza. 0 ato de falar. Como "comportamento" . cOlltudo. variado. 1969.desse fehchlSIllO: A aparente estupidez de fundir todas as multiplas relaçôes das pessoas cm uma IImc~ relaçao de utilidade. r <. 0 fe nômeno 1 1 \ 26 ~ua nt ? ao pr6pr~0 ~arx. pcssoa. valores ou eoneeitos culturais nao pode. grifo meu."Cia l abs l~ata. toda a ativ idade de 11l?~Vlduos el1~ ~nte~-relaç5. ("Ao examinar 0 can ibalism.Dornstrcich e Moeren. Assim.o> operamos a partir da premissa de que toda s as ativid ades que proporcionam alImentos para os membros do grupo.s e relaçôes sodais. foi ele quem formulou as crfticas e explicaçôes . cujo saber é seu efeito biol6g ico.se do conceito de cultura. Para ele. A expressào material desse uso é 0 d~nhelro. COffiO 1I1O. isto é. . Dentro do ecossistema.• ~ '. a antropologia pode jâ ter encontrado â seu Robespierre. a palavra significa algo opressivo ou de dimensües e poder monstruosos. a mente s6 poder ser uma propriedade do todo: "em nenhum sistema que mostre caracterfsticas mentais. esse golpe e todos os golpes que 0 antecedem. coma seu acess6rio isolado vivo" (Marx. é outra.. provavelmente 0 hipop6tamoi cm sua acepçào correllte." ser negada cm qualquer uma das suas partes.iste camo um sin al de pontuaçào de um .T.a. Cada golpe do machado é modificado ou corrigido. Murdock . que. IIbid. 0 trabalho ~ uma totalidade . A alternativa cibernética prevista pela teoria dos ecossistemas nao passa de um fetichismo ecol6gico mais apropriado ao seu pr6prio contexto cultural... Para Murdock. (Donde. mas sua compreensâo da estrutura social deriva em hnha direta da teoria da praxis. J .. . .·p. arvore-olhos-cérebro-musculos-ùlachado-golpe-arvorc. a automediaçao da natureza. e portanto sistematicamcnte governado.) 27 "De fato.. se qualquer um dos C0111ponentes desse sistema auto-regulat6rio fosse capaz de impor seu pr6pr io projeto à totalidade. p_37 1.cstando a sua IIIr idade dCll1iimaçao cm outra parte _ assim camo a sua unidade material aparece subordi nada à rmidade objetiva da maquinaria. seria caracterizada por relaçôes de retroalimentaçao (feedback) reciprocas e iguais às existentes entre quaisquer outros elementos do circuito. objeüfica a idéia cicntlfica e é. em tcrmos de um projeto significativo cuja final id ade governa os termos da interaçao redproca ent re 0 homem e arvore.. 1 medida em que esta ûltima é concebida como uma ordem cibernética. logicamente (no interesse da autor idade exclusiva do Behemath). na medida em que 0 homem é mais que uma variavel fun cional do todo . a capital fIXO. repetia em seus pontos essenciais 0 entendimento morganiano das relaç6es entre circunstância pratica.caracteristicas mentais. 27 .1$l ro allimado.316). de acordo corn a forma do co rte da ârvore provocada pela golpe anterior. Murdock aproveitou a ocasiao aparentemente apropriada da Huxley Memorial Lecture de 1971 para anunciar a morte da cultura. simplesmente.um compone nte reativo em mutua determinaçao corn variaveis ambienta is. açao utilitaria e ordem cultural. qualquer uma das partes pode ter um controle unilateral sobre 0 todo...Em George Peter Murdock.animal descrito no Velho Testamento. do capitalismo industrial e burocratico.~ 2 h ~%r t .cture (1949). ou 0 subsistema q ue envolve 0 homcm e seus arredores Îmediatos..) . Como conjunto de relaçôes termodinâmicas auto-regulado ras.individuo animado. A interaçao determinada de arvore-olhos-cérehro-etc.. as caracteristicas mentais do sÎstema siïo imanentes. 1 . uma forma cultural. Evidentemente.. (N. apesar de a transaçao homem-natureza ser mediada pela cultura. Ele comparara. ~. çôes fUllcionais como elementos de um processo pro dutlVO auto determmante. ~/'" 4 0 . senda a cultura inclufda em uma "ciência unificada". a formaçao de "grupos de paren- ~h. Se 0 objetivo é produzir uma canoa. .. desde 0 inicial. es~e nll... <. como é comum nos estudos ecol6g icos. a resposta a uma mudança na arvore é uma. mas ao sistema coma um todo" [ibid.> t .. exib ira. t interessante observar como ele finalmente chegou a esse ponto de autoconsciência metodol6gica. ao contrario. que possua a complexidade apropriada de circuitos causais e as rela ~ çôes apropriadas de energia. gover ~ nado apenas negativamente pelos limites de funcionamento possîvel. 0 coordenador. cujo projeto consiste igualmente em reduzir os homens e as coisas às suas especifica· . 0 " 1?:~ ~~$ AQ ~ çt ~."" "" ~ ::~.. . é um exemplo paradigmatico da na tureza subordinada a serviço da cultura. de modo que 0 ~rocesso global como uma totalidade 11110 é 0 traball/O do trabalhador individual. esculpem as figuras de deuses cm clavas gllcrn?iras. a trama interativa.470). É somente 0 modo humano de resposta. no processo de produçao do capital .." cujas partes componentcs individuais sao estranhas umas às outr<lS. <Processa ra informaçôes' e sera. quer no sentido da maximizaçao de certas variaveis" (1972. mental) é realizado par um sistcma total. e é esse sistema total que tem as ca racterist icas da mente Îmanente. A cultura é aqui. foi estipulada par uma o rdem simb6lica. ex. . mas sempre estabelecem re1açôes corn a madeira de um modo especifico. autocorretivo. 0 ultimo deles se toma ria uma mera cadeia de conseqüências. > -I I Consideremos um homem que corta uma arvo re cam um machado.. Bateson exp li ca esses sistemas: "podemos afirma r que qua/quer co njunto de acontecimentos e objetos em andamento. inevitavelmente.J • Behemoth . nao a esta ou àquela parte. c< " G. 1'.315 ). dependem da intençao significativa.3. Em outras palavras. quer no sentido de 6timos homeostaticos.. Eles cortam toros para as canoas. elas mesmas tao suj eitas ao seu objeto quanto vice-versa. 197311857-8].o se rclaciona de mancira alguma corn 0 trabalhador individual camo seu instrumento. para preservar a sistematicidade.P. Murdock pode ter sida 0 primeiro a dive rgir de Morgan cm questôes de metodologia e detalhes de in terpretaçao. 0 processo aulocorrelivo Osto é.~ '\- (j .. de fato. A resposta ao ultimo golpe depende de um objctivo que nao é dado ao processo coma um processo natural. A combinaçào desse trabalho <lpucce exatamente coma subservicnte e controlada l'or uma vontade e par uma inteJigência estranhas . Um dos exemplos favoritos de Bateso n é a interaçao do homem corn a arvore no corte da madeira: o problema é que os homens nllI1Ca "cortam madcira" simplesmente dessa forma . isso também requereria 0 deslocamento da propriedade da "mente" da humanidade para 0 ecossistema. ou mesrno cortam madeira para lenha. mas 0 trabalho de dlfcrentes trabalhadores que Cslào juntos s6 na medida em que esUo agrupados là fo rçai e naD se reûnem Ivoluntariamente] uns corn os outras.!1 94 Cullllra e raziio pra/ica Dois paradigmas da teoria antropol6gica 95 1( . se a meta é a obtençao de lenha. ~ o fim do "terror" sera a morte da cultura nobre . 0 ecossistema camo um todo é hoje 0 local de uma "atividade mental" que deve. p. ~. t ~ri.( r. respondera a diferenças ... 0 tema central do seu Social Stru.. que respondem às "informaçôes" ou a alteraçôes significativas dos se us componentes. reflerem as "condiçôes fundam en tais de vida": A rcsidência unilocal nâ. pra ticame nte. que. de adaptaçoes internas coma invcn çocs lecnol6gicas.] 1 1 1 · 1 1 As condiçôes de existência de qualqu cr socicdadc estao sempre passando por mudall ças . a herança pat rilinea r é accita. casa exislam sociedades pa trilineares nas redondezas para se rvirem como modelos. d e p ersuadi r os pais das noivas a perm iti rem que suas filh as se mudem para a casa d eles. c isso pode ocorrer mui[O rapidamente. 0 que a residência mat rilocal ou patrilocal realiza é reunir. 1949. A p ratica res idencial é portan to a chave dinâ m ica. algurn fator apa rece no conj unto m atrilin ear que "co n fe re esta va ntage m à residência pat rilocal". co ma no sistema matrilinear. que pOl sua vez respondem a exigências praticas..29 sâo capazes.28 cujo " recon hecimento" . toma "riqueza" corna tlma catcgoria natural. por exemplo: A residência patrilocal parccè scr desen cadeada por alguma mudança na cultura das condiçëies de vida socia l que. Ao mesmo tempo.o produz diretamentc li nhagens ou parentes. "ao adqui:':rem Tiquezas".. concatenaçôes particub res de circunstâncias que favorecerao 0 desenvolvimento de qualquer um a das regras alternativas de res idência. e que um grupo se melhante vive do outro b do da rua. A deter m inaçào da composiçao rcal dos agru pamcntos 50ciais descmpe nha. camo Morgan.recon hecÎmcn lo este que pode sel' negado .( 1 Assim. escravos ou rnoedas de con cha. a c1assificaçao de pa rentes . p.. podendo um desses leva r ao rcconheci mento de gru pos de parentesco nao-Iocalizados. 206] Essas prât icas residencia is geram alin hamentos especî ficos de paren tes. junto corn as suas csposas.às vezes nipid as. 21O . no esquema de Murdock. e os antigos matrietas foram transformados cm incipientes patriclas. E ~odos os ho m en s começam a d eixar aIgumas de suas propriedades para os filh os.istente de residênciao Tao diversos sao os fatares causais na mudança social. MuÎ tas mudanças nas condiçëies fundamentais de vida podem exercer pressao na direçao da mod ificaçao da regra ex. Com o diz 0 relato. a importância e a influência dos ho mens em rdaça o ao sexo oposta. corn 0 caracL cristico alinhamento nao-linear de parentes. 0 pr6p rio método d e Morgan despo nta clara mente. ela descobriu que as casas de um lado da rua eslllo agora oc ~padas por homens relacionados patri li nearmen te. A residência patriloca l fo i firme mente estabelecida. em detrimento dos filh os da irma.lt O gClle:l16gico. A situaçào esta madura para 0 desenvolvi mento da descendência patrilincar.2 17). de influências bi o16gicas como uma de nsidade populacional em crescimento. 29 Murdock. ao pagarem 0 preço da noiva. aumenta 0 status.l 1 96 CI/llr/ra c razao pnirica Dois paradigmQs da {caria mltrop%gica 97 tesco co nsangüincos" . nâo SOmeI)te em termos gerais. acompan hado pela noçao d e que 0 p restîgio é fort alecido pela poliginia (ibid" p. Elas sào as exprcssôes articuladas de arranjos residenciais. . Ago ra. As relaçôes de parentesco sac con stituidas por um a consciência reflexiva da composiçào do grupo en tao estabelecida.] Murd ock resume toda a discussâo em um relato do desenvo lvim ento de um sistema patrilocal-patrilinear.estabelece grupos d e pare ntesco tais co mo as linhage ns e as costumci ras c1 assificaçoes d e p essoas: 28 Murd ock considera 0 "parcntesco " Uln (. por sua vez. gr upos de parentes do mesmo sexo unilinearmente relacionados. um papei anâlogo ao desempen hado pelas uniôes exogâ micas nos primeiros estâgios de Morgan: 0 in st rum en ta p elo quai a LO mpulsào obj etiva ou natural é reificada na fo rma cultura l. dos quais nâo é 0 menaI' a de que Mur'dock é levado a cunhar sua cxplicaçào co ma um mito d e orige m. 0 exemplo é capital sob diversos ângu los.nalural.e pOl" con scqüê ncia. p. indepen dente do nive! de cult ura das for mas existentes de organ izaçao social. provavclmente. de acontecimentos sociais co mo guerras e revoluçoes. coma a introduçao do gado (0 pr6prio "fato r" de Morgan ).216. corn as suas mulhcres c filhos. e de conlatos externos que podern esti mular empréstimos cu lturais. 1972). nao afi rme que essa tenha sido u ma seqüência universal da evoluçao ). significativamente. {Ibid. "po uco a pouce': os laços corn a "parentela patrilinear" sâe reforçados às expensas da "pa rentela matrilinear': até que as pesseas final m ente descubram que estavam u sando a patrilin earidade sem ter consciência disso: Pouco antes de a populaçao da aldeia se dar con ta de que algo particula'rmcnte signi ficativo tin ha acon tecido. ]-lois po r meio dela as atividades masculi nas na divisao sexual do trabalho chcga m a prod uzi r os principa is mei os de subsistência. qualquer sociedade.203. . [Ibid" p. out ras vezes lentas _ em conseqüência de acontecimen tos naturais como fomes e ep idemias. [Ibid" p. arranjos res idenciais esses q ue. . .'['.. exa tal11 ente nos termos expostos c crit icados por Schneider ($cbneid. pode encontrar. Simplesmente favo rece 0 descnvolvi mento de fa mil ias extensas e demes exogâmicas. a partir de uma orga nizaçao dual d e dis matrilineares. praticamente do mt!s mo modo que aceita "parentcsco" ou "parcntela patrilin ear" como catcgorias gc ncaJ6gicas.~. cm uma proximidade espacial.] ~ :t . Assim. e tao poucas as alternativas nas regras de residência. m as através dos detalh es do crescirnc nto d a patrilincaridade a partir da m atrilinearidade (embora Murdock. Qualquer modificaçao na economia basica é particularmente influentc. todos os homens. [Murdock.representa 0 reconh ec imen to d e arranjos baseados cm relacioname ntos determ inados pelas praticas residcnciais. evidentem ente. 1968. "a abordagem da tOIllad a de d ecis6es para 0 estudo dos fenômenos sociais" de Frederik Barth. 'lusao dupla. que tendemos a reificar sob 0 nome de cultura. Murdock se consc ientizou da teoria ~.ai nda que 0 cruzamento das li nhas filogenéticas seja aqu i comp lexo. Finalmente. A idéia geral da vida social aqui expressa é 0 comportamento particular das partes no mercado.. J' a fato de qu e. .<?*s~j!y~rdade. [Murdock. uma abord age m que "focaliza 1 os acontecimentos d a vida social em Jugar de seus aspectos ffsicos o u estatisticos.. f :. 1tt-" 30 Nao obsl an tc Leach tenha sido muito influenciado pelas técnicas estruturalistas francesas.' ~ ' -î'~g 2i\ .!V em sua pratica..J.identalS2xnQ.?i'·"I/\.. 0 conceito ~ ~. foi apen as l6gico co ncordar corn Leach. na medida em q ue ele entende a imposiçao de um ou out ra c6digo alternalivo (gumsa/gumb.230). 124). invertendo a frase de modo a dize r que as regras legais sac melhor observadas coma 0 resultado de uma tendência estatistica d as escolhas individu ais (Murdock. . p. a condusao a part ir da "exper iência" de que a cultura nao existe é um a \-Z. "~ t S& (' il - ~ .'C-~. seJam abstraçôes conceltualSrlus6nas l11fendas da observaçâo dos "fen6menos rea is" que sao os individuos interagindo uns corn os outros e . com a mesma suspensao do coletivo ou do objetivizado em favor d e intenç6es indiv id uais.f. é a sociedade burguesa.. a necessidade te6rica de Si.idade pratica. geral de que 0 conceito nao procede da prat ica_ 0 status empfrico da propos içao . t~4 '~:.