Anotações de Even Ruud - Caminhos da musicoterapia

May 30, 2018 | Author: daniel_avila4251 | Category: Psychology & Cognitive Science, Emotions, Self-Improvement, Thought, Psychoanalysis
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Anotações de Ruud, Even. Caminhos da musicoterapia. São Paulo: Summus, 1990. Trabalho original publicado em 1990. Cap.1 Musicoterapia – Profissão de Saúde ou movimento cultural - Música como instrumento diagnóstico: análise das improvisações e avaliação do nível de desenvolvimento da criança/sintomas - “a opção terminológica reflete com frequência sistemas subjacentes de avaliação ou uma escola de pensamento à qual pertence o terapeuta que está definindo. (p. ex. “crescimento” e “mudança” – psicologia humanista; “adaptação social” – comportamentalistas?; “aumentar as possibilidades de ação do paciente” – sociologistas) - doença: “conflito ou contradição entre o estado biológico/psicológico do paciente e o meio econômico e material em que vive” (p. 15). Doença ou incapacidade podem ser reduzidas “não por intervenção terapêutica mas por mudança de contexto material ou cultural da pessoa” (p. 15). - A cultura pode ser então “curada” ou “doente”, ou fazer parte do tratamento. História das Teorias da Musicoterapia: “a história da musicoterapia relata que sempre houve alguém capaz de transformar as novas descobertas do pensamento filosófico ou político predominante em uma nova base racional voltada ao uso da música para cuidar da saúde ou da doença” (p. 17) - Pré-científicas: “Música como reforçador usual da mente”: Doença é causada por um verme/animal (quimera) no corpo e o trabalho da música é reforçar a mente para que esse animal não entre (Centro médico de Epidauros – Grécia) - Ciência moderna: “Música pode expandir ou contrair o spiritus animale do corpo e, portanto, influenciar de maneira direta o estado da mente” (Descartes e a teoria do afeto), capacidade em atingir as esferas “pré-intelectuais” da mente. - Ciência romântica: “(...) quando todo o universo consiste em um organismo vibrante, dançante, música e som realmente devem ter sua oportunidade histórica de mudar a humanidade” (p. 17) “Música como espécie universal de terapia ou pacificadora”, em função de uma abordagem holista da vida, influência de outras culturas musicais, colapso da lógica linear e da razão instrumental. Para Ruud, essa mudança levaria o foco às qualidades inerentes da música em efetuar mudanças, independentemente da intervenção do terapeuta. “Uma característica desse panorama parece ser que a música possa se constituir numa ilustração de algumas das características básicas do ‘universo’, ‘realidade’, ou como designarmos o mundo ‘lá fora’” (p. 18) a arma do crime.Ruud crê que. -“Uma crítica importante contra boa parte da musicoterapia e especialmente algumas recentes abordagens esotéricas (“música é uma força vibrante.Teoria Racional: a realidade é mais do que o “dado”. . no entanto. e faça sentir bem ou em direção a algo melhor? Em suma. curativa” (. o ato terapêutico deve ter uma eficácia simbólica. depois da integração. Afirmar algo sobre o mundo é criar ou recriar esse mundo pela representação das sensações em um sistema de linguagem culturalmente obtido. .)) é que estão usando explicações psicológicas.. mas não há meio de acessar essa realidade senão pela linguagem. 2 Teorias do modelo médico . perceber como a participação universal através da música nessa outra realidade pode ou deve garantir ‘paz. aquele criado com a música) com algum efeito terapêutico. saúde e harmonia’” [grifo nosso] (p. ex.Atitude religiosa: compreensão de outra realidade transcendente a esta. tomando-se como ponto de partida a natureza . reduzindo todos os processos da doença a processos e energias psíquicas” (p. isto é. se não houver falta. a música pode apenas trazer efeitos temporários Cap.Doenças/distúrbios mentais são alterações bioquímicas no organismo “a influência da música poderia ser melhor explicada.ex. deve transitar por meio de alguma representação. 19). “a música é um salto básico” ou “nós todos participamos de uma vibração universal” “Torna-se difícil. pois o processo de ligação ao Outro é claro e por duas etapas: alienação (integração) e separação.Abordagem holista: duas visões do mundo . o sistema todo falha. Da mesma forma. acessada e compartilhada por todos por meio da música (p. desconsiderando o contexto orgânico ou material. O laço está naquilo que se experimentou e que nunca mais voltará. 18) Direção clínica importante: vincular a participação no comum (p. nesse caso. e o desejo que será a consciência culpada e o objeto a. Daí o discurso da falta ser a pedra angular.. o que faz laço? É aqui que o discurso lacaniano se instalou. depois de participar de algo comum que faz com que algo mude. O que vem depois disso. 30) Cap.biológica do ser humano” (p. i. 1954..a música pode influenciar os processos básicos [grifo nosso] que causam os sintomas. “Uma vez tendo atingido o tálamo. ex: Princípio ISSO.Modelos de pesquisa fisiológica da música 1)Pesquisa pura – efeitos fisiológicos como fatos empíricos para aplicação em outras pesquisas 2) Pesquisa conduzida com o intuito demonstrar que a música apresenta efeitos mensuráveis e previsíveis sobre o ser humano. possui fundamentos orgânicos. 21). P. É a estimulação do tálamo que incita o córtex e as vísceras e musculatura. 30) “Os conceitos aos quais a música se refere atingem o plano interior da pessoa através da ‘porta dos fundos’ e esta vida interior de distorções é resolvida e trazida à tona pelo conteúdo conceptual da música” (p. emoções.e. explicações das reações fisiológicas à música . p. 1967) “Para a maioria das pessoas a essência verdadeira da música está no fato de que ela proporciona a cada pessoas a oportunidade de projetar suas experiências particulares através de suas próprias imagens pessoais ou mesmo de ouvir sem tentar evocar imagens de qualquer espécie” (Farnsworth. (A dificuldade em comprovar um efeito terapêutico a longo prazo torna a segunda posição menos aceita) 3) Uma vez conhecendo que a música influencia determinados sistemas fisiológicos. persistindo a situação. e ao pensamento e raciocínio. Altschuler – “teoria do tálamo” ou “teoria Cannon-Bard de emoção”: o tálamo tem a capacidade de ser atingido pela música antes de outros centros cerebrais. 1921: “este assunto difícil que se situa o mais distante da exploração psicanalítica” Escritos psicanalíticos sobre a música: 1) Linguagem da música (3 aspectos discutidos) a) propriedades específicas da música que a distinguem da linguagem falada b) semelhança auditiva entre a música e outras formas de expressão significativas c) música como um padrão de símbolos que expressam conteúdo inconsciente (Noy. um contato mais próximo entre o hemisfério dominante e o mundo da realidade por ver a se estabelecer” (Altschuler. 3 Teorias psicanalíticas Sachs. p. aplicar esse conhecimento em terapia (dificuldade é o musicoterapeuta aceitar as seguintes proposições: . 96) . 1969. o hemisfério dominante é automaticamente invadido e.a “doença mental se assemelha a qualquer outra doença”. Isso explica porque a música está ligada aos afetos. fisiológicos e bioquímicos . relação da música com o conteúdo é a mesma que no sonho “Supõe-se facilmente que em música. mais do que em outraos campos de criação artística. aceitáveis ao ego. no entanto deve ter sido bastante agradável ao indivíduo cuja fantasia era inteiramente sexual. Ponto de vista econômico: harmonia pode gratificar mais pela quantidade de expressão simultânea libidinal. usando a ideia de que a ontogênese repete a filogênese Nettle tentou fazer uma analogia entre as músicas infantis e as primitivas.2)Desenvolvimento da linguagem musical Bachelard (1968) sobre a origem do canto no homem primitivo (“Pôr fogo num graveto atritando-o no sulco de um pedaço de madeira seca leva tempo e paciência. a combinação da tensão nascida em cada item pode aumentar a energia individual a ponto de derrubar uma inibição. utilizam-se . sublimação. Esta tarefa. o homem provavelmente aprendeu a cantar” (p. Enquanto emprenhado nessa tarefa delicada. a pessoa esteja apta a projetar os seus desejos mais profundos de maneira simbólica e torná-los. 28) Theodor Reik: origem da música pe o culto ao totem. Na criação musical. canto é construído em terça menor ou segunda maior e é ritmicamente estruturado numa sequência de duração igual à que precede um som mais extenso (tema inicial da quinta sinfonia de beethoven). é a transformação de impulsos no inconsciente. então. energia sexual primitiva em transformação. sem necessidade de um processo intelectual. Origem ritualística e ligada à dança Noy: origem da atividade musical se dá no início da vida. fantasia e chiste: transformação de desejos latentes (pode então ser analisada e interpretada) Masonyi: criação musical é a mesma que ocorre no sonho. 4) Música e Emoção Tendência absolutista: Música se refere a si Tendência referencialista: foco no extramusical Psicanalistas?. Nenhum psicanalista tentou integrar a visão “histórica” com a “desenvolvimentista”. ex. “antes que a libido narcísica tenha se desenvolvido em sexualidade objetal” – narcisismo primário e ego que não delineia nitidamente os limites do eu e da realidade. para a psicanálise. tendência expressionista (música expressa emoções e é atraente ao mundo dos sentimentos 5) Estrutura da música Estrutura musical análoga ao sonho. 