~é?~~ . na li nha da teor ia da praxis iniciada por Julian Steward. 0 sistema social e todos os conceitos sup~a-individuais. igno rando a . ll1~~!deol. Esses conceitos.:W Com relaçâo à aldeia sinhalesa de Pul Eliya. Dai. De cefto modo. ja que to ma como mode lo de toda a vida social nao a realidade da lf l.produtos dcrivados da interaçâo social de pluralidades de individuos. nao passam d e "abstraçôcs conceituais ilus6rias" dos "fenô m enos reais" de ind ivîduos que ÎJ (~LJY\l interage m uns corn os outros e corn 0 seu m eio ambiente em busca dos seus ) 1 pr6prios e melhores Înteresses. .a. Para Murdock. 1 Parece-mc agora desconcertantemente 6bvio que a cultu ra.. Murdock renunciou à sua adesao _.. Leach d isse que "as estruturas sociais sao algumas vezes JI melhor obscrvadas coma 0 resultado estatistico de multiplas escolhas individuais do que como um reflexo direto de regras lega is" (1960.d a Grâ-Bretanha e l rlanda. ~lo:>~c ~ conceitual il us6ria" do método que ele tin ha utilizado durante tanto tempo: l l I l' {b'1l (ji.. r I~ ~. 0 errc de MUI"dock nao chegou a sê-Io. Naquele ano. A anatomia do homem e do ma caco: 0 ultimo paradigma de Murdock é u ma for ma evolufda daquele contido no funcionalis mo de Malinowski . m as é também 0 casa cm Sistemas po/it.. 1550 é cxplicitado em Pul Efi)'a. que telldemos a reificar coma estruturas ou siste* mas.~. Toda a cultura é entendida como 0 efeito orga nizado da economia individua l. evento cuja insignificância te6rica s6 pode ser equiparad a à sua solenidade.98 Cu/lura c razao prtilica Dois parndigmas da teoria alltropol6gica 99 A posiçao basica de Murdock pod e sel' ilustrada de outra forma.' .9).. E isso era 0 que de vinha ! dizendo pelo menos desde 1949: E em 197 1 a conclusao l6gica evidenciou-se para ele. cultura e sistema social sao meros epifenômenos . a que se rcfcre 0 exemplo acima.o.. . p. • 1 . ou seja. difcrcntc apenas no conteudo da prcmissa economu:mte da economia cblssica. 1960.. ~t de cultu ra de Murdock nao veio da experiência an tropol6gica: 0 conceito antropol6gico ja era uma experiéncia cultural.o ) coma umOl escalha ditad a pela vOlntagem polftica.----- _.' A ciência social eleva a uma declara. a salvaçâo do ho mem manipulativo de Malinowski" (I973. s_ep'_c!.. consideremos a noçao que Murdock colocaria posteriormente no lugar da chamada cultura.ao m en os para as ciéncias sociais . perante a reuniao dos antrop6logos .t ~.! assumir uma propcnsao natural para compctir par prcstigio. E mais.. desse tipe. f entao.f. t ao de princîpio té6riê"O-ë que a socied~d:_lrtITgae~~ seëreta-<:omo.. e para conferir-lhe 0 pOlpel de uma força motara geral nos assuntos humanos (1954.cos dos plana/tos de Burina.. através de um confro nta c1assico com Leach. mas a autoconcepçao dessa sociedade. tais com~ re~r~senta~a~ cole.) ~ YI h ~~ 1 1 . ja pode servir como consolo.~ tlda ~ultur. Mas nao se deve deduzir que essa d er ivaçao da ontologia a partir da metodo* 1 log ia represe n te uma exceçao . ele é capaz de uma discordância malinowskiana corn ambos. Na realidade. esse negligenciamento tenha levado a algum arrependimento. e vé 0 comportamento social do po nto d e vista das decisôes tomadas por indivfduos na 'alocaçao de tempo e recursos' dentre as alternativas disponfveis" (ibid. conspirando portanto para a ~lusaE_ \ .. p. e que assoma à "-" supe rfic ie aqui co mo a verdad ei ra font e da proposiçao.'· 1 ocied ade burguesa.. no quai a pr6pr ia concepçao de Murdock da relaçâo entre a ord cm vivida e a ordem pensada emerge claramente do equfvoco. } . l~~ f o nstituiçao simb6lica da ~~i:. segundo a quaI a cultura é 0 "epifenômeno" d e uma outra rea!idade é em si mesmo 1"" •• UIua i1usao. As circunstâncias da sua interaçâo levam quase sempre a similaridades no oornportamento de individuos diferentes.. v ' social como u ma rede de relacionamentos didaticos reais tornou -se. Mas 0 ~I <Chomem man ipulativo" revela a ascendência com um de t?das essas teorias utilitârias.~~. ainda que trcinado nas tradiçôes de Radcliffe-Brow n. disse ele. p. espirito de grupo e organ lsmo social. A Cultura é 0 Neg6cio na escala da Sociedade. l O). ~ :< t ~ .. com 0 seu meio ambiente natural.0 ~~~ cultura é ass im ameaçada co rn um negligenciam ento na antropologia 1 [que s6 se equipara à co nsc iència dcla na· sociedade. pois reconheceu no fato de Leach privilegiaI' a escolha individual sobre a regra legal um desvio do paradigma cstrutural -fu ncional semelhante à sua pr6pria p râtica.~~ïa:1 1ir...l l rJ .riva. uma vez que. 1972. e fazem corn que os indivîcJuos se relacionem uns corn os outros de manei ras rcpeti tivas.22-3). ara.. iro nicamen..19. ~de gue ~~<:!mcntc é 0 pro~uto socializado da atividade pratica. Por consegui nte. a qu e esta\'a presen te ao longo de todo 0 métod o.da nossa tese .. "A visao de Radcliffe*Brown da estrutura \. . espccilicalllcnte qu:mto 3 interposiçao de inte resses praticos entre ci rcunstância e ordem social..i""J L~ 1. p. Murdock simplesm ente prod uz pa ra a antropolog ia 0 mes mo tipo d e reduçao so lipsfstica que Max \. p. aos conceitos de "c ultura" e "sistema social". Ac!-cdita na a~~.\leber ten tou para a sociologia. como se refere Kuper ao modelo de Barth. Essa nova concepçao da cultura nao era mais que uma "abstraçao .te. arrola as mais importantes condiç6es técnicas e sociais dos caçadores e coletores . Os recursos sao a objeto de trabalho e ai jaz sua importância para uma comprec ns ~o da sociedade e da cultura .. "matrilinear" e "composta".1571 ..155 J. e mais tarde Murphy [1970J.".. e esses dois falores servem para limita r as atividades humanas às quais cstao relacionados [p. de uma maneira o'u de outra. outras à natu reza humana. também como um conjunto evidente em si mesmo de intenç6es: a provisâo da "subsistência': Essa tecnologia se desenvolve em areas de recursos alimentares limitados. 135 L Com a patrilocal idade assim estabelecida corn base na sua superio ridade eco n6 mica. cm tcrmas gcrais. da ordem de 20 a 50 pess03s. e 0 bando de fammas. dai. passa-se a determ inar a base ecol6g ica das varias formas de banda. 0 elo critico entre 0 meio am bien te e a est rulura social é a prâtica reside ncial. Em uma versao posterior. que a teoria deriva.i1ise de Mu rdock. a estrutura do bando d eco rre como reconhecime nto e articulaçâo .. As principais relaçôes de produçâo . co rn base em "uma excitabilidade sexua! crônica" da espécie hunJ.de uma maneira agora fami li ar a n6s. "patrilinear". Steward conce ntra suas atençôes sobre 0 tipo de bando m ais difun dido. Portanto. é \'antajoso que os homens permaneçam no seu terr it6r io gera l de nascÎ - promove~_I?gicaY:a_t~c-" ::~. e a aplicaçao desses inst rumentos a materiais induz a posteriores ajustes de cornportamento [p. 3 ! A proposiçao tambérn épura praxis. devem ser analisados os padrôes de comportamento envolviclos na exploraçiio de uma ârca particular por mdo de uma teenologia partieular .ma... pAO-I).. Esses padrôes de comportarncnto sac 0 lrabalho e a lecnologia.estrutura. scus cidos e ritmos. sua organizaçao. Como na an. a patrilocalidade é rc1acionada particularmente ~s suas vantagens econômicas cm areas d e recursos animais dispersos. os caçadores nunca ultrapassarem os pequenos agregados em b. p.1)riori \ da açao econômica i te da forma cultural. Os padrôes de trabaillo sao diretalllelite derivados das fcrramclltas e recursos aos qua is eles sao aplicados. eles possucm cerlas caracteristicas imadificâveis às qu ais a trabalho deve sc adaptar para fazê-Ios acessÎvcis à cxploraçao."_d_~~~~ mento" (is to é. As ferramc ntas devem sua posiçao central na analisc da socicdade à sua co ndiçaa de instrumentos e mediadorcs do trabal ho.. Scu esclarecimen to mostrara co mo a mistificaçâo da 16gica cultural 1 ~ eI1~~". os grupos d e famflia.333). a patrilocalid ade é explicada pela dominância inata do m acho e pela importânc ia econômica dos homens nas culturas caçadoras (p.... Na p rim eira versao do estudo (1936)..referindo aigu mas à vantagem econômica.~ I~ 1 100 Cufll/ra e razao pralica Dois pamdigmas da /caria (lIJ /rol'0l6g ica 101 Julian Steward A perspecliva fundamentaJ de Steward sob re a "ecologia cultural" é. s6 valeriaa pena expô-Ia aqui para apresentar 0 contexto paradoxal no quai Steward. (1970.pdticil. Pois para da os "padr6es comportamentais de trnba/ho" "exigidos" pela contexto ecol6gico é que se rea lizam sob forma cultura l. co locam sua ecologia cultural .. Resumindo a questao em termos gerais: a eficiência econôm ica em um dado conjunlo de circu llstâncÎas técnicas e ambientais requer certas prâticas e relaçôes sociais (residè ncia patrilocal) que. no detalhamento do se u artigo paradigmatico sobre os bandos patrilineares ( 1936). Isso proporciona um tip o d~ seguro de subsistência" (Steward. Como abjctos de trabalha.. mas.1 f. por sua vez.. 31 0 parildigma praxis . ~ generalizado por Ste .o patrilinear.ard na forma de "três procedirncn tos fundamentais da ecologia cultural": "Primeiro dcve seT:lI1alisado 0 inter-rdilcionamento de tecnologia explorativa ou produtiva cam 0 mdo ambiente .:mdo. 0 terceiro procedirnen to é para detcnninar ah! que ponto os padroes de comportamento rcqueridos na cxploraçiio do meia ambicnte aCctam outras aspectas da cuttura" ( 195 5. encontra-se subjacente ao sistema social Shosho ne como um todo. p. o ponto que desejo enfatizar é que 0 dominio da açào social enyolvido na produçâo material.. Essas atividades sac aquelas pertencentes ao cido de trabalho e delas emerge a estrutura da sociedade Shoshone [p.sao encaradas a partir de sua generalidade empirica entre os caçadores. 0 trabalho. 1-- ~ 1 i 1 .. . Em seu preâmbulo à principal quesUio eco16gica sobre os "bandas primitivos". E isso também em relaçâo à simp les tecnologia existente. t'ois os "padrôes de compartamento" ex igidos na sua exploraçâo através do usa de ccrlos "dispositivos econômicos" é que sâo os e1ementos-chavcs. E é da (!f/{îlisc da atividadc. a mcsma da problemâtica desculturad a de Morgan e.156]. EI11 scgundo lugar. corresponde exatamente à idéia de estrutura social de Murdock. e apresentarem baixas densidades populacionais. e outras simples mente ao fato empirico.332). Dadas essas condiçôes. de vez que ja conhecem 0 territ6rio ) (I 955.como oposiçao à bio16gica. emiugarda muilise das instituÎçôes e vaiores. 0 tabu do incesto é imposto ao nivcl do ba ndo.. que ele entende como a fo n na lizaçao da residência patr il ocal. islO é. e suas modalidades situacionais . mas fixos: "cm um mcio ambiente no q uai 0 p rincipal alimento seja caça nào-migrat6ria e d ispe rsa.a divisao de traba lho por sexo . 0 paradoxo é instrutivo. A upropricdade" territorial se entende corn base em que "qualquer ani m al pode se assegu rar de alim ento e agua de uma maneira n'lais eficiente no terreno que habitualmcnte utiliza". os "dispositivos econômicos': Dc uma fo rma muito simples. corn base no fato de que "em praticamente todqs os grupos humanos muitas familias cooperam . 1936.. 0 uso de fcr ramentas requer certos mados de comportamellto. e 0 grupo é organizado coma uma patrilinhagem exogâmica.. Pu ro Morgan. 156 J . Stéward. A residência patrilocal d eve ag regar pa re nles "p a lrili neares'~ Conseqüen temente.. sào fo rmuladas e cod ificadas como uma estrutura social (bando patrilinear). nao apenas como um conjunto de ferramentas em si mcsmas. Murphy expl ica a posiçâo de Steward: o rneio ambiente por si mesmo naD é 0 fator critico. p. a teoriada ecologia cultural esta envolvida corn 0 processo de Irabalho.!'.. : mo 0 que estas se 3}Ustam pm I"od .n. ... enquanto que a razao atI\ïdades nao passa da sua eficJ:. e as nào sao apenas um rc(\cxo 1 . . parte a mesma duahdade de açao e norma K"«la e e c tura..\1 d..:-. ~se sempre 1 us6no (por exemplo.. " citada). lTIulheres colhendo). ' . . eL ~".\ e 0 St.) reduçoes blOloglCas da nova ecologia" (da quaI Vayda.zendo ~ma eloqüente defesa dessa "ecologia cultural".'. . '. desaparece no momento da produçao.' 1 . Tudo.". po em sunphfic:i· la e dlstorcê la ou d . É justam ente assim. A sabedo ria ecol6gica consiste em esquecer a ordenaçao cultural da natureza em todos os rnomentos decisivos.iCa el': .es~ a soc~edade goz3na de uma relativa autonomia. U7. as idéias sac sobre atividades. . e a "exigência" em questao é a purarnente objetiva de lidar com sucesso corn 0 meio ambiente. p. 102 CI/II/ml c raziio prtilica Dois paradigmas da teoria anlropo16gica 103 7:~-nto que. .~ 1 .l. Ordenada por idéias e .1). COlI' 0. -. . .. aptaçào c coerCJlCI<l slslcmal lcas ('l1lre cultura e mcio ambientc. ~e aco rdo corn Murphy.. '.. L. .. No entanto.. Por outro lado) os padrôes de trabalho "derivam diretamente das ferramentas e recursos". ..l as 2 natureza. juntamente corn as relaçôes de famHia e de produçao (divisao de traba . Do mesmo modo. Steward. ' 1 dC . mas infelizmente nao sao pertinentes à ecologia stewardiana. ••. sem ser "culturolôgica" ou «supcrorgâ n ica>~ E mais.. regulado por normas. é dlflctl dlstmguir as duas posiçôes. a nao ser por diferenças de ~nUmento. A cultura S-' ~ ~ ~I \ ~ <:" " 'tas de mod .. I. incapacidade de desenvolver ao nivel do co nceito 0 que é reconhecido de fato. mas ISSO dlficllmente elllllina as frolltt'ir:1s enlrt' os d o 's A cl '. .:l. ! 970.: •.. 'd d ~ ... . ~[~~phy c~ntin~a . 15 mç 0 e a 3utonomla a "'. c ll1n 0 as que sao 1l0nnatlvas elll uma sociedade podern ::~ .34-5. confere significân cia a recursos por um critério de re levância cultural.cultural nao sao UIl1 tipa de determÎnismo ambienuJ. Essas institu içôes e valores.' _ '..·l a pratlCa em deterrnmadas clrcunstân..é considerada por Steward coma um fato instrumental.):\-I:l p:r:1 distingui_la da ecologia cultural de Steward. . Sweet e Leeds sac . os sistemas sociais humanos alcançam e envolvem os ecossistemas. mas chegam à cena post festum.:ultural da vantagem adaptativa.'. " .' 1. nao se faz sem contradlçôes e. co nseqüentemente...O iltradl~3? sucmtamente. no unl1.u a e a comporlamento IJode " . as ferra~~nt~ e recurSQS rcquerem [grifo de MurphyJ aIguns lipas de comportamento para ~~ èm mtegrado~ corn sucesso. estando essas duas proposiçôes rclaciona_. por sua vez...:~~~~:a ne. p. cl .~~~~...d cl '.:1. mento e ordem na I"claçào caUS:1 0 ob ...... mas suas moda!idades ellcontrarn-se alél~l da natureza" (Mur~hy. Embora reconhecen'::0 que 0 c?mportamcnto é. e das premissas irreconcTâ .. •d uI .ra.:ltJOÙS como expoentes) 33 A der .. d _ ..ao <i precondlç:1o da atividadc" (p. A morfologia cultural se toma inteligîvel precisamente nas mes mas bases que as asas de um passaro ou as guelras de um peixe. Na realidade) a intencionalidade completa do processo produtivo é neglige nciada na suposiçâo de que essa seja uma economia de "subsistência". .'.. 169.' " '" . ..': fI ~. ... As . e. . !~·m.sobre a quaI se erige uma morfologia cultural . corn a ~ . . vé também as narmas ù'mo slIrgllldo 110 primeiro piano dc açao sOCJa 1 e sen d0 wl1a cnstaltznçiio do comporta_ .~. ' • ~ • ~ _ru! al 1 t vels e que a atlvldade gera Idélas e a percep\âo é . . toda a filosofia de Steward se encaminha exatamente no sentido oposto. Iho por sexo: hom ens caçando. leva à noçao de "exigências". . para Steward. porem.. no sentldo cm que esse terma foi usado cm sociologia.) .de anles da idéia que é a recondi :1 d .163. po em:llll aem rar cmconflitoabertoeconscientc . rl.. e a cultura reordena a natureza e realça as partes deia que sac relevantes para a situaçao humana.1>. . cessa busca lM • • . a nâo ser 0 pratico.' III rCJI1tcrprcta_la de acordo corn outras estruturas de ~run . fi a aÇ30 SOCldJ. ~.'side no dominio das idéias e das atividades . ~..260..158). . . todos os grifos sao meus corn as e. . ..' _ . lcsa. portanto. ç 0 a atlVldadc. f 1970. todo objetivo. Steward pensava a sociedad e como um modo distin- " = ". Trata-se de ~a ~eona cult~ra l . das contas.... cm ora cu tenha argumentado que as idéias sâo ~.! a rea..dad.J!> po.' d' .: A.. da ecologia como sistema cultural. 1 . a teoria de Steward deriva mais da atividade do trabalho "do que das instituiçôes e valores". Mas para apresentar a ~. e nao 0 contrario. : . • 0 que 0 pnnclplO a ordem cullu ral permanece sendo 0 princfpio . 0. des sac "exigidos" para a integraçao efetiva dos dois no processo de produçao (cf.. ~e llltegraÇao. "·d d d ' .' .. 1 1 ~tl\. w: tur mente de modo qu 'l' '. conde nada pela pobreza do s meios técnicos a LIma rnisedvel existência.:.. ' . 1938. sso n:1o slglllfica que 0 sist .' SCUrCCll1lCnto c 0 des:1parccimcnto das distinçôes entre . nao organ izam a interco nexao huma na COOl a natureza.. _. ~n~ IÇoeS de uma Interaçao dlalétu:a tornam-se en tao contradiçô d 6' M h ! t:.. e essas exigencias _ 0 processo de trabalho _ pres. No entanto. . como uma cristalizaçao das relaçôes estabelecidas na situaçao de trabalho. nao reo rdena a natureza através dos seus pr6prios objetivos porque...' • ' d . :l <.. 'cl ai '. cl . . Isso é cm parte uma questao de ornissao. Como 0 pr6prio Murphy observa (na passagem -:6$3. d cl 0 a ~ e que sua IIllegraçao n. es 0 pr pno urp y. _ ._ . As conexôes entre um SISlcma soc' · J ' . que é transmitida através da açao à estrutura se r a eco-1 A problemâtica de Steward é um padrào para 0 negli genciamento. embora o<io possam altera r suas propriedades. co mo tal •..:n~d:u. \:(eçoes cxpressas.~ n ~. I.. Steward estâ bem dente de que 0 carMer particular da tecnologia determina o ca rMer do meio ambiente. (essa atl\'1 a cou uma reafirmaç:1o dela na form a ~'•. mantém esses padr6es comportamcntais [p..1.~.. estâ ~:: .:: . nem ~stao mesmo basicamente preocupados corn 0 mcio ambicn lc. Dai a ordem 6gica da adaptaçao efetiva.. 1 .~ ' ..("~~gia'.... . é urna tcaria ~:: aç"û.: .:ma social derivam d t: t d . ' como dey? c~)all.'11 melO :1mblente podem ser cfetivamente . ' .">-!:. 90. intere:ssante obra te6rica de Murphy (297!) cl ' .. cilla Ilormaln'o n:1o esteJa relaclonado à condula pois J. . ' p. )32 A t".. '. uma negatlvldade aleat6na ' I)o r ex 1" b • . .l1l""Il.nao-subord inada à natureza.. no modo de argumentaçao de Steward. cm boa parle. A ordenaçao cultural da natureza é portanto disfarçada como premissa para uma ordenaçao naluralista da cul tura.oria e 0 método da ecoJogia . ~ !Onam cm segUlda a estrut ura social gcral fp. If " 1 " • . isto é..:n .163J . 55. p. . no princîpio te6rico.1 . ..~ ~ a açao. isto é urn dado. As conclusôes de Murphy sobre as relaçôes de cultura corn a natureza sao verdadeiras. Os fenômenos de ordem superior ordeoam os fenômenos de ordem inferior de aco rdo corn seus objetivos.. 015 . cl ' ' . 100-2).fa. A interaçâo da tecnologia corn 0 rneio ambiente segundo determinadas relaçôes de produçao ...5 . Ao contnlno as Idélas in 1 . d • .11 um mo 0 de \'Ida coerente e orde nado Elas est:io ~. d ~.s s. . na realidadc vive coma um an imal" (Braidwood. Em suma.. '" . ou economidstico. a cultura é 0 ep ife nômeno das suas intençôes. a utilitarismo subjetiva esta.camo objeto di stintivo da d isciplina. ____ . Nen hum deles foi capaz de explorar a fu ndo a d escoberta antropol6gica de que a criaçao do significado é a qualidade q ue distin gue e constitui os homens . Coma l3audrilJard explica cam muila propriedade. Os australianos sao mesmo capazes de um totemismo concreto. p. Pode-se dizer que este segundo tipo de teoria pragmatica pressupôe um Homem Econômica Universal. IV f < ! . ::1 ':o. 0 ---------- . em contraste) preocupado corn a atividade intencional dos indiv îduos na p ersecuçao dos seus pr6prios interesses e das suas pr6prias satisfaçôes. sexo e cond içôes rituais tais C0l110 sao local mente defin idas. par tl. do caçador-coletor é. produçao. ç C).- ~ . p.~ _... ç:~0- . naO ha qualquer demanda te6rica de que os atores façam seus calculos diretamente em utilidades adapta tivas..~ '- <:. mas também sua apropriaçao) coma premissa. . Vê-se. 0 csquema cu ltural é 0 signo de outras realidades. a os esses tipo?ae râzio pratica tallÏoénlfêiTïefilèomüm uma conœpçao empobrecida da simbolizaçao hu ma na. corn um conju nto relativizado de preferências. Para todos eles.i · 0 ~ç' '" . dentro da natureza. sao orga nizadas. Mais do q ue par u ma pragmatica de formas culturais. 0 saber an tropo16gico aceito. Por ignoraf 0 c" rater hist6rico dos objetivos econ6micos. . uma acomodaçao à variaçao cu ltural .~.enquan to a segundo é utilitario no se n tid o c1assico. exatamente como qualq uer "cornportamenta especîfico de espécie>l.. "necessidades a nao ser aqueJas Inecessidadesl de que a sistcma nccessita" e isso nao se da porque 0 consumo é uma funçao da. . 1 ~. os mais triunfantes eurekas! serao reservados para a d emonstraçao de que 0 fa zem malgré eux.61).. os ritas e a in terdependência de grupos imaginados no sistema totêmico. A quesUio real colocada à antropologia par essa raZaO pratica é a da existência da cultu ra. desconstituida culturalmente. duplicando.ual a ~ 1 (. ou passando de urna moita de fruteiras para outra. Essa relativizaçao é. Toda grupo distingue a comestivel do nao-com estîvel e nâo apenas para a popula ~·. Sendo este 0 casa..m a explicaçâo que pretende representa-la camo conseqü ência.. \. objetivo . no quai os grupos de vizinhança se esp ecializam na produçao de diferentes objetos utilitarios para comerciar a partir de materia is igualmente disponîveis para todos. Apenas os atores (e os interesses considerados a priori como seus) sao reais. d esfr uta dos poderes de auto -regulaçao ou "men te': e cujas li mitaçôes se dâo sob formas cu ltu rais. ta illa nos bens particulares que se tenta produzir quanta na intcnsidade do processo.. para dar luga r à constituiçao da cuhura pela at ividade da produçao. um "objeto de consumo le pOl'tanlo de produç:io] existe da mesma forma que um fonema tem um significado absoluto em lingüistica.. p. a cultura é tom ada coma um meio amb iente ou 0 conjunto dos meios à di sposiçao do "individuo que age': e também camo uma resultante sedimentada de su as maquinaçôes au to-Î nteressadas. A atividade d a produçâo é) ao co nt rario.. 0 ato fina l para a cultura consiste n a su a abso rçao.-. A soluçao caracterist ica da cultura é portanto solipsistica na forma. o!lo h:\. Essa naturalizaçao da econonù:-. desse modo.O que Steward deixa d e lado é a organ izaçâo do trabalho como um processo simb6 lico que opera tanto nas reIaçôes de produçâo co rn a nas suas fin ali dades. Nessa praxologia. -- /.\'eis. 35 a que esta falt:mdo especificamentc é a intencionalidade cultural corporificada no c6digo de objetos descj:\. 1972. 1 . é uma ordem instrumental.~ c . carece ainda da organizaçao cultural da relaça o corn a cultura.Ios.l j Lee e De Vore.. invocando a familiar rclaçao m eios-fins do sujeito humano racional. A cultura. um homem agindo racio nalm ente em direçao a metas que variam contudc je sociedade para sociedad e. a praxologia é "objetiva" no scntido de que a explicaçao consiste em determ inar as virtudes mate riais ou bio16gicas de determin ados traços cultu rais. de acordo cam um c6digo herarqu ico" ( 1972. as relaçôes entre os 1ho mens) bem coma entre eles e a natureza. ~ ~ )_ . ç ' . ou ela se in clui dentro de um ecossistema mais geral que.. 1968)..$ '" l . mas porque a cOI!SIII11/nalivité é um modo estrutural de produçao (ibid. mas para classes especificas de idad e.__ ~ f [ti ~.a "essência humana" de um d iscurso mais an tigo . Ou a pratica cultural é um modo comportame ntal de aparên cia das leis da seleçao natura l.. evidentcmen te. referi -me à rel açâo ex isle nte ent re a proposta cultural e a proposta prâtica coma uma oposiçao dclica e repetitiva à q.122j cf. dois tipos principa is qu e co rrem ao 10ngo de dua s eSlradas diferentes em direçao a esse fim comum. pelos processos de valor izaçao e significaçao diferenciais. ~.S A razao cultural Nos paragrafos iniciais deste capitula. 104 CI/hum c mzdo prtlticil ~ Dois paradigmas da tcoria alllropolOgica 105 iQ. . 1 L.. 0 . portanto. isto é.89). pelo contrario.. 1957. obedecendo no final em se u arra nj o interna a outras leis e outras 16gicas. . através da va ri edade dessas teorias. no plana econômica. de uma m aneira ou de outra.. tanta cm qualidade coma em quantidade. concebida (segundo cada esco la eco16gica em particular) camo engajada na reproduçao d e si mcsma enquanto cultura ou na man utençao da populaçao huma na dentro d e limites de viabilidade biol6gica. 3S Neill l11CSIllO os caçadores estâo engajados cm lima simples economia de subsistência. o n aturalismo compreende 3 cultura coma 0 modo humano da adaptaçao. nem numa relaç:io operativa COrn 0 mundo (0 obje to·utensîlio)j cie s6 adquirc significado através de sua di ferença dos outras objetos. . J' 1 1 .ao como um tod o..- ~ e - ~-.por assim dizer.. desse ponto de vista.de modo que. Um tipo é naturalist ico ou eco l6gico .- H "Um hom em que passa a vida seguindo animais apenas para mata-los e comê.. Em qualquer caso. cap.'. sozinho e camo uma total idade. $ab lins.3~ E isso km a ver dire lam cnte com uma exp licaçâo "ecoI6 gica" da cultura total. Esse objeto naD adquire signific:ldo nem numa rclaçao espedfica corn 0 sujeito. uma porçao de exemp los do s aborigines australi anos serve para rnostra r que diferentes tipos de troca intergrup al têm imp licaçôes correspondentes sobre a intensidade e os padrôes sociais do traba lho. ç:>. As teorias da utilidad e jâ mudaram muitas vezes de roupa) mas a desfecho é sem pre 0 m esm o: a eliminaçao da cultura . Além do mais. t. seja por m ediaçao das relaçô es sod a is igu alm en te dete rminad(\. um mundo de idéias e filosofias. p. u m filtro seletivo q ue reduz iria 0 ca os em potencial dos empréstimos c ulturais (a difusao) po r m eio de um critério de ace itaçao e uma atribuiçao de significad o (Benedict.. exatamente coma na . uma idéia. e sim um continuum que se estendc ao infinito em amhas as direç6es. Aqui) sua form ulaçao te6rica provém di retamen te da epistemolo gia de Morga n. Assim . Esse conceito foi posterio rm en te d esenvolvido. as id éias sào. d eve ria fo rçosam ente dar lugar a u ma fil oso fi a cientifica baseada no co nh ecimento objetivo.ou. Tcmporalmente.. Esse mundo das idéias da provas de uma continuidade e de uma perma nência que 0 mundo externo dos sentidos jamais podeni ter. n essa pe rspectiva simb6lica . A ferra m enta "nao é um me ro objeto mate rial o u mesmo u ma imagem se nsorial como pode se r para um macaco. 1. mas pela sistem a d e relaçôes en tre simbolos. se m que. da ctcrnidade à etern idadc. Ele naD é feiro apenas do presente. 0 sup ern aturalism o pri m iti vo) correspo nd ente à rep rese ntaçao a ntropom6rfica de uma igno rânci a fu nda m enta l. N a obra d e Lesli e Whi te. a d ete rm in açào tecnol6gica d a cul tu ra n a teori a evolucion ista de White atu a lado a lado com a d eterm in açao cultural da tecnologia em sua teo r ia simb6lica: • 50co (cm franc~s no original). s n a maioria d a. constitui um reconhec imento leg ftimo de quea razao pratica e 0 simb6lico coabi tam. p. D esenvolvida tanto na Eu repa com a . ) da perspectiva cultural q ue pode ria ser qualificada co mo uma tentativa de Iib ertar . Corn palavras . Em verdade. Vm determinado tipo de tecnologia enco ntra cxpressao na filosofia do lotemislllo. outro tipo na astrologia ou na mecânica quân tica. Segundo Bened ict. ela p r6p ria. u m sistema d e sign ifi cados q ue indepe nde da realid ade fisica. Co nseqü entemente. seja d ireta m ente.] Mas en tao. (\o\'hite. e m sua essé n cia..atitud es compa raveis enco ntrados em todas as praticas d a cultu ra. A cada tipo de tccnolog ia corresponde um tipo de filosofia. alin havand o-os para forma r padrôes con siste n tes d e cultura . essa luta se tem caracterizado nao som ente po r uma m aio r _. 1949.'~. de todos os out ros sercs vivos po r ser capaz de um comportamen to simb6lico. por um lado) a refI exo da base tec nol6gica.372. sobretudo pa r Ruth Be nedict. 1942.s por essa base. nos Estados Un idos. seja alcan çada a unidad e dos opostos te6ricos. Pa r out ro lado.1 l • !co n sc iên cia an t rop ol6gica a resp eito d o simb6lico. Nesse mun do. Se um m achado de pedra gera deter mi nado tipo de filosofia. 