3) Origens intraspsíquicas da Música Arte. em seus sentimentos. p. Pfeifer: música é satisfação autentica da libido. desejos e proibições conflitantes. música-id e música-superego. por causa de sua natureza abstrata. A música provoca em nós um estado que atua. b) música como defesa de determinado perigo. mas uma atividade do ego com o objetivo de: gratificar-se. para dominá-los. Aqui ela é ativa enfrentando a parte do ego na consecução de certos objetivos 8) Música como estímulo Taylor e Paperte (1958): “a música. inversão. A música é mais que uma expressão indireta da energia básica e desejos inconscientes. . 252) .se a música lembra a estrutura da experiência e conflitos inconscientes. e que podem então ser expreso e reativados por meio dela. .técnicas semelhantes às do sonho e do chiste: condensação. de forma passiva. deslocamento. trazendo-os à tona. ela deve ativá-los. de algum modo. 82-94) 9) Música como Função-do-Ego Com o objetivo de atingir o domínio. Kohut e Levarie: ruído como ameaça primária. lapso e assim por diante. tende a uma regressão primária. unidade ou defesa contra diferentes forças. contatanto diretamente os centros mais profundos. p. despertando diversas reações no organismo que.indicação para tratamento do autismo. desvia o ego e controles instintuais e. resolve conflitos latentes e emoções. pela não-verbalidade. provoca reações de defesa e organização. defesa contra forças diversas e domínio. que podem ser usadas para equilibrar a estrutura do paciente. Racker: repetição – Tanatos e variações em uma unidade “The Unity of Multiplicity”. Terapia Psicanalítica e Prática da Musicoterapia Wrigth e Priestley – “Analytical Music Therapy”: sessão de improvisação livre com o analisando toca vários instrumentos de percussão e o analista toca piano – pode usar a música para a expressão de conflitos e emoções e descarregar sensações angustiantes e dolorosas. Eros) 6) A personalidade do músico Patografias (estudo da vida do artista criador em vez do significado da música como tal) 7) Funções da Música a) música é um estímulo externo. fazendo a sua expressão possível Sentimento oceânico: Momento em que a música dissolve o mundo externo e interno (Noy. como um sonho no sentido psicanalítico” (p. Wang (1968): música-ego. que em um nível mais profundo. valores. ritmo. constâncias. orientações comportamentais. que passa a ser identificado como um alicerce familiar. 5 . "arena de formas e gestos repetitivos.Diálogo musical entre duas pessoas inteiras em um contexto chamado de "estética": "A estética é uma circunstância na qual as condições incluem as tendências humanas do indivíduo. que propriciam um fundamento para a inovação . força e movimento e significativos recursos externos no campo existente". A intencionalidade denota a estrutura dinâmica da cosnciência. atitudes. modos.poder: "O poder é vivenciado através de um diálogo entre motivação interna. questões de crescimento e modificação" . .Ruppenthal (1965): rabisco musical Alfred Schmölz Edith Lecourt Mary Priestley Johannes Eschen Wolfgang e Beate Mahns: musicoterapia psicanalítica infantil Isabel Frohne Cristoph Schwabe Cap. inseparável dos objetos que a informam.Aspecto ritual. atitudes. confiável. valores. Carolyn Kenny: abordagem fenomenológica na improvisação em musicoterapia . Ruud (1987): modelo de quatro etapas para descrição de aspectos musicais na improvisação em msucioterapia a) ouvir a improvisação abertamente para dar início à abordagem auditiva com todad as possibilidades de expressão mantidas (redução fenomenológica) b) nível estrutural: identificar aspectos estruturais/códigos como andamento. um território que é bem conhecido e seguro " "espaço para experimentação. que é a pessoa" (Kenny. 1987.Musical Space: "espaço sagrado. 