1942.365-6. Ao dispor de recursos tecnol6gicos cada vez m a is efi cazes para tidar corn 0 mundo. '1 çao cresce n te no cam po d a a nalise do p ratico.. concebid a por \'\Thi te co mo a passage m do estagio d a falsa co nsc iência pa ra 0 estagio da verdade ira con sciência.. W h ite insiste no ca rater u n ico do "com porta m ento simb6lico': isto é. Essa ambivalência presente na filosofi a de White pod e nao se r idiossincni tica. 0 mod o pelo quaI 0 mund o é "experimentado" nao constitui um simp les processo sensorial determin ad o pela exposiçao direta da rea lidade à percepçao por m e io d a tecnolog ia.) r I! ~ .. a h ist6ria . teori as antropol6gicas. que sustento u a idéia de uma 16gica o r ienta do ra q ue re un ifica ria os fragm en tos espalhados por Lo wi e. acima d e tudo. !' . soc iedade no rte-amer icana. no en ta nto. sem suscitar muitos comenta rios ou escândalos. a travessa ndo 0 curto periodo de tra nsiçao da m etafîs ica.\~. ao q ue sabcmos. Ë també m u ma id éia" (White. As id éias qu e os ho m ens elaboram sob re 0 mundo d eriva m n ecessa ria m en te do m odo peio q uaI 0 conhece m pela experi ênda. o utro co nheddo a nt rop61ogo norte-am erica no. p. mas de um passado e tambérn de um fu turo.. ele pr6prio. d e um c6digo di fe rencia l. como às vezes cie 0 chama. n ao por suas propri edad es o bjetivas.. 0 p ode r que 0 ho m em tem de co n fe rir significado . .. :. f) ) ~ a an t ropo logia dos g rilhô es do naturalism o. é clare. A interpretaçao de um sistema de experiência do q uai m TI coup de pOÎnt é um traço caracterfs tico refletira neccssariamente esse tipo de experi éncia. as in tcrpretaçôcs sa o pro fund amente condicionadas pelas tecnolog ias.~ f' . . No q ue se refe re aos Estados Unidos. por sua vez.a si a defesa do seu co nceito d e cultura com a es tru tura sign ific ativa interposta ~ èn t re a s circu nstân cias e 0 cost u mé . . os pr6 prios discipu los de Boas tomaram .. 0 homem sente que a qualidade essencial de sua cxistência consiste em ocupar esse m undo de sfmbolos e idéias . a ordem seria produto da in fusao d e significados e . a existência do homem é tào real quanto no mundo fisico de seus sentidos. 106 Cul/u ra e raziio pra/ica < " ~ Dois paradigmas da tcoria alltropoMgica 107 antro polog ia se m anteve presa nos ultimos cern a nos.sào flXados. m as também por uma penetra..experiênda com o atribu içao d e si g ni ficado .. u m conce ito cujo significado e uso .(. a evoluçao da fil oso fia é. ncm po r isso deixa d e sel'.que se opoe à co nsc iência p ositivista e utili ta ria através da exposiçao tecnolôgica . 0 homem cria um novo mundo. t\ filosofia co up de poing hem como de uma tecnologia coup de pOÎng . l . Assim.co nstr6i o u t re tipo de mundo : 1 3'- 1 c o homem difere do macaco e. mas de um opératoire global que organiza 0 mei o ambiente.. nao co'nsiitui uma sucessao de epis6d ios desconcxos.~ .a ferrame nta é. começo u em desvantagem a luta p elo reco nhecimento ) _~ Il . e essa expe ri ência. '" . Mas a experiência e) em conseqüênci a. (Wh ite. depende d o m odo pela q uai se articulam tecnicam ente ao mund o: Os sistcmas ideol6gicos ou filos6ficos sac 0 produto da organ izaçao de crenças nas quais a experiência hum ana encontra sua interpretaçào..373). " 1) . Para "White.co m o oco rre co rn todos os conce ito s .. Nao se tratava.'. • ~.-. as relaçôes socia is e.ép \". 0 mund o da me nte ou do espirito. onde tud o que é essencialmente 0 m a is co nvencio nal é tido com o 0 mais natural. 1961 11934]J . 0 p arad igma d e Boas coiwive corn 0 de Morgan. Nao seria impr6prio falar em um tipo de Com o as id éias decorrern das co ndiçôes técn icas da percepçao. de pOiS. embora scja le propre da escol. " • • ~ c ~ WHITE 1 ! 1 1 1 i Se afi rmamos que 0 esquema concei tuaI comanda e define as prâticas.eri~a na. E esses sigl/ificados e va/ores 0 orie ll ta 1'L'111J. caçavtl ccrvos. Por outra Jado. Tudo estava "banhado por luz celestial" e havia «sugestôes de imortalidade" em cada mao. Essa distinçao. Lukes. Co nkl in e outros. A agua ja nâo servia mais apenas para saci ar a sede. tod a traça cultural.e ignora 0 proccsso real pelo quai as prod uçôes hum3113s si'io reificadtls ou "ohjeti\ltldas'.. nâo se confund em com a praxis que . os "simbo13dos" \listos no contexto de outros "s imbolados':o que coloca a ca rga da deu'nn inaçao no antrop61ogo . num contexto extra-sol1latico.. Mas tlldo cra permeado pela essêllcif"! Jas palavras: os significados e valores ql/e estamm além dos sell tidos. isto é.'".. Começo pOl' Durkhei m. foi agrilhoada por um conceito positivista de cuttura co mo competência compar tam en t ~l ou e tnogra ~a . para mencionar exem plos de natureza bem dlstmta (ainda que igual mente imp ression antes pela qualidade inte l ectu~l ). co mo seres ao mesmo te mpo empi ri cos e inteligivoi s. Vcr Berger e Luckmann pa ra ll!l1tl di scussilo rcccnte de "objctivaçao". verifica-se. A imp ressionante etnociência dese nvolvida por Goodenough. sociedade e cultura. p. é caracteristlca do s melOS europeus.. ou scja. de escuta.fen ômcllos que têm seu lugar no organ ismo huma no .} de Boas: 0 homem to rnou-se 0 animal irracional.. : Dois paradigmas da leoria {!llI rop ()IJ~ îCll 109 108 Cultura c razao prdtica Um machaclo lcm um co mponentc subjetivo.. Mas ja nâo era 0 mesmo sol! Nada mais era como antes. é porque essas prMicas. Ce rtamente ele nâo deixo u de palmilhar a terra. a titudes e scnt îmentos . concebido a parti r da disti nçao en~ re açao e l~eolog. cm vez de cm sua relaçâo COOl 0 organismo h umano . cOlltudo.-'~ '. do objeto cultural pelo significado... tais como arcos. e distintivas de gêneros de vida e de form as de civili zaçao. tendo /nlliras vezes precedê/!cia sobre eles. Permitam -me justapor uma citaçao de Lévi-Strauss. 1959a. Lascava pcd ras. de certo modo inescrupulosa. para fin s de interprctaçao cicntifica. cm particular. a/ém cfe oricl/tar seus selltidos.lacalizadas no tempo e no espaço. a partir da sua relaçâo corn outras coisas e acontecimcntos simbolizados.c6digo aparentemente Ob)l2! tIV CUp ob! e~'Vl O. presa.mesmo quando 0 local do simb61ico permanecc no sujeito humallO . acasalava-se e procriava . esbarraram tambem em ~ma hn:'taçao especifica do simbolo.J36 / CO ll ceiwal por obm do quaI t/l1U1 matéria e lima forma. um mach ado pode ser co~side ra do a partir da sua relaçao 1 corn out ras co isas e acontecÎmentos si mbol izados. os esfo rç~s ~e Geertz ou Schn eider. isto é. ~ :. [19 58 ms. enX2das e costumes que regem a d ivisao de tra balh o na sociedade. e ele nada poderja cllxergaf" (j lU'i O scr arTavés desse véu. se nao exatamente essa ambivalência de White.podem ser considerados.236.pareceu-m e mais correto dedicar maior aten çao à maneira pela quaI fo i concebida a relaçao entre util itarismo e cultura nessa tradiçao. grifo rneu ·1 Em oposiçao ao parad igma fund amentalmente prat ico e tecnol6gico que 0 Iiga a Morgan. \Vhite confere dcsncccssariamente à cultura um a definiçi'io contextual. objeto de estudo do etn61ogo. Ou. Embora se t'cnha tornado a her6i de um cer to "funcionalismo" posterior. White é capaz de . 1972) .1Clal e. [White. k<"j _ . 130. [1966. 37 Ë evidcntc que essa comparaçao é IC\le l11ente maliciosa.Associaçao America na para 0 Progresso da Ciência]: UVI -STRAUSS 1 Entre 0 IlO1IIC 1 e a WHll reza. Ao que parece. em termos de um. cremos que entre prâxis e prâticas se intercala sempre /lm medindor. torn am-se "cxt ra-sornâticas". 1968 [19371. dormiu sob as estrelas e leva n tou-se para sa ud ar 0 sol. M as as con cepçëies. dade" encerra uma teoria. ssumir uma perspectiva simb6lica que 0 cola ca a em co mpanhia de um nome inverossimil." . ~ . a um texto extraido do d iscurso pro ferido por White na condiçâo de presidente da seçao de An tropolagia da MAS [American Associati on for the Advance ment of Science . mu ito mais di fundida na antropologia soci~l inglesa q. conseq üe nt eme nte do significado coma significância rcfe. Sem pôr cm duvida 0 incontes tavel primado da s infra-estruturas. lcm um aspecta objetivo Csubjetivo. transcrita anterio rmente.Jl7 ~~ .a.polagia norte-an:ericana. se mpre que se incu rsiona pela antro. desprovidas al1lbas de existéllcia independel'lte. n30 teria scntido algum sem UI11 COllceito cuma atit ude. às ll ot6rias origens na pr:ixis. Toda eleme nto cultura l. uma ap ropnaçâo. de sentir 0 vento no rosto. '" ~ } . Como suas implicaçoes remontam a Durkh eim e. ele bebeu a agua dos rios... um concei to ou uma 3titude nao teriam sentido algum sem uma clara expressao. sob a forma de realidades discretas. Durkheim .ue na n orte-an. Ele ainda usa\'a seus sentidos.lo suspirar nos ramos dos pinheiros. realizam -sc COIIID cstrul'ura s. [Desse modo. grifo meu. Durkheim dese nvolveu sua pr6p ria posiçâo a respeito da sociedade em co ntra posiçao à moda lidadc de economicisl11o e individualismo radical qu e vimos conti~o no projeto de Malinowski (cf. ao 111oderno es tt uturalismo francês _ que també m incorpora a tradiçâo de Boas através de LéviStrauss. cm outras palavras. illterpu11 /l iul-se a Véll da W/lH rrI . pois a frase fin al do paragrafo ~de V lhite é uma proposiçao que Lévi-Strauss nao endoss a ria. Lounsbury. que é 0 esquema Assim [corn simbolosl 0 homem èriou um novo mun do pa ra nele viver.. por caminhos diferentes. através do comportamento ou da (ala (que é uma forma de comportamen to) . constitui a tota lidad e fundam ental para as ciências do homem . p. l6 Nesse artigo. Parsons..rel. poderia torn a r a vida ete rn a. sobretudo a partir do legado lîngü istico da escola de Boas. d(~ a~â~l~e camo traduçao. do convencional em oposiçao ao espontâneo. portanto. . em parti- "" . ~ '4. e portanto é mais correto entendê. pois os usas aos quais serve pressupèiem as propriedades espedficas que a caracterizam. . p. Segundo CSSa concepçao. Privado de todas as coordenadas de tem po. Com retaçao a esse individuo eterno do quaI fora abstraida a sociedade. p.Io camo uma profunda crîtica à autoconcepça6 do cap italismo que se exibia como teoria da socied~lde.la pela realidade exclusiva do sujeito intencional.l\'n-se em sua critica à economia. ç:~ J - ~. é nelas que se encontra a fonle de Ioda a evoluçao social..ss ica. uma entidade metafisica que 0 estudioso ... escreve: a economia politica consiste na satisfaçao das nccessidades dos indivfduos. m esm o q uando conseguim os neutra li za-Ia.." .' 38 Mostrar em que sentido um fato é l'tlll nào é explicar par que é verdadeiro nem por que é a quê é.:. as leis socio16gicas s6 podem ser um carola rio das ieis mais gcrais da psicologi a. os deli neamen los do fu ncio n alismo de RadcliffeBrown transparecem na onto logia de Durkheim . aspectos negativos da individualidade. Além disso. espaço e h ist6ria. Ressaltar a fac ticidade do fato social efa precisamente uma fo r ma de removê. portanto..110 Cul/lira c razao pratica Dois paradigmas da feoria alltropoldgÎca 111 elegclI Spencer coma seu principal adversario socio16giço no que se [cfere a essas questocs.uma espécie de supersuje ito. 1972. /Ibid.90. A qu estao nao se reduzapenas a que 0 fato soc ial seja coletivo. em pri ncip io. <0 l . e em vez de se o ri gin~r das necessidades. paralclamente ao contraste entre Morgan e Boas. se a sociedade é apenas um sistema de meios instituidos pelo horncm para atingir determinados fins. S -:·~ ·C ~. Por varias razoes. contudo. e n~o apenas corn Spencer. Durkheim opôs 0 fato soc ial.:s . Entendia de que a origem real do reducionisillo era a ideologia do homem que calculava: D. Durkheim nao poderia deixar de nutrir 0 mesmo desprezo que Marx. 0 m6vel rea l das incursôes de Durkhe im no terreno da psico lo gia ach. que sac internas. l8 Nâo obstante. Do individuo.' c~ "" ~. ha nas socicdades apenas consciências individuais.. que é extern:l. tudo que restava era "0 triste retrato do puro egoÎsmo" (D urkheim [ 1888 [. é passivel estabelecer uma COI11paraçao paradigmatica entre Spencer e Durkheim.: f" e!'!Î'. Sch ~ofIer e A." (1950a {1895J. 0 exerdcio dessa comparaçâo entre Durkheim e Spencer nao seria tao valioso. . Durkheim convenceu -se de que a econornia poHtica conslÎluia UIl1 eSlagio do desenvolvimento da ciênc ia soc ial que precisava ser superado. m odela que elevava a sociedade ao status de predicado das su postas fin alidades e necessidades humanas..11. a ma is impor tante caracteristica de u m a 'coisa' é a impossib ilidade de que seja modificada po r u m simp les esforço de vontade" (ibid ." cular de suas necessidades mate riais. Durkhe im foi obrigado a reproduzi r ao nivel da sociedade.. cc- ft ~ -. p. esses fins 56 podem ser individuais. é uma invcnçao do pensamento. Porta nto. é nccessariamen te através dcle que tudo devc ser explicado. e sc é dele que Indo provém.80). ela se impôe como coe rçao... "De fato. Em conseqüência. De mane ir. 1950b [1895]. p. pois somente os individuos podcriam tcr existido anles da sociedade. Ao negar a economia politica. Il .] Desde cedo. on de enaltece as perspectivas sociais d os historiadores econômicos G. As esmaga. . p...97-9. "' ~ . simultaneamente. e 1965.iv-vi). Esse p r6prio "individuo" era uma abstraçao.. p. Tratava-se de uma crîtica gera l à adoçao da f6rmula racio nalista d o indivîduo q ue acumula como 0 modelo da produçao soci al.. par conseqUência. Durkheim recusava-se a conceber a socied ade como 0 objeto externo da manipulaçao huma na ou troca. as mesmas consideraçôes imped iriam Durkheim d e ser in dulgente corn a utilitarismo mal disfarçado do func ionalisIl1o sociol6gico.42-4). f. 0 m esmo economicismo qu e se h avia recu sado a admitir como const itut ivo ao n ivel do in dividuo. logo.. citado par Lukes.. par sua vez. s '" ~ ~ . Pode-se perceber m u ito bem essa uniao de opostos em um ensaio (1887) que escreveu sobre a ciência moral alema. Como en lâo se co loca Radcliffe-Bro wn ? Seguramen te. Ncm Malinowski nem Weber.represen tava mais que uma liçào aplicada à ret ificaçao positivista. Uma delas é a grande seme lhança res idual en tre 0 "superorgânico" de Spencer e a "sociedade" d e Durkhe im.lo da produçâo individ ual: "Pois tu do q ue é real possu i uma natu reza defi n ida que impôe con trole. cm par ticular na obra A divisiio do traba lho (1949 [1893J).' tato. observa Luke. cujo deba te mais recente estava cent rado no utilitarismo pr6prio ou na sua açao eco nomicistica. p. nao é cssa nccessidade que pade retira-las do nada C conferir-lhcs existência (Durkheim.l a naloga. cmanaram ns nçc:essidades e dcscjos que determinam a formaçao de socicdades.. Ma is importante é que D urkh eim forjo u seu conceito de social n u m confronta gera! corn a economia poli tica clJ. do ras prop riedades e poderes qu e Ihe atr ibui em relaçao ao individuo representam um ataque d ireto à idé ia que 0 economÎsta liberal fazia da sociedade como produ to publico do Interesse privado. mas flao a criam. . Todos os aspectos afirmativos da sociabilidade no esquema de Du rkh eim sao. que a funçao de u m costume 9U seu papel na satisfaçao dos b~soil1s sociaux poderia dar conta de sua natureza especifica. Obrigada a part ir do pressuposto de que "nada ha de real na sociedade além do indivfduo'~ tai ciênc ia nao oferec ia qua lquer espaço te6rico para a sociologia. . estanda es ta ûltim3 relacionada à 16gica materi aI da prod uçao e. Nem mesmo se u entusiasmo pela "solidariedade" 0 levou a supor. Trata-seda consc iência em o pos içJo ao desejo.. combatendo os liberais da "escola de Manchester': Co rn relaçâo a estes ultimos.28) . por conseguinte._ f. A esse vo Iu ntar ismo e intencion alismo. encarada como . na oposiçao en lre ind ivîduo e sociedade.94-5. A necessidadc que temos das coisas nâo pode determinar que elas sejam desta ou daquela forma c.. Wagner. à oposiçào global entre cultura e natureZ3. cf.~ =1 c . a célebre advertência contida em As regras do tnétodo socio16gico" tratar os fatos sociais coma coisas" .~ 1:: . 0 individuo supôe-se camo 0 unico hm das relaçôes econômÎCasi tudo é feito par e1e e para de. Po rlan to. Asociedade. 109. que deve ser levada em conta e que ja mais é com pletam en te superada. entre as quais a necessidade de objetos materiais para satisfazê-las. e a terceira a sua renovaçao e continuidade" (D urkheim.processos tao di stintos na concepçao de Durkheim qu e isso 0 deixa inca paz de abarcar seu pr6prio programa positivista. p.-----------------'- . con ù êlr io. Sahlins. tem os seus propr ios fins.. Illas a atividade da naçao cm se u conjunto. Por urn lado. mas dotado de propriedades especiais e que.seja produto do desejo indi vidual adquire a forma de uma insistênci a em sua utilidade social: Para [Wagner e Schmoller]. mas tamb ém à pr6pria sociedade. a outra a alimentaçâo da sociedade. 1972.. [D urkheim .om=-.~-it·~ d~. 1887. Esse programa afirmava que os fatos sociais..·1 " ~ • ~e .. J Quer di zer entào q ue 0 argu menta iilvocaclo contra 0 scr individual é exatamente o da existência de u m ser social . da mo. Nesse casa. basicamçn te.. nos co ra mos das ciências natu rai s: morfologia.. Em um cnsaio postcrior (1965) sobre Rousseau. os ecoll omi stas libcrai s s:io. fisiologia e evoluçao.. É ycrdadc que reconh cCè I1l que 0 cstado de isolamcnto nao é id eal. e que era construida de modo a evitar esse peri go.~.r~ol~gia i social. p.t d'être (Radcliffe-Brown. A negaçao de que determinada praticaecon6mica..in ividual proporcionou a base 1 6gica para a apropriaçao de toda a metafora orgânica omo a idéia basica da constituiçao social. Vê -se que. vêcm no do soc ial nada mais que um a aproximaçao supcrficial.. s6 podiam ser penetrados de fora. 0 paradigma meies-fins camo U1n tode foi construide co rn base na cOll cepçao do rata social. tem sua pr6pria natureza e personalidade. . pode inclusive tom ar-se conscien te de si mesmo ... trala-se de um fodo que . disdp ulos de Rousseau .- . tampouco a maioria dos cidadâos.. em OPOSiÇ. Ela requeria apenas a proposiçâo de que a " funçâo social" de um a instituiçâo. tal como Rousseau. e nao do indivfduo. Assim.JCadoJIalyeZ _e~se sej~-". nao obstante. -=.~~_~~!mar_am..". algo de nova resulta de sua combinaçao: um ser composto.~. po rtan to. Outro conjunto de paradoxos é 0 problema (mu ito semelh ante ao de Malin owski ) da diferença entre 0 modo de conhecimento do soci610go e a maneira pela qual 0 conhecimen to é co nstituido na infância e na sociedade .Sc redu?. -é " m ela a divisao da antropologia social ou sociologia. que Durkheim se tornara cada vez malS consciente da auto nomla e da Uri'ivêtsalidade do sÎgnifj . que a atividade social po de ser comp reendid a. contanto que guiados pela percepçao e sem preconcepçao.nent.66). corpo da naçào . à soma das suas partes .~eJ~emplo da_ '!i~er_':. esse conceito. B 6bvio que a ênfase na vida da sociedade em oposiçao ao pro 6s~:. -' d~ . Um deles cra a visao de qu e a sociedadc cstava continuamente ameaçada a pa rt ir de dentro por uma guerra da parte contra 0 toda. 0 exé rcito. cap.m _ estar consciente de um fato e conhece r seu lugar. precisamente porque eram "coisas".s i~~. 0 ser social lcm necessidades pr6prias.37 -8. d ctermin ada pela conjunçao de înl ercsses individuais.e a transferência do utilita rismo do indivîduo para 0 sllpersujeito que a pr6pria linha inicial de argumentaçâo de Durkheim tornou inevitavel. cie institui e organiza uma atividade econômica que nao é a ativid ade deste ou daquele individuo. 4). por exemplo . ele deve in teressar nao apenas aos individuos considerados separadamcnte. mas que. te6ricq açi!!_~a. ou sua contribuiçao à continuidade social. 1886. A tradiçao da socieda e co ITm organismo foi mantidal)Or ltaa.112 CI/hura e. Pode se r que essa noçao de luta subterrânea e dos problemas funcionais que ela apresenta à sociedade permaneça como 0 legado mais importante conferido à ciência socia l pela ideologia capitalista. a sociedade é um verdadeiro ser que nao esta. No entanlo. os fatos sociais tivcssem a mesmo tipo de gênese. [ ~ ."-!~_e~tr:. p. porque estao (ato de que as partes man}êm relaç6es dcfinidas L dispostas de determinada maneira. mas. Lukes e o utros antrop61. p.e·~ -a-mbos os lados da questâo equivalem a ap enas um conjunto de paradoxos dentro da co mpreensao do m est re da relaçâo do pensamento com a mundo.. razao pra/Ica Dois paradigmas da teoria alltropo/6gica 11 3 pade c devc ignoraI'. . "Para um fa to ser sociol6gico. alé m di sso. enca ntrava-se também por detrâs da preocupaçao de Radcliffe-B rown corn a "cooptaçao" e corn a ordem legal em geral (cf... da mesma forma que se tornou.. a vida da sociedade era a fin alid ade relevante. nas mâos dos seguidores antropol6gicos.QQ:_ Os lextos que lfJ poderiam ser pe ~. ~ ~ . acima dos indivîduos que a co mpôem. [Ibid. a fa mflia possuern fun çëies sociais na medida cm que têm coma se us objetivos um a defesa. Mas. sem duvida. cspirito coletivo. 1950..a.] A sociedade. Essas express6es utilizadas na linguagem corrente .62) para completar em um mesmo movimento a reversâo da maxima de Durkheim para 0 seu contrario .. :Ë errado dizer que 0 todo é igua l à soma de suas partes. Durkhei m nun ca acred itou qu e 0 nosso pr6prio con hecimento como m embros da sociedade ou. a telcologia utilitaria nâo pode se l' evitada. incluindo a muito conhecida "epÎstemologia sociol6gica': acabou viti ma do mesmo tipo de dualismo.3 7.. fosse também sua miso. mas expressam fatos que sac emÎnentemen te concretos. que inspirou profundamente a m aioria das obras do grupo do Am1ée Sociologique.~~"""oa. sua opiniao muda . e é através da sociedade.~q__àS~ objeçôes de Lévi-Sffairs'Sà-aëriVaçâo~ repr~se nt~!? c~~eti:. qu e nào sao aqueles do ind ividuo. é certo. es sa idéia de sebrevivència social ao il produzia grande numero de efcitos permanentes sobre a idéia do obje to social. a fortiori. a quem repud iam par cngano. precisamente porque foi definida camo exterior e por distinçao ao bem -esta r individua!.ow·n. em ci rcul1stâncias especia is. outra forma de 16gica instrumental. a industria. Pelo simples unas com as outras. Esse dilema pode ser exemplificado por duas curtas passagens das Regras. Durkheim escreve que "toda educaçao é um esforço continuo para irnpor na i J. Essa pa lavf(l apcllas [ol ula 0 conj unto de todas as atividades individuais.êïTffé~·s..consciência colctiva.e contra 0 l'ode r orde nado r da necessidade individual esta 0 da l1ecessidade social. o conceito de simbolizaçao de Durkheim. na medid a em que esse fato foi determinado por oposiçiio à necessidade individ ual.: ~ A. Como . sem 0 sabcr.nao possuem apenas uma dimens âo puramcnte verbal. p. al gu mas paginas adiante. DaÎs paradigmas da tcaria lZlltrapolOgica 115 1 cf iança maneiras de ver. relaciona-se sempre corn um objeto determinado ou corn uma coleçao de objetos desse tipo c expressa 0 estado momentâneo de uma consciência particular. sem colocar em Jogo qualquer outra tendencla. às vezes sonhamos co rn uma ciência que expresse adequadamcnte tod<l a realidade.\ \ i ~. corn relativa liberdade. Nossos apetl~ es sensonalS sao neccssariamente egolstas: des têm a !lossa indiv id u ali d ~dc . ha um nûmero muito pequeno de pal avras que empregamos normalmente cujo significado nao ullrapassa. apresenta d uas formas muito. Ur. [Durkheim.. de direito. a co ntradiçao era m a{s complexa e nao deixava de apresentar certa determi naçao. dill~~al~dade ~oci.6). 1'. que satisfazemos.~~~_~_4~_r::!. na. No caso mediado.. c apenas a n6s mesmos. 40 E uma vez que ascategorias nao sao as particularidades d a experiência. sociais). te'rhpo. por definiçao. Cada uma dessas duas partes de n6s mesmos representa um p610 scparado do !lOSSO ser. mas antes idéias gerais das particulariclades (que fazem de um a exper iência um a particularidad e). Em vez d e arttcularem essa expe n êncla.23-4). Durkheim escreve sobre a alien açâo envolvida nessa apropriaçao da experiência individual de uma forma semelhante à que Ma rx aprcsenta nos Manl/s.O san apenas distintos um do outro. 'l • l ! f f . Por isso.ho mem como um supersujeito cujos pr6prios c. porém. distin guem-se pelo fato de que as regras de condutas às quais estao su}eltos po~em sel" univers:lIizadas. e apenas da. os limÎtes da nossa experiência pessoa!. temos os meios e a liberdade para representar em outros termos: Urna sensaçao.onceitos do mundo dominavam e suhstitufam suas sensibilidad es e depois.r12 . 1 fato social de Durkheim na formulaçao de Saussure da d istinçao entre langue e .ividade moral. r ( 114 Clllwra e raziiQ prl!/ica 1. ' .da nos prende. Durkheim reconhece 0 cara ter arbitrario do signo diretamente. exatamente porque a sensaçâo individual é so m ente um fato transit6rio que 116s. uma vez que para Durkhei m as categorias representavam a morfologia o () Em outro artigo ( 1914 ).: ~or um lado. mas aprop riam-na dentro de um siste ma cultural 41 relativo. e as hm ltaçôes da problemahca durkhelmlana como da cultura. A moral co meça com 0 desmteresse. mente em termos inteligiveis.f . p. ~1. elas nao refietem especifica m ente a percepçao. \1 l " .Essas 1 iJ . mas é projetar uma luz sobre a sensaçao que a ilumina. 39 40 "De fato. Frente a elas. e nao podemos sen tir aquela vida sem renunciar à sua compreensao. como uma conseqüência 16gica da distinçao entre 0 fa to individual e 0 social.l ~~ i em t~ f0.434). como nossas idéias (représentations) das coisas fisicas sâo derivadas dessas pr6prias coisas e as exp ressa m mais ou menas exatamente. Porém. particularmente em r~ferêncla às c~teg. No cntapto. aquilo que as fazem ralar ao nosso se r sensorial e a comprometê. ela é esscncialmente individual c subjetiva. virtudes sao apenas parcialmente docum entadas pela mfluencla do concelto de Jw. ao contrario. Observa-se outra paradoxe do ponto de vista do carater arbitrârio do sig no. ass im [como estudiososJ nossas idéias de ét ica devem ser derivadas da manifestaçao observavel das regras que estao funcio nando 50b nossos olhos" (ibid.eles transcen~em . Mas a realidade sensorial n:ïo é fcita para en trar no quadro de conceitos. 0 primeiro era 0 d estino do homem na sociedade. com a ligaçao com alguém que naD n6s mesmos" (1 960 ( 19 14]. Todavia. D. 1947 [19121. de representa-las a n6s como se desenvolvendo em urn a ordem difercnte daquet a na quai realmentc se produzirarn. temos de submetê-Ia a todos os tipos dc operaçoes laooriosas que a alteram de modo que a mente possa assimila-la.o~las de classe.. podemos dispor. Sem duvida. 23).especificamen te a expe: n ênc la IOdlvldual. Durkheim esc reve~: "Nossa inteligência. desse modo. Na condiçao de locus desse dualismo antagônico entre sociedade e se nsibiJidade. Assim. um termo expressa coisas que nun ca percebemos ou experiências que nunca tivemos ou das quais nunca fomos testemunhas" (Durkh eim. como seres sociais. eles se eleva m a uma metalinguagem pela quai a experiência é organ izada. 195 1. e a dualidad e d o seu ser correspondia a uma oposiçâo entre percepçao (individual) e concepçao (social). é um ideal do quai nos pod emos incessantemen te aproximar.l·V al-1 <"parole (Doroszewski..327. Entretant o. sao sensaçoes e tcndèncias $ensoriais. mas nunca atin gir" (Durkheim. Na Classificaçao primitiva (juntament~ corn Mauss) e ~al-tkJacto (voltaremos-a-essa~.!!. Ela resiste e. sentir e agir às quais ela nao poderia chegar espontaneam en te" (1950a [1895].435).q uestao m ais ad iante). cnquanto nao intervenham consideraçôes de outro tipo [ou seja. bem como entre gratificaçao egoista ~ e moralid ade coletiva. Elas s6 tomam forma conceit ual perdendo 0 qu e ha de mais concreto nelas.~ ) Menc~on.lo na açâo. Ij~udes te~na . Durkheim se apegou simultaneamente a uma re'laçao mediada e nâo -medi ada entre suj eito e objeta. q ue da seguimento às Formas elementares. para submetê-Ia.JPas~~le~1:~tar~~.u u ma Unoçao~o signo. 0 hom em era «duplo" na visao de Durkheim.J. isso. e esses d. ~ ! . ~ espaço. p... 0 conceher algo é aprender mclhor seus c1ementos essenciais e tamhém situa-Io cm seu lugar. 1933).o essas ~o nvoluçôes ?ialéticas ~or~ue e1as ajuda~ a explicar as vir!(' . . se impOem a n6s de [ato.tual e a atlVldade moral.ritas de 1844: "N6s s6 comprecndemos quando pensamos soh a forma de conceitos. No en tanto. perseguem fin s impessoa is.o Dur~ei~ desenvolve. Portanto. p. nem espontaneamente nem por si mesma. cm maior ou menor medida. mas também sao opostos um ao o ut ro. 42 Em outra pa rte da sua obca. sao 0 pcnsamento conce. cada civilizaçao tem seu sistema de conceitos organizado que também a caracteriza" (ibid. como o~Je t ? Quando satisfazemos nossa fome. [0 pensamento conceitualj e a ~ t. tornam-se algo ftxo e morto. . .!.