173) . A experiência nos demonstra que a consciência é sempre consciência de alguma coisa. pensamentos. imitação em formas sonoras que expressam.The Field of Play: território da improvisação . Ao contrário.Tendência Humanista/Existencial Brentano: "consciência não é puramente formal no sentido kantiano nem inútil e passiva no sentido lockeano. a [estética]. representam e comunicam sentimentos significativos. O conteúdo subjetivo da consciência não pode estar separado de seu conteúdo objetivo. experiências de vida e todos os fatores que se unificam para criar a forma integral e concreta da beleza. modelação. p. conceber a consciência como inútil ou desconexa é interpretá-la. tessitura. pois toda afirmação sobre a realidade deve estar fundado em um sistema de linguagem construído socialmente. A . ou afirmações mais metafísicas como “a linguagem das esferas” ou a música como energia afetando centros do corpo humano. onde podemos alegar ou alcançar intersubjetividade.c) nível semântico: significado d) nível pragmático: expressão . poderíamos proporcionar uma descrição do elemento da música que pode ter conduzido a modificações significativas no comportamento do paciente" OBS 1: trevarthen: intersubjetividade inata indica que o tratamento do autismo deve ser mais voltado à sócio-comunicação que à modificação do comportamento. é um ponto de partida necessário caso nossa descrição ganhe credibilidade científica (. de comunicação musical. Há. 6 – Conceito de Música em Musicoterapia “O que é música” não está dissociado de valores culturais implícitos na linguagem. “música é emoção”. Tanto da música como do "conhecimento do paciente. sem destaque à natureza expressiva ou comunicativa Música como meio de comunicação: Psicologia da “terceira força” – música contém ou representa emoções que são comunicadas ao ouvinte.. 86) Música como estímulo discriminativo: descrição dos parâmetros acústicos. “a música é triste”.) Desta maneira.. que argumentar contra uma crença dogmática na linguagem natural da música como atividade “psico-mecânica”. 89). Conceito que encontrou forte apoio na cultura e provou a eficiência na musicoterapia humanista.Dois últimos níveis devem partir da experiência intersubjetiva (minha interpretação). OBS 2: A compreensão disso é todavia de mais importância quando se estão limando as demais correntes não-behavioristas Cap. todo o terreno intersubjetivo) "Parece-me que essa descrição de uma área de um código musical observado. no entanto. os efeitos ou a natureza da música’” (p. onde a música é vista abrangendo numerosas emoções ou conceito a seres transmitidos ao ouvinte. parece mais razoável considerá-la como um meio de criar uma situação comunicativa onde se encontra um número infinito de possíveis representações da música” (p. está tentando lidar com a antiga questão do ‘significado. o que está contido na expressão da música" (talvez esteja contido muito mais. “Em vez de salientar o ‘modelo de transmissão’. “ música são ondas sonoras” Panorama Contemporâneo: “O musicoterapeuta contemporâneo entregou a questão da natureza da música ao psicólogo musical quem de acordo com prevalecentes regras científicas. e. apenas presente. não apenas aspectos da mente e do corpo. Esse conhecimento ampliado. “Devido à sua natureza ‘estética’ indefinida ou. algumas vezes.e. i. pode nos ajudar a construir novas categorias. tendo um caráter diferente na melodia e na harmonia. 91) . a experiência musical pode transcender o código cultural e verbalmente organizado. E se esse conhecimento ampliado inclui. transformado em música.. onde imagens se sobrepõem.representação depende. a nos abrirmos na direção de áreas não pesquisadas do corpo e da consciência. nesse sentido. harmônico e melódico pode expressar imagens e sentimentos complexos. nem negação ou conjunção. às vezes. A natureza polissêmica da música nos força. Aprendizagem e Contexto: Valor fundamental da música em nossa cultura – meio de criar e representar novas categorias de experiências não referenciais. A música não é capaz de passado ou futuro. mas um novo conhecimento de nossa relação com a natureza assim como nosso lugar na comunidade social. Experiência. Última analogia é a condensação. um único motivo rítmico. combinado com pensamento e reflexão. ligados ao inconsciente. simplesmente à sua presença sonora. i.. Música como linguagem não-verbal: Linguagem emocional capaz de atingir áreas da psique que processam informação mas que não nos comunicamos a nós mesmos. a simbolização pode ser apresentada. há uma esperança de que a experiência da música possa conduzir a mudanças pessoais” (p. A estrutura polifônica da música é como a estrutura do sonho. novos espelhos através dos quais iremos de encontro ao mundo. dos indícios dados pelo contexto e o nível de percepção e consciência envolvido. fazendo com que as contradições sejam apresentadas em conjunto. É a entonação que determina o significado. Uma das funções primordiais é o impacto. cultural e universal. Friedrich Klausmeier (1984): semelhanças entre música e processos primários do pensamento (anterior à lógica e à linguagem verbal). dependendo de como se apresenta o conteúdo e expressão.


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