~~~:::! 0 ~r6pr:. por outro. nunca somos completa mente bcm-sucedidos ao controIar nossas sensaçôes e ao traduzi-Ias t·otal. como os ( ~c:~~~_s. Se 0 segundo se adaptava ao projeta cientîfico. como um objeto. das reprcsentaçôes que têm essa origem. qqe em mUltos pontos essenClalS era bastante pr6Xlma à d e Sa ussure. p.329). etc. 1947 (1912).14. a experiência direta do que explicava empiricamente esse processo de imposiçao co nceitual. ele diz: "Os moralistas pensam qu e é necessario d eterminar co rn precisao a essência d as idéias de lei e élic3. cf. e Lukes. Eles ai nd a nao chegararn à ve rd ade muita simples de q ue.a~. causa..ois p610s ~li. Finalmente. 41 "0 pensar através de conceitos nao é apenas ver a realidade do seu lado mais geral. 1972. como nossa atividade. urna irnagem. é a n6s m esmos. temos de cometer aigu ma violência para com cla. 1'. quando nossas sensaçôes sac reais. penetra-la e transform a-la. Sem duvida. somos livres 'para concebê-las de modo diferentc do que realmente sâo. 1'.. nossa sede etc. Com muita frequ ência. n:io podemos comprecnder as coisas sem renunciar parcialmente a um sentimento sobre a sua vida. diferentes. num~ro. a soc iedade co nfrontava o . 1960 [1914]. 39 .. a derivaçao de forma 16gica do afeto inqistinta pe le q uai Lévi-S trauss a censuro u .ovimentos que executa~.s acima l de tudo é 'l lde 'VIue ela for ma de SI mcsma (1914 [1 9121. nao é um simp les reconhecim ento da circu nstância mate rial. idéias e imagens que. pairando for a do mundo': ambos estào Ide aco rd o quanta à proposiçao corolarÎa de uma natu reza sociali zada ou)h'1maniJzada. se ntimentos. . mas um sign ificado social. 1947 (1912 ). Ele foi esse ncÎal ao lraba lho de Radcliffe-Brown sobre a crcnça e 0 . The Nuer (1940). Foi antes a diferenciaçao fatal entre morfologia soc ial e representaçâo coletiva . Villa socicdade 1.) ~ fi . perguntou cIe. reconhece-se nesse problem amat riz da antropologia social inglesa a mesma "i530 geral da relaçào de costume corn a natureza que distingue Boas de Morgan. • j . pessoas essencia\mente racionais camo os Azande. l "nao se enco ntra fora da socied ade real. 1972. precisa mente nao um reflexo. .um problema tam bém co locado··pelo papel que Durkhei m e Mauss (1963 [1 90 1-2]) emprcstaram à "confusào" na geraçâo de categorias conce ituais. ~~~oisas que eles usa~1 e os n~. Issa significa tudo que éco nsiderado natural em Ùhl d e(ermi nado lesta gio d e desenvolvimento soc ial. e se 0 exagerou pela transposiçao de uma telcolo gia utilitâria ao supersujeito social. ele nao pode m ais ser pensado para agir sim plesme nte de fora.. p. èsse mesmo rnovimen to evitaria a naturalismo vu lgar.. sao elementos const itutivos dela e. Uma vez incorp orado ao dOl11lnio huma no. • ' . a forma da natureza. em co rrespondência corn as categorias de homens. Mas entao Evan. Observem que mesmo dentro da epistemologia sociol6gica surgiu um desvio fundamental na relaçao en tre sociedade e natu reza qu e podia afastar qualquer reflexio nismo. A oposiçao 30 marxismo foi exagerada nesse exemplo te6rico. camo Durkheim colocava. ~. . ou a ecologismo. Os objetos dessa existê ncia social nao eram simp lesmen te classificados isomorficamente corn a homem.• cerimon ial dos andamaneses. Um fato natural abrangido pela ordem cultural. e da si ntaxe significativa coma sui ge/leris: "A sociedade ideal". 1 . da ordem na lural (OIllO ordem moral. embora essas combinaç6es nao sejam comandadas nem compelidas pelas condiç6es da realidade subjacente" (ibid. Se a funcionalismo in glês reproduziu certo tipo de eco nomicismo.~" 6 Cl/IIUnI e razào pra/Îca Dois paradigllws 1'1/1 tcoria fill/ropo16gica 117 I l Portanto. dividem e multiplicam.23!). A hi ~t6 ria do mu ndo era a narrativa da existência da tribo. açao da natureza nâo é mais um J'nera fato empirico. se nao cede suas propriedades fîsi cas. para Durkheim. Dlvergmdo do i m aterialismoh ist6rico em gestaçao. exatame nte camo os home ns. ma. 'ft epistem o logia sociol6gica 2te Durkheim tinha seus lim ites enqua nto teoria { do significado.. tabu c :" reli giao cm ge ral. t. p. • • . Eles se atraem. casa. p. Embora a fogo passa ter a propri edade de qu~eirii3r'uma casa.234) .) Se. / categoria social. Nem ha uma resposta comensurave l. A oposiçào a essa recluçao levaria Durkheim. é pa rte integra nt e dela . 0 chao que ': el es OCUP~J!:1.424. de uma maneira puramente natu ral. p. Nào me refiro ao sentimentalismo da exp licaçao de Durkheim do totemism o austral iano.141 ). Por que. elas têm um lugar determ inado no esquema geral da organizaçao da soc iedade" [Durkheim. limites esses.422). é até m esmo 0 o posto. por isso fo i dado a eles um Iugar dentro des grupos huma nos. ele passa u a uma determinaçao da m orfolog ia social camo significativa. e J tudo que fo rm a seu envolvimento com cie. Além di ssa.)-P ritchard ja hi'vi~î dês~~volvido os 'pOÎ1toS essen'ciaisde uma v~rdadeira ecolog ia cultural em sua ob ra sobre a bruxaria Zande (1937). Durkheim con trap6s "todo um mundo de . ainda assirn acusava rn disso seus vizinhos e parentes e ernpreendiam aç6es magicas de defesa e represâlia? A resposta que ele mesmo deu foi que a efeitb socialhâo resulta da ca usa natural. além de seu pr6prio reflexio ni smo soc iol6gico. seu conteu. ! do e sua objetividade sâo todos soc ialm en te condicionados" (1971.recriada por auteres mod ern es coma socicdadc Il t r r r . A respos ta poderia se r enco ntrada também especificamente no nivel cultural. BuJrrier e Tam biah. dcsen'lolve lad a a questao na sua co nst ruçâo. Da determinaçao do esquema significativo pela morfo Jogia socia l. assim como aas seU5 estudos de totemismo. nao dita mais suas conseqüê ncias. Em um ~e ntid ~ crit ico. 0 universo s6 exis te na medida em que é pensado. DurkJ1eim costumava dizer.. mas dc dcntro da sociedadc. A descr içao feita por Lukâcs é valida para os dois: \'A natureza lé u ma . u ne m. repelem. ab ra nge os "moldes d entro dos quais é formada a experiência humap-~': Conseqüentemente. E entre a propriedade de 0 [ogo queimar madeira e 0 fato de um homem perder sua propriedade nao existe q ualq uer relaçào comensurâvel. p. a fogo s6 queima madeira. t_ . desse modo. . nao é propriedade do fogo quc imar a sua casa. A sociedade. POl' nenh uma 1 6gica natural a açao nl<\g ica contra um tipo especifico d e pessoa é conseq üência do processo d e comb us tao.. permeando 0 contraste entre as detenn inaçôes gc rais ~ da ecolog ia e a especificidad e do sistema de linhagem pelas suas famosas passo. entao ele foi abrangido d en tro d e uma ordem até m esmo maior.. Do mesmo m odo que Du rkJle im concordaria corn Marx quanto ao recon hec imento 'Ide que "a homem nao é um ser abstrato. tudo que existe no universo. contudo. nao é constituîda somente da massa d e ind ividuos que a com p6em. exatamente coma 0 espaço geogrâfico podia ser explicado a partir do ponto central de um a aldeia. gens sobre a constituiçao social do tempo e do espaço. con ti nua a in fo rm ar a rnclhor antropologia es trutural. inglesa ou francesa. ao menos momentaneamente. contudo. insistia ele. isto é. a . compara r com as primeiras observaçôes d e Labrio la. acima de toda consc iênc ia coletiva. 0 "resultado" cultural particular nào é qualque r p redicado d ireto da causa natu ral. e. bem como às ana lises mais rceentes de c1assificaçâo de Douglas. uma vez nascidos. sao um a parte da tribo. as pr6prias co isas. de Evans-Pritchard. nao estâ na natureza do fogo queimar uma . 0 fato social. obedecem a Ieis pr6prias. que parece m estaI' reproduzidos nos melho :/ res traba lhos mod ernos. Leach. 0 mundo conhecido do homem era um mundo soc ial. sabendo perfeitamente que suas hortas ti nham sida destroçadas par elefa ntes e suas casas que im adas pela fogo. em Lukes. essa natu reza é re lativa 30 homem. Ele também foi dcte rrn in ante para as in iciativas etnograficJs de Evans-Pritch ard e seus alunas. membros rcgulares dela. por assim dizer. Esse conceito da apropriaçao soc ial da I1Jtureza. ("Para os australianos. . mas na pr6pria organizaçao e açâo da vida social: 1 As primeiras categorias 16gicas foraru categorias sociais. em um senti do.foram dadas... desviam da sua significaçao primeira.. (\ <:::5~: t..~- Durkheim derivou as catego rias que a sociedade "sllpôe" de sua constitu içâo jâ concretizada.(} 1Ol .. Basta md lca r certas conseqüênc ias da distinçao-en tre eStrutura social e conceito mental coma realizadas em um a a. espaça e causalidade" (1919.443).: ~ particlllar~nente ~piste~016gico. ".J ~ ----. _i .. ou n_ n~raliz~çao do sig~)e de.. s6 0 reverso parecI3 verdadelro. continua a perseguir 0 funcionalismo est rutural desenvolvido por Radcliffe-Brown e outros em uma base durkheimiana.. Se. ao reflexo representaciona l na ciência social angloamcricana a prcferéncia pelo termo "simbolo" em oposiçiio à utilizaçiio (rancesa de "signo".a. da pr6pria sociedade? 0 problema da sua natureza "' ... que s6 dif~re dos ~utr~~ por sua mais>r complexidade.1 . uA sociedade".-.155ss. 1" !I Na visâo de Durkheim. . ja q~e reconc~iou .:~ .9_uma l U teoria sim.. cm um superpa radoxo que as futuras geraçôes teriam de combater. a nao sec que Cfa "natural': Daî 0 dualismo de estrutura social e conteudo cultural.. numero. é sua mamfestaçao mais elevad!:l2_ 1 .ocie~~de é uma real idadc espcdfica.(totlt à coup)) todos os paradoxos do superorganiClsmo de Durkheull. cf. nas quais as co isas estavam integradas..f-l.. quando elas se . as primeiras classes de coisas t~ foram classes de homens.4 3 Porém sc as catcgorias nao traduzem originariarncnte nada além de estados sociais. '. como . . e foi seu lugar na sociedade que determinou seu lugar na natureza.: A soc iedade nao er~ vista co~o constitufda pelo . 1963 (1901-2).i .. e por isso representam operaçôes mentais das quais eles sao.~ ' .. ao contrario. As metades foram os primeiros gêneros. ao contrano. a noçao de classe precede necessariamente a apreensao de que os pr6prios 1 grupos sociais. . os clàs."".. Parodi. ~ t. u:. Durkheim. mas isso nao pode ser feito sem as pr6prias ca tegorias que Durkheim e Mauss derivam do modelo ( 1963.a natural: ) f. qualqucr relaçao espacial que pudesse entao ser aplicada ao universoj as categorias de quantidade têm de existir a fim de que uma mente i individual passa ser capaz de rcconhecer uma. pela fato mesmo de que sâo conceilos construfdos·. intcrprctar dessa maneira uma teoria sociol6gica do conhecimento é esquecer que. A rÎ1ësmaaprec~çao incompleta do sfmbolo. que contestou a idéia de que nossas categarias de eomprecnsao e 16gica derivasscm cm primeiro lugar da "maneira pela quai determinada tribo armara suas tcndas"..-. Foi porque os 1 homens (otam agrupados.} -u '"' c ~ fi ' .m:. [Durk1 heim e Mauss. que a simples cristència de cerimônias ou de trabalhos rcgulates. e a tendência dM resultante de se relacionarem os termos em \llll sistema scmi6tico cujos principios de " po .44 0 "simb6li co" fo i. isto é. \. as primeiras espécies. -.!!< QI : ft! r . ~ . tornou -se agudo ao nî vel pois Durkheim tinha E d e enfrentar a questao de como as categonas denvadas de uma formaçao social f' particula r podiam provar-se adequadas para a compreensâo do mund9' A respo~ ~a. . BaO inata ou transcendentalmente. ~w.. Patodi cscteveu: "Parcee manifesta. p. Cl/flLlra e razao prritica Dois paradigmas da tcoria mrtropolOgica .-_ . (ou sistema social) versus cultura (ou ideologia) . como vimos.. Ao menos. 118 . A dificuldade foi que r! Durkh ei m formulou um a teor ia sociol6gica da simboli7.. tempo. -P.xxvii ). cm sua disposiçao. t ~. se a s. que contiI1uamente ameaçava 0 segundo corn uma reduçâo funcional aQS modelos e prop6sitos utilitarios da primeira. escreveu Durkheim. foi amplament~ ~atisfat6ria.V ..r!l. cm um sentido. .~~ t ~ processo slmb6 hco.açao. original. J 43 Durkheim rcecbcu edtieas do mesmo teor do fil6sofo contempon'lOeo D.. eladaS'TIa'.ntropologia posterior. as metades sac el as mesmas categorizaçôes (de ho mens). p.*. - '--.. : ~ ::. deixando assim a forma da sociedade sem explicaçâo.. Em outras palavras. d3 sociedad:. "sup5e uma organizaçào autoconsciente que nada mais é qu e uma classificaçiio" (194711912 J.} ~ dos suporles das categorias. IDurkheim. 44 Jamesoll atriblli.que arbitra ria mente limitou a extensao de simb61ico e deixou 0 campo aberta ao habitua i dualismo funcionalista.18-9.::rW ": É po r isso que noçoes ~ue se elaboraram sobre 0 modela das coisas sociais podem .il: '. '~cf~c J119 t ~~: C:~ '~ '\ •"1 'Ift\ ~ •. na maior parte dos casos.. supostamente. D. fez a seguinte objeçâo: l a 110çao de espaç~ teve de existir antes de os grupos sociais poderem ser percebidos J para cxibir. A resposta a coma as categorias mOd.1\ \ ._ ' / " :i I No entanto. nao deriva dai que elas possam ser aplicadas ao resta da natureza apenas camo rnciâfo ras? '" Porém. i~ 3)udar-nos a pensar as COJsas de outra natureza lobse~vem a idéia exatamente oposta de Lévi-Strauss do "chamado totemismo''J.~6Iic3. p. que a simples distinçao entre dis e tribos e os seus respectivos lugares no campo pressupoem as categorias 16gicas e s6 sao possivcis gruças à intervençào anterior dOlS idéias de tempo..:~i no s. convincentemente. e pensavam em si mesmos sob a forma de grupos... tomado no sentido secundârio -.s~ciedade podiam aplicar-se à natu~ reza foi que a pr6pria sociedade et:. ma~ll. .S . entra neles a artificialidadc. dvo t!L • "1 1 -:! . etc..>$. -. ~ ~~ . sac c1assificados. " ". é uma artificialidade que segue de perto a natureza e que se esforça par se aproximar dela cada vez mais. 0 ÇO~ papel de shnb~los.. Que dizer enHio .. que em i suas mentes e1es agruparam outras coisas.oc iaI é um reine n?. e no inkio os dois modos de agrupamento se misturavam ao ponto de serem indistintos. ... naD é ~em duvida oum império den tro de um IInpenoj forma parte da natureza.. muitas e a totalidade de divisoes da sua sociedade. p. essas noçôes descmpenham. .. qllase à maneira de VVhorf. ...1 ~ao yale a pena est~nder-se nessa recuperaçao da sociedade pela natureza..outras contradiç?es par~ u~la melhor compreena saD soclO 16gJc ~ do que DurkheIm apresenta aqu J.82-3..sun pies representaçao de realidades so~ iai s.! "poLas-'" sim dizer. 0 pr6prio "modelo" social deve ser : percebido para possuir as caracterfsticas que a tornam util na classificaçao de outras coisas. combll1and~.!. Gostaria de ugradecer a Mark Franci!lon por chamar minha atençào para cssa passagem e para esse livro.. ~. 0 modelo 1 "". 1947 (1912). m _. Rodney Needham. trata-se de simbolos bem fundamentados.. 1947 (1912).431-47.t~...).' .~1. as noçôes fundamcntais dos ho mens {de classe. sem duvida. em concordância corn os qua is os fen6menos naturais sac dispostos f em classe. p.. As coisas cram pensadas coma partes integrantes da sociedade.L (~ ~ ~ . p. . .. A diferc nça de predileçôes analiticas pareee rcal. céu e agna como a priori e normal. p. HilL L 1 IH . por conseguinte. 0 significado é coerentemcnte sacrificado à marcaçao social. Vma d iscussâo do significado corn a atençào~ particularmente vo ltada para a diacritica social permite .61). en tao...uma . Douglas promove a adoraçao de Terminus. mas apenas m ais abstratamente se a espéc ie é olhada cam benevolência.de · ... como as co rrespo ndências entre eles. de fr'o nteiras e transaç6es através das fronteiras . possibilitando portanto uma d iscussâo da maneira pela quai 0 m undo é culturalmente construfdo em relaçao aos homens.apenas parcialm ente . d iferenciaçao de grupa. ! simb6lica envolve um esvaziamen to progressivo €~. 0 mais importante é que. dualismo malino wskiarf6?~ ~c·uitûral n nâ?yo~sü(q~~qu:: 16gica n~cessar ia em sG'--m esma." ---_.. :~ .. Vma cadcia politîcamente ascendente asseguraria a hostilidade crcscentc de se us vizinhos. 0 deus dos marcos fronteiriços. Fiel ao nosso santuario e à nossa lei. 0 simb61ico é simplesmente uma condiçao variavcl ou acide ntal do objeta antropol6gico. cm vez de sua pro pr iedade d efi nido ra. nem que fosse de ouro. e da o rdem cultural total como um projeto utilitario.coisa J.e"~a lor d ai doutrin as epistemol6gicas de A s formas elemetltares da vida religiosa. tend. . Na realidade. 0 soc ial também d eve sofrer uma decomposiçâo estrutural. um movirnenlo ja absorvido e interiorizado no pr6prio signa coma a ll1ovimento do signifi canle ao significado" (Jameso n. u ma expressâo nas regra s para lidar corn os objetos. codifica rn eventos sociais" (ibid.. pAO). 1 t: ':. ~ J) 1midos em implicaç6es abstratas de inclusao e exclusâo. 120 Cllttura c ra ziio prtftica Dois paradigmas da tcoria alltropo/6gica c derivalivo de uma m oda lidade ideal do fato socia l. l ' j total.z. escreve Douglas. de inclusâo·e exclusao.?~'!~9Ividos.. nao se .apo io para rc lac Îonam entos farm adas por pro cessos t polîticos e econôl-qicos reais.. essa rcduçao.---121 . mensagem trata d e diferentes graus de h ierarquia. 1972... como se as relaçôes sociais também nac fosse m compostas e organizadas pela sign ificado.digamos. nào sao os aspectes contrastantes de espécies liminares que merecem atençâo. fogen\ a qua lquer exp licaçao sÎgn ificativa. p. ciais daquele tempo e lugar" (Dc:Jglas.q s_ totalme'!!.. Em termos mais precisos. n . uma expressao articulad a da sociedade. a pr6pria palavrn '51I11bolo' implica que a rclaçao entre patavra t. traz cons igo mesmo..a liberdade analitica para considerar 0 que é simbolicamente variavel e problem atico .~os culturais de pessoas e objetas.--. a ordenaçao da natureza é uma objetificaçao. ass im como sua o rdem verdadeira é ul1l_refle?o:9 d os grupos . de lin signo plr~ outro. coma os "interesses humanos" que se d f" ~: sup6e constituf.. seria q uase a suficiente. Pelo lado dos objetos e das re~6cs soc~s. Entretanto. As linhas de Irajct6 ria do seu sistema sac laterais. Saussu re. revclar-lhe Ul1l l yisào l1l onoteistica e dar-Ihe um conceito de santidade que pod eria espe ra r que a 16gica simb6lica fosse m ais sistematica que «as m aneiras inco rretas pelas quais as pessoas usam a 16gica para lidarem umas corn as ou tras" (Douglas. ser-lhe· ia evidente que nenhuma irnagem de animal. ma vontade ou ambivalência. os elemen tas de um c6d igo de objeto.aç6~s a:. nem mesmo um bezerra. O~nesmo cfcito é dada pe la arbitnl ria diferenciaçào J entre "cultura" e dsistema social" na escola in glesa. diferenciaçao ordcnariam a referênCÎa objctiva.Ï!?~n~?!i~ uma d es-'i consideraçâo para corn a sua estrutura em favor d e propri edades pu ra m en tell· formais de distinçao e categorizaçao. uma vez que seu signi ficado nao é mais que a intençâo social dirigente. 1973a. «as m ensagens que ela codifica serao encontradas no padrâo d e relaçôes sociais que estao se ndo exp cessas. tais como diferenças alimentares.. que exista alguma adcquaçao basica na situaçâo inicial. que fadamos? Prometer a seus descendentes uma terra fér lil e ce rca· la de impérios ini migos. Na realidade.. .69 ).~ e!ati~ social: _ Antes de serern Iistados para os prop6sitos .inta deve ver 0 resta do mundo com a composto desse modo. ap6s esse processo pelo quai sao selecionados do "meio ambiente cultural" e assim classificados e inter-relacionados.1li. A. à m cdida que 0 sign ificado é considerado como 0 m era "conteudo cultural" de relacionamentos cuja estrulura form ai é a preocupaçao verdad eira. sentisse em sua pr6pria carne.o a funçao "de . por outra lado. ~ um tende a ser id en tificado corn 0 outre conteudo significativo corn valor l~ocial (no sentido dado ppr Radcliffe-B rown)~ 'po'r uma ifàaiçao -q ue"toma como ce rto que 0 pensam ento huma no se rve aos interesses humanos e. Mesmo os trabalhos m ais valiosos sobre a conceitualizaçâo da natureza. Pois no projeto te6r Îco . da pabv!"a à {eoria. 1973b.c cja ~fbj trar~'1-. frase por fr ase. po r exemplo.-----~. na medida em que um grupo humano que se concebe coma uma espécie disl. As categorias de comida. consc" qüentemente. uma a. eles nao ~ estao realmente em melhor condiçao semântica. cm qualqucr mo men to._ . de u m modo paralelo ao . !a 1 ii . Para eIa.3I·2). da palavra 'sim1>olo'. Reconhecendo . p.. E observcm que ao prestar-se a ess'e empobrecimento. contanto que um deles esteja preparado para definir essas relaçôes corn 0 rnesmo grau de indete rm inaçao. • . par si mesmo.j. pAl). 197 1. a tàref:rmais importa nte de in\'cstigaçao lingü ist ica consiste cm uma busca de referentes.o sîmbolo nao é mais que um signo que nao é gerativo d e sign ificância em c~J". pode riamos 1er imaginado um pIano melhor? Se quiséssemos cscalher um pava para n6s mesmos. as configu raç6es soj .-_· . 45 Mas. possuem apenas a co erência de um "fluxo arnbiente d e simbolos" (Douglas.. Um exem plo apropriado disso é a tentativa de Do uglas d e correlacionar a co nsideraçao atribu ida a espécies r t. Do mesmo modo. da d iferenciaçao dos grupos r __ î Jhumanos. "Se a com ida é tratada COlüO um c6digo". tendem a troca r 0 valor scmântico das categorias pelos se us efe itos sociais.. ou m elho r.. poderia relratar seu deus 1ou scia. mas empiricamente motivada (f'l . Os c6di". 45 "Se fosse mos Deus. 0 efeito disso é uma visao u nilateral do significado como diacritica social. Sua desconfiança dos estranhos seria validada ainda m ais completamente. dcsviou·sc. .. de Ioda a quesU'io dos referentes tiltimos do signa lin gülstico. sac co nsu':::. devido à sua pr6pria terminologia. é a de di ri gir nossa atençaÇ! para 0 relacionamento entre as palavras e scus objctos o u refcrcntcs no mundo T cal. Aco nlece que.las.f'~ 06··ïl virtude do scu luga l' em um sistema de simbolos. rncsmo se a expllcaçao nac for inteiramente convÎncente (accitando-se 0 USQ corrente do (rancrs da palavra signe): " 3 etidcia da terminologia anglo-americana. 0 ') . desse ponto de vista. 1973a. ein vez de front ais. uma divisao trip artida de espécies entre terra. as qua is.! por realidades sociais existc nt es. Isso. visto que isso pode sec comparado às relaç6es entre grupos.--. cie seria 1110 pouco capaz de aceitar uma divindade beneficente sob forma extra-humana quanta de acolher um genro nao-judeuJ" (Douglas. p. 0 de Mary Do uglas. 11 )..e rel. Douglas prefere ignorar as armaduras espedficas e bem-conhecidas das relaçôes intergrupais..presa durkheimiana a uma conclusào consisten te incluindo as rel açôes sociais dentro Il do sistema geral de represen. a exclusividade social dos israelitas como povo é comparada às relaçOes entre linhagens Ka ram ou Leie.com. mas ao menas concedeu m enos espaças para essa preocupaçào atuar. sao slmbolos pa r dircito mlto. sendo estas entend idas aqui co mo privilegiadas e 1 .~ A recusa deffil-Strauss de conferir status ontoI6gico a essa di stînçâo. Conseqü entemenle. 1973a) . conceitos de animais.' usando agora "slmbolo" e "signo" no sentido anglo·americano costumeiro (na verdade. pade agiralternadamente. outro (a . por outra lado .foi um passa decisivo no desenvo lvimento de uma teoria cultura1. Também é verdade que Lévi~Strau ss.: . Kamakau. isto é. uma importante caracterlstICa do Slgno motJvado lem frances. J: fkil constatar. cm contraste corn 0 nao· motivado. como jâ vÎmos.. 1973 p. assim a definiçao do sign Îficado de um pela conexa~.tuaI de um c6digo de objetos em uma mensagem funcional. a U1~. Primeiramentc..\'c1 co rn um conjuntode animais normalmente constituido. no processo. Es te é 0 resultado da adesào à decisiva separaçao durkheimiana da morfolotl gia social da represe ntaçào cole ti~ . simbolo no seu pr6prio d om inio. Douglas nem sempre é cuidadosa cm seus estudos de diferentes culturas ao comparar "grupos" ou processos de diferenciaçao da mesma ordem.' oug as esta realmente preocupada com 0 fundonamento de e1ementos j a simb6licos (relaçoes corn f :'fY. Douglas. .. as varias formas de ordem intergrupal. A amilise semi6 ti ca das praticas alirilenta~ res deve transcender de longe a transCerência aos grupos sociais. 1964). 1972). de Corças sociais..t6gica. Argumenta.BlE~riOr.223) .) como signos uns para 'os outros .d é "éo~ o·s. seria um erro equiparar a invocaçao da mente de Lévi-Strauss ao "princîpio de pensamento" de Morgan. a anâlise de Douglas . "0 homem nunca pode sel' imediatamente confren- n • < . no final. dos estudos antropol6gicos endereçados ao "simb6Iico" estao mais preocupados corn essa funçao de 1 segunda ordem do signo do que corn a constituiçao da forma e ~o signi~cado sim. da insistência de Morgan de que 0 crescimento das instituiçôes estava predetermlnado e limitado pela "16gica naturai da mente humana" a uma analise estruturalista cuja coda é composta por uma frase semelhante (Lévi-Strauss. em mTIa relaçâo de signo motivada.ao-{çoI6gico.~' à-parênéias dos primeiros. 48 bem verdade que essa recu sa nào desvinculou inteiramente 0 trabalho de Lévi-Strauss das preocupaçôes fun cio nalistas (cf. e portanto da domesticidade das espécies. .signifj. embora a implicaçao do casamento da filha do irm ao do pai entre os judeus. No cn taoto. ara como sigoificante ora camo significado do outra.. como aponta Roland Barthes.· . cada um continua sendo.38). Douglas 56 chega a essa correlaçao entre a consideraçao para corn 0 afim e as relaçàes corn as espécies intersticiais através de uma operaçao dupla na estrutura de troca que a disso lve (às vezes falsamente) em uro coeficiente de integraçao entre grupos. as estruturas elernentares (inc1uindo a forma LeIe da troca generalizada perm item uma incorporaçao mais radical de estranhos do que. 47 i ..lmente co~ 1 . a categoria da afinidade é identifid. Mais uma vez se coloca a questao da pretensa conexao entre os afins e as espécies anômalas.afins. ao leva r a em. como por exemplo no caso dos tabus alimentarcs e dos grupos sodais exclusivos. dividiria.taçôe~ coletivas. Nesscs exemplos. e vice· versa. que q U3 i1do 0 significante e 0 significado. nao considerando mais uma vez as régras. as espécies anôma!as na Polinésia sao muitas vezes identificadas especificamente corn as suas pr6prias linh agens ancestrais.. uma vez que toda a apropriaçao do simb6 lico intervém eH route. p. 47 Desse modo. 0 afim.·.m~ t.j J anômalas corn tipas de tracas matrimoniais. linhagens.as_p_ roibiçôe.d.: .sua apropr iaçao do social pela simb61ico . Mas 0 curso desse processo foi mais um a espiral do que um circula. que vista que se padern casar membros c1assificat6rios das categorias preferenciais de parentesco. entendida par Doug!as coma uma indicaçao de desprezo pela estranho. 1974). symbole]. ambos roram analisados dcntro de um unico qU:ldro de referência" (Kupcr. ou entre as respectivas diferenciaçôes dessas taxonomias. é muito difidl sc exaurir 0 . . linhagem minima por linhagem minima dentro da mesma tribo israelita (cC. a maior parte r. 3. portanto. através de estudos que Douglas prefere ignorar: Leach (1964) sobre os camponeses Kachin e Tambiah (1967) sobre os carnponeses Thai... 122 CrI/film c razao pnftica Dois paradigmos da tcoria all tropol6gica 123 1 :1 ij . além do signo do outro. significado de um pela a nalagia (Cracîonaria) corn 0 outro. baseada em uma l6gica de grau de distAncia do Jar. Baon e Schneider. E menos ainda negar a impor tância crftica das correspondências estabelecidas nas sociedades hurnanas entre categorias de pessoas e: categarias de coisas. na medida em que as varias regrascomo 2 da troca gcnera lizada. Dada a relaçao logiea entre e1es.b6Iicos).situa riam a pessoa intercalada. evi ta ndo todo e qualquer reducion ismo na rel açào entre sociedade e ideologia. coma sac geradas por regras de troca marital elementares e complexas.0) fara necessariamente corn que a maior parte do eonleudo cultural se evapore. praticas. cada u m dos e!ementos. é que no primeiro ' nao existe qua!quer adequaçao conceitual entre significante e sign ificado: 0 conceito "ultrapassa" 0 signo fisico. 1971. sendo estas t'iltimas tratadas coma me. igualmente. fi utra Corma de pensar essas Iimitaç6es é observar que Douglas esta }ogan 0 pnnclpd. açôcs motÎvadas entre sfrnbolos.1'-"'-"- O ij 46 De Corma seme!hante. essa inadequaçao é composta duplamente. labus a!imentkios etc. substituir os efeitos sociais abstratos por forrn conceituais espedficas. Crow-Omaha s (que proîbem a repetiçâo de inter\aSamentos corn as m~sn1'a\liriliâ~ens). como no aI/makI/a havaiano (cf.. ou 0 casamento da filha do irmao do pai . Pode ~ se obse rvar lllcluslVe um aparente fecham ento do clrculo te6 nc~. r ! ' ~ . '-1 Nao quero corn isso negar 0 sentido apurado que Douglas demonstra corn i relaçao à construçao humana da experiência. por . a verdadeira 16gica do todo socioc ultural é utili~ taria. similar. d ... Assim. como a cristand ade é maior que a cruz (1970 [ 19641. por exernplo. Inversamente. n~tura lis.31) tende a tornar-se um feichismo ae--sociabj@ je. que nao podia senao limitar-se a reagir racionalmente a valores pragmâticos inerentes à experiência. Desejo apenas sugerir as limitaçôes de uma anâlise que almeja fazer desmoronar a estrutura coocei. chega.. . mas sim invocando praticas de facto que Ih e permitem ignora-las {as regras}. 48 "Lévi-St rauss Coi bem-succdido porque n ao olhou os fatos culturais co mo expressoes. as exclusôes Crow-Omaha. de algu m modo. par exempla. Entreta~l' '~ to..46 Em suma. ' • .cados s~o constituidos" (1973a. corn 0 resultado sernelha nte de dissolver 16gicas estruturais definidas em in teresses funcionais incipientes. ela traduz essas regras e formas determinadas em implicaç5es de d istância social. ao contrario. p. Em segundo lugar.. ""~:. como se as co isas culturais fossem s i mplesme~te versôes substancializadas de solidariedades sociais. qu e governa se u entrosamen to d e ac?rdo ~on: a su....~e inteira e exclusivamente den tro da esfera da interpretaçao signifi cativa. _tëvi:Str:uss~~~<:?~?~~:liâOde~ufiïraSsubstanëi~~ ~xa:. Nenhum costume part i· cular podera ser atribuido à natureza da mente hurnana) pela dupla razao de que em sua particularidade cultural ela esta para a mente como uma diferença esta : para uma constante e uma pratica para uma matriz. Lévi-Strauss vê css:! perspectiva como 0 UI1I CO tlpo de matcn~hsmo '.561). ".4 j.. . embo ra nao diferentes em espécie dos c6digos est ruturais nO_5 quais 0 slstcma n ervos~ as interprcta.a l . p. mas a maneira em que os sign ificado s sâo sistematicamente relacionados ..at~lr::l : . ao que me parece. reveJ:lm. procura acima de tudo apreender (saisir) as propriedades intrinsecas de certos tipos de o rdens.. consisten te c.'" leis "subjacentes" à mente confere toda força de coerçao 30 lado m e ntal.como uma crH ica nitida a varios reducion ismos biol6gicos.i'~ l segundo apenas passivo.? seu método pr6prio de Iiga r men~e e natureza.269-73 algumas ten tativas de uma integraçao substanclal de estruturas cullurals C : 1 perceptivas. 1961 ! l84. Segu ndo a mes ma premiss3. "Vm estruturalismo autên tico. Mas se é forçado a referi-las a algo n'terno. as "similariclades" nâo padern aqui significaro contcudo daquele projeta. na med lda em que a natureza usa. p. questâo de "reducion ismo biol6gico". 0 objeto cultural. a estereoqu imica de 1 · odores _ qu e a mente emprega para ~~1~1preendê-la. projeto. Essas propricdades li do expresjam Nada do que esra fora de si mcsmas {grifo meuJ. um encargo que. 0 projeta do redueionismo. Piaget observou.que n6s con hec. ~s estruturas Ee_~!~~?~~. Talvez fosse melho r dizer que as cstruturas da m:nte s~. 49 Nessa passagem de L'Homme 1/11.como hdar ./': constantemente 0 cstru turali smo moderne consis te em um 1110 0 de Iscurso 'r. incluindo especificamente os sentidos e a· transmissao senso ri al.m. em url! outr~ I~i~el. pode se r observada como gerais.c~ lo car a cultura em um a posiçao de submi ssao e dependencla. p.. ~o~ ess~s cont radlçoes ~m. assim coma todo conteudo é um a form a dos conteudos que ele ab arca.cole tlva ou pensa men to ob)etlficado que atribu .cultural humano.).~o. . dando à me nte todos os poderes da "lei" e da " ~im~taçâo'~ acabou por . às estruturas originais da rcalidade.. Ma rxisme et structuralrsme. 1971) . -.... ha en lr~ c~~s um a cumPlîci-l\ :~~~ ~~~ l 0 dad e ultima que é a co ndiçao da posSlblhdade de compree nsao. Ô natureza-humana. ! 1. 197 1).I'uma funçao . 0 de que.me ntos...~. perm.a~ ~esmo conJ'!nto sâ~nge~ ilradas"t 197 1.o de Marx: UA pr6pria Hist6ria é lima parte real da Iu sfona lUlli/rai: da natureza gue \em a ser homem.I. mas antes arcaria ca m as co nseqüências de sua pr6pria ub iqüidad e.: s6 apliea operaçôcs que nao difcrem em espécie daquelas que ocorr:m ~o.m a ~aneira pela quai a ciéncia se desenvolve" (. Apenas os pontos comuns da estruturaçao podem ser referenc iados à mente.d~ mesma forma que a ciência do homem induira as ciências da natureza. em formas do tipo "oposiçâo bimiria". 50 "A nalurela aparece cada vez ma is como construfda de propriedades estrut~rais ~ndubitavelmcnte mais ricas.:'a pr6pna construçao..tente 11 \ cam a vis3. que 0 problcma principal do "reduc io nisdmo " qUd~ aOige ' '..enquanto tenta com~rcender 0 mllnd7.qual Lévj·Strauss une-se a ~l M~rx e a Durkheim atr~vés d.. Reco nhccer que apenas a mente écapazde compree~ der 0 ll111ndo que nos ccrea porque da. da sua pr6pria maneÎ ra. 0 olho que vê ~ conslderado em sua particularidade cultural. no . corn efeito...ib~d:). também nâo se trata de uma t:-':'. 0 c6digo genético. :Ë impossivel denvar 0 ~~ltural dlretamente da ~p eriência ou-dô-acoi1teèimento.. Todo 0 vocabulano das :. 0 argumenta se desenvolve com base na simples prernissa de que...'11 \).por exemplo. ou seJa. que toda fo rma é um conteudo relativo à sua forma circundante. q uaisquer sim ilaridades nas operaç5es pelas quais os diferentes grupos constroem ou transfo rmam se u projeto cultural padern sec atribuidas à maneira pela quaI a pr6pria mente é construida. ai nd a falta fazer a crHica especifica da posiçao morganiana connda dCI~tro da perspectiva estruturalista.' Pareceria. é 0 de explicar um tipo de ordem referindo-se a um conteudo q ue nao é da mesma natureza e que age sobre ele a partir de fora.a natureza exatame nte como governa seu investimento cam con teud os slgOlficatl vos dive:sos. E ela é totalmente conSlS.---~::--. Porém. (Lévi-Strauss 1972 p.14) . 'K '''''' que. como se 0 prime iro fosse 0 clemento allvO e_ .que.-_ . que parecem F .. na sua integndade slmb6liëa. termo~ de "consciência coletiva". uma discussâo da cuttu ra 'poderia igualmente provocar.operar por prindpios sim ilares ao contraste binario (cf. co n tu do. 0 l t m es mo tipo de processos .o -:: (1 --fiï. em um estrutul'alismo fa lho de compreensilo cultural (Piaget...iinpera tivos da 'c ultura do que se us impIe. Para alérn disso instaura-se 0 mais alto naturalismo.. C01~0 îndividual? Para responder a todasns questôes des se tlpO.. os modos de inlereonexao" (1971 . no entanto. co ncebida coma um a rede da quai as mais diversas ideologias..~qq. prossegue Lévi-Strauss..em a uma entidade quc~ socia. nem das propriedades estruturais elabo radas pela compreensao a fim de voltar. ETE~""""'-'-'"~~''' .':' ~~_~as riI!ff ~ ~.. . Eu ilustraria essa cr~tica lançando mao do notavel trabalho de Lucien Sebag. na medlda do posslvel. havera ruila s6 cl:ncla (Marx.~~ . Ver às p. 0 cultural pode apenas responder. ao contrario. interprctando esta ou aque1a propriedade nos termos de um a estru tura parlicular.lll ).J '.qual 0 Y: ..56 1). . na medida cm que a pratlca se desdo~ra cm um . //f . As ciências naturais chegarao a incluir a ciència do hom~. pr61 rLO mundo n..124 CI/Ill/ra e raziio puitÎca Dois /Ulnldig/luu da Icoria alllropolôgicn 125 tado ccm a natureza da man eifa pela quaI 0 materialismo vu lgar e 0 sensualismo empirico a concebem': escreve Lévi -Strauss.. na medida cm que 0 mundo humano é simbolicame nte cons ti tUldo.".~ . Nunca é uma questao de significados especfficos. Lévi-Strauss. sera necessano slt~ al 0 èquipaTÎ~ento mental humano anteS como instrumento do que como determman -· lêCa cultu ra. Lévi-Strauss emprega uma frase de Piaget . na st.baseada.. POl' consegu inte.Nâ realirlade. EI ~s co mpoem um conjunto de possibilidades orga ni zaciona is à disposlçao do pro)e to . nâo provocaria curto-circuÎto no simb6lico. Conseq üenlemente. Seu apelo ao esprit humain. sera necessârio vohar-se no sentido da organizaçao cerebral. é parte c produto deste mesmo mundo nao \r~ signifiea sel' mcnlalista ou ideali sta.e~10s. no co ntexto da mente.. "representaçao. t~niOpdarnvocaçao de um superorga nismo. onde se pode rec~nhecer uma tese que também é essenciamente de Boas. Aq~i. nosafastamos muito do "prindp io de pensa mento" d: Morgan. em si mesma. .\' Portanto. qu e cada grupo executa po r sua pr6p ria iniciativl. Como explicar a prese nça na cultura de estrutu ras universais ~ue)" (~ nao obstan te~ -n~o ~ao ~~i_~~~lm~ te 'presentes? F. a mcnte. entao. mas apenas 0 modo de ordenaçao.ê-Il0S-0S. Nesse sentido.. sons. ~once~ere-se. - ~~. em primeiro lugar.51 mas através da integraçao de certo numero de elementos naturais a um tipo de ordem que caracteriza a cultura. 1974). " . a exp~riênCia) mesmo quando ela se depara com ~. p. objeta ele: da . \) [Sebag. 1 . nunca é tao grande quanto a possibilidade que ela tem de estudar como.. entrelanto. Os determinismos entrevistos sao de uma ordem diferente da daqucles que impôe 0 meio._-_ _-.. tentei mostrar a continu{dade da luta da antropologia contra seu pr6prio l <~aturalismo. a utilizaçao ordenada e regular do universo animal supôem grande . essa caracterfstica é pr6pria de todo sistema simb6lico e mais profundamcntc de todo discurso. 5! Compare-se corn Rappaport (1967).o r meio da quai é compreendida.142. « .-_..'V"" 't\ " . certas sociedades do mesmo tipo organizam 0 espaça.' I Ao confron tar os ultimos desdobramentos do estruturalismo corn Morgan e i\Boas.' l .) ou cultural (a forne cida par sistemas semiol6gicos jâ construfdos) e aplicaçao a essa matéria que é ordenada em si mes ma d e um prîncfpio de oTganizaçao que Ihe scja transcenden te. .• '" " " . .1 'C. a um côdigo _~: distinçôes pr6prio à cultura em quéstao. "' "t l. {1964. 0 llltelro: 0 pr6XIffiO. Iho da terra. de analises que nao podern. tualmcntc" c nas praticas rituais da sociedade a maior sabedoria biol6gica da adaptaçao. a pratica de determinado tipo de cultura sao 0 p roduto de um trabalho permanente do in telec ~ to que sc exerce sobre um certo meio natural. do que é irredutiv€l a certo nivel de funcionamento da socîedade.' .' .'.. ser !evadas a termo de maneira "Cragmentada. .. de pesquisas. Mas a passive) relaçao que essa paroquial co ntrovérsia passa ter Ilcom 0 marxismo requer outro capltu 1" l . cuja relaçâo corn 0 objeto é prccisamente con fin ada às coisas como elas sâo: A Fecutldidade da geografia huma na. nâo pode have r qualquer interesse ou sign ificância prâticos nos objetos de consumo.. ~ . ! i !' .p 216. a sociedad e com porta sign ificados d esenvolv idos por toda a ordem culturaL Para os homens. os meios de tematizar efetivamente essa constitui çào de sentido. 1964. 1 en contra-se red uplicado pela integraçao de cada un idade significa nte (integraçao que 1 é a pr6pria lei dessa associaçao) em um sistema difcTenciado que perm itc 0 surgimen1 to do efeito de sentido. Dois p(/radigmas da leori(/ antropo16gica ..1 lEm francês 00 original.J . estes Ultimos nao possuem ~ um carMer malS natural do q e qualqucr outro aspecto da cmtura de uma sociedade. <") li. ( :. As distinçoes da natureza reaparccem portanto na traduçao cultural.is se desenvolvc em um universo ja simbolizado e nao é concebivel qualquer surgimento anterior dessa simbolizaçao. que. gestos etc."·\ A tese nao é mais que uma deduçao im ediata da natureza do pensamento simbo- f}".) ~Ignl ~cado. p. Vê~sc entao cm que sentido a noçao de infra-estrutura pode encontrar um sentido relativo: trata-se sempre do limite do espîrito. Berger e Luckmann.\ ~ quant idade de observaçôes. 127 mundo jâ simbolizado. a partir de condiç6es naturais globalmente idênticas. f '.em mais vasto que ultrapassa 0 pIano l tecnol6glco ou SimPlesmeOfleCOri. os ritmos de utilizaçao do solo etc. assim. _ alternativa marxÎsta corrente. €las s6 tomam forma através da 1mediaçao de u~~ma .J '.] Mas seus comentârios sobre a experiência da natureza também sac diretamente relevantes para a antropologia convencional da praxis: A ioterferência entre natureza e cultura nao provém entao da sua colocaçao em relaçao extrînseca. .. 0 tra~a.. que é também. l 07 -8. . t (~ c .ômiCO. Ci} . A natureza tornase cultura nao em razao da existêncïa de um sistema de equivalências que faria corresponder a cada unidade de mn dominio uma unidade emprestada a um outra domfnio.1 lEm fT ancés no original. \ '1 " L~ ~tMk.. é construi~...~ l li 1 1 il 1 '. remete a totalidade das significaç6cs ao sujeito em fornccer.. 1 ~ \:t . ! 0 arbit rario do signa. . 1967). Mais que uma p ratica ou interesse "econômico".~ " da coma uma realidade humana pelo:conceitodela (cf. tal como é caracterîstico no s animais.• ·. Ora. Friedman.. ' • 1 (... que encontra oculto no "meio ambientc apropriado concei. j '. 'b . '. cada sociedade poderia ter feito a mesma escolha que a vizinha e nao a fez por motivos que sac 0 signa de seus objetivos essenciais.. sen do a segunda apcnas um mcio de forçar uma aderência às primeiras (cf.de pcnsan:e~~). 0 cielo de atividades produtivas. É cm direçao a essa tematizaçâo que tendem as distinç6es que retomamos depois de outras. .uma realidade externa à Iin guagcm 'p. A criaçao de detcrm inada espécie de animais. sem duvida. pois essa prâx.:1. matéria que pode ser natural (cores. desde que a mensagem que eJe veicule 'suponha urna codificaçao suplemcntar em relaçao à da lingua.. a fabricaçao de Înstrumentos. 1 ) Ibid. a preparaçao do terreno.. elas excluem a possibilidade de uma gênese hist6rica ou l6gica da sociedade em seu conjunto a partir da praxis constitutiva dos indivfduos e dos grupos. uma luta contra sua pr6pria natureza bItturai herdada. resmtado da associaçâo de do is planas distintos do real. mas de uma culturalizaçao da realidade naturaI. " " . por con seguin te. Scbag desenvolve a idéia no contexto . 126 Cu/lZlra e raziio prtitic(/ : . da pode ser definida como se segue: utilizaçao de uma matéria retirada de outre registra que nao este onde funciona 0 sistema. 0 ' ~ ~ \\~) . po ç assim dizer. . '.' '" . de modo al~ ' j gum.co'Fi? signi fi cado é sem pre ar~~0-üo em relaçao às propriedades fisicas doobj~t~ As ressonâncias da primeira v iagem d e Boas aos esquÎm6s aparecem claram ente no texto de Seb ag..
Comments
Report "Marshall Sahlins - Cultura e razão prática dois paradigmas da teoria